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Desafíos

versión impresa ISSN 0124-4035versión On-line ISSN 2145-5112

Desafíos vol.35 no.2 Bogotá jul./dic. 2023  Epub 11-Oct-2023

https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/desafios/a.11983 

Artículo de análisis

Sem mulheres não há saúde: o desmantelamento da política exterior de saúde pública do Brasil durante a pandemia dacovid-19

There is no Health Without Women: The Dismantling of Brazilian Public Health Foreign Policy during the covid-19 Pandemic

Sin mujeres no hay salud: el desmantelamiento de la política exterior brasileña en salud pública durante la pandemia de covid-19

Fernanda Cimini* 
http://orcid.org/0000-0003-2170-6443

Amanda Diana Rodrigues** 
http://orcid.org/0000-0003-2182-8272

Wellington Luiz Osterno Duarte Filho*** 
http://orcid.org/0000-0003-4580-0354

* Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil e Harvard School of Public Health, Boston. fcimini@cedeplar.ufmg.br https://orcid.org/0000-0003-2170-6443

** Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil amandaddiana@gmail.com https://orcid.org/0000-0003-2182-8272

*** Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil wellingtonosterno@gmail.com https://orcid.org/0000-0003-4580-0354


Resumo

Não é coincidência o fato de que governos de extrema direita tenham promovido políticas negacionistas durante a pandemia da covid-19 e que esses mesmos governos tenham desqualificado a luta pela igualdade de gênero em seus países, pois o campo da saúde pública é pioneiro na discussão de direitos reprodutivos e emancipação sexual feminina. O artigo analisa o caso brasileiro, explorando as possíveis relações entre as agendas de política exterior, saúde e gênero, contrapondo os governos de centro-esquerda de Lula e Dilma, por um lado, e de extrema-direita de Bolsonaro, por outro lado. Analisa ainda o desdobramento dessa agenda no âmbito da política exterior que, durante a pandemia, resultou no desmantelamento de arranjos regionais de saúde pública em prol de uma aliança global conservadora pró-cloroquina.

Palavras-chave: política externa brasileira; covid-19; gênero; conservadorismo; América do Sul

Abstract

It is no coincidence that far-right governments have promoted denialist health policies during the covid-19 pandemic or that these governments have disqualified the struggle for gender equality in their countries, as the field of public health is a pioneer in the debate for gender equality, reproductive rights, and female sexual emancipation. The article analyzes the Brazilian case, exploring possible connections between the foreign policy, health and gender agendas during opposing governments: Lula and Dilma’s center left, on the one hand, and Bolsonaro’s extreme right, on the other. We also analyze the foreign politics of this agenda within the scope of the external analysis which, during the pandemic, resulted in the dismantling of regional public health arrangements in favor of a conservative pro-chloroquine global alliance.

Keywords: Brazilian foreign policy; covid-19; gender; conservatism; South America

Resumen

No es coincidencia que los gobiernos de extrema derecha hayan promovido políticas de negacionismo en salud durante la pandemia de covid-19 o que hayan descalificado la lucha por la igualdad de género en sus países, dado que el campo de la salud pública es pionero en el debate por los derechos reproductivos, la igualdad de género y la emancipación sexual femenina. El artículo analiza el caso brasilero, explorando las posibles relaciones entre las agendas de política exterior, salud y genero, al oponer los gobiernos de centro-izquierda de Lula y Dilma, por un lado, y la extrema derecha de Bolsonaro, por el otro. También se analiza la política exterior de esta agenda en el ámbito del análisis externo que, durante la pandemia, resultó en el desmantelamiento de los arreglos regionales de salud pública en favor de una alianza global conservadora procloroquina.

Palabras clave: política exterior brasileña; covid-19; género; conservadurismo; América del Sur

Introdução

A agenda da saúde pública tem historicamente ocupado um papel de destaque na política externa brasileira. A Organização Mundial da Saúde (oms) chegou a ter um diretor-geral brasileiro por vinte anos (1953-1973), e o país esteve na liderança de inúmeros protocolos e tratados, como a Convenção para o Controle de Tabaco, além de ter se tornado referência mundial por ser o primeiro país a disponibilizar tratamento universal para pacientes com hiv. No âmbito multilateral, o país se destaca historicamente como protagonista das reivin dicações do sul global, tendo atuado em diferentes frentes: contestação de direitos de propriedade intelectual e aprovação de medicamentos genéricos, atenção a doenças tropicais negligenciadas, pesquisas em biologia molecular e recursos genéticos vegetais (Biehl, 2016; Muzaka, 2018; Shadlen et al., 2020).

No âmbito regional, o Brasil foi peça chave na criação do Conselho Sul-Americano de Saúde e do Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde (isags) sob a União de Nações Sul-Americanas (unasul) nos anos 2000 (Buss & Ferreira, 2010; Faria et al., 2015; Costa Bueno et al., 2018). A unasul teve um papel predominante no combate à pandemia de h1n1 na região (Temporão, 2009), permitindo a criação de redes de políticas para coordenar a troca de informação e conduzir trabalho colaborativo na investigação e gestão da saúde (Almeida et al., 2010).

Porém, a virada neoliberal, iniciada logo após o impeachment da presidente Dilma Rousseff e consolidada com a eleição do presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro, selou o fim do protagonismo brasileiro nesta agenda. Arranjos regionais existentes (a exemplo do isags/unasul) foram dissolvidos, sem que novos projetos (como o prosul) conseguissem decolar. É nesse contexto que a pandemia atinge a América do Sul. Não por acaso, o país e a região tiveram os piores resultados na gestão da pandemia.1 Mas não foi somente a falta de uma liderança regional que contribuiu negativamente para esse resultado. Pior: foi a estratégia de um país, com dimensão territorial, econômica e política como a do Brasil, de promover deliberadamente políticas de propagação do vírus da covid-19 - a começar pelo negacionismo do próprio dirigente máximo da nação.

Nesse sentido, o artigo apresenta uma interpretação de que a ausência de mulheres e de uma perspectiva de gênero nas políticas pública e externa afetam as dinâmicas destas em vários âmbitos, e neste trabalho daremos ênfase à área da saúde. Utilizamos três eixos analíticos - o desmonte da agenda de gênero, a chegada da extrema direita no poder e a política exterior de saúde - para explicar que a dinâmica excludente da área pública e política a partir do gênero contribuiu negativamente para as respostas públicas à pandemia de covid-19. É essencial ressaltar que o propósito do artigo é uma interpretação do vínculo entre os três eixos.

Aliado a isso, o artigo busca compreender a “rationale” de adoção da estratégia neoliberal, conservadora e negacionista do governo brasileiro na política pública e exterior. Tal adoção afetou as relações internacionais do país e impactou a resposta à pandemia de covid-19 na América do Sul. Desqualificar a ciência e as instituições de saúde pública não foi somente um “desconhecimento genuíno”, mas sim uma estratégia dos grupos conservadores (a aliança pró-cloroquina) para limitar os avanços pela igualdade de gênero e manter o statu quo patriarcal.

O artigo está estruturado da seguinte forma. A segunda seção explora os conceitos-chave que serão utilizados na nossa análise. A terceira seção analisa a virada conservadora na política brasileira e suas consequências para a gestão da pandemia da covid-19 no âmbito doméstico e internacional. A quarta seção faz uma análise do histórico brasileiro em políticas de saúde e sinaliza as possíveis implicações da estratégia negacionista do Governo Brasileiro para a gestão da pandemia. Já a quinta seção analisa as relações entre gênero, saúde pública e política exterior, trazendo evidências da conexão entre ambas as agendas e sua contestação por setores conservadores. Por fim, nas considerações finais, analisamos os custos dessa estratégia à luz do amálgama conservador identificado ao longo do artigo.

Conceitos-chave para a análise

Nesta seção, apresenta-se os principais conceitos utilizados na análise do artigo. Com isso, busca-se mobilizar esse aparato analítico-conceitual para explicar a interpretação que o artigo traz sobre o desmonte institucional das políticas de saúde, a limitação da igualdade de gênero e a política exterior de saúde pública.

O conceito de política exterior de saúde identifica as políticas exteriores no âmbito da saúde pública e as estratégias de saúde nacionais e internacionais derivadas dos projetos dos Estados para a área. Está inserido nas dinámicas dos fóruns internacionais e da governança da saúde global, com participação nos projetos nacionais, regionais e internacionais acerca do tema. Tal termo origina-se dos acordos internacionais e projetos de cooperação internacional, além da inclusão de atores e projetos para a saúde pública (Ventura, 2013; Lima, 2017; Brasil, 2018).

Já o neoliberalismo epidemiológico é definido pela crença de que a estratégia de imunidade coletiva seria o suficiente para lidar com a covid-19. Isto é, a propagação natural do vírus na sociedade levaria a uma imunização coletiva suficiente e, dessa forma, não seria necessário o isolamento social para conter o vírus, mesmo que esta estratégia ainda custasse milhares de vidas. Temia-se os efeitos deletérios na economia caso a população ficasse isolada em suas residências, criando assim uma dicotomia falaciosa entre saúde e economia (Ventura & Bueno, 2021).

O populismo médico descreve os movimentos políticos que buscam mobilizar “o povo” contra “o sistema” durante emergências de saúde pública a fim de alcançar objetivos específicos da figura ou grupo político em questão. Para isso, utiliza-se de alegações de conhecimento alternativo, simplificações espúrias, politização e espetacularização dos problemas de saúde pública para descredibilizar médicos, técnicos e acadêmicos da área (Casarões & Magalhães, 2020). A partir da ideia de uma cisão social entre o povo e o sistema, o líder político apresenta-se como defensor da sabedoria do povo, enaltecendo as ideias falaciosas em prol de seus objetivos políticos, sociais e econômicos.

Ligado ao último conceito apresentado, Casarões e Magalhães (2020) definem a “aliança pró-cloroquina”, outro conceito importante nesta análise. Tal aliança foi composta por líderes de extrema direita durante a pandemia que utilizou-se do populismo médico para mobilizar o seu público-alvo. Por meio da promoção da hidroxicloroquina, os governantes de extrema direita conseguiram se promover e ganhar popularidade ao noticiar que este remédio era eficiente para tratamento precoce contra covid-19, mesmo que não houvesse estudos conclusivos que confirmassem tal afirmativa. Ao não terem respaldo científico nessa e em outras afirmações, os líderes políticos procuraram respaldo em ciência alternativa e politização do assunto.

Ainda, um aspecto importante para a política externa brasileira no governo Bolsonaro foi o nacionalismo religioso, que se sustenta em uma visão de sociedade que condiciona o pertencimento nacional à filiação religiosa. Com Bolsonaro na Presidência da República e Ernesto Araújo no cargo de ministro das Relações Exteriores, a política externa brasileira passou a ser orientada com um viés claro e explícito ao cristianismo.

Esses conceitos-chave orientam a interpretação desenvolvida ao longo do artigo. O neoliberalismo epidemiológico e o populismo médico apresentam aspectos fundamentais da gestão da covid-19 no Brasil durante o governo Bolsonaro. No âmbito internacional, a aliança pró-cloroquina é o reflexo externo do que estava ocorrendo no âmbito doméstico. Assim, o governo Bolsonaro aliou-se aos outros governos de extrema direita que utilizaram das mesmas bases para buscar seus objetivos políticos, econômicos e sociais. Nessa dinâmica, a política exterior de saúde do Brasil, historicamente muito respeitada pela gestão exemplar domesticamente e regionalmente, foi afetada de forma severa como o artigo apresenta de forma mais detalhada. Ainda nos mecanismos da atuação desses governos em seus países e nas suas relações exteriores, os governos de extrema direita, como o de Bolsonaro no Brasil e Trump nos Estados Unidos, realizaram uma série de ataques ao campo da saúde pública, que é pioneiro na discussão de direitos reprodutivos e emancipação sexual feminina. Em nossa perspectiva, o ataque a esses dois eixos - à saúde pública e à igualdade de gênero - não são isolados, mas sim apresentam alguma sobreposição.

Ou seja, a conexão da desqualificação da luta pela igualdade de gênero e o desmantelamento institucional da saúde pública doméstica e regional nos países da aliança pró-cloroquina é mais do que uma mera coincidência. A luta pela igualdade de gênero historicamente teve agentes e fatores que buscaram desacelerar seu desenvolvimento. Além do próprio sistema social baseado na diferença entre os sexos, grupos sociais e políticos buscaram a diminuição do papel e da agência das mulheres nos diversos âmbitos da sociedade, como político, econômico e social (Rago, 1998; Scott, 1995). Por exemplo, a divisão sexual do trabalho delega às mulheres os trabalhos domésticos, ligados aos cuidados maternais e de saúde, com baixas remunerações e uma valorização inferior ao trabalho do homem. A noção de sexo frágil e emotivo apresenta um imaginário social que deslegitima a independência e capacidade da mulher na construção de uma vida pessoal e uma carreira profissional por si só. Delega-se a elas os cuidados parentais e domésticos de forma subserviente ao homem, ao passo que a carreira profissional e o âmbito público e político apresenta-se caracteristicamente masculino (Rago, 1998; Scott, 1995). Nos diversos ramos profissionais, foi negado às mulheres o desenvolvimento para diversos ramos como o industrial, científico, comercial, executivo, político, dentre tantos outros (Enloe, 2004; Rago, 1998; Scott, 1995).

Principalmente do último século em diante, os movimentos feministas tiveram grandes avanços e as mulheres têm ascendido a papéis sociais diversos a esses denominados a elas. Mulheres chefes de família, cientistas, líderes de equipe nas empresas que atuam e independentes em vários âmbitos sociais passaram a ser cada vez mais comuns. Mesmo as mulheres que têm um papel muito mais domiciliar e em segundo plano na vida pública passaram a ter sua agência social estudada e reconhecida (Enloe, 2004; Rago, 1998; Scott, 1995).

Tais avanços do papel das mulheres gerou reações contrárias dos grupos conservadores e neoliberais ao redor do mundo, o que está cada vez mais em pauta com as discussões políticas levantadas por tais grupos nos espaços públicos e políticos. Apresentamos aqui um dos meios de exercer uma força contrária à emancipação feminina na sociedade a partir da chegada do governo de extrema direita de Bolsonaro, a partir do enfraquecimento da saúde pública, do questionamento da agenda de gênero nos espaços de discussão política e suas ações no âmbito internacional. Por fim, apresentamos que tal dinâmica excludente da área pública e política a partir do gênero afeta negativamente a construção de políticas públicas e inclusive afetou as respostas públicas à pandemia de covid-19.

A virada conservadora na política externa brasileira

Durante a pandemia da covid-19, o presidente Jair Bolsonaro adotou uma estratégia conhecida como “neoliberalismo epidemiológico” - caracterizada pela lógica da imunização de rebanho, que confia ao mercado a contenção do vírus da covid-19, sem restringir deslocamento ou atividades econômicas, a custo de algumas milhares de vidas (Ventura & Bueno, 2021). Diferente de outros países que também optaram inicialmente por essa estratégia, mas acabaram por recuar após a primeira escalada de casos fatais, o Brasil de Bolsonaro não alterou seu curso de (in)ação. Até mesmo quando o mundo já se mobilizava para a produção e aquisição de vacinas, o governo brasileiro mantinha sua postura de não-intervenção estatal. Em outubro de 2021, o Ministério da Saúde foi acusado por uma Comissão Parlamentar de Inquérito, “cpi da Pandemia”, por ter negligenciado a compra de imunizantes no ano de 2020, atrasando a vacinação (Resende, 2021). Ironicamente, a primeira vacina a ser aplicada no país foi fruto do investimento do Governo do Estado de São Paulo, liderado por um dos principais opositores de Bolsonaro (Gallas, 2021).

Mas o que teria levado o Brasil a se desviar da sua trajetória histórica de respaldo no sistema público de saúde para a contenção e, posteriormente, imunização contra o vírus da covid-19? Ao observarmos a narrativa construída pelo governo Bolsonaro à luz do conceito de interesses nacionais poderemos compreender melhor a atuação do país durante a pandemia de covid-19 e sua conexão com políticas de gênero e a atuação de mulheres nessas políticas. Nesse sentido, ao analisarmos a literatura sobre narrativas e interesses nacionais, Weldes (1999) ao discutir o caso da crise dos mísseis entre os Estados Unidos e Cuba, afirma que o comportamento adotado pelos estados está intimamente conectado com a interpretação de atores estatais da realidade. Dessa maneira, o processo de definição dos limites de ação é feito anteriormente à atuação do estado e pressupõe uma linguagem compartilhada pelos agentes estatais, linguagem essa que se reflete na ideia de interesse estatal. Assim, para a autora os interesses nacionais são desenvolvidos por meio desse processo de interpretação compartilhada da realidade. É possível observar esse processo de definição de interesses tanto no governo Bolsonaro, quanto em governos anteriores, no entanto, o caso do governo Bolsonaro é especialmente interessante, dado que sua interpretação da realidade e suas políticas durante a pandemia não somente foram altamente criticadas por países e organizações internacionais, como também foram um claro desvio do histórico brasileiro em relação a políticas de saúde.

De acordo com Ventura e Bueno (2021), a atuação do governo Bolsonaro, mais que uma estratégia de “neoliberalismo epidemiológico”, trata-se da adoção de uma política institucional de propagação do vírus. Essa política, sustentada mesmo diante de inúmeras evidências do fracasso da imunização coletiva, estaria em total alinhamento à agenda ideológica do Governo Bolsonaro de rechaçar o conhecimento e a expertise das redes de saúde pública. Em última análise, reconhecer o mérito dessas redes e atores, poderia significar uma chancela aos princípios da laicidade e dos direitos humanos na condução da saúde pública - em clara oposição à agenda reacionária defendida pelo atual governo brasileiro.

Em outras palavras, para evitar o confronto direto ao principal sustentáculo do seu mandato - uma agenda conservadora e reacionária - Bolsonaro optou por seguir em frente em sua política institucional de propagação do vírus, a despeito de inúmeras evidências sinalizando o alto custo humanitário dessa estratégia. Mas por que adotar uma estratégia tão custosa do ponto de vista econômico e social? Essa resposta parece estar na própria trajetória política de Bolsonaro, que desde sua atuação como deputado federal, tem buscado mobilizar para si o apoio dos setores religiosos e conservadores, sobretudo do eleitorado evangélico em plena expansão no país.

De modo geral, as sociedades atuais apresentam estruturas patriarcais significativas para a dinâmica nos diversos âmbitos sociais. O desenvolvimento de uma agenda de gênero em diversos setores sociais gerou reações importantes de grupos que se beneficiaram desta dinâmica (Enloe, 2004; Rago, 1998; Scott, 1995).

Atrelado a isso, não é novidade que o Brasil é um país marcado por uma estrutura patriarcal-sexista-racista, característica que remete à própria construção histórica nacional, pautada na escravidão e no ethos oligárquico (Bicalho, 2020; Silva & Ferreira, 2019; Souza de Oliveira, 2018; Wermuth & Nielsson, 2018). No período recente, a redemocratização e a Constituição de 1988 possibilitaram a maior competição política e, consequentemente, o fortalecimento de pautas sociais e progressistas, que contestavam privilégios históricos, direitos excludentes e costumes reacionários. A “ofensiva conservadora”, como alguns autores têm colocado, veio como reação à ascensão da esquerda ao poder, nos anos 2000. Desde então, grupos de direita passaram a se organizar em torno de pautas comuns: apoio aos governos militares, fim da “ideologia de gênero”, agenda anti-comunista, entre outras pautas inspiradas sobretudo nos trabalhos de Olavo de Carvalho, que passou a mobilizar comunidades virtuais para disseminar valores cristãos e conservadores na política.

É nesse contexto que o então deputado federal Jair Bolsonaro começa a ganhar força. Em 2010, Bolsonaro já chamava atenção para o “Kit Gay” para se referir ao material do “Projeto Escola sem Homofobia” do Governo Federal. Em seu discurso na Câmara dos Deputados, Bolsonaro convocava a bancada evangélica para seu unir contra esse “escândalo que estimulava o homossexualismo e a promiscuidade” (Santos, 2020). Seis anos depois, por ocasião do impeachment da Dilma, Bolsonaro voltou a chamar atenção da mídia ao proferir um discurso marcado pela “apologia da tortura e de um torturador e a misoginia com que ele expressou seu repúdio à mulher” (Saliba & Santiago, apud Wermuth & Nielsson, 2018, p. 474). Diversos outros episódios marcaram o posicionamento conservador e reacionário do deputado que, em 2018, articulou todas essas pautas com o apoio dos militares, evangélicos e ruralistas para se eleger presidente.

Nesse sentido, a defesa de uma sociedade patriarcal - sob o signo de “valores da família” - estaria acima da defesa da vida. Por isso, a interpretação feita por muitos analistas de que Bolsonaro teria gerenciado a pandemia a partir do dilema “saúde × economia”, priorizando somente esse último, encontra limites no desdobramento dos fatos. Se a economia estivesse no cerne das preocupações, a saúde pública poderia ter sido priorizada justamente para evitar custos econômicos ainda maiores, como apontaram inúmeros especialistas de diversos espectros políticos (Paes-Souza et al., 2020). Mas esse não foi o cálculo do governo. Em situações de conflito de interesse entre visōes pragmáticas e laicas de proteção à vida e aos direitos humanos e visões religiosas que privilegiam sua base mais fiel, Bolsonaro não hesitou: preferiu uma ação descoordenada a desagradar os interesses de evangélicos, olavistas e grupos conservadores.

A política externa brasileira (peb), por extensão, seguiu a mesma lógica. Na linha do desmonte institucional, o Itamaraty deixou de ocupar lugar central na formulação da política externa e na interlocução do Brasil com o exterior, sendo alvo das disputas domésticas e fragmentação do processo decisório (Saraiva & Albuquerque, 2022). Contrariando o cânone diplomático, o presidente, e seu filho, o deputado estadual Eduardo Bolsonaro, utilizaram a política externa como instrumento de guerra ideológica conduzida por uma retórica inflamada, endossada pelo então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.

Com Bolsonaro, a PEB passou a se orientar por valores do chamado “nacionalismo religioso”, que se sustenta em uma visão de sociedade que condiciona o pertencimento nacional à filiação religiosa (Casarões, 2020). Desde o início do seu mandato, Bolsonaro tem buscado projetar a imagem do Brasil como um país cristão. Nas palavras do ex-chanceler: “Eu acho que um momento simbólico desse movimento - movimento no qual o Brasil tem um papel fundamental, foi no último Fórum Mundial de Davos [2019], onde, no discurso de abertura, o presidente Bolsonaro, no final, falou de Deus. E eu acho que é isso, que o momento que estamos vivendo é esse, é Deus em Davos” (Araújo, 2019, p. 13).

Não surpreende, portanto, que a estratégia adotada pelo Brasil de enfrentamento da pandemia estivesse alinhada com países do eixo ideológico da direita conservadora: Donald Trump, nos Estados Unidos, Narendra Modi, na Índia, Benjamin Netanyahu, em Israel e Viktor Orbán, na Hungria. Em comum, esses governantes adotaram posturas de negacionismo como uma estratégia deliberada de desmonte institucional dos arranjos de saúde pública.

Para Casarões e Magalhães (2020), a aliança pró-cloroquina (hydroxychloroquine alliance) - cujo objetivo era a promoção da hidroxicloroquina e da cloroquina como uma rápida e efetiva solução para a pandemia de covid-19 - é uma proxy dessa estratégia. Tal aliança é formada por presidentes, políticos, figuras públicas da mídia, empresários, líderes religiosos e cientistas (ou melhor, cientistas dissidentes). A aliança pró-cloroquina baseia-se na ciência alternativa, definida pelos autores como “movimento de supostos buscadores da verdade que promovem publicamente alegações científicas em uma encruzilhada entre evidências parciais, pseudociência e teorias da conspiração”2 (Casarões & Magalhães, 2020, p. 199, tradução nossa).

Outra base deste movimento é o populismo médico, termo utilizado para descrever movimentos políticos que buscam jogar “o povo” contra “o sistema” (a elite) durante emergências de saúde pública e para isso utiliza-se de alegações de conhecimento alternativo, colocando em dúvida a credibilidade de médicos, cientistas e tecnocratas (Casarões & Magalhães, 2020). Além disso, utiliza-se também de simplificações espúrias, politização e espetacularização dos problemas de saúde pública para desacreditar os especialistas e “o sistema” em geral. Para os autores, a aliança pró-cloroquina utiliza-se do populismo para engajar o seu público-alvo a partir da ideia de que o povo é a fonte de sabedoria (o senso comum), composta pelas características socioeconômicas, culturais e tradicionais desta população. Assim, o político populista nega a cultura do mainstream (a elite) em prol da cultura do “povo”. Constitui- -se, assim, como um movimento anti-elite (Casarões & Magalhães, 2020).

Com isso, o argumento de Casarões e Magalhães (2020) é que a hidroxicloroquina é uma ferramenta integral do desempenho do populismo médico na pandemia, por possuir as características necessárias na narrativa criada. Também argumentam que o populismo médico é um esforço coletivo de uma rede de ciência alternativa, a qual não é somente nacional mas também abrange uma rede internacional.

Casarões e Magalhães (2020) mostram que no início da pandemia havia interpretações de que os governos populistas não conseguiriam sobreviver à tal situação, porém a promoção da cloroquina como “remédio milagroso” tornou possível a estabilidade dos líderes populistas da extrema-direita em suas políticas internas. Esse resultado veio mesmo que os líderes populistas tenham publicamente ido contra os seus próprios conselheiros para a pandemia. Trump confrontou Anthony Fauci, que foi membro do Coronavírus Taskforce do então presidente, quando Fauci desmentiu as anedotas contadas sobre a hidroxicloroquina. Já Bolsonaro teve fortes atritos com seu então ministro da Saúde Henrique Mandetta, que além de apoiar o Sistema Único de Saúde (sus) e promover as medidas de distanciamento social, ainda defendia uma atuação baseada na ciência, criticando a utilização da cloroquina sem comprovação científica de eficácia. Isso foi o suficiente para Mandetta ser retirado do cargo. Além de Mandetta como ministro da Saúde, Bolsonaro teve Nelson Teich, que durou menos de um mês pelo mesmo motivo: ele relutou em utilizar a cloroquina como protocolo padrão para tratamento de covid-19. Por fim, Eduardo Pazuello se tornou ministro da Saúde e se estabilizou lá, pois aprovou tal medida controversa e é general do Exército brasileiro, uma corporação a qual Bolsonaro sempre alega fazer parte e se identificar.

Ainda nesta rede da aliança pró-cloroquina, no caso dos Estados Unidos os empresários do Vale do Silício tiveram bastante interesse no remédio, como o ceo da Tesla e da SpaceX, Elon Musk, e também cientistas que deram voz a um estudo inicial que apresentava uma aparente eficácia do remédio, mas tal estudo tinha problemas metodológicos. Na mídia, a Fox News dava voz aos que apoiavam aquela provável solução para a pandemia. No caso brasileiro, a Prevent Senior foi uma das empresas que apoiou o uso da cloroquina e realizou estudos questionáveis para tal. Além disso, uma parte importante da base eleitoral de Bolsonaro é a igreja Pentecostal, cujos líderes fizeram questão de apoiar Bolsonaro e a cloroquina como solução (Casarões & Magalhães, 2020).

A história recente tem mostrado que os resultados dessa aliança foram desastrosos tanto do ponto de vista doméstico quanto internacional. Passados dois anos desde o início da pandemia, os Estados Unidos liderava o ranking com maior número absoluto de mortos, com 987 mil, seguido do Brasil, com 662 mil.3 No âmbito internacional, o resultado dessa escolha foi a perda da posição de liderança brasileira no âmbito da saúde pública global e o consequente desmantelamento da frágil estrutura de governança regional em saúde. Como descrevemos anteriormente, a interpretação do governo Bolsonaro da realidade do país e sua definição de interesses nacionais pautada na manutenção de estruturas patriarcais e na negação da ciência podem ser vistos como desvios em relação ao histórico de atuação do Brasil pós-1988. Wendt (1992 apud Weldes, 1999) afirma que o significado que ações, objetos e eventos podem possuir para os estados está intrinsecamente conectado com os agentes que atuam em nome deste estado e, dessa forma, ao atuarem no nível internacional esses indivíduos levam consigo as noções que construíram de forma compartilhada. Com isso em mente, na próxima seção analisaremos a interpretação da realidade e as consequentes ações de governos anteriores, como o de Lula e Dilma Rousseff que focaram mais no desenvolvimento das redes de saúde no Brasil e ao incentivarem a cooperação em saúde com outras países da região permitiram um desenvolvimento maior, em relação ao governo Bolsonaro, de políticas não somente de saúde, mas também de gênero.

A liderança regional brasileira na cooperação internacional em saúde pública

Quando observamos o histórico de cooperação na América Latina, é possível destacarmos o papel que o campo da saúde pública teve no processo de aproximação dos países da região, sendo a Organização Pan-Americana da Saúde (opas) uma das primeiras representantes desse movimento. Criada em 1902 e denominada na época de Repartição Sanitária Internacional,4 a agência tinha, no período de sua criação, o objetivo de ser a responsável pela administração da saúde pública na região, além da disseminação de informações sobre o desenvolvimento da medicina preventiva (Nunes, 2008). Contudo, com a criação da oms em 1948, o papel da organização foi revisto e por meio de acordos foi definido que a opas a partir daquele momento seria considerada o braço direito da oms nas Amércas. A organização e a capacidade da instituição, continuaram a se desenvolver, apesar das limitações orçamentárias, ao longo das décadas do século XX, evidenciando não somente a importância da temática na região, mas também o papel da opas no desenvolvimento de outras estruturas de cooperação em saúde, como a Caribbean Cooperation in Health (cch), em 1984 (Carrillo & Santana, 2012).

Ao longo do século vinte, outros arranjos de cooperação foram desenvolvidos na região. Em relação à América do Sul, e mais especificamente no que tange a política externa brasileira, a cooperação no campo da saúde pública, para além da opas, pode ser traçada para o final da década de 1970, com a criação da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (otca). No que diz respeito ao campo da saúde pública, o tratado tinha como objetivo fortalecer as capacidades nacionais e regionais dos países membros, ao promover avanços tecnológicos e pesquisas sobre saúde pública, o que, por sua vez, afetaria positivamente as condições sanitárias dos povos da região amazônica (Carrillo & Santana, 2012). No entanto, foi somente no início dos anos 2000, com o desenvolvimento do conceito de cooperação sul-sul estruturante em saúde e da unasul, que o Brasil se voltou de maneira expressiva para o campo da saúde pública.

A ideia da cooperação sul-sul está relacionada à noção de que os mecanismos tradicionais, característicos de um sistema de cooperação norte-sul, não seriam capazes de realmente auxiliar as nações subdesenvolvidas a alcançarem independência e o desenvolvimento desejado. Dessa maneira, a cooperação sul-sul surgiu como uma alternativa para esses países, ao permitir não somente que todas as nações subdesenvolvidas incluídas nesse processo tivessem vantagens mútuas, mas também facilitando a construção de estruturas e absorção de tecnologias que poderiam reduzir a dependência externa (Faria et al., 2015).

A aproximação do Brasil com a noção de cooperação sul-sul no campo da saúde pública ocorreu principalmente durante o governo Lula. Santana (2011) discorre sobre como, a partir de 2007, o campo da saúde pública passou a ser visto como uma questão de interesse para a PEB, quando, por meio de uma série de publicações, a Agência Brasileira de Cooperação definiu diversos temas específicos a serem focados no processo de cooperação, dentre eles, a saúde. Associado a isso, Ventura (2013) demonstra como o investimento federal em cooperação sanitária cresceu de cerca de 2,78 milhões de reais em 2005 até atingir 13,8 milhões de reais em 2009. Paralelo a esse crescimento, a autora descreve também uma ampliação no número de projetos internacionais de cooperação sanitária, chegando a 107 projetos em 2012.

Ventura (2013) descreve ainda como o foco da política externa brasileira em relação ao tema de saúde pública estava conectado, intimamente, com o desenvolvimento do sus. Nesse sentido, a experiência brasileira com o sus foi central para o desenvolvimento da noção de cooperação estruturante e para a compreensão dos determinantes sociais da saúde, duas questões que foram exploradas mais profundamente pela peb a partir da criação da unasul. Dessa forma, a diplomacia da saúde adotada pelo Brasil após a Reforma Sanitária e a definição de saúde como um direito e dever de todos os cidadãos passou a ser visto como um modelo a ser seguido pelos outros países da América do Sul.

Criação da unasul e um novo paradigma em saúde regional

A criação da unasul foi um marco histórico no que tange à cooperação e à diplomacia em saúde na região. O Tratado Constitutivo da unasul, que entrou em vigor em 2008, possuía raízes na Comunidade Sul-Americana de Nações, criada em 2004 e representou uma mudança qualitativa na maneira na qual os países da região, em especial o Brasil, tratavam o tema de saúde pública a nível internacional.

A UNASUL era composta pelos 12 países independentes da América do Sul e tinha como objetivo aproximar as nações da região por meio da construção de uma identidade e cidadania sul-americana. A organização funcionava, dessa maneira, como uma estrutura e espaço de integração em diversas temáticas e níveis, sendo a saúde e a segurança os temas que tiveram maior protagonismo (Costa Bueno et al., 2018). A estrutura da unasul era formada por conselhos, que incluíam chefes de estados, ministros de relações exteriores e outros responsáveis pela política externa dos países-membros. Além disso, faziam parte da estrutura da organização os chamados Conselhos Setoriais que eram responsáveis por lidar com temas específicos, na qual existia uma secretaria geral cujo encarregado possuía um mandato de dois anos (Costa Bueno et al., 2018). A escolha para a liderança dos Conselhos era organizada pela Presidência Pro Tempore (ppt) da organização, que era anual e rotativa.

Como mencionado anteriormente, as duas temáticas que possuíram maior protagonismo dentro da unasul foram as questões de saúde e segurança, sendo a saúde organizada pelo Conselho de Saúde Sul-Americano (css). O css foi criado com base na noção de que a saúde é um direito universal e que possuía uma centralidade para o desenvolvimento dos países e o desenvolvimento humano (Costa Bueno et al., 2018). Nesse sentido, a saúde era vista pelo Conselho como um fator significativo para o processo de integração da região, para a diminuição das desigualdades e o crescimento conjunto dos países.

A estrutura do CSS era composta por representantes dos ministérios da saúde de todos os países-membros, além de representantes de outras organizações internacionais, como a opas, a otca e o mercosul (Costa Bueno et al., 2018). Contudo, as áreas mais inovadoras dentro de sua estrutura tratavam-se dos Grupos Técnicos e as Redes Estruturantes. Os Grupos Técnicos eram responsáveis pelas linhas de ação do Conselho e estabeleciam as áreas e objetivos prioritários de atuação em relação à saúde pública. Conectado a isso, os gts trabalhavam em proximidade com as Redes Estruturantes, responsáveis pelo avanço e construção contínua das redes e formação de profissionais de saúde dos países-membros.

Nesse sentido, as Redes Estruturantes eram os principais representantes do processo de integração dos sistemas de saúde dos países-membros, funcionando também como fóruns para a troca contínua de conhecimentos e novos métodos. As Redes eram formadas por grupos de técnicos e pesquisadores no campo da saúde pública que buscavam construir, de maneira conjunta, o conhecimento sobre os sistemas de saúde sul-americanos, além de formar profissionais e desenvolver novas tecnologias apropriadas para a realidade dos países-membros (Costa Bueno et al., 2018).

Dessa forma, o conceito de Cooperação Estruturante em Saúde era baseado justamente no trabalho exercido por essas Redes, trazendo para o campo da diplomacia da saúde diversos outros atores e aproximando a organização de questões práticas. As Redes incentivaram, dessa maneira, o intercâmbio de conhecimento entre nações com realidades similares, permitindo uma construção conjunta do desenvolvimento, um dos pilares principais da Cooperação Sul-Sul. Como descreve Almeida et al. (2010):

Este novo paradigma inova em dois aspectos em comparação a paradigmas anteriores: integra formação de recursos humanos, fortalecimento orga-nizacional e desenvolvimento institucional; e rompe com a tradicional transferência passiva de conhecimentos e tecnologias. A nova abordagem propõe explorar as capacidades e recursos endógenos existentes em cada país. (p. 28)

Dentro da estrutura do CSS era possível delimitar seis Redes Estruturantes: Rede de Gestão de Riscos e Mitigação de Desastres; Rede Internacional de Educação de Técnicos em Saúde (rets); Rede de Escolas de Saúde Pública (resp); Rede de Assessorias de Relações Internacionais e de Cooperação Internacional em Saúde (redssuroris); Rede dos Institutos Nacionais de Saúde (rins) e Rede de Instituições Nacionais de Câncer (rinc). Um fator significativo presente nessas redes tratava-se do protagonismo e da liderança brasileira, que estava presente na coordenação de virtualmente todas elas (Costa Bueno et al., 2018). O protagonismo brasileiro, no que tange essas redes, estava relacionado, como discutido anteriormente, ao pioneirismo do sus e às práticas em relação à saúde primária e ao ensino técnico.

Um segundo avanço importante que era possível encontrar na unasul tratou-se do desenvolvimento do isags, que tinha como objetivo favorecer o contato entre os ministérios da saúde dos países-membros, aprofundando, dessa forma, ainda mais o intercâmbio de conhecimento e informações sobre práticas de gestão em saúde. A criação do Instituto foi feita com apoio da fiocruz e sua sede era no Rio de Janeiro. A atuação do Instituto enfatizava temas como a diplomacia e a saúde pública, focando especialmente em questões como os determinantes internacionais da saúde e como eles afetam os países pertencentes à unasul (Buss & Ferreira, 2011). Em conjunto com a atuação do isags, foi iniciada a construção do Programa de Bolsas da unasul-Saúde que tinha como propósito auxiliar na formação de recursos humanos, em particular em áreas críticas que necessitavam de profissionais qualificados, estando dentre elas áreas como saúde da mulher e da criança, oncologia e doenças infecciosas (Buss & Ferreira, 2011).

Essa preocupação, no entanto, não existiu unicamente na unasul, podendo ser verificada em outras estruturas de cooperação sul-sul das quais o Brasil fazia parte. No que tange a Cooperação em Saúde da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (cplp), por exemplo, também foi possível observar um enfoque na formação de recursos humanos, com ofertas de programa de pós-graduação em áreas onsideradas críticas como a de saúde da mulher e da criança e doenças transmissíveis (Buss & Ferreira, 2010)

Avanços e retrocessos: gênero, saúde pública e política externa de saúde com a chegada do governo Bolsonaro

A liderança brasileira descrita na seção acima foi central para que o país, em conjunto com seus parceiros da região, pudesse enfrentar algumas das importantes emergências sanitárias vivenciadas durante as primeiras décadas do século vinte, como a h1n1 e o zika vírus. Ao observar o papel cumprido pelo Brasil durante esses momentos, é possível destacar que uma característica importante da liderança e da concepção brasileira de cooperação no campo da saúde pública tratou-se do apoio às políticas de distribuição gratuita de medicamentos e o incentivo à produção local desses fármacos, sendo um dos principais exemplos desse processo a construção, em 2008, da fábrica de medicamentos antirretrovirais em Moçambique, considerada um marco para o país africano, dado que foi o primeiro laboratório completamente público da África, sendo ele conduzido pela fiocruz (Ventura, 2013).

Com o início da gestão Bolsonaro, no entanto, foi possível observar um processo de enfraquecimento e afastamento das estruturas que até aquele momento eram parte significativa da política externa do país. O afastamento do Brasil da unasul, junto de outros países como a Argentina, Chile e Colômbia, no início de 2019, evidencia essa mudança em relação à maneira como funcionava a cooperação em saúde na região.

Já no que tange a temática de gênero, ela ganhou grande repercussão durante a pandemia da covid-19, com inúmeros estudos demonstrando o aumento dos casos de violência doméstica, agravamento da mortalidade materna e maior propensão a diagnóstico tardio da doença, dificultando o tratamento adequado (Organização das Nações Unidas [onu], 2020; opas, 2022). No campo econômico, constatou-se também a maior perda econômica relativa, provocada tanto pelo aumento da carga de trabalho das mulheres com atividades de cuidado quanto da queda de receita de postos de trabalho informal (Organização Internacional do Trabalho [oit], 2021). Já no campo da saúde, observou-se a maior exposição feminina ao vírus na linha de frente de resposta nos postos de atendimento de saúde (opas & onu, 2020).

O relatório da opas concluiu que se uma abordagem de gênero tivesse sido incorporada nas respostas à pandemia, essas desigualdades entre homens e mulheres poderiam ter sido melhor detectadas pelos governos para ações mais incisivas em todos esses aspectos. No Brasil, não houve uma estratégia voltada à proteção da saúde, do bem-estar e do emprego das mulheres afetadas. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos não conseguiu executar mais de 50% do orçamento destinado à pasta nos anos de 2020 e 2021 e, para 2022, sofreu corte de 33% (Instituto de Estudos Socioeconômicos [inesc], 2022a). Esses números indicam que durante a pandemia os recursos destinados para estados e municípios financiarem as redes de atendimento às mulheres não chegaram até o seu destino.

A ausência de estratégias voltadas para as necessidades de gênero durante emergências internacionais de saúde não é novidade na região. Ao analisar as emergências de saúde do Zika vírus, que teve como foco o Brasil e a América do Sul, Davies e Bennett (2016) constataram uma queda nos serviços de saúde para mulheres e meninas, reduzindo o acesso delas aos seus direitos reprodutivos e sexuais. Ao reconhecer a associação entre o vírus da Zika e a microcefalia, autoridades públicas brasileiras, e também nos países vizinhos, fizeram recomendações públicas para que mulheres e casais adiassem a gravidez, desconsiderando o fato de que “56% das gravidezes na região não são intencionais e que nem todas as mulheres têm acesso e controle sobre o uso de contraceptivos” (Nunes & Pimenta, 2016, p. 37).

Recomendações como estas, ressaltam Davies e Bennett (2016), deveriam ser promovidas e orientadas pelos governos, como acesso a educação sexual, práticas seguras de aborto e acesso a métodos contraceptivos seguros. Deve-se notar também que as práticas citadas, na verdade, exigem um grau elevado de liberdade reprodutiva e sexual, algo pouco visto no caso estudado. Por exemplo, a oms sugeria que as mulheres que quisessem abortar por causa do risco de contrair o vírus deveriam ser orientadas sobre o procedimento para tal. No entanto, muitos países na América Latina têm leis muito restritivas quanto a abortos, inclusive o Brasil (Davies & Bennett, 2016).

Para essas emergências de saúde, as atuações dos governos nacionais, assim como das organizações internacionais de saúde, como a oms e do Special Rapporteur on the Right to Health, devem oferecer mais do que orientações sobre reprodução e maternidade. É preciso também levar em consideração as condições socioeconômicas e o acesso à informação das mulheres e meninas afetadas, a fim de tornar mais adequada a atuação do governo ou da organização para orientá-las a passarem por essas emergências e desfrutar amplamente os seus direitos sexuais e reprodutivos (Davies & Bennett, 2016). Com isso, seria possível que dentro de emergências de saúde homens e mulheres pudessem usufruir dos seus direitos, incluindo e, no caso deste estudo, enfatizando, direitos e saúde reprodutivas e sexuais. Em suma, para tal objetivo, Davies e Bennett (2016) defendem que é essencial que a resposta global a emergências de saúde leve em consideração as necessidades e direitos das mulheres.

Ao explorarmos as políticas dos governos de Lula e Dilma de um lado e Bolsonaro de outro, torna-se claro que os líderes de centro-esquerda possuíam uma visão de interesse nacional pautada na importância de políticas de saúde que difere da interpretação do governo Bolsonaro. As consequências dessas visões heterogêneas vão muito além dos efeitos negativos à saúde das mulheres durante a pandemia, dado que em outros locais a liderança feminina provou ser crucial para a contenção do contágio e melhores resultados relacionados à taxa de mortalidade pela doença (Taub, 2020; Henley, 2020). A melhor gestão da crise sanitária pelas mulheres teve repercussão na mídia após o relativo sucesso de países liderados por presidentes femininas, como Nova Zelândia, Alemanha, Taiwan e Bangladesh. No Brasil, Bruce et al. (2021) revelaram que cidades governadas por prefeitas mulheres tiveram menores índices de mortalidade e internação do que cidades governadas por homens. Além disso, o número de medidas preventivas adotadas nessas cidades (obrigatoriedade do uso de máscara, distanciamento social e cordões sanitários) foi superior ao número de medidas em municípios governados por homens.

Apesar dos resultados serem significativamente favoráveis à participação da mulher na gestão da saúde, a igualdade paritária ainda é um enorme desafio. Apenas no campo da saúde pública tem-se que enquanto as mulheres constituem 74% das profissionais que atuam na linha de frente dos hospitais e postos de saúde, 75% das funções de liderança e gestão ainda estão a cargo dos homens (oms, 2019). A predominância masculina é ainda maior no âmbito das organizações internacionais que atuaram diretamente na resposta à covid-19, sendo 85% dos postos ocupados por homens (Grynspan, 2021). Já a participação feminina em comitês de políticas de resposta nos países foi de apenas 24%.

É no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, porém, que a relação entre gênero e saúde encontra seu calcanhar de aquiles. Por um lado, a luta pelo direito da mulher de decidir sobre sua sexualidade e seu projeto de vida, por meio do acesso a contraceptivos e a serviços para interrupção da gravidez de forma segura, tem sido uma bandeira histórica do movimento feminista no âmbito das instituições de saúde pública. Por outro lado, essa agenda também mobiliza diretamente grupos conservadores, em escala global. Como consequência, a agenda de direitos sexuais e reprodutivos é caracterizada por movimentos de avanços e retrocessos.

Na década de 1980, Ronald Reagan (presidente dos Estados Unidos entre 1981 e 1989) acusou a oms de ser uma instituição ideológica por defender os direitos sexuais e reprodutivos. Mas Reagan não estava sozinho: contava com o apoio de países majoritariamente católicos e muçulmanos, além de outros países industrializados. Como retaliação, o governo norte-americano não aumentou o orçamento da oms durante o período (Ventura & Perez, 2014).

Em contraste, a década seguinte foi marcada por importantes avanços. Durante a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, que ocorreu em 1994, no Cairo, a temática da reprodução e sexualidade passou a fazer parte também da agenda de direitos humanos (Gomes, 2021). Nesta Conferência, vários temas passaram a compor a agenda de direitos sexuais e reprodutivos, incluindo acesso à educação sexual, paternidade responsável, planejamento familiar, doenças sexualmente transmissíveis, proteção contra hiv, saúde reprodutiva e sexual de adolescentes, em especial gravidez não desejada, além de outras previsões e ações ligadas ao tema. Ao mesmo tempo o aborto inseguro foi reconhecido como um problema de saúde pública, embora a legislacão a esse respeito permanecesse no âmbito da autonomia soberana de cada país. Com esta Conferência de 1994, em Cairo, os direitos reprodutivos e sexuais ganharam espaço nas conferências internacionais com uma imagem positiva destes direitos. Consequência disso, foi o avanço para o reconhecimento do controle feminino da sua própria sexualidade, o que gerou avanços para emancipação sexual feminina. Por fim, outro avanço a ser comentado é que os direitos sexuais e reprodutivos passaram a ser vistos como fundamentais para o desenvolvimento dos direitos humanos. No ano seguinte, a IV Conferência Mundial sobre a Mulher: Igualdade, Desenvolvimento, realizada em Pequim, trouxe um novo avanço: a recomendação de se rever leis que pre-viam medidas punitivas contra mulheres que tenham se submetido a abortos ilegais (Gomes, 2021).

Os resultados das Conferências de Cairo e de Pequim foram interpretados com grande otimismo pelos movimentos feministas como marco importante não só da saúde reprodutiva feminina, mas também da própria luta pela igualdade de gênero, pois serviriam como base para o avanço dos direitos da mulher no âmbito doméstico. A esses eventos seguiram importantes marcos no âmbito da própria Organização Mundial da Saúde que, em 2004, adotou a “Estratégia de Saúde Reprodutiva” (oms, 2004) que traz, entre suas preocupações, o alto índice de mortalidade materna, em muitos casos relacionados ao aborto inseguro e, ao mesmo tempo, chama os países para ações severas no sentido de alinhar suas leis e regulamentos sobre saúde sexual à estratégia reprodutiva global.

Em 2005, por ocasião da IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Beijin +10), a diplomacia brasileira se articulou junto a outros países para barrar a proposta dos Estados Unidos de inserir um parágrafo contra direitos sexuais e reprodutivos e também contra o aborto no texto final da Declaração (Viotti, 1995). Posteriormente, o Brasil liderou a construção de importantes consensos no âmbito regional favoráveis a uma visão abrangente de saúde sexual e reprodutiva, incluindo esse conceito às agendas de direitos humanos e de desenvolvimento sustentável.5

Contudo, ainda na década de 2000 já havia movimentos conservadores contra os avanços em direitos reprodutivos e sexuais. Um deles, citado acima, foi a proposta dos Estados Unidos na Beijin+10 de inserir parágrafos contra direitos sexuais e reprodutivos e contra o aborto no texto final. Em outros casos, nas Conferências de icpd+5, em 1999, e Beijing+5, em 2000, que foram conferências de revisão dos encontros originais, viu-se alianças entre o Vaticano e países muçulmanos, a ascensão do conservadorismo em alguns países, sobretudo nos Estados Unidos (Gomes, 2021).

Ao longo dos anos 2010, o Brasil também começou a gradualmente a se mover na direção do conservadorismo (Souza de Oliveira, 2018; Santos, 2020).

com o fortalecimento de lideranças de direita no país, e esse movimento teve seu auge com a chegada de Jair Bolsonaro ao poder, em 2019. Bolsonaro foi eleito pelo voto popular com uma pauta abertamente em defesa da “família tradicional, contra o casamento homossexual, o aborto e a “ideologia de gênero”. Escolheu Damares Alves, então assessora jurídica da Frente Parlamentar Evangélica (fpe), para comandar o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Damares promoveu uma agenda contrária aos direitos sexuais e reprodutivos femininos sob o logo “vida desde a concepção” (ONU News, 2019), contando com apoio de lideranças evangélicas e católicas.

Durante a pandemia, o país recusou-se a se juntar à declaração conjunta de mais de 60 países para a defesa dos direitos de mulheres e meninas. Outros países fizeram o mesmo, como Hungria, Polônia e países árabes. Esse grupo de países se autointitulava “Consenso de Genebra”, com o objetivo de ser uma aliança antiaborto e pró-família. Com a saída de Donald Trump da presidência dos Estados Unidos,6a aliança passou a ser liderada pelo Brasil (Chade, 2021; Corrêa & Huppes, 2022).

Nesse contexto político, o desmonte institucional das leis e práticas alinhadas à agenda global de direitos sexuais e reprodutivos tornou-se a principal bandeira política das pautas conservadoras, criando obstáculos para a plena realização desses direitos. Segundo levantamento realizado pelo Center for Reproductive Rights, em todo o mundo, apenas 36% das mulheres em idade reprodutiva têm direito ao aborto legal independente das circunstâncias (Center for Reproductive Rights, 2022).

Dessa forma, o contexto da pandemia tornou ainda mais claro a conexão entre gênero e saúde, não somente no que tange os efeitos negativos que políticas de saúde mal elaboradas podem ter em mulheres, mas também como visões que interpretam o interesse nacional por meio de uma lógica de manutenção de estruturas patriarcais e que desconsideram a importância de lideranças femininas, afetam negativamente as políticas de saúde como um todo. O argumento presente neste artigo não leva em consideração somente

a importância de políticas para mulheres, mas principalmente políticas feitas por mulheres que não visualizam os interesses nacionais por meio de lentes neoliberais e patriarcais. A política externa na área da saúde por vezes contribuiu para os avanços da agenda de gênero e para a emancipação social feminina e, em outros momentos, apresentou-se como fator importante para a desestruturação institucional desses avanços, afetando não somente as mulheres de maneira geral mas principalmente na construção de novas políticas públicas e soluções inovadoras para problemas públicos pensadas fora do padrão patriarcal, como vimos com a pandemia de covid-19.

Considerações finais

O Brasil tinha tudo para ser protagonista na gestão da crise sanitária da covid-19: um sistema de saúde público com enorme capilaridade e uma estrutura regional de saúde com experiência em emergências sanitárias internacionais. Também tinha tudo para consolidar seu soft power na região, liderando a coordenação das respostas regionais ao enfrentamento da pandemia. Mas o país não aproveitou sua capacidade institucional instalada. O Governo Bolsonaro optou por uma estratégia pautada no neoliberalismo epidemiológico e, mesmo diante do fracasso dessa estratégia, optou por mantê-la em consonância a outros governos de orientação reacionária e conservadora. O que explica essa decisã?

Esse artigo argumenta que não é coincidência o fato de que governos de extrema direita tenham promovido políticas negacionistas durante a pandemia da covid-19 e que esses mesmos governos tenham desqualificado a luta pela igualdade de gênero em seus países. A “rationale” que move esses governos não é de ordem econômica ou pragmática, mas orientada a valores.

Não por acaso, várias pesquisas apontam que a presença feminina em postos de comando durante a pandemia, seja no nível nacional, seja no nível local, foi determinante para o bom desempenho da gestão da crise sanitária, com resultados associados a menores taxas de mortalidade e de internação e maior número de medidas não farmacêuticas para achatamento da curva. Até hoje, foi esse campo que defendeu e possibilitou várias conquistas do direito feminino: uso de preservativos, planejamento familiar, combate à violência doméstica, diminuição da mortalidade infantil, saúde da gestante, prevenção ao câncer de mama, entre outras pautas.

Ao colocar em cheque essa confiança no sistema de saúde pública, os conservadores querem retirar das mulheres um sustentáculo institucional para proteção e reivindicação dos seus direitos. Objetivam precarizar ainda mais a insuficiente rede de proteção voltada para o público feminino. Eles, que historicamente estiveram amparados por políticas e instituições patriarcais e que se veem ameaçados por aqueles e aquelas que desafiam essa estrutura. Por isso, ir contra as recomendações da oms e o campo de especialistas do campo da saúde é uma estratégia de deslegitimar esse campo histórico de lutas das mulheres.

Ao manter uma estratégia discursiva e prática alinhada à sua base conservadora, Bolsonaro promoveu a contestação e o desmantelamento institucional das redes de proteção da saúde feminina. Ao fazer isso, o país põe em xeque o posicionamento adotado ao longo de décadas no campo da saúde pública global e regional. Se não bastassem os custos humanitários, contabilizados pelo número de fatalidades da covid-19, tem-se ainda os custos políticos. Em pouco menos de dois anos, o Brasil substituiu o papel de protagonista das reivindicações do sul global pelo papel de pária internacional. A política exterior de saúde brasileira, respeitada em todo o mundo, foi substituída por uma política externa baseada em nacionalismo religioso, ciência alternativa e uma aliança internacional pró-cloroquina, vinculando-se a outros governos de extrema direita que objetivavam metas similares: dentre outras, a restrição de desenvolvimento da agenda de gênero e da emancipação feminina. Tais ações afetaram as mulheres de maneira significativa, mas sobretudo dificultaram a construção de novas políticas públicas e soluções inovadoras para problemas públicos pensadas fora do padrão patriarcal, como vimos na gestão pública da pandemia de covid-19 no Brasil.

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1 Desde o início da pandemia da covid-19, a América do Sul tem apresentado os piores resultados da gestão da crise sanitária, com a maior taxa de mortalidade por milhões de habitantes e também por número de casos registrados.

2No texto original: “a loose movement of alleged truth-seekers who publicly advance scientific claims at a crossroads between partial evidence, pseudo-science, and conspiracy theories”.

4A mudança de seu nome para opas ocorreu somente em 1943, com a resolução XII da Conferência Sanitária Pan-Americana.

5Ver “Consenso de Brasília, XI Conferência Regional sobre a Mulher da América Latina e Caribe, 2013” e “Consenso de Montevideo sobre População e Desenvolvimento, 2013”.

6Nos seus anos na presidência dos Estados Unidos, Donald Trump (2016-2020) esforçou-se para impedir os avanços nos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres. Razão disso, em boa parte, deve-se ao perfil dos seus apoiadores: 81% dos eleitores evangélicos e brancos. Uma das suas principais vitórias foi ter conseguido compor a maioria conservadora na Suprema Corte americana que, em maio de 2022, anulou a legalização do aborto nos Estados Unidos.

Para citar este artigo: Cimini, F., da Ponte, A. D., & Duarte Filho, W. L. (2023). Sem mulheres não há saúde: o desmantelamento da política exterior de saúde pública do Brasil durante a pandemia da covid-19. Desafíos, 35(2), 1-31. https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/desafios/a.11983

Recebido: 06 de Maio de 2022; Aceito: 02 de Maio de 2023

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