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Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales, Niñez y Juventud

Print version ISSN 1692-715XOn-line version ISSN 2027-7679

Rev.latinoam.cienc.soc.niñez juv vol.22 no.3 Manizales Sep./Dec. 2024  Epub Dec 27, 2024

https://doi.org/10.11600/rlcsnj.22.3.6580 

Estudios e Investigaciones

Pedagogia do cuírlombo: violência a um pai cuír na educação infantil*

Queer Pedagogy: violence against a Queer parent in early childhood education

Pedagogía del cuírlombo: violencia a un padre cuír en la educación infantil

Mg. Ana Paula Freitas Padilha1 
http://orcid.org/0009-0002-2002-5099

Ph.D. Vinícius Bertoncini Vicenzi2 
http://orcid.org/0000-0001-8208-2131

Ph. D. Jaime Farias Dresch3 
http://orcid.org/0000-0002-9488-1456

1 Universidade do Planalto Catarinense, Brasil. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Planalto Catarinense. Graduação em Pedagogia, Centro Universitário Leonardo da Vinci. 0009-0002-2002-5099. H5: 0. Correo electrónico: anapadilha@uniplaclages.edu.br

2 Universidade do Planalto Catarinense, Brasil. Doutorado em Filosofia da Educação, Universidade do Porto (Portugal). Mestrado em Educação, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Bacharelado e Licenciatura em Filosofia, Universidade Federal de Santa Catarina. Graduação em Pedagogia, Universidade Paranaense. 0000-0001-8208-2131. H5: 1. Correo electrónico: viniciusvicenzi@uniplaclages.edu.br

3 Universidade do Planalto Catarinense, Brasil. Doutorado em Educação, Universidade Federal de São Carlos. Mestrado em Educação, Graduação em Pedagogia, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. 0000-0002-9488-1456. H5: 4. Correo electrónico: prof.jaime@uniplaclages.edu.br


Resumo

Apresentamos a discussão sobre um relato de experiência no cotidiano da Educação Infantil, tendo sido este o ponto de partida para identificar a violência nas práticas da colonialidade cishetero-endossexo presente no discurso de professoras. O artigo apresenta posibilidades de resistência fundamentadas nos estudos e nas experiências cuír. Discute o dispositivo da colonialidade cishetero-endossexo, por meio da perspectiva do biopoder, que circula nos espaços da escola de forma excludente, pejorativa e discriminatória. O estudo foi embasado em proposições teóricas decoloniais e pós-estruturalistas, articulando questões emergentes da produção cuír/queer, feminista e antirracista. Os resultados da pesquisa apontam a existencia de algumas linhas de fuga para o agenciamento da escola pela colonialidade cishetero-endossexo. Discute-se como o entrecruzamento de outros discursos que chegam à escola, impulsionados pela maior visibilidade cultural e política do cuír, possibilitam a constituição do cuírlombismo pedagógico.

Palavras-chave: Sexualidade; gênero e educação; filosofia e educação; educação infantil; professores de educação básica

Abstract

This article presents an everyday experience in the field of early childhood education, specifically colonial cisgender-endosex violence contained in teachers’ discourse. Possible forms of resistance based on Queer studies and experiences are presented. The article discusses the colonial cisgenderendosex apparatus through a perspective of biopower, which circulates in the school space in an exclusionary, pejorative and discriminatory way. The study draws on decolonial and post-structuralist theory, articulated with emerging issues from queer, feminist and anti-racist production. The results of the research evidence the existence of some escape lines for the school’s agency in relation to its cisheteronormative discourse. The discussion focuses on how the intersection of other discourses present in the school, driven by an increased cultural and political visibility of the Queer population, contribute to the construction of Queer Pedagogy.

Keywords: Sexuality; gender and education; philosophy and education; early childhood education; basic education teachers

Resumen

Presentamos la discusión sobre un relato de experiencia en el cotidiano de la Educación Infantil, siendo este el punto de partida para identificar la violencia en las prácticas de la colonialidad cishe-teroendossexo presente en el discurso de las profesoras. El artículo presenta posibilidades de resistencia fundamentadas en los estudios y en las experiencias cuír. Discute el dispositivo de cishetero-endossexo, por medio de la perspectiva del biopoder, que circula en los espacios de la escuela de forma excluyente, peyorativa y discriminatoria. El estudio se basó en proposiciones teóricas decoloniales y postestructuralistas, articulando cuestiones emergentes de la producción cuír/queer, feminista y antirracista. Los resultados de la investigación apuntan a la existencia de algunas líneas de fuga para el agenciamento de la escuela por el discurso cisheteronormativo. Se discute cómo el entrecruzamiento de otros discursos que llegan a la escuela, impulsados por la mayor visibilidad cultural y política del cuír, posibilitan la constitución del cuírlombismo pedagógico.

Palabras clave: Sexualidad; género y educación; filosofía y educación; educación infantil; profesores de educación básica

Introdução

Sem querer

Sou queer

Por querer ser

Mais do que si

Há de ser

Ainda não sou quem serei

Ainda não sou pelo meu querer

Ainda não sou porque não pude ser

Amarraram minha arte do fazer

Ser queer é no devir ser

É violento não ter nome pra se entender

Descrição significado e prazer

Ser margem do léxico de você

Me pergunto quando eu vou chegar a ser

Se ser nunca me foi permitido

Se quando eu falo comigo

eu tenho que usar «você»

(Mateus Rebello, 2021)

Violência semântica é o título do poema de Mateus Rebello que abre este artigo. Assim, buscamos demarcar uma dimensão estética acerca das reflexões, discussões e posições teóricas e políticas tratadas mais adiante. A sensibilidade expressa nos versos mostra o quanto é difícil para os sujeitos cuír expressarem suas identidades dissidentes, um problema que tem como base um conjunto de violências, que se manifesta das mais variadas formas contra os sujeitos que performam identidades e/ou orientações sexuais dissidentes. Embora o termo queer seja de uso frequente na literatura científica brasileira, adotamos a grafia cuír, assim grafado, para demarcar uma posição político-epistemológica que visa descolonizar os estudos queer, ou teoria queer. Além disso, cuír aparece aqui para «nomear» aqueles sujeitos que escapam às definições, que rejeitam as definições e que transitam entre as práticas e identidades de gênero e afetividade. Propomos, então, denominar a comunidade formada por pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Travestis, Cuir/Queer, Intersexos, Assexuais, Pansexuais, Não-bináries e Outras expressões e identidades de gênero e sexualidade por meio da sigla LGBTCIAPN+, trocando-se a usual letra «Q» (Queer) pela «C» (Cuír). Entendemos que a denominação de um grupo não é mero detalhe, mas uma questão política ligada às lutas de um grupo e de subgrupos por direitos. Este movimento, não apenas linguístico, contempla o deslocamento e a transformação do queer, possibilitando seu encontro com histórias locais e a invenção de um «queer nos trópicos» (Pereira, 2012), ou cuír.

O artigo apresenta uma revisão narrativa da literatura sobre a teoria queer, com base em autores/as que problematizam a forma colonialista como essa teoria chegou ao Brasil e a necessidade de se produzir leituras mais próximas ao contexto brasileiro. Nesse sentido, destacam-se os trabalhos de Flores (2013), Garcia (2021), Louro (2000, 2013), Pelúcio (2014), Pereira (2012), Piscitelli (2009), Saxe (2022). Por meio da revisão, optou-se por utilizar o termo «cuír» e, assim, construir um aprofundamento teórico sobre a violência contida no relato de experiência docente. Com base nos estudos já realizados sobre essa temática, propomos a desterritorialização do conceito de Tatiana Nascimento (2018), o cuírlombo da palavra, para nos ajudar a pensar uma educação para o acolhimento, para as diferenças e radicalmente anticolonialista. Articulado com esta proposta, buscou-se a contribuição de pesquisas mais recentes sobre a relação do cuír com a educação, como os trabalhos de Benevides (2024), Carine (2023), Cassal e Oliveira (2023), Cordeiro (2024), Garcia (2021), Santos et al. (2024). No que se refere à articulação entre pedagogia cuír e aquilombamento podese mencionar as contribuições de Casa Neon Cunha (2023), Coelho da Silva e Farias (2022), Gabriel e Santos (2021) e Silva e Maciel (2023).

Larissa Pelúcio (2014) propõe falarmos em «teoria cu». Com isso, retoma a questão colocada por Paul Preciado sobre a abjeção histórica da sociedade em relação ao ânus. Se o termo queer não tem para nós o sentido depreciativo que tem no inglês, uma teoria cu imediatamente recoloca a abjeção e a marginalidade em foco. Segundo a autora, «mais que uma tradução para o queer, talvez eu esteja querendo inventar uma tradição para nossos saberes de cucarachas. Tentativa de evidenciar nossa antropofagia, a partir da ênfase estrutural entre boca e ânus, entre ânus e produção marginal» (Pelúcio, 2014, p. 18).

A partir desse ponto de vista, o artigo problematiza a relação entre pais que se identificam enquanto cuír e as percepções de professoras. A discussão tem como base um relato de experiência de uma professora e mobiliza conceitos, especialmente da perspectiva pós-estruturalista, para compreender como ocorrem as práticas de governo centradas numa educação que interdita o modo de vida cuír. Entretanto, percebemos que existem linhas de fuga, entre elas, destaca-se, como no relato, a afirmação dos sujeitos e de suas famílias, inventando e permitindo-se viverem experiências afetivas outras - rompendo os limites da «colonialidade cishetero-endossexo» (Moraes et al., 2023). Optou-se por utilizar o termo cishetero-endossexo, para superar os limites das análises decoloniais e feministas baseadas em conceitos como «heterossexualidade compulsória» ou «cishete-ronormalidade». Corrobora-se, assim, com a urgência de incluir e denunciar a violência colonialista contra a população intersexo. Para deixar claro, «cis» é a pessoa cujo sexo biológico atribuído no nascimento coincide com seu gênero (macho/homem; fêmea/mulher); «hetero» é a pessoa que sente atração sexual e afetiva pelo gênero oposto e «endos-sexo» é a pessoa cujas características sexuais no nascimento se enquadram no ideal normativo para corpos masculinos ou femininos, ou seja, sem ambiguidades biológicas ou genéticas. A colonialidade, portanto, constituise por meio de práticas de normalização dos corpos baseadas nos ideais cis-hetero-endossexo.

Tendo isso em vista, o objetivo principal do artigo é analisar uma situação do cotidiano escolar tendo em vista a identificação e o funcionamento de práticas cishetero-endossexo diante de manifestações de rompimento do discurso normalizador.

Neste contexto, coloca-se em discussão as possibilidades de se construir uma Pedagogia do Cuírlombo, como tática de resistência dos sujeitos cuír e reconhecendo a própria construção deste artigo como manifestação criativa do cuírlombismo pedagógico. Para além da denúncia e da reação, a posição política aqui assumida é a de inventar uma outra escola possível, que possa ser capaz de olhar de frente para as pessoas em suas múltiplas diferenças. Para que isso possa acontecer, é necessário problematizar discursos naturalizados, descrever situações que parecem corriqueiras, analisar o discurso da colonialidade cishetero-endossexo, apontar suas rupturas e abrir espaço para a proliferação de outros enunciados possíveis.

Uma das violências recorrentes que podemos observar em vários espaços sociais -e no âmbito escolar não é diferente- deriva de um conjunto de práticas de governo, efetivando-se, como aponta Foucault (1995), no exercício de conduzir condutas. Aqui estamos focando na violência contra as pessoas que não se ajustam ao padrão de comportamento da colonialidade cishetero-endossexo. No que se refere ao governo, existem nos espaços sociais em geral relações de poder -nas quais os sujeitos estão inseridos- que agem de forma mais ou menos calculada «sobre as possibilidades de ação dos outros indivíduos» (Foucault, 1995, p. 244). Não se trata de um afrontamento entre adversários, adverte Foucault (1995), pois esta operação ocorre no nível do governo e supõe como princípio que os sujeitos sejam livres. Deve haver, portanto, linhas de fuga, possibilidades de escape às táticas de condução.

A questão que colocamos é a de que os sujeitos cuír desestabilizam o discurso normalizador cishetero-endossexo, produzindo linhas de fuga ao governo dos corpos. E, neste caso, há uma fissura nas relações de poder e o espaço que se abre permite que outras relações de coação ou de violência se manifestem. Nas últimas décadas, as escolas têm se efetivado como esse lugar de ambivalência ou sobreposição entre as táticas de governo e de violência. Em suma, quando pensamos nos sujeitos cuír e sua relação com a escola, estamos focando numa população para a qual certas normas institucionais não são capazes de capturar, para a qual as táticas de governo existentes não têm a mesma eficácia e, portanto, precisam ser constantemente reconstituídas nos jogos de saber/poder. Diante da falta de agilidade em lidar com (ou normalizar) a população cuír, ainda vigoram antigas estratégias de segregação, exclusão, proibição, coação: tudo isso demonstra o quanto a escola pode ser hostil e violenta para pessoas com identidade de gênero e orientação sexual dissidentes. O ministro do Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, no seu voto à Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI n.º 5668, permite compreender alguns aspectos das táticas de exclusão da população cuír na escola. Segundo Fachin (2024), existe um movimento de elaboração de leis estaduais e municipais proibindo a adoção de programas de ensino e até mesmo interditando o discurso docente sobre questões de gênero e orientação sexual, ainda que dispositivos deste tipo já tenham sido julgados inconstitucionais.

Percebemos a relevância de trazer à tona vivências que demonstram a violência e a intolerância contra a diferença no espaço escolar não para julgar ou condenar, mas para problematizar, trazer refiexões de como as subjetividades influenciam no modo como os sujeitos da escola se colocam frente as diferenças, sendo esta, um campo plural, diverso, multi, de personalidades e pessoalidades. Podemos, então, levantar algumas questões pertinentes, tais como: a escola está preparada para ser colocada de frente com as diferenças, e aqui especialmente a população cuír? A escola é capaz de lidar com aqueles que ela não consegue ou que não querem ser nomeados? De que forma a escola pode se transormar num ambiente de acolhimento, superando o (neo)conservadorismo, o fanatismo religioso e ideológico, o negacionismo científico em favor de uma educação inclusiva? Bárbara Carine (2023) questiona: «quem descoloniza a decolonialidade?» (p. 130), e a questão é que os mesmos homens cisgêneros continuam produzindo as teorias decoloniais. Então, seria possível mudar a escola se o conhecimento segue sendo sobre o outro, sobre aquele que não fala? A discussão aqui proposta percorre estas questões, sem a pretensão de esgotar tais problemáticas, mas buscando fortalecer a luta pelo direito à educação de qualidade. Nisso reside a defesa de uma escola comprometida com as diferenças, um aspecto fundamental da Pedagogia do Cuírlombo e de suas práticas pedagógicas marginais, subalternas e criativas.

Metodologia

A discussão sobre a questão da violência contra a população cuír numa instituição de Educação Infantil tem como ponto de partida um relato de experiência. Este tipo de produção constitui uma «maneira de acessar os meios utilizados pelo docente para enfrentar o cotidiano escolar, sua forma de lidar com as situações inesperadas, posicionamentos dos alunos e principalmente como estabelece a relação pedagógica» (Neira, 2019, p. 267). Como veremos, o relato aqui utilizado ilustra um posicionamento ainda presente nas instituições de ensino e seu desdobramento, por meio da discussão mais aprofundada da questão, possibilita às docentes criarem estratégias para enfrentar o cotidiano escolar.

Serão levantadas problematizações acerca do entendimento que a escola tem do que é ser cuír, e quais condutas adota. O relato apresenta uma situação real, ocorrida em uma escola pública de Educação Infantil, no período pós-pandemia de Covid-19.2 As identidades das pessoas foram preservadas com o intuito de resguardar seu direito ao anonimato. Trata-se de um tipo de estudo que busca aprofundar teoricamente aspectos de uma situação ocorrida espontaneamente a partir da prática docente cotidiana, e que não revela dados sobre os sujeitos, ficando dispensado o registro e avaliação pelo sistema CEP/Conep, nos termos da Resolução CNS/CP n.º 510, de 2016 (Conselho Nacional de Saúde, 2016, Art. 1º, § 1º). No relato, são apresentados aspectos das violências, veladas ou não, contra uma pessoa cuír, que matriculou seu/sua filho/a em uma instituição educacional (que atende crianças de zero a cinco anos de idade). A criança em questão encontrava-se, naquele momento, em processo de adaptação na Educação Infantil.

Este relato se desenvolveu a partir de um diálogo presenciado por um dos autores deste artigo. A instituição está localizada na região periférica de um município de médio porte, no estado de Santa Catarina, região Sul do Brasil. Sua identificação será preservada, sendo aqui denominada como Escola Essencial3. Sobre a comunidade na qual a unidade escolar está inserida, observa-se ampla diversidade cultural, na qual habitam e se relacionam diferentes sujeitos, com etnias, crenças, ideologias, orientações sexuais e identidades de gênero, organizações familiares diversas e plurais. Devemos lembrar que a situação narrada pertence a um contexto histórico e social que é também subsídio para as subjetivações dos sujeitos que serão citados neste relato.

Ressaltamos ainda, que este relato de experiência se originou na disciplina eletiva «Escola, relações de poder e violências», no Mestrado em Educação da Universidade do Planalto Catarinense. Com base nos estudos realizados a partir desta produção, foi possível compreender que a escola é uma instituição com certas especificidades e que nela circulam relações de saber-poder, de forma hierarquizada vertical, às vezes linear, em alguns momentos privilegiando o poder disciplinador, vigilante e biopolítico, em outros momentos ressaltando as relações participativas e democráticas. Há divergências de saberes, de discursos e práticas quanto às várias questões que emergem no cotidiano escolar, e aqui neste relato ficam evidenciadas alguns dos diferentes posicionamentos dos sujeitos com relação a gênero e sexualidade.

O estudo da questão cuír, tendo emergido no relato de experiência, contou com a revisão narrativa de literatura. O objetivo deste tipo de metodologia é situar a questão tratada, buscando problematizar o que aparece naturalizado no cotidiano escolar. No caso, buscamos conhecer como o discurso normalizador cishetero-endossexo aparece no contexto social e no ambiente escolar, bem como identificar na literatura científica como este discurso tem sido tratado. A revisão narrativa, portanto, fornece «sínteses narrativas», que permitem situar a questão de pesquisa, mesmo que de forma menos sistemática (Ribeiro, 2014).

A análise dos dados foi realizada a partir da análise do discurso foucaultiana, que toma a situação relatada não como um conjunto de frases, com significados em si mesmas, mas como um acontecimento discursivo, que possibilita problematizar o cotidiano escolar e indagar como se tornou possível um determinado acontecimento. «Analisar o discurso seria dar conta exatamente disso: de relações históricas, de práticas muito concretas, que estão "vivas" nos discursos» (Fischer, 2001, pp. 198-199). O relato de experiência, apresentado a seguir, serviu como ponto de partida para o aprofundamento teórico da questão cuír e para a compreensão dos aspectos discursivos relacionados à violência na escola. O discurso analisado aqui diz respeito à forma como a violência a um pai cuír ocorreu, tendo como base a descrição da situação. Cada seção do artigo busca responder, sem pretensão de esgotar, algumas discussões extraídas do relato: a) introdução ao cuír; b) Pedagogia do cuírlombo como estratégia de resistência e possibilidade de ser o que se quer; c) o cuír como resistência possível às práticas da colonialidade cishetero-endossexo. A ordem em que as seções aparecem no texto torna possível a leitura do relato seguido a discussão da questão cuír na escola, a partir de um conjunto de pontos levantados na literatura científica, incluindo a proposta de uma denominação específica para este tipo de «problema»: Pedagogia do cuírlombo. Esta seria uma forma de trazer uma discussão já existente no campo dos estudos de gênero e da linguagem para contribuir com o campo educacional.

Análise do caso

Uma experiência docente relatada: «ela nunca vai ser pai»

Apresentamos, a seguir, a narrativa que compõe o relato de experiência que serviu como ponto de partida para as problematizações que levaram à discussão aqui realizada. A situação narrada é mais que um registro do cotidiano escolar, a partir do olhar da autora/ narradora. Talvez não possamos denominá-lo como «narrativa dissidente», pelo menos não diretamente, pois foi reconstruído com base na percepção da professora/narradora, movida pelo inconformismo contra a violência à um pai cuír. Ainda assim, o relato busca criar possibilidades outras de educação, articulando-se com as estratégias dissidentes de uma Pedagogia do Cuírlombo. De acordo com Cassal e Oliveira (2023), «as narrativas dissidentes desempenham um papel fundamental na desestabilização dessas normas e na abertura de espaços alternativos para a expressão de identidades marginalizadas» (p. 22).

Esse relato surgiu em uma disciplina eletiva, como já mencionado, realizada («Escola, relações de poder e violências») realizada em maio/junho de 2023. Foi solicitado a escrita de um relato de experiência em que os/as discentes tivessem presenciado ou vivido alguma situação de violência no âmbito escolar. E que, diante desta, tivessem identificado um aprendizado, ou mobilizado uma problematização sobre as questões vividas. A partir disso, deveriam desenvolver um contexto e embasamento teórico para discutir os pontos sensíveis que surgiram.

Durante o processo da disciplina a autora/narradora recordou imediatamente uma situação que marcou sua trajetória como professora da Educação Infantil, na qual ouviu determinados enunciados ligados ao discurso cishetero-endossexo, endereçados a um pai «cuír» de uma das crianças da escola. Isso diretamente refletia no modo como era percebida aquela criança, correlacionando uma tendência de incerteza ou fracasso futuro ao fato de viver em um núcleo/constituição familiar que não corresponderia ao modelo tradicional, ideal, normal - segundo o padrão da sociedade cishetero-endossexo, como já discutimos anteriormente.

Os sujeitos deste relato terão seus nomes preservados, substituídos por pseudônimos, os quais são relacionados às práticas discursivas de cada sujeito e será apontado ao lado de sua identificação. Professora Norma, docente da Educação Infantil na Escola Essencial, argumenta pela via da colonialidade cishetero-endossexo. Professora Etiana, docente da Educação Infantil, discursa pela via do respeito às diferenças, ocupa um lugar de problematização. Professora Marcela, docente da Educação Infantil, posiciona-se a partir do discurso da resistência e da minoria, demonstrando iniciativa para argumentar e contra-porse. Vó Valen, mãe de Queércia (demonstra coragem e força para afirmar o que sua filha e Sol são, independente de possíveis nomeações ou tentativas de normalização contra sua família). Considerava-se a avó de Sol. Queércia, pai cuír, demonstra, na maioria das vezes, preferência por performar no masculino, entende-se como cuír, questionando e quebrando parâmetros cishetero-endossexo. Pai da criança Sol. Queércia identificava-se como uma pessoa que transita entre gêneros, não se enquadrando na colonialidade cishetero-endossexo. Acolheu e assumiu o papel de pai (assim que ela/ele se define e assim que a criança a/o chama) de Sol. Sol (nome escolhido para a criança do relato, por ser neutro e não revelar o gênero desta criança, preservando sua identificação. Foi escolhido, também, por remeter à resistência, luminosidade, vida e amabilidade). Sol frequentava a Educação Infantil. No momento do relato, estava em processo de adaptação escolar. Mostrava-se uma criança muito sensível, carinhosa e expressiva, contudo, um pouco insegura com a situação de adaptação à nova rotina e ao ambiente.

Em certo dia na Escola Essencial, em meio a uma interação de turmas das professoras Norma, Etiana e Marcela, professora Norma chamou a atenção para o choro constante de Sol, o qual sobressaía em meio às interações das outras crianças, justificando que Sol estava em período de adaptação. Comentou, logo em seguida, sobre a estrutura familiar em que a criança vivia, já de modo pejorativo e taxativo. Falou que vivia com a mãe biológica, com a avó Valen, e Queércia (pai cuír), e fez questão de deixar claro que, se fosse com ela, não aceitaria esse tipo de relacionamento se fosse escolha de seus/suas filhos/as. E que isso, «com certeza», estava afetando psicologicamente e emocionalmente a criança.

Tanto a posição da professora Etiana, quanto da professora Marcela, foi de afirmar que não estavam no lugar de julgar ou apontar sobre esta questão de estrutura familiar envolvendo Sol. Professora Marcela se pôs no lugar da vó Valen e disse que independente das escolhas que farão os filhos (as) dela, sempre os(as) aceitarão de volta em casa. Norma, também, mostravase muito incomodada por Sol chamar Queércia por pai. Disse às professoras que o chamava o dia todo, e em certo ponto, perguntou a avó Valen quem era esse pai que Sol tanto chamava. Perguntou se não tinha a possibilidade de Sol estar com saudade do seu pai biológico. Norma ainda confessou que fez isso já sabendo a resposta, mas queria ver se a avó sustentava o fato de Queércia se considerar pai de Sol, sendo que na concepção cishetero-endossexo de Norma, Queércia era uma mulher, independente de como ela mesma se entendesse, e de como Sol a chamasse e identificasse. E contou também que a avó afirmou que o pai que Sol chama é Queércia, sim, e que era assim que se tratavam.

As professoras colocaram para Norma que a referência e concepção de Pai não é necessariamente homogênea, e que para esta família e para Sol, o pai é Queércia. Ela as interrompeu, colocando que essa criança vai crescer, na verdade, sem referência masculina, pois nada muda o que Queércia é biologicamente. Nesse momento, Etiana e Marcela ressaltaram que, não necessariamente, uma figura paterna masculina garante uma boa educação, bom exemplo, bom convívio familiar, e nem uma estrutura emocional sólida. Lembraram-na de muitas situações de pais violentos, machistas, abusadores, que também fazem parte de muitas famílias aparentemente consideradas ideais e bem estruturadas. Norma, permeada por suas crenças limitantes, disse que não a convenceriam, e que para ela aquilo era errado e soltou uma das frases mais marcantes de toda a conversa: -«Me desculpem, achem o que achar, isso não existe. Ela nunca vai ser homem, nunca vai ser pai! Nada muda o que ela é biologicamente, assim, na essência mesmo».

E continuou sua fala chancelando o futuro de Sol, dizendo que provavelmente, vivendo nessa estrutura familiar, seria -«mais um(a) largado(a), com escolhas erradas, desempregado/ a, e marginal», já comparando a criança com as demais daquela instituição, que viviam em uma estrutura tradicional considerada ideal, principalmente aquelas famílias com influência religiosa, falando que, do seu ponto de vista, estas crianças sim, teriam uma perspectiva, estudo, futuro...

Estas falas, para além de seu preconceito, são um discurso violento pois adentra à dignidade de outras pessoas, aqui de uma criança e de sua família. Movidas pelo sentimento de indignação, as professoras Etiana e Marcela tentaram mostrar, discutir e levantar outros pontos, retomando vivências nada boas envolvendo suas próprias paternidades, índices, outros exemplos da comunidade escolar, e que apesar disso, mesmo fazendo parte das subjetividades, não é a ausência ou a presença de uma figura paterna masculina que vai sentenciar a vida das crianças/pessoas. Mesmo porque a vida não é uma cartilha ou um manual igual para todos, reconhecendo que cada família e cada sujeito tem sua história, suas problemáticas, desafios, suas escolhas, e lembrando-a que o papel enquanto professoras certamente não era de estar discutindo como Sol deveria chamar o pai. Deveriam olhar para isso como uma possibilidade de combater a violência, discutir sobre outros modos de ser, outros modos de ser família, pois não adianta a escola discursar que é acolhedora, inclusiva, democrática, diversa, e na prática, e nos discursos individuais, isso não se realizar. Norma, mesmo depois de ouvir os posicionamentos, disse que casos de sucesso em famílias assim desestruturadas são «exceções», e que no caso de Sol duvidava muito que tivesse um futuro bom. E terminou com «-Pra mim, do jeito que for, criança precisa de pai e mãe, digo pai pai! mãe mãe!».

Neste momento instaurou-se um silêncio, mas que falava através das expressões. Logo foi quebrado pelas demandas da rotina da escola, mas isso marcou as professoras. Foi constatado como, através da linguagem, dos discursos e práticas, e estas como extensão incorporada do discurso, materializase a subjetividade dos sujeitos na qual a violência pode ser vista imaterialmente, mas que, fisicamente (no corpo), causam sensações de vulnerabilidade, sentimentos de exclusão. Marginalizam e quase criminalizam a vida dos sujeitos das relações de saber-poder que se encontram às margens das práticas discursivas cishetero-endossexo.

É o quê? Cuír!

O que é queer / cuír? Podemos iniciar pela etimologia da palavra que, para muitos, ainda causa estranheza e curiosidade. Pode ser interessante ou angustiante não poder dar significado a uma palavra, dependendo de quem a toma ou pronuncia. Mas podemos adiantar que ela é profundamente cheia de história, lutas, significados e resistência. Sobre a palavra queer, Teresa de Laurentis (2019) nos aponta que «esta existiria na língua inglesa há mais de quatro séculos, e durante todo esse tempo, a palavra sempre carregou consigo denotações e conotações negativas, como: "estranho, esquisito, excêntrico"» (Laurentis, 2019, p. 397).

O significado de cuír já foi lido pejorativamente, designando o outro como estranho e desviado. E segundo Rafael Garcia (2021) entendido por «um ato discursivo (…) utilizado para causar medo e designar um conjunto de corpos obscenos, abjetos, imprestáveis, improdutivos, e por esse motivo, indesejáveis nas sociedades patriarcais brancas, burguesas, coloniais, capitalistas» (p. 5). Wesley Ribeiro e Rosângela Matos (2020) nos falam sobre a ressignificação do termo cuír a partir de movimentos de resistência das minorias de gênero e sexualidade. Isso ocorreu na década de 1980, quando passou a se constituir «uma teoria queer», que buscava «questionar os papéis impostos pela socialização cishe-teronormativa: questionar o modelo binário de análise da existência, como homem-mulher, homo-hétero, denunciando o caráter construído e os discursos em jogo para a produção de uma relação de poder» (p. 5).

Podemos constatar, então, que o termo cuír, como é utilizado hoje, foi legitimado, personificado, ressignificado pelo próprio movimento. Se antes os sujeitos sofriam ataques com a utilização deste termo, agora houve uma ressignificação em torno do cuír, o qual vem reafirmar o pensamento e a luta contra as práticas de normalização. Neste sentido, Flores (2013), afirma: «Mi filiación con lo cuir se dispone como una práctica epistemológica, como operación política, como crítica cultural a todo proceso de normalización » (p. 35). Portanto, o cuír aparece como um discurso político produtor de relações de poder e, também, de marco teórico, em oposição às interdições colocadas pelo discurso cishetero-endossexo. Além disso, Saxe (2022) aponta que não há uma «versão única do queer» (p. 3) e que suas diferentes formas de aparição podem servir para problematizar uma percepção mais ou menos homogeneizada do cuír. A partir da argumentação de Saxe (2022), podemos ver o #queer aparecer em diferentes espaços. Como tag (marcador) no Instagram, #queer aparece com mais de 16.1 milhões de publicações e a tag #cuir, com 1.2 milhões.4 Em relação ao «deslocamento na grafia», Saxe (2022) informa que isto tem aparecido com mais frequência «no contexto ativista» (p. 7).

Tatiana Nascimento (2018) propõe realizar um movimento de descolonização conceitual, tornando a palavra queer e sua semântica mais próximas do contexto latino-americano e, dessa forma, utiliza o termo cuír, fazendo derivar dessa rasura do conceito-chave -queer studies- a discussão do projeto epistêmico do cuírlombismo. De acordo com Gabriel e Santos (2021), «É de outros Nascimentos que Tatiana herda o quilombismo como ideia. E da potência confabulativa do encontro com as teorias queer (ou na sua versão latinoamericana: cuír) nasce a noção de queerlombo, ou cuírlombo» (p. 16).

Poder ser o que se quer? Da teoria cuír ao cuírlombismo pedagógico

Para discorrer sobre a Teoria Cuír é necessária uma contextualização histórica sobre a questão. Os primeiros movimentos cuír tiveram seu início nas décadas de 1980 e 1990, e aqui no Brasil, com mais expressividade, no início dos anos 2000, especialmente a partir das traduções das obras iniciais de Michel Foucault e das pesquisas sobre gênero e sexualidade, como as de Guacira Lopes Louro, Mário Cesár Lugarinho, entre outras. É importante esclarecer, entretanto, que o termo queer / cuír só vai aparecer mais recentemente, sendo que os movimentos gay, lésbico e travesti são precursores de um conjunto de movimentos sociais que hoje se convencionou denominar LGBTQIAPN+, ou como nós já propusemos no início, LGBTCIAPN+.

Como explica Guacira Lopes Louro (2013), cuír é um corpo estranho, que perturba: «Queer é um jeito de pensar e de ser que não aspira o centro nem o quer como referência; um jeito de pensar e de ser que desafia as normas regulatórias da sociedade» (pp. 7-8). De acordo com Louro (2013) esse incômodo tem relação com a ambiguidade do cuír, por existir no «entre lugares».

O movimento cuír busca se afastar das práticas normalizadoras, das nomeações, enfim, do discurso cishetero-endossexo, o que amplia e aprofunda as vozes dos distintos movimentos não binários, por exemplo. Mário César Lugarinho (2001), a este respeito, considera que a teoria cuír «problematiza e desconstrói os conceitos de identidade, a partir da constituição de um sujeito queer, definido através de sua etnia, classe social, ideologia política, religião etc» (p. 41). Um dado positivo sobre a teoria cuír está no fato de ela congregar uma «comunidade» que possui em comum diferentes formas de oposição «à identidade heterossexual dominante na cultura» (Lugarinho, 2001, p. 41).

A crítica e a resistência dos movimentos das minorais de pluralidades sexuais, em toda sua diversidade, positivaram o termo cuír enquanto posicionamento político e teórico, tensionando e desestabilizando referências normalizadoras. Assim, fazem emergir, com sua luta e força, as pluriformas de identificação de gênero e de possibilidades afetivas. Desafiam, contestam e refutam, portanto, ideias e ideais hegemônicos heteronormativos e binários, mostrando que há transições, transgressões entre a margem e o centro, muito além do que se pode ser considerado margem e centro. Segundo Colling (2013), para o movimento cuír, não existe apenas uma forma de viver as sexualidades, como também não existem apenas dois gêneros, mas há uma considerável parcela de pessoas que prefere transitar ou permanecer nas margens.

Partindo de uma leitura pós-estruturalista, Ribeiro e Matos (2020) apontam que a teoria cuír não está focada em buscar «uma» verdade sobre as «minorias sexuais», mas «compreender e politizar estudos e provocar estranhamentos em suas construções para que possamos sair das lógicas, historicamente construídas, de sujeitos determinados, essencialmente biológicos e em estudos hetero centrados, buscando questionar papéis impostos na socialização heteronormativa» (p. 5).

O questionamento pode se efetivar de muitas formas, inclusive pelas táticas do cuír-lombismo pedagógico. Silva e Maciel (2023) analisam a «Pedagogia da Putaria» que embasa estética e politicamente o trabalho musical das Irmãs de Pau. Podemos afirmar que se trata de uma manifestação pedagógica da arte, o que se constitui na própria «guerra contra o cistema».5 Então, caberia dentro do cuírlombo tantas pedagogias e manifestações estéticas e políticas quanto necessário para enfrentar a colonialidade cishetero-en-dossexo. A arte, em seu conteúdo educativo é visto pelos autores como uma «pedagogia de guerrilha» e, neste sentido afirmam: «Ser poc é estar na intersecção entre gênero, classe, raça e território, na encruzilhada entre o camp e o ‹pobre›, num apelo estético-político que brinca com excessos que denunciam desigualdades e escorregam na passabilidade» (Silva & Maciel, 2023, p. 139).

O cuírlombo é o território das visibilidades, entendida como estratégica na luta contra o silenciamento e a resignação frente à violência. As Irmãs de Pau são habitantes deste território, na medida em que integram uma guerrilha, constituem uma «epistemologia da putaria» na qual a visibilidade é sua potência: fazem aparecer o estranho, o abjeto, por meio do seu «pop travestigênero», e reivindicam seu lugar de fala como travestis artistas. Abrem «outras novas possibilidades para outras visualidades do pop, fazendo-o provocativamente cuír, marginal, trans, preto. Das encruzilhadas das quebradas a música das Irmãs de Pau vem como oferenda» (Silva & Maciel, 2023, p. 140).

Dentro do território das visibilidades, além das produções culturais, podese incluir diversas outras estratégias de luta, as quais podem assumir um caráter pedagógico. Por vezes, é preciso considerar que a população LGBTCIAPN+, sujeita em grande medida à violência estatal/policial ou a condições de extrema vulnerabilidade social, precisa em primeiro lugar sobreviver. Em janeiro de 2024, a Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (Antra) publicou o Dossiê anual sobre os assassinatos e violências contra travestis e transexuais no Brasil (Benevides, 2024). Dentre os pontos analisados no Dossiê, percebe-se que «a maior parte das vítimas é jovem, entre 13 e 29 anos; (…) a maioria é negra, empobrecida e reivindica ou expressa publicamente o gênero feminino; (…) entre as vítimas, a prostituição é a fonte de renda mais frequente» (Benevides, 2024, p. 112). O perfil basicamente não difere dos dossiês da Antra que mapeiam a violência contra travestis e transgêneros desde 2017, evidenciando que essa é a parcela da comunidade mais vulnerável. Abordar o cuírlombismo pedagógico, neste contexto, pode representar a diferença entre a vida e a morte. Para que os direitos humanos possam ser garantidos, parece pouco estratégico apenas esperar uma resposta do Estado. Em se tratando da população LGBTCIAPN+ já é notória a omissão do poder público, especialmente o legislativo. Poucos são os lugares da sociedade em que esta população pode sentirse acolhida, respeitada e exercer cidadania. Mas é possível encontrar nas cidades brasileiras lugares de acolhimento ao público LGBTCIAPN+, que funcionam como cuírlombo pedagógico, mostrando aos sujeitos possibilidades de resistência. O documentário «Do Sonho ao Pertencimento: Documentário Casa Neon Cunha» (Casa Neon Cunha, 2023) é um exemplo de instrumento do cuírlombismo pedagógico, cumprindo a função de registrar modos de vida e corpos em dissidência, por meio dos relatos e reflexões das pessoas que trabalham e frequentam aquela Casa.

Uma proposta de Pedagogia do Cuírlombo passa pelo reconhecimento de que a escola, para os sujeitos com sexualidades e/ou identidades de gênero dissidentes, não é um local acolhedor nem seguro. Cordeiro (2024), ao analisar narrativas de professores com este perfil, constatou que «a escola é um espaço não pensado para acolher as diferenças. Seria, nessa perspectiva, na maioria das vezes, um recinto tóxico onde a cis heteronor-matividade impõe-se como modelo de normalidade» (p. 21). Outra questão apontada é o fato de a escola não saber lidar com a violência, muitas vezes, tratada como problemas menores.

De acordo com Coelho da Silva e Farias (2022), «o Quilombismo pode ser pensado dentro do contexto educacional, de forma que a escola seja espaço de acolhimento e não de reprodução e manutenção de violências» (p. 41). Sendo assim, as noções de quilombismo e cuír podem juntas se alastrar nos territórios colonizados da educação institucionalizada, representando para a escola a possibilidade de ser atravessada por linhas de fuga aos agenciamentos da colonialidade cishetero-endossexo e do racismo. Essas linhas tanto podem se estender a partir das manifestações culturais e políticas de fora, como podem se constituir no próprio cotidiano escolar, sendo fortalecidas por fatores externos. Em outras palavras, a Pedagogia do Cuírlombo instaura territórios (ou terreiros) onde as relações pedagógicas são atravessadas ou sustentadas pelas manifestações das culturas e das políticas cuír, antirracista e decolonial. Nessa encruzilhada entre o fora e o dentro, os sujeitos são capazes de se apropriar das armas necessárias para questionar e transgredir a colonialidade cishetero-endossexo. O que se aprende nos movimentos de resistência LGBTCIAPN+ e nas diversas manifestações culturais e artísticas compõe o que podemos chamar de estética da guerrilha cuír, ou seja, o modo de vida e de luta do cuirlombismo.

Um exemplo de estratégia transgressora é a utilização da literatura infantil para apresentar formações familiares divergentes da família «normal», ou como alguns insistem chamar, «família estruturada». Santos et al. (2024) analisaram algumas produções da literatura infantil que tratam especificamente deste tema e concluíram que as obras permitem que os docentes trabalhem os «novos modelos de família existentes, fomentando debates sobre modelos únicos de encarar o mundo, desmistificando pontos de vista unilaterais e preconceituosos e, principalmente, combatendo discriminações e silenciamentos sócio históricos referentes às relações afetivas das pessoas» (p. 10).

Como a violência relatada foi gerada através do discurso e da prática de uma professora a partir da lógica da «colonialidade cis-hetero-endossexo» (Moraes et al., 2023), percebe-se a importância de discutir a incidência deste dispositivo e como ele opera no âmbito escolar, lugar este que poderia ser de acolhimento e respeito às diferenças. No entanto, acaba por atingir, apontar, nomear e classificar os sujeitos, apenas por serem diferentes da norma, daquele modelo naturalizado, o ideal da colonialidade cishetero-endossexo.

A colonialidade cishetero-endossexo e a Teoria Cuír geram poder e resistência, e a partir destes, resultam saberes que permitem conhecer e administrar os sujeitos destas relações. Há, também, nessas relações o surgimento de mecanismos, de dispositivos de controle e de poder que são instituídos através da chamada biopolítica. A partir disso, Foucault (2017a) aponta que o discurso sobre o sexo funciona, para além de condenar ou respeitar, como ferramenta para administrar, gerir, com a retórica de regular, não causar ou diminuir risco para a sociedade, ou ainda, fazêla funcionar através de uma norma idealizada como «padrão ótimo» e de utilidade.

Sobre o entendimento de dispositivo Foucault (2011) aponta que «o dispositivo, por-tanto, está sempre inscrito em um jogo de poder, estando sempre, no entanto, ligado a uma ou a configurações de saber que dele nascem, mas que igualmente o condicionam» (p. 246). A colonialidade cishetero-endossexo pode, dessa forma, ser considerada um destes dispositivos de biopoder que visa, no que concerne à sociedade, a «regulação social», ao moldar, ajustar a sexualidade a algo justificado a partir de discursos, tais como o biológico e «natural», não distante de juízos de valor, moralidades e ideologias conservadoras, desconsiderando a existência de outras sexualidades e identidades de gênero. E, assim «desconhecer diferenças fundamentais que dizem respeito ao tipo de relação consigo e, portanto, à forma de integração desses preceitos nas experiências que o sujeito faz dele próprio» (Foucault, 2017b, p. 178), é tentar deslegitimar os movimentos cuír.

E quando a colonialidade cishetero-endossexo identifica sujeitos, movimentos contrários às práticas normalizadoras, a violência pode vir a acontecer através da homotrans(intersexo)fobia, como um exemplo perverso onde se visa a destruição, a humilhação e o aniquilamento da existência destes sujeitos como forma extrema de invalidação e silenciamento da resistência. Nesse momento, não há mais relação de poder, mas, sim, o rompimento de qualquer relação possível. Ou simplesmente, em uma palavra, violência.

Os sujeitos dos movimentos cuír são aqueles que problematizam, desestabilizam e tencionam o pensamento cishetero-endossexo. Adriana Piscitelli (2009, p. 143) apresenta algumas dessas possibilidades de ser na diversidade da sexualidade presente no mundo cuír, as quais formam um «conjunto de pessoas que resistem a classificações lineares como "homens" ou como "mulheres"»: travestis, transexuais e pessoas intersexos.

Sob a ótica da colonialidade cishetero-endossexo todos os sujeitos que não sejam coerentes com a binaridade, com a sua «essência», e que não performem, portanto, conforme seu sexo designado, são desviados e passíveis de normalização. Parece haver algo como indigesto e doloroso ao ver a possibilidade de afirmar a diversidade que existe entre a sexualidade, os gêneros e suas diversas formas de ser, sentir e performar. De acordo com Piscitelli (2009), a existência de pessoas que não apresentam a «coerência» esperada pelo pensamento hegemônico de gênero nos indica que o binarismo não é suficiente para pensar o que seja homem e mulher.

Mesmo diante das diferentes possibilidades de ser, sentir, afetar e se identificar quanto ao gênero e à sexualidade, a colonialidade cishetero-endossexo, que opera pelo viés do biopoder, não reconhece ou atua para interditar quem está nas margens. Assim, permanece em circulação o discurso que deslegitima as relações afetivas consideradas marginais, que sustenta práticas violentas para nomear os sujeitos, normalizar seus gestos e atitudes consideradas desviantes, levando em conta sua «natureza biológica». As práticas discursivas cishetero-endossexo, enfim, buscam assegurar que as relações ocorram segundo uma ordem «natural», de modo que tudo e todos possam ser nomináveis e, portanto, administráveis.

Oliveira et al. (2016), ao pesquisarem as práticas discursivas homofóbicas relacionadas à escola, compreendem que tais práticas reforçam e promovem a violência contra os sujeitos LGBTCIAPN+. Embora tratem da «homofobia» na escola, podese aproximar o pressuposto dos autores à discussão aqui realizada, sobre as práticas discursivas cishetero-endossexo: são práticas que se materializam «em discursos de aversão, rejeição, exclusão e são legitimadas institucionalmente, produzem efeitos de sentidos que desqualificam o grupo LGBT, fomentam os discursos que negam ao grupo o direito às políticas públicas de direitos humanos» (Oliveira et al., 2016, p. 1484, tradução nossa). Portanto, como defendem os autores, «é preciso pensar em um modelo educacional que deixe de reproduzir a lógica de exclusão» (Oliveira, 2016, p. 1491, tradução nossa).

Conceição Evaristo (2010) propõe pensar o quilombo como «um espaço de vivência marcado pelo enfrentamento, pela audácia de contradizer, pelo risco de contraviver o sistema» (p. 139). A partir do exposto, a Pedagogia do Cuírlombo, assume uma potencialidade de criar experiências capazes de «contraviver» as práticas cishetero-endossexo, as opressões, injustiças e violências presentes no ambiente escolar, vindo a reforçar os aspectos ligados à vida, às expressões de afeto e à liberdade.

Considerações finais

Observamos neste artigo conceitos teóricos e uma contextualização a partir de um exemplo real da prática do cotidiano escolar. Pode-se dizer que é um pequeno recorte de como acontecem as relações de saber-poder, de como os discursos circulam e se posicionam dentro das malhas dessas relações em uma instituição, resultando em saberes e efeitos de verdade que interpelam e subjetivam estes sujeitos. Neste contexto, a partir desse relato de experiência, constatou-se a relação estreita entre teoria e prática. Vimos como atuam, se mobilizam e agem os sujeitos da relação da colonialidade cishetero-endossexo e do movimento cuír, tanto conceitualmente como inseridos no contexto escolar.

Diante disso, a pesquisa aqui apresentada apontou um vasto campo de problemáticas e violências que podem acometer os sujeitos desta relação. A escola é apenas um espaço, dentre vários, onde cotidianamente esse enredo acontece em menor ou maior escala. São eventos onde o poder pode punir e humilhar, mas, também, conduzir e administrar sutilmente os corpos, gestos e expressividade dos sujeitos, visando corrigir desvios dos corpos indizíveis ou abjetos, tentando recolocá-los dentro dos trilhos da colonialidade cishetero-endossexo.

Neste sentido, entendemos também que a escola não se dissocia de discursos cishe-teroendossexo, preconceituosos e até criminosos que provêm da própria sociedade. Vemos, então, a importância de problematizar e apontar que o preconceito, a violência, o estranhamento quanto à forma de ser do outro está intrinsecamente ligado a uma medida ou norma central, a um ideal universal, essencial. Esta medida é, muitas vezes, naturalizada como parte de certos discursos atrelados a ideologias políticas extremistas, valores religiosos, costumes e ou mesmo um senso comum nutrido por informações falsas, os quais não deixam de constituir os sujeitos que atuam na educação ou em qualquer espaço institucional.

Percebe-se que a naturalização de discursos cishetero-endossexo pode chegar a produzir situações de violência, pautadas pelas manifestações de ódio às diferenças. No contexto atual, especialmente no Brasil, discursos de ódio tem ganhado espaço e se tornado algo natural, que tem, inclusive, adentrado as escolas sob diversas formas. Seja pela censura às discussões de gênero, seja pela omissão dos entes públicos na construção de políticas de enfrentamento ao racismo, à homotransfobia e às violências contra as mulheres, crianças e adolescentes, é necessário prestar atenção às linhas de fuga que atravessam o ambiente escolar no sentido de resistir e colocar as diferenças em pauta. O que ocorre fora da escola impacta a educação, esse território que aqui aproximamos da ideia de Cuírlombo - território em que relações outras podem e devem ser construídas. Lembramos que no Dia Internacional da Luta contra a LGBTfobia, em 17 de maio de 2023, a Deputada Érika Hilton (PSOL-SP), demarcou o que significa o seu mandato, a sua visibilidade como mulher trans na Câmara dos Deputados. Segundo Hilton (2023), sua presença naquela casa representa que «a agenda dos direitos da comunidade LGBTQIA+ não pode continuar sendo empurrada para debaixo do tapete, que o Parlamento brasileiro, o colegiado, os Deputados e os Senadores precisam legislar sobre os direitos da comunidade LGBTQIA+» (p. 184). Essa mensagem tem um efeito educativo, e é parte do que descrevemos como Pedagogia do Cuírlombo. Ou seja, compõe o entrecruzamento de táticas de resistência, de performances disidentes de sexualidade e gênero, de manifestações políticas e culturais que dão visibilidade às pessoas cuír e que, de alguma forma, chega à instituição educacional para desnaturalizar os discursos cishetero-endossexo.

Compreendemos que a colonialidade cishetero-endossexo, como dispositivo de bio-poder no contexto escolar, pode ser percebida como um discurso de normatividade em operação. Intenta a regulação, a nomeação, a normalização e o controle sobre as ações, sexualidades, performatividades dos sujeitos que tensionam essa ideia normativa. Seja através de um questionamento, de um direcionamento do que é o certo ou errado, de uma humilhação, apatia, aversão, abjeção, afronte... Em outras palavras, este dispositivo atua por meio de práticas mais ou menos visíveis de homotransfobia (o que pode configurar crime de injúria racial, nos termos da Lei n.º 7716, de 05 de janeiro de 1989, de acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Mandado de Injunção n.º 4733, em 22 de agosto de 2023).

A Pedagogia do Cuírlombo, como apresentada, mostrase um potente instrumento para discutir as táticas de resistência contra a violência da colonialidade cishetero-en-dossexo. É preciso cuirizar a escola, trazer as diferenças e valorizálas como aspecto central de uma educação efetivamente inclusiva. Mais que isso, o cuírlombismo pedagógico aponta caminhos para tratar esta problemática de forma interseccional, articulada com o enfrentamento ao racismo, capacitismo, elitismo, machismo, fanatismos, negacionismos.

O cuírlombismo pedagógico consiste de uma resistência criadora e inventiva. Este artigo foi, por parte de seus autores, uma forma de colocar em prática essa perspectiva sobre o que se pode fazer na educação, o que é permitido inventar como resposta à violência contida no relato de experiência. Nosso desejo é que novas inquietações, suspeitas, incertezas e inconformismos possam surgir. Esse caminho de possibilidades, de saberes, é instigante e transformador e, se nos for permitido uma licença poética, ao modo como nos atravessa esse artigo: cuírformador!

Agradcimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc), pelo apoio financeiro (Termo de Outorga: 2021TR001305).

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* Este artigo teve como ponto de partida os estudos realizados na disciplina optativa «Escola, relações de poder e violência», no Mestrado em Educação da Universidade do Planalto Catarinense, realizada entre maio e julho de 2023. A pesquisa continua a ser realizada pelos pesquisadores e pelas pesquisadoras do Núcleo de Pesquisa em Educação Básica - NuPEB/Uniplac, sendo que este artigo apresenta alguns dos resultados alcançados até o momento. Área: Ciências Humanas. Subárea: Educação.

2Para preservar os/as participantes da pesquisa, optou-se por não mencionar o ano exato.

3Essencial, nome escolhido por representar as ideias de essencialismo, natureza, origem.

4Consulta realizada na rede social Instagram em 07 de março de 2024. Comparativamente, é interessante mencionar que a tag #gay possui 91.6 milhões de publicações e a tag #lesbian, 18.7 milhões.

5Neologismo que indica a posição hegemônica dos discursos cisgêneros na constituição do sistema, entendido como os diversos aspectos que se entrecruzam para formar o que é considerado «verdadeiro» em determinada sociedade, em certo período histórico.

Para citar este artículo: Padilha, A. P. F., Vicenzi, V. B., & Dresch, J. F. (2024). Pedagogia do cuírlombo: violência a um pai cuír na educação infantil. Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales, Niñez y Juventud, 22(1), 1-24. https://doi.org/10.11600/rlcsnj.22.3.6580

1A comunidade formada por pessoas dissidentes de gênero e sexualidade é, muitas vezes, referida como sendo formada por Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis (LGBT), sigla bastante utilizada na literatura científica, tanto em português como em espanhol e em inglês, conforme consulta realizada em diversos bancos de dados, como o Google Acadêmico (https://scholar.google.com.br). Há muitas discussões sobre a questão da sigla que melhor representaria a comunidade, sendo que o formato LGBTQIAPN+ é mais inclusivo e, além disso, foi encontrado em diversas produções científicas recentes brasileiras, sendo utilizado também em canais oficiais do governo, bem como pela mídia em geral. No artigo, optou-se por trocar a letra «Q» (Queer) pela «C» (Cuír), mantendo a coerência com a proposta de descolonizar o queer

Recebido: 24 de Abril de 2024; Aceito: 05 de Agosto de 2024

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