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Investigación y Educación en Enfermería

versão impressa ISSN 0120-5307

Invest. educ. enferm vol.33 no.1 Medellín jan./abr. 2015

 

ARTÍCULO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE / ARTIGO ORIGINAL

 

O saber dos enfermeiros peritos e a racionalidade prático-reflexiva

 

The knowledge of expert nurses and the practical-reflective rationality

 

El conocimiento de los enfermeros expertos y racionalidad práctico-reflexiva

 

 

Paulo Joaquim Pina Queirós1

 

1Enfermeiro, Pós-doutorando ICBAS-UP. Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal. email: pauloqueiros@esenfc.pt.

 

Fecha de Recibido: Abril 14, 2014. Fecha de Aprobado: Agosto 25, 2014.

 

Artículo vinculado a investigación: Ninguna.

Subvenciones: Ninguna.

Conflicto de intereses: Ninguno.

Cómo citar este artículo: Queirós PJP. The knowledge of expert nurses and the practical-reflective rationality. Invest Educ Enferm. 2015; 33(1): 83-91.

 


RESUMO

Objetivos. Conhecer o que caracteriza um enfermeiro perito. Metodologia. Perguntámos a um conjunto de 49 enfermeiros a iniciar cursos de mestrado ''Que características e competências diferenciam um enfermeiro iniciado de um perito?'' Analisámos e categorizámos as respostas seguindo a metodologia de análise de conteúdo de Bardin. Resultados. Através de três fases de categorização, sintetizámos em 17 categorias as competências e capacidades atribuídas aos enfermeiros peritos. Estes têm competências e capacidades aprofundadas, alargadas e adquiriram metacompetências. Os enfermeiros peritos caracterizam-se pela capacidade de liderança, de supervisão, de gerir mudança e por competências comunicacionais e relacionais acrescidas. Apresentam capacidade de agir reflexivamente, planear, sistematizar, avaliar consistentemente, têm mais destreza, maior capacidade de adaptação, segurança e conseguem uma visão mais global. São competentes na gestão de conflitos, em lidar com o stress, bem como articulam a teoria e a prática, criam conhecimento, utilizam a investigação, respondem a situações complexas e têm capacidade de decidir. Conclusão.Os enfermeiros peritos apresentam capacidade de antecipação, perspicácia, fazem uso da observação discriminada, rapidez na ação e competência na definição de prioridades, comportam uma visão do contexto e tendem à especialização.

Palavras chave:  enfermagem; educação em enfermagem; conhecimento.


ABSTRACT

Objective: To identify the characteristics of an expert nurse. Methodology: A group of 49 nurses starting their Master’s degree was asked to answer the following question: ''Which characteristics and skills distinguish a novice from an expert nurse?'' The answers were analyzed and classified based on Bardin’s content analysis. Results: Through a three-stage classification process, the competences and skills assigned to expert nurses were divided into 17 categories. These nurses showed wide-ranging skills and acquired meta-competencies. Expert nurses are characterized by their leadership, supervision and ability to manage change, as well as their communication and relational skills. They have the ability to act reflectively, plan, systematize and consistently assess; they also show more dexterity. They have more adaptive skills, confidence and achieve a broader view. They are competent while managing conflicts and stress, as well as articulating theory and practice; they create knowledge, make use of research, respond to complex situations and are capable of making decisions. Conclusion: Expert nurses have anticipation skills, insight, use detailed observation, take immediate action and are able to define priorities; they keep context in mind and have a tendency for specialization.

Key words: nursing; nursing education; knowledge.


RESUMEN

Objetivo. Establecer diferencias entre una enfermera experta y una novicia para determinar las condiciones que caracterizan a la primera. Metodología. Estudio cualitativo en el que se preguntó a un grupo de 49 enfermeras que iniciaban los cursos de máster "¿Qué características y competencias diferencian una enfermera experta de una novicia?'' Se analizaron y categorizaron las respuestas siguiendo la metodología de análisis de contenido de Bardin. Resultados. Luego de tres fases de clasificación se sintetizaron 17 categorías de competencias y capacidades asignadas a enfermeras expertas. Las enfermeras expertas se caracterizan por el liderazgo, las habilidades de supervisión, por la gestión del cambio y por unas habilidades comunicacionales y relacionales incrementadas. Tiene la capacidad de actuar reflexivamente, planifican, organizan, evalúan y tienen más destreza que las enfermeras novicias. Poseen, además, una mayor capacidad de adaptación, seguridad y tienen una visión más global. Son competentes en el manejo de conflictos, manejo del estrés, así como en la articulación de la teoría y la práctica; crean conocimiento mediante la investigación, responden a situaciones complejas, y tienen capacidad de decisión. Conclusión. Las enfermeras expertas presentan capacidad de anticipación, perspicacia, observación detallada, acción rápida y la competencia en la fijación de prioridades. Finalmente, tienen visión de contexto y tienden a la especialización.

Palabras clave: enfermería; educación en enfermería; conocimiento.


 

 

INTRODUÇÃO

O conhecimento utilizado e criado pelos enfermeiros nas suas práticas clínicas adquire e desenvolve-se com base em conhecimento de natureza cognitiva, na experiência pessoal, profissional e vivencial. É um processo progressivo de crescimento, onde os profissionais progridem em fases, estudadas e descritas por Benner1 como: iniciado, iniciado avançado, competente, proficiente e perito. O desenvolvimento de competências em contexto prático processa-se numa lógica racional prático-reflexiva, distanciada e diferenciada da racionalidade técnica. Conforme refere Moya2, ''este saber prático reflexivo existe na ação profissional de maneira implícita e pessoal, e desenvolve-se numa realidade complexa, incerta e saturada de valores''.  Para Moya3, os trabalhos de Benner demonstram ''a existência de um conhecimento implícito que se ativa com a ação da enfermeira e que permite o reconhecimento instantâneo de situações problemáticas e respostas intuitivas características de uma prática profissional perita''. Vivemos um ''eclipse do conhecimento clínico pelo conhecimento científico formal'',4 e a supervalorização das práticas baseadas em evidências, na busca da cientificidade disciplinar, ajuda no movimento de encarar a enfermagem como ciência aplicada onde o trabalho prático é sobretudo técnico. As técnicas, pela diferenciação que comportam e segurança que permitem, têm forte atratividade, tornam os enfermeiros em verdadeiros técnicos, aplicadores de elevado desempenho, numa racionalidade técnica em que o padrão de conhecimento empírico se torna dominante em detrimento de outras formas de saber. No entanto, as ''formas de representação positivista ligadas aos fenómenos dos cuidados profissionais na saúde e do seu ensino apresentam uma certeza de que realmente carecem''.5

A obsessão pela prática baseada em evidências desvirtua e subalterniza a clínica, o saber fazer também baseado no conhecimento estético, ético, processual, tácito, de contexto. Como refere Schön6, ''inerente à prática dos profissionais que reconhecemos como especialmente competentes, existe uma fundamentação artística''. O conhecimento clínico, segundo Benner, mostra-se pelo reconhecimento de padrões, compreensão das mudanças na resposta humana ao longo do tempo, a capacidade de fazer distinções qualitativas, um reconhecimento muitas vezes tácito, a identificação de subtis mudanças, isto é, ''a enfermeira perita é capaz de reconhecer o que é notável em determinadas situações''.4 O enfermeiro é um ''profissional prático-reflexivo cuja ação se baseia num conhecimento prático e tácito que se ativa durante a ação e no qual podem, sob o ponto de vista heurístico, distinguir-se três componentes: conhecimento em ação, reflexão em ação e reflexão sobre a reflexão em ação''.3 Sendo que ''o elemento fundamental aqui é a reflexão em ação posto que é um mecanismo mediante o qual surge o conhecimento profissional (prático) que habilita para um exercício competente do cuidado''.3

A competência para agir em situações de grande complexidade, variabilidade, imprevisibilidade ''implica uma mistura integrada de ciência, técnica e arte, caracterizada por uma criatividade e uma sensibilidade de artista... Esta competência para agir no imprevisível assenta num conhecimento tácito, inerente e simultâneo às ações do profissional''.7 Um conhecimento na ação ''que se evidencia num know-how inteligente e socialmente relevante.7 Encontramos em Schön ''uma epistemologia da prática como resultado do conhecimento que os profissionais constroem a partir da reflexão sobre as suas práticas''.8 Esta epistemologia da prática consiste em ''o individuo agir em situação, em uma dinamicidade que permite a interação permanente entre a ação e o pensamento que resulta na reflexão''.8 Estamos assim perante ''...uma nova epistemologia em que se pretende que se desenvolva uma ação intencionalmente reflexiva''.9

Esta abordagem reflexiva é de natureza construtivista e assenta na consciência da imprevisibilidade dos contextos de ação profissional e necessariamente na compreensão da atividade profissional como atuação inteligente e flexível, situada e reativa.7 Enquadrado nesta epistemologia da prática, Zeichner afirma ''que não é a prática que ensina mas sim a reflexão sobre ela''.9 Neste âmbito importa sistematizar o conhecimento que brota da interação entre a ação e o pensamento.7 Grundy10 aponta como elementos constitutivos da praxis, a ação e a reflexão. A praxis tem lugar não no mundo hipotético mas no mundo real, mundo das interações, do social e do cultural. A praxis é um processo de construção de sentidos, um mundo construído não um mundo natural.9

Em relação ao saber profissional, das práticas, dos enfermeiros peritos, ''é necessário deixar vir ao de cima... e sobre ele construir o saber sobre a profissão'',7 tornando-se hoje imprescindível dar visibilidade a este conhecimento. Shulman11 afirma que esse conhecimento só será verdadeiramente reconhecido se obedecer aos mesmos requisitos a que obedece o conhecimento proveniente das atividades de investigação: a) ter um caráter público; b) estar exposto à crítica é à avaliação pelos pares e c) estar acessível para poder ser replicado e utilizado por outros. A lógica da racionalidade técnica, objetiva, formalista é inoperante quando confrontada com a imprevisibilidade que caracteriza grande parte do quotidiano profissional.7 Este quotidiano é marcado pela diversidade de contextos e de atores que ''... constituem a substância das nossas próprias diferenças enquanto profissionais, o valor acrescentado da nossa diversidade, a marca singular da nossa identidade pessoal e profissional. E que exige de nós não a competência aplicativa simplista e muda, mas uma metacompetência reflexiva e crítica, inteligente e estratégica que se traduz no saber pensar e na obrigação de o fazer a todo o instante no exercício das práticas''.9

O sentido de peritagem deriva de uma compreensão global da situação da valoração holística e qualitativa que passa por três características: esquemas de reconhecimento (padrões); sentido de proeminência (destaque) e consciência situacional.12 São os enfermeiros peritos que têm uma enorme experiência, que compreendem, agora, de maneira intuitiva cada situação e apreendem diretamente o problema sem se perder num largo leque de soluções e de diagnósticos estéreis.4 ''A enfermeira perita apercebe-se da situação como um todo, utiliza como paradigmas de base situações concretas que ela já viveu e vai diretamente ao centro do problema sem ter em conta um grande número de considerações inúteis''.1

 

METODOLOGIA

No âmbito da metodologia qualitativa numa perspetiva exploratório-descritiva de inspiração fenomenológica e com o objetivo de conhecer o que caracteriza um enfermeiro perito, solicitámos, em outubro de 2013, a um grupo de enfermeiros a iniciar a frequência de cursos de Mestrado em Enfermagem (Saúde Infantil e Pediatria; Saúde Materna e Obstetrícia; Reabilitação; Saúde Mental e Psiquiatria) da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra - Portugal que respondessem por escrito à seguinte pergunta: ''Que características e competências diferenciam um enfermeiro iniciado de um enfermeiro perito?''

A pergunta foi respondida em sala de aulas, após a explicação do que se pretendia, do pedido de consentimento, da garantia da confidencialidade e do anonimato. O grupo de informantes, livre e voluntário, com adesão de todos os solicitados, ficou constituído por 49 enfermeiros. Os dados foram analisados com técnica de análise de conteúdo seguindo a metodologia de Bardin.13 O processo de codificação das respostas seguiu a técnica de recorte com registo de unidades base (de registo), com análise de unidades repetidas, similares, ambíguas e de grupo, de enumeração com a determinação de frequências absolutas e relativas, e a classificação e agregação em categorias (sem a existência de categorias a priori), foram discutidos os achados e tiradas as conclusões. O processo de análise decorreu em três fases. A primeira iniciou-se com uma leitura de todas as respostas de forma a obter uma visão global, seguindo-se a leitura resposta a resposta anotando-se em cada uma as correspondentes unidades básicas de registo que foram analisadas e dando origem à primeira categorização. Numa segunda fase, confrontámos as categorias codificadas com os recortes textuais e as categorias entre si, permitindo reduzir e renomear as categorias. Na terceira fase, refinámos a análise, voltando a confrontar as categorias com os recortes, de onde resultou novo renomear e nova redução do número de categorias.

 

RESULTADOS

Dos 49 enfermeiros informantes, 8 eram do sexo masculino (16.7%) e 40 do sexo feminino (83.3%) (1 missing na idade e sexo). Média de idades 28.35 (min. 22 e máx. 49), e média de anos de profissão de 5.79 (min. 0 e máx. 28). A primeira leitura de todas as respostas permitiu ficar com a noção de três aspetos: i) grande volume de material com elevada valia; ii) generalizada capacidade argumentativa em relação ao que diferencia os enfermeiros peritos; iii) ideia transversal que aos enfermeiros peritos corresponde inequivocamente algo mais que aos iniciados, sendo notório a utilização generalizada das palavras ''mais'' e ''profundo''.

Da leitura resposta a resposta chegámos às unidades básicas de registo. Foram enumeradas 145 unidades básicas de registo e anotados os respetivos correspondentes recortes textuais. As unidades básicas foram analisadas e desse processo surgiu uma codificação em 35 categorias, com frequência de 1 a 9 unidades por categoria (Tabela 1), a que corresponde frequências relativas entre 0.7% e 6.2%, revelando por um lado uma grande dispersão, por outro lado profundidade na enumeração.

Tabela 1. Categorias surgidas na primeira fase de análise

Tabela 1.

A segunda fase de análise permitiu a agregação de algumas categorias com a consequente renomeação, reduzindo-se de 35 para 20 o número de categorias. Estas vinte categorias apresentam naturalmente uma maior concentração do material empírico, com frequências absolutas de 3 a 13 unidades básicas por categoria e frequências relativas de 2.1 a 9.0%. Ainda assim, pareceu-nos adequado uma nova análise dos recortes e do processo de categorização, resultando numa terceira fase (Tabela 2) com o reagrupar de categorias e renomear de algumas (Tabela 2). Demos por finalizado o processo com 17 categorias com frequências relativas de 4 a 24 e percentagens de 2,8% a 16,6%, como se percebe, com grande dispersão, mas pensamos sem perder a riqueza empírica.

Tabela 2. Processo de refinamento das categorias

Tabela 2.

As categorias encontradas e que correspondem as características e competências que os informantes indicam para diferenciar um enfermeiro perito de um enfermeiro iniciado (Tabela 3), seguindo uma ordem decrescente das frequências, poderão assim ser enunciadas: Os enfermeiros peritos têm conhecimentos aprofundados, diferenciam-se pela capacidade de liderança, de supervisão e de gerir mudança e pelas competências comunicacionais e relacionais acrescidas. Apresentam capacidade de agir reflexivamente, planear, sistematizar e avaliar consistentemente. Têm mais destreza, maior capacidade de adaptação, segurança e conseguem uma visão mais global. São competentes na gestão de conflitos, e em lidar com o stresse, bem como articulam a teoria e a prática, criam conhecimento, utilizam a investigação, respondem a situações complexas e têm capacidade de decidir. Apresentam capacidade de antecipação e perspicácia, fazem uso de uma observação discriminada, rapidez na ação e competência na definição de prioridades. Comportam uma visão do contexto e tendem à especialização.

Tabela 3. Categorias finais

Tabela 3.

Descendo no pormenor, é possível caracterizar e ilustrar estas capacidades e competências com os recortes textuais dos informantes, como por exemplo:

Que os peritos comportam uma visão do contexto está patente nas afirmações: ''gerir e adequar a sua personalidade perante o meio envolvente'' (informante 7), ''conhecimento da realidade que o rodeia'' (i46), ''desenvolve um maior contexto face às situações'' (i7).

A apresentação de capacidade de antecipação e perspicácia pode ser ilustrada pela afirmação da ''capacidade para a deteção de problemas'' (i40), pelo ''pensamento mais apurado para a ação'' (i38) ''de forma mais perspicaz'' (i42), com a ''previsão de cenários possíveis'' (i20) e ''deteção mais precoce de desvios da normalidade'' (i39), que permite ''identificar potenciais problemas de forma precoce'' (i42). Uma observação discriminada, ''observando determinados aspetos'' (i5), com ''conhecimentos mais pormenorizados'' (i43), uma ''triagem de situações'' (i28), com o ''saber olhar, ver e ouvir'' (i33). Com rapidez na ação expresso nos seguintes recortes, ''rapidez de resposta a diversas situações'' (i17), e na ''capacidade de raciocínio mais rápido'' (i33) e com competência na definição de prioridades, expresso na capacidade de ''estabelecimento de prioridades'' (i18, i31, i42), e na ''interligação de todas as prioridades'' (i12).

Os peritos criam conhecimento, são ''capaz de acrescentar conhecimento'' (i45), e ''capaz de criar por si conhecimento'' (i48). Utilizam a investigação (i45), e conseguem ''refletir sobre a sua área através da investigação baseada na prática'' (i6). Os enfermeiros peritos respondem ''a situações complexas'' (i49), com ''capacidade de resposta às exigências colocadas'' (i24) e de ''identificar e atuar em situações de maior dificuldade'' (i42) e têm capacidade de decidir com ''mais capacidade de resposta'' (i14), ''tomando decisões na maioria autónomas'' (i8), com ''maior capacidade de resolução de problemas'' (i15).

É próprio dos enfermeiros peritos conseguirem uma ''visão global do doente'' (i41), uma ''visão mais ampla'' (i12), de ''várias valências do ser humano'' (i8), uma ''capacidade de resposta mais abrangente'' (i38), que permite um ''olhar para o todo ao mesmo tempo que se atua em cada parte'' (i41), em que não é estranha ''formação extra curricular'' (i11), com ''ligação com outras áreas do saber'' (i16). Têm capacidade de agir reflexivamente, que passa por ''proporcionar momentos de reflexão'' (i35), e pela ''reflexão crítica do trabalho diário'' (i15), uso de ''pensamento crítico'' (i17), agindo ''metodicamente e reflexivamente'' (i48), tirando partido da ''experiência por ter passado por vários contextos'' (i46), e proveito da ''capacidade de comparar factos e experiências'' (i48), para com ''humildade e consciência das limitações e do impacto das suas ações'' (i49) ''resolver novos problemas e ultrapassá-los'' (i31).

Os enfermeiros peritos têm conhecimentos aprofundados, ''consciência da aprendizagem ao longo da vida'' (i36), da necessidade de ''atualização'' (i15, i44), com ''maturação do conhecimento'' (i29), ''conhecimento mais profundo'' (i13, i44), que ''aprofunda as suas competências'' (i7), com ''experiência prática'' (i2) e ''novas competências a nível prático'' (i19), ''conhecimento adquirido pela experiência'' (i47). As competências comunicacionais e relacionais são acrescidas nos enfermeiros peritos, e passam por ''saber comunicar com equipa multidisciplinar'' (i35), pela ''capacidade de argumentação'' (i17), ''saber argumentar'' (i35) e por uma ''comunicação mais direcionada'' (i11), que passa por ''maior sensibilização no contacto com a pessoa'' (i15). Este contacto ''se torna mais humano e menos técnico'' (i36) e ''consegue fazer ponte com a psicologia humana e o impacto emocional da doença'' (i41), resultante de os enfermeiros terem adquirido ''novas competências a nível relacional'' (i18, i19), estabelecendo uma ''relação de ajuda'' (i33), uma ''relação terapêutica'' (i34).

 

DISCUSSÃO

Os resultados mostram que os enfermeiros informantes diferenciam os enfermeiros peritos dos enfermeiros iniciados pelo desenvolvimento de competências e capacidades num triplo processo: aprofundamento, alargamento, e aquisição de metacompetências. O aprofundamento de competências e de capacidades está bem patente naquilo que revelam como sendo o aumento da destreza, em ter capacidades comunicacionais acrescidas, maior segurança e capacidade de adaptação. Estas estão presentes nos enfermeiros iniciados, fruto da experiência clínica profissional, e são desenvolvidas e aprofundadas, quantitativamente, sendo que o desenvolvimento qualitativo ainda não se espelha neste processo. Isto só será possível quando ocorrerem outro tipo de operações, como sejam as descritas por Benner4 como ''raciocínio-em-transição''  semelhante à ''reflexão-em-ação'' de Schön,6 já que ambos os processos se esforçam para clarificar a incerteza da ação que surge nas zonas indeterminadas da prática e em ampliar o conhecimento para a prática4, aspetos identificados na literatura de teoria de enfermagem como característicos dos peritos. Por outro lado, são identificados um conjunto de competências novas, - processo de alargamento -, como sejam as de liderança e de supervisão. Julgamos não ser ainda este o âmbito da descoberta de conhecimento incorporado na prática que expande o conhecimento em enfermagem.14

Por último, fazem referência e podemos sistematizar um conjunto de competências e capacidades resultantes do processo prático-reflexivo (reflexão na ação e reflexão sobre a reflexão na ação) que se traduzem num processo de aquisição de metacompetências, traduzido em ter capacidade de decidir, de responder a situações complexas, de antecipar, de uma ação rápida, em definir prioridades. Estas operações têm por base ''esquemas de reconhecimento'' e ''sentido de saliência'', no âmbito do conhecimento tácito e intuitivo, capaz de ''um juízo clínico perito que deriva de uma compreensão global da situação, em vez de analítica''.12

Em síntese, caracterizamos os enfermeiros peritos como enfermeiros que têm conhecimentos aprofundados, alargados e adquiriram metacompetências. Diferenciam-se dos outros enfermeiros (iniciados, iniciados avançados, competentes, proficientes – seguindo a categorização de Benner 1) pela capacidade de liderança, de supervisão, de gerir mudança e pelas competências comunicacionais acrescidas. Apresentam capacidade de agir reflexivamente, planear, sistematizar, avaliar consistentemente. Têm mais destreza, maior capacidade de adaptação, segurança e conseguem uma visão mais global. São competentes na gestão de conflitos, em lidar com o stresse, bem como articulam a teoria e a prática, criam conhecimento, utilizam a investigação, respondem a situações complexas, têm capacidade de decidir. Apresentam capacidade de antecipação, perspicácia, fazem uso da observação discriminada, rapidez na ação e competência na definição de prioridades. Comportam uma visão do contexto e tendem à especialização. Assim sendo, o saber dos enfermeiros peritos é um saber diferenciado, construído e só possível pela experiência profissional, pela ação, ou seja, pela clínica de enfermagem.

 

REFERÊNCIAS

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