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Investigación y Educación en Enfermería

Print version ISSN 0120-5307

Invest. educ. enferm vol.31 no.3 Medellín Sept./Dec. 2013

 

ARTÍCULO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE/ ARTIGO ORIGINAL

 

Aleitamento materno exclusivo. Motivações e desmotivações das nutrizes de Eldorado do Sul (Brasil)

 

Exclusive breastfeeding: motivations and disincentives for nursing mothers in Eldorado do Sul, Brazil

 

Lactancia materna exclusiva: motivaciones y desmotivaciones de las madres lactantes de Eldorado do Sul, Brasil

 

 

Juliana Machado Schardosim1; Petronila Libana Rauber Cechim2

 

1Enfermeira, Mestranda. Universidade de Brasília, Brasília, DF - Brasil. email: jumachadoju@hotmail.com.

2Enfermeira, Mestre. Professora UNISINOS, Sao Leopoldo, RS - Brasil. email: plcechin@unisinos.br.

 

Fecha de Recibido: Octubre 30, 2012. Fecha de Aprobado: Agosto 20, 2013.

 

Artículo vinculado a investigación: Aleitamento materno exclusivo. Motivações e desmotivações das nutrizes de Eldorado do Sul.

Subvenciones: ninguna.

Conflicto de intereses: ninguno.

Cómo citar este artículo: Schardosim JM, Cechim PLR. Exclusive breastfeeding: motivations and disincentives for nursing mothers in Eldorado do Sul, Brazil. Invest Educ Enferm. 2013;31(3): 377-384.

 


RESUMO

Objetivo. Descrever as motivações e desmotivações que influenciam a adesão à lactância materna exclusiva até os 6 meses de vida do menino no município de Eldorado do Sul (Brasil). Metodologia. Investigação exploratória descritiva qualitativa. Entrevistaram-se de outubro a dezembro de 2009 a 25 mães de meninos de 6 a 18 meses de vida. Resultados. Emergiram três categorias de motivações -o leite humano e a saúde e nutrição do menino, praticidade e economia, e, prazer e promoção do vínculo mãe-bebê- e três de desmotivações - diminuição brusca do leite sem causa aparente, o trabalho fora do lar, e, problemas com os seios e os mamilos-. Conclusão. A decisão de amamentar exclusivamente ao menino menor de seis meses envolve um conjunto de fatores que deve enfrentar a mãe durante a lactância.

Palavras chaves: aleitamento materno; enfermagem obstétrica; desmame.


ABSTRACT

Objective. Describing the motivations and disincentives that influence adherence to exclusive breastfeeding until children's six months of life in the town of Eldorado do Sul (Brazil). Methodology. A descriptive qualitative exploratory study. Between October and December/2009 it were interviewed 25 mothers of children aged from six to18 months. Results. Three categories emerged from motivations - relationship of human milk with health and child nutrition, practicality and economy, and enjoyment and promotion of mother-infant bond; and three from disincentives - sudden decrease of milk with no apparent cause, working outside the home, and nipple trauma. Conclusion. The decision of exclusive breastfeeding until the child's six months of life involves a group of factors that the mother has to face during lactation

Key words: breast feeding; obstetrical nursing; weaning.


RESUMEN

Objetivo. Describir las motivaciones y desmotivaciones que influencian la adhesión a la lactancia materna exclusiva hasta los seis meses de vida del niño en el municipio de Eldorado do Sul (Brasil). Metodología. Investigación exploratoria descriptiva cualitativa. Se entrevistaron, de octubre a diciembre de 2009, a 25 madres de niños de 6 a 18 meses de vida. Resultados. Emergieron tres categorías de motivaciones: la leche humana y la salud y nutrición del niño, practicidad y economía, y placer y promoción del vínculo madre-bebé; y tres de desmotivaciones: diminución brusca de la leche sin causa aparente, el trabajo fuera del hogar, y problemas con los senos y los pezones. Conclusión. La decisión de amamantar al niño menor de seis meses envuelve un conjunto de factores que debe enfrentar la madre durante la lactancia.

Palabras clave: lactancia materna; enfermería obstétrica; destete.


 

 

INTRODUÇÃO

O aleitamento materno (AM) é um tema amplamente discutido na enfermagem. Trata-se de prática com inúmeros benefícios para o binômio mãe-bebê. O AM bem sucedido não depende apenas da vontade e disponibilidade da nutriz sendo importante o auxílio e orientação por parte dos profissionais de saúde desde o acompanhamento pré-natal, durante o parto e recuperação até o retorno da nutriz e seu bebê para a Unidade Básica de Saúde. As prevalências de AM exclusivo e não exclusivo no Brasil em 1999 eram respectivamente: 53.1% e 88% nos primeiros 30 dias e 9.7% e 72.9% entre 151 e 180 dias de vida da criança.1,2 Na região Sul as prevalências de AM exclusivo e não exclusivo variaram respectivamente: 64.3% e 82.3% nos primeiros 30 dias e 12.9% e 65.2% entre 151 e 180 dias.1-2 Estudo realizado pelo Ministério da Saúde do Brasil em 2009 mostrou prevalência de AM exclusivo no Brasil em crianças menores de 6 meses de vida de 41% e na região Sul 43.5%.3 Observa-se, portanto que nestes 10 anos, mesmo com a criação de programas e políticas públicas de atenção e incentivo ao AM e incentivos na mídia, as taxas de prevalência de AM exclusivo aumentaram mas mantém-se ainda abaixo de 50%. Neste cenário torna-se importante a investigação dos motivos que levam estas mães a abandonarem a prática da amamentação para desenvolver ações direcionadas às causas.

O Ministério da Saúde em sua Política Nacional de Promoção Proteção e Apoio ao Aleitamento Materno possui algumas estratégias: rede amamenta Brasil, rede brasileira de bancos de leite humano, Iniciativa Hospital Amigo da Criança, proteção legal ao aleitamento materno, mobilização social e monitoramento dos indicadores de aleitamento materno no Brasil.4 As ações possuem diferentes públicos alvo com o objetivo comum de aumentar as taxas de aleitamento materno no Brasil.

A Organização Mundial de Saúde5 classifica o aleitamento materno nas seguintes categorias: Aleitamento materno exclusivo: a criança está recebendo somente leite materno, diretamente da mama ou extraído, e nenhum outro alimento líquido ou sólido, com exceção de gotas ou xaropes de vitaminas, minerais ou medicamentos; Aleitamento materno predominante: a criança está recebendo além do leite materno, água ou bebidas a base de água, como sucos de frutas e chás; e Aleitamento materno: a criança se alimenta com leite materno independente de consumo de outros líquidos ou alimentos sólidos/semissólidos, inclusive o leite não humano.

Incentiva-se o AM baseando-se nos benefícios para o binômio mãe-bebê, que além da saúde física interfere na formação do apego entre mãe e filho. Sabe-se que o leite materno possui os nutrientes necessários para o desenvolvimento do lactente até o 6° mês de vida, sendo desnecessário administrar outros alimentos sólidos e líquidos. Os componentes imunológicos protegem contra doenças infecciosas e alérgicas, a melhora no desenvolvimento cognitivo é citada como benefício em longo prazo e pode ser atribuída à grande quantidade de energia fornecida pelo leite humano que auxilia o processo de mielinização dos nervos. Para a puérpera o AM potencializa a involução uterina prevenindo hemorragias puerperais, auxilia o retorno mais rápido ao peso pré-gestacional e promove sensação de relaxamento causada pelos hormônios envolvidos no processo.5,6 Estudos sobre AM e políticas públicas descrevem o processo biológico e comentam a importância do profissional da saúde no incentivo e orientação das pacientes para que a adesão à prática seja positiva, mas pouco comentam sobre as motivações e desmotivações maternas para a adesão ou não ao AM. Na assistência, por vezes, os profissionais deparam-se com situações das mães não quererem amamentar e mesmo assim continuam transmitindo seus conhecimentos sem investigar as razões. Ansiedade, tensão, dor, estresse e insegurança podem inibir o reflexo de ejeção do leite, por isso a importância de um espaço de diálogo com as pacientes e suas famílias.5,7

A prática do AM é transmitida às mulheres como prazerosa, benéfica para elas e seus bebês, porém sensações desagradáveis são sentidas principalmente no início, até que o organismo se adapte e estabeleça a lactação conforme demanda. É comum as nutrizes sentirem cólicas nos primeiros dias pós-parto durante a amamentação, isto ocorre pela ação da ocitocina, outras sensações como dores mamárias e agulhadas durante a descida do leite também são descritas.6 A partir desta reflexão foi estabelecida a seguinte questão norteadora: porque o aleitamento materno exclusivo até o 6° mês de vida possui baixos índices de adesão no Brasil? Diante do exposto o objetivo do estudo consistiu em investigar e descrever as motivações e desmotivações que influenciam na adesão da nutriz ao aleitamento materno exclusivo até seis meses de vida da criança.

 

METODOLOGIA

Trata-se de estudo exploratório descritivo qualitativo. O estudo foi desenvolvido em Eldorado do Sul/RS, no Pronto Atendimento Pediátrico Municipal (PA). Foram incluídas no estudo mães de crianças pacientes do PA com idade igual ou superior a 18 anos, mãe de feto único, parto a termo compreendendo-se este como ocorrido entre 37 e 42 semanas de gestação, peso de nascimento do feto igual ou superior a 2 500 gramas, neonato sem intercorrências que exigissem internação em unidade neonatal, lactente possuir 6 a 18 meses. Foram excluídas mães com patologias que contraindicavam a amamentação e mães que haviam desmamado o filho precocemente por indicação médica.

As entrevistas com roteiro semiestruturado com perguntas abertas foram realizadas no PA entre outubro e dezembro de 2009, pela própria pesquisadora com seleção intencional por informações encontradas no prontuário no PA no momento em que as mães procuraram o serviço para atendimento de seus filhos, até identificar-se a saturação dos dados (informações repetitivas compartilhadas com o pesquisador pelos participantes). Os relatos foram gravados e transcritos e as gravações serão mantidas em poder da autora durante 5 anos, sendo apagadas após este período. O convite para participar do estudo foi realizado na triagem antes da consulta médica.

A análise das entrevistas seguiu a metodologia de análise de conteúdo em quatro fases: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação. Este processo inclui a organização do material a ser analisado, definição dos registros, trechos significativos e categorias bem como a quantificação e categorização das informações para verificar a frequência que estes dados apareceram nos relatos. Procurou-se ilustrar o texto com passagens retiradas diretamente das entrevistas para tornar as descrições mais consistentes e aproximar o leitor do conteúdo.

Os princípios éticos foram respeitados conforme orientações da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.8 O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Vale do Rio dos Sinos sob n°09/092 e pela Prefeitura de Eldorado do Sul. As mães que aceitaram participar do estudo assinaram o TCLE na sala de espera do PA. Os autores consultados foram referenciados ao longo do texto e os nomes das mães entrevistadas foram substituídos por pseudônimos (componentes do leite humano)6 para aproximar o leitor do tema do artigo. Cabe salientar que o estudo não recebeu nenhum tipo de ajuda financeira ou subvenções e não houve nenhum tipo de conflito de interesse.

 

RESULTADOS

Foram entrevistadas 40 mães de lactentes entre 6 e 18 meses conforme os critérios previamente estabelecidos. Após, foram excluídas 15 participantes devido aos critérios de exclusão. A amostra final totalizou 25 participantes divididas em 2 grupos: o grupo de nutrizes que mantiveram a amamentação exclusiva durante os primeiros 6 meses de vida da criança (Grupo A) e o grupo de nutrizes que não mantiveram amamentação exclusiva até 6 meses de vida do bebê (Grupo B). Na análise das entrevistas surgiu a necessidade de incluir uma participante nos dois grupos por possuir dois filhos (um que foi amamentado exclusivamente e outro que não foi amamentado exclusivamente por 6 meses) que atenderam aos critérios de inclusão do estudo. Desta forma ambos os grupos (A e B) contém 13 participantes cada, sendo 1 participante em comum.

Os dados sócio-demográficos apresentaram idade das participantes variando entre 18 e 45 anos, porém no grupo A a faixa etária mais frequente foi de 26 a 30 anos enquanto no grupo B foi de 18 a 20 anos. Quanto à situação conjugal, escolaridade, renda familiar e ocupação os dois grupos apresentaram semelhança, o regime de união estável, ensino fundamental incompleto, a renda familiar até 1 salário mínimo e a atividade do lar foram as características mais frequentes. O perfil obstétrico dos grupos foi semelhante, sendo predominante o parto vaginal, pré-natal completo (acima de 6 consultas) e mulheres multíparas. A caracterização dos bebês também foi semelhante entre os grupos de modo que não houve predominância do sexo masculino ou feminino nos grupos e a faixa etária dos bebês mais frequente foi 6 e 12 meses em ambos os grupos. A faixa de peso de nascimento mais frequente nos dois grupos foi de 3000 a 3500 gramas e a relação do peso com a idade gestacional mostrou que a maioria era adequada em ambos os grupos. Nota-se que a idade gestacional mais frequente no grupo A foi 41 semanas enquanto no grupo B foi 40 semanas mas do ponto de vista de maturidade para AM não tem diferença.

A análise de conteúdo evidenciou três categorias de motivações no grupo A e três categorias de desmotivações no grupo B. Abaixo estão descritas as categorias de motivação do grupo de nutrizes que mantiveram a amamentação exclusiva durante os primeiros 6 meses de vida da criança (Grupo A):

Relação do leite humano à saúde e nutrição da criança: foi observado nos relatos das nutrizes do grupo A uma convicção a respeito das propriedades imunológicas e nutritivas do leite materno. Abaixo alguns trechos das entrevistas ilustram as propriedades do leite: Eu acho bom amamentar porque além de fortificar a alimentação é remédio né (Água); Eu optei por amamentar porque eles não ficam doente, ficam mais saudáveis (Proteína); Esse é mais saudável do que o que não mamou. O outro mamou só 1 mês [...] até o crescimento é melhor. A criança desenvolve melhor (Gordura); Eu acho muito importante, meus filhos sempre mamaram e eu já vi crianças que nunca mamaram e são muito diferentes, é uma gordura não saudável [...] a criança é gorda e inchada de farinha, mas não é saudável (Lactose).

Praticidade e Economia: os relatos apontam que as nutrizes consideram prático não precisar fazer mamadeira, principalmente durante a noite, nem carregar leite e mamadeira na bolsa quando saem com as crianças além de ser econômico não gastar dinheiro comprando leite. Os relatos abaixo ilustram a praticidade e economia no contexto da amamentação nesta amostra: [...] eu adoro assim sentar num lugar e dar mamá, adoro, acho a coisa mais prática que tem pro bebê e pra mãe [...] aonde ele estiver no momento que ele quiser vai estar prontinho o mamá que ele gosta. E pra nós é bem mais prático tu vai estar com o bebê e a hora que ele pedir tu tem o mama pronto pra dar (Caseína); [...] é tudo mais prático, não precisa ficar carregando mamadeira, enquanto eu tiver leite eu quero amamentar (Lactoalbumina); [...] a minha prima mesmo empedrou o leite e não fez força nenhuma pra amamentar, teve que gastar com leite. Geralmente estas mães que preferem dar mamadeira não levantam de madrugada para esquentar o leite e o peito fica prontinho e quentinho pro bebê (Lactoglobulina).

Prazer e promoção do vínculo mãe-bebê: são aspectos enfocados nos movimentos pró-amamentação promovidos pelo governo federal. É comum observar em cartazes a frase ''Quem ama amamenta'' e este aspecto também foi verbalizado nas entrevistas das participantes do grupo A como fator motivador do AM exclusivo. Desta maneira observa-se que o ato de amamentar não está ligado exclusivamente ao instinto de alimentar o filho, este ato transcende o instinto envolvendo os sentimentos. Os relatos abaixo ilustram este aspecto: [...] e fica um vínculo muito forte entre a mãe e o filho (Cálcio); [...]é amor, muito amor, eu gosto de amamentar[...] a criança se sente protegida e segura com a mãe, a amamentação é tudo (Fósforo); É prático tu pegar uma mamadeira e deixar alguém cuidando dele mas eu acho importante também amamentar por causa do afeto mãe-filho [...] aquele momento ali é só de vocês dois, não tem uma terceira pessoa, é ali que tu começa a observar o rostinho do teu bebê e depois de grande é mais especial, eles ficam mais brincalhões e a mãe que não tem isso eu acho triste (Sódio).

Abaixo estão descritas as categorias de desmotivação do grupo B de nutrizes que não mantiveram amamentação exclusiva até 6 meses de vida do bebê (Grupo B):

Diminuição brusca do leite sem causa aparente: principal fator desmotivador ao aleitamento materno exclusivo até o 6° mês evidenciado no estudo. Participantes do grupo B verbalizaram o desejo de querer amamentar, mas obrigação de iniciar alimentação com outro tipo de leite devido à pouca quantidade de leite produzida e sua diminuição gradativa sem causa aparente até a cessação da lactação. Neste contexto elas informaram que ao iniciarem a mamadeira o bebê foi perdendo o interesse pelo seio materno. Seguem os fragmentos das entrevistas das participantes do grupo: Eu amamentei 1 mês e 15 dias só e depois secou. O leite parou do nada, simplesmente secou (Potássio); Amamentei 1 mês porque o meu leite secou. Eu tive que começar a dar outro leite e no momento que iniciei a mamadeira ele começou a não querer mais o seio[...]as vezes até tem um pouco de leite daí eu dou pra ele (Ferro); É bom amamentar, mas eu não tinha muito leite. Eu queria ter amamentado só que o meu leite secou, nem foi ele que deixou de mamar ele estava mamando ainda quando o leite acabou, secou do nada (Vitamina C).

Trabalho fora do lar: ao longo da história os movimentos feministas reivindicaram os direitos da mulher e a igualdade entre os gêneros. A mulher conquistou o direito ao voto, ao trabalho fora do lar, ao acesso aos métodos contraceptivos e a desvinculação do sexo à procriação com o domínio da mulher sobre seu corpo. Neste estudo um destes aspectos foi referido como desmotivador do AM que é uma prática tão feminina que envolve um símbolo forte de feminilidade (o seio). Os relatos ilustram esta categoria: Só parei antes de 6 meses porque eu trabalhava em Porto Alegre e não tinha como eu vir até em casa para amamentar e eu não sabia que podia congelar meu leite (Vitamina D ); Voltei a trabalhar quando ele tinha 4 meses, daí tive que acrescentar outro leite mas eu dava mais leite materno do que o outro porque eu ia amamentar na creche, mas foi a partir daí que ele começou a largar o peito (Imunoglobulina A).

Traumas mamilares: referidos por muitas participantes em ambos os grupos. Porém no grupo A estes acontecimentos foram desafiadores para as mães enquanto no grupo B foram desmotivadores do AM exclusivo. O primeiro relato abaixo é de uma participante do grupo A e o segundo do grupo B: [...] eu tive um problemão, aquele problema no seio, não foi o tal do figo que eles chamam, ela pegou mal. Fiquei com rachaduras, sangrava, eu chorava porque eu via que ela tinha fome e eu chorava porque eu tinha leite e não tinha coragem de dar, mas depois que engrenou foi uma beleza [...] eu tentei dar uma mamadeira, a minha irmã esgotou pra mim, porque eu estava com a mama cheia, aí ela esgotou com a maquininha, e eu colocava na chuquinha e dava pra ela. O que aconteceu? Ela só sugou duas vezes e acabou o leite e eu me apavorei, porque eu pensei, se eu der mais uma vez ela vai se acostumar e não vai mais mamar no peito aí eu tirei, dava com dor, passei tudo que me ensinaram mas eu continuei dando mama (Linfócitos); [...] 3 meses, qualquer uma das minhas filhas mamaram 3 meses. O meu peito ficou seco, endureceu, rachou e eu não tinha nem o formato de bico assim sabe? Aí ela não pegava direito além de dor muito e eu tive que dar outro leite (Macrófagos); Nos primeiros dias eu tive fissuras porque ele mamava toda hora, qualquer chorinho eu dava o peito daí rachou e doía demais [...] fui obrigada a dar o NAN porque não suportava a dor e aos poucos ele foi largando o peito e preferindo o NAN até secar meu peito (Vitamina C).

 

DISCUSSÃO

Esta seção do artigo discutirá as categorias identificadas na análise de conteúdo comparando os achados deste estudo com a literatura. Inicialmente serão discutidas as três categorias de motivação evidenciadas (grupo A) e posteriormente as três categorias de desmotivação (grupo B).

A relação da prática de aleitamento materno com a diminuição da morbidade e mortalidade infantil é justificada pela composição do leite humano e suas diferentes fases de colostro a leite maduro. Desta forma o leite materno é o único alimento capaz de atender a todas as peculiaridades fisiológicas (nutricionais e imunológicas) dos lactentes até o 6° mês de vida.5,6 As propriedades imunológicas do leite humano vêm sendo amplamente abordadas na mídia através de campanhas de promoção ao AM e estas despertam o interesse da população e dos profissionais de saúde da área materno-infantil bem como incentivam esta prática no Brasil. A trajetória da amamentação no Brasil mostra aumento no tempo de amamentação ao mesmo tempo em que mostra redução no índice de mortalidade infantil.1,3,9 O AM é essencial para a sobrevivência de crianças pobres em países pouco desenvolvidos onde há risco constante de adoecimento devido à complexa associação de má nutrição, falta de saneamento, infecções frequentes e falta de alimentação nutritiva.6,7

As mães multíparas do grupo A que possuíam filhos amamentados e não amamentados ao seio referiram notar diferenças entre seus filhos, este dado é evidenciado no terceiro relato da categoria relação do leite humano à saúde e nutrição da criança. Entre as diferenças observadas pelas mães estão o desenvolvimento cognitivo e o ganho de peso. A praticidade e economia foram aspectos identificados no estudo mas também são abordados nas campanhas pró-amamentação e merecem ainda mais destaque nos países em desenvolvimento devido às disparidades socioeconômicas. Cabe salientar que populações de baixa renda são mais expostas à doenças parasitárias e infecciosas devido aos fatores já descritos de saneamento inadequado e falta de acesso aos serviços de saúde, desta forma a amamentação constitui um fator protetor por ser um leite protegido de microrganismos durante o preparo.5

A vinculação entre mãe e filho não é inata e a amamentação representa uma oportunidade deste vínculo ser instalado ou aprofundado, portanto a amamentação é muito mais do que garantir a sobrevivência da espécie.10 A amamentação por vezes é referida como fator protetor da saúde mental do indivíduo, pois quando ocorre adequadamente favorece um ambiente facilitador ao desenvolvimento do bebê.11 O último relato da categoria prazer e promoção do vínculo mãe-bebê mostra que quando a amamentação é bem sucedida a autoestima da mulher eleva-se, pois representa um cuidado exclusivo da mãe para o filho. Este sentimento desencadeia tranquilidade e sensação de bem estar contribuindo para o estabelecimento e manutenção da lactação. A relação da sensibilidade aumentada das puérperas no período pós-parto com atitudes das pessoas que a cercam é decisiva na manutenção da lactação.6,11

O neonato tem todos os sentidos ao nascimento, que serão desenvolvidos e aprimorados conforme o crescimento. A visão do neonato é nítida até cerca de 25 centímetros de distância e no momento do AM o bebê encontra-se a esta distância do rosto de sua mãe, desta maneira observa o rosto dela além de estar mais próximo do cheiro e do calor materno que acalmam a criança e estimulam o afeto entre o binômio.12

A oferta de leite por mamadeira bem como a utilização de chupeta favorecem o desmame precoce devido principalmente à chamada confusão dos bicos que consiste numa mudança no posicionamento da língua do bebê durante a sucção e do próprio movimento de sucção causados pelas diferenças anatômicas entre o mamilo e os bicos de mamadeiras e chupetas. A confusão de bicos impede a pega adequada ao seio materno, além disto a sucção na mamadeira não exigir tanto esforço por parte do lactente quanto ao seio materno, deste modo é comum os bebês preferirem a mamadeira ao seio materno. Portanto a diminuição da lactação e o uso de mamadeira estabelecem uma relação de causa-efeito complexa, uma vez que a hipogalactia motiva as mulheres a iniciarem a oferta de leite por mamadeira e esta atitude acelera o processo de hipogalactia até a cessação da lactação.7 Estas situações estão ilustradas pelos relatos da primeira categoria do grupo B denominada diminuição brusca do leite sem causa aparente.

As dificuldades enfrentadas pelas participantes que trabalham fora do lar incluem problemas para ir em casa ou na creche amamentar bem como falta de informação sobre congelamento e armazenamento de seu leite. Este contexto incita uma reflexão acerca da política trabalhista que prevê licença maternidade de 120 dias para a iniciativa privada e da atuação dos profissionais que atendem estas pacientes nas revisões de puericultura. Será que a falha está na formação dos profissionais ou na falta de interesse em ensinar estas mulheres sobre a possibilidade do esgotamento mamário e estocagem do leite humano? Estas perguntas infelizmente não poderão ser respondidas neste estudo. Os traumas mamilares foram citados como ocorridos nos primeiros dias em ambos os grupos. Algumas mães referiram ter procurado auxílio de profissionais da saúde, outras referiram ter procurado auxílio de familiares e amigos e outras ainda referiram que não procuraram nenhum tipo de auxílio. O principal problema informado pelas nutrizes foi a fissura mamária e o principal produto utilizado por elas para cicatrização foi pomada indicada por médico. Poucas participantes informaram não terem tido nenhum problema durante a amamentação evidenciando que a prática da amamentação exige perseverança, paciência e muita vontade, pois estas mulheres relatam muita dor e sofrimento que no grupo A foram desafiadores e no grupo B desmotivadores.

Um dos relatos informa problema na técnica de amamentação e sabe-se que esta favorece o desenvolvimento de traumas mamilares bem como esvaziamento inadequado da mama que implica em outros problemas como mastite, ingurgitamento e insaciável do neonato.6,12 Os relatos evidenciam o sofrimento destas mães que se empenharam e tentaram superar os problemas, mas sentiram a necessidade de complementar a mamada com outro tipo de leite. O terceiro relato da categoria de desmotivação traumas mamilares aponta a questão discutida anteriormente sobre o menor esforço do bebê na sucção por mamadeira o que favorece sua preferência pelo leite artificial e pela mamadeira. Este mesmo relato também está relacionado com a relação de causa-efeito da hipogalactia e oferta de leite por mamadeira, pois a medida que foi ofertado o leite por mamadeira o bebê começou a preferi-la e diminuiu o número de mamadas ao seio favorecendo a hipogalactia e cessação da lactação.

Considerações finais. A história do AM no cenário nacional mostra que esta prática já passou por momentos de desaprovação e anos mais tarde iniciou-se um movimento pró-amamentação até a atualidade. As pesquisas nas últimas décadas trouxeram avanços no conhecimento nutricional do leite, na técnica de amamentação e na atuação dos profissionais na promoção desta prática.

Após a discussão dos achados deste estudo pode-se considerar que a decisão de amamentar exclusivamente ao seio materno envolve um conjunto de fatores, é uma atividade prazerosa para a mulher que favorece o vínculo mãe-bebê e proporciona melhor nutrição e saúde para as crianças além de praticidade e economia para as mães. Pode-se apreender ainda que as mulheres que mantiveram o aleitamento materno exclusivo até 6 meses passaram pelos mesmos traumas mamilares que as mulheres do grupo de aleitamento materno não exclusivo. Entende-se, portanto que a decisão de manter o aleitamento materno depende da interpretação e da vontade da nutriz de superar estes desafios, mas não somente deste fator necessitando de suporte familiar e de profissionais da saúde.

Acredita-se que a baixa adesão evidenciada no Brasil esteja relacionada às desigualdades sociais e às políticas trabalhistas que ainda não preveem licença maternidade de 6 meses em todo território nacional provocando um distanciamento entre mãe e bebê. Além disto a baixa adesão pode estar relacionada à falta de apoio dos profissionais de saúde para corrigir e ensinar o posicionamento correto do bebê, esvaziamento e esgotamento da mama e armazenamento de leite materno para a nutriz deixar com o cuidador do bebê na sua ausência. Os achados deste estudo podem servir de subsídios para uma melhor atuação dos enfermeiros frente aos problemas que dificultam a manutenção do aleitamento materno exclusivo até os 6 meses de vida da criança, pois apresentam motivos descritos pelas nutrizes como motivadores e desmotivadores.

Recomenda-se que novos estudos sejam realizados sobre a atuação dos profissionais da saúde, em especial dos enfermeiros, no atendimento às nutrizes em dificuldade de manter o AM exclusivo. Algumas falas apresentadas anteriormente elucidam a procura das mães por ajuda profissional para solução de seus problemas no aleitamento materno, porém as informações deste estudo são insuficientes para determinar quem são os profissionais mais envolvidos nessa prática e que tipo de postura eles apresentaram.

 

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