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Investigación y Educación en Enfermería

versão impressa ISSN 0120-5307

Invest. educ. enferm vol.32 no.1 Medellín jan./abr. 2014

 

ARTÍCULO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE / ARTIGO ORIGINAL

 

Formação continuada na enfermagem como um fator associado ao conhecimento em aleitamento materno

 

Continuing education in nursing as a factor associated with knowledge on breastfeeding

 

Formación continuada en enfermería como un factor asociado al conocimiento en lactancia materna

 

 

Mariana de Oliveira Fonseca-Machado1; Vanderlei José Haas2; Juliana Cristina dos Santos Monteiro3; Flávia Gomes-Sponholz4

 

1Enfermeira, Mestre. Doutoranda Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo EERP/USP, Ribeirão Prêto, Brazil. email: mafonseca.machado@gmail.com.

2Físico. Doutor. Professor Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba (MG), Brazil. email: haas@vjhaas.com.

3Enfermeira, Doutora. Professora Doutora. EERP/USP, Ribeirão Prêto, Brazil. email: jumonte@eerp.usp.br.

4Enfermeira, Doutora. Professora Doutora. EERP/USP, Ribeirão Prêto, Brazil. email: flagomes@eerp.usp.br.

 

Fecha de Recibido: Agosto 13, 2013. Fecha de Aprobado: Febrero 10, 2014.

 

Artículo vinculado a investigación: Conhecimento e práticas de profissionais de enfermagem das equipes de saúde da família, de um município do interior de Minas Gerais, sobre promoção ao aleitamento materno.

Subvenciones: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Conflicto de intereses: ninguno.

Cómo citar este artículo: Fonseca-Machado MO, Haas VJ, Monteiro JCS, Gomes-Sponholz F. Continuing education in nursing as a factor associated with knowledge on breastfeeding. Invest Educ Enferm. 2014;32(1): 139-147

 


RESUMO

Objetivo. Identificar o conhecimento de profissionais de enfermagem da Estratégia de Saúde da Família sobre aleitamento materno e possíveis associações entre o conhecimento e aspectos pessoais, profissionais e de auto avaliação. Metodologia. Estudo observacional e transversal, desenvolvido em unidades de saúde da família de um município de Minas Gerais, Brasil, com 85 profissionais de enfermagem. Os dados foram coletados por meio de um questionário. Utilizou-se o teste t-Student para a diferença entre médias e a análise de correlação de Pearson. Resultados. A média de acertos dos profissionais no teste de conhecimento foi de 6.6 e foi maior no grupo que participou de cursos sobre aleitamento materno. Conclusão. Há a necessidade de educação permanente, proporcionando mobilização reflexiva e crítica, a problematização da realidade e a identificação das necessidades dos usuários.

Palavras chaves: aleitamento materno; educação em enfermagem; conhecimentos, atitudes e prática em saúde; saúde da família.


ABSTRACT

Objective. Identifying the knowledge about breastfeeding of the nurses of the Family Health Program, and possible associations between the knowledge and personal, professional and self-evaluation aspects. Methodology. Observational and cross-sectional study conducted in family health units of a city in Minas Gerais, Brazil, with 85 nursing professionals. Data were collected through a questionnaire. We used the Student t-test for differences between means and Pearson correlation analysis. Results. The mean score of the professionals on the knowledge test was 6.6 and was higher in the group that attended courses on breastfeeding. Conclusion. There is a need for continuing education, providing reflective and critical mobilization, the questioning of reality and identification of user's needs.

Key words: breast feeding; education, nursing; health knowledge, attitudes, practice; family health.


RESUMEN

Objetivo. Identificar el conocimiento de los profesionales de enfermería de la Estrategia de Salud de la Familia sobre la lactancia materna y las posibles asociaciones entre el conocimiento y los aspectos personales, profesionales y de autoevaluación. Metodología. Estudio observacional de tipo transversal, desarrollado en unidades de salud de la familia de un municipio de Minas Gerais, Brasil, con 85 profesionales de enfermería. Los datos fueron recolectados mediante un cuestionario. Resultados. La media de aciertos de los profesionales en este test de conocimiento fue de 6.6 y fue mayor en el grupo que participó en cursos sobre lactancia materna. Conclusión. Se precisa una educación permanente, proporcionando movilización reflexiva y crítica, una problematización de la realidad y la identificación de las necesidades de los usuarios.

Palabras clave: lactancia materna; educación en enfermería; conocimientos, actitudes y práctica en salud;salud de la familia.


 

 

INTRODUÇÃO

Os benefícios do aleitamento materno para a nutriz e para o lactente têm sido bem documentados pela comunidade científica. No entanto, seus indicadores, no Brasil, têm revelado uma tendência à estabilização e, ainda, estão aquém do recomendado pela Organização Mundial da Saúde e Ministério da Saúde, de aleitamento materno exclusivo até seis meses de vida e complementado por dois anos ou mais.1 Em 2008, a duração mediana do aleitamento materno exclusivo foi de 54.1 dias e do aleitamento materno de 11.2 meses.2

No Brasil, o Ministério da Saúde estabeleceu que o incentivo ao aleitamento materno deve ser uma das ações básicas de saúde. Neste contexto, a Estratégia de Saúde da Família foi proposta como eixo organizador da assistência, incorporando os aspectos socioculturais presentes nas famílias e o significado das práticas e ações de saúde.1,3 Considerando o papel protetor do aleitamento materno sobre a morbidade e mortalidade infantil, as iniciativas de promoção da prática devem ser prioritárias dentro das políticas de saúde pública direcionadas à saúde da criança.4

Profissionais de enfermagem sem conhecimentos e habilidades necessários para o manejo clínico e aconselhamento em amamentação contribuem para a redução da prática do aleitamento materno.5 A capacitação profissional é essencial para o sucesso das ações de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno, conferindo competência às equipes de saúde e facilitando o envolvimento com as usuárias dos serviços.6 Estudos nacionais7-9 e internacionais10-11 analisaram o conhecimento de profissionais de saúde dos diferentes níveis de atenção, sobre aleitamento materno. Estes estudos têm como foco principal a relação entre o conhecimento sobre aleitamento materno e variáveis como sexo, idade, categoria profissional, tempo de atuação no serviço, ter sido amamentado e experiência pessoal em amamentar.7,10

Contudo, há uma lacuna no conhecimento científico quanto à identificação de fatores relacionados, exclusivamente, ao conhecimento sobre aleitamento materno de profissionais de enfermagem da atenção primária. Esperamos que ao identificarmos este conhecimento e os fatores que o influenciam seja possível reconhecer o cenário de apoio à prática da amamentação; refletir sobre a atuação dos profissionais; planejar, elaborar, implementar e avaliar as políticas públicas de promoção ao aleitamento materno;12 e propor ações e políticas de formação continuada que atendam às necessidades dos profissionais de enfermagem da atenção primária e que valorizem suas práticas na promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno. Assim, o objetivo do presente estudo foi identificar o conhecimento de profissionais de enfermagem da Estratégia de Saúde da Família sobre aleitamento materno e possíveis associações entre o conhecimento e aspectos pessoais, profissionais e de auto avaliação destes profissionais.

 

METODOLOGIA

Tratou-se de estudo observacional e transversal, desenvolvido nas equipes urbanas da Estratégia de Saúde da Família do município de Uberaba, polo da macrorregião de saúde do Triângulo Sul, no Estado de Minas Gerais, Brasil. O município é composto por 50 equipes de saúde da família, sendo 46 na zona urbana, as quais oferecem assistência para aproximadamente, 60% da população. Participaram do estudo enfermeiros e técnicos de enfermagem, sendo estabelecido como critério de exclusão a atuação em equipes da zona rural. Sete profissionais não participaram da pesquisa, sendo um enfermeiro e seis técnicos de enfermagem, por terem feito parte do estudo piloto, por estarem em vias de contratação e afastados por licença-saúde. Configurou-se uma população final de 85 participantes, sendo 45 enfermeiros e 40 técnicos de enfermagem.

A coleta dos dados aconteceu entre março e julho de 2010. O instrumento utilizado constituiu-se em um questionário autoaplicável e semiestruturado, previamente testado e validado.13 O questionário foi preenchido no local de trabalho, individualmente e em um mesmo momento pelos enfermeiros e técnicos de enfermagem, com a presença de uma das pesquisadoras no local. Tais cuidados foram tomados visando evitar que discussões sobre o tema interferissem nas respostas. O instrumento contemplou questões para a identificação de características pessoais (idade, sexo, número de filhos, amamentação dos filhos), profissionais (participação em cursos, tempo de atuação na Estratégia de Saúde da Família) e de auto avaliação (percepção quanto à própria competência para atuação em aleitamento materno) dos profissionais de enfermagem. Para a identificação do conhecimento sobre aleitamento materno, o questionário apresentou um teste com dez questões do tipo verdadeiro (V) ou falso (F), que investigaram: autocuidado com as mamas, condução da mamada, uso de bicos artificiais, intercorrências mamárias,composição do leite materno, controle da lactação e alimentação complementar.

A cada acerto no teste atribuiu-se um ponto, sendo o escore máximo igual a dez. Para as questões respondidas incorretamente atribuiu-se o escore zero. O escore final do teste de conhecimento deveu-se ao somatório das respostas respondidas corretamente. Como referência e fundamentação teórica para a correção das respostas às questões tipo verdadeiro ou falso, foi utilizado o Caderno de Atenção Básica número 23, intitulado ''Saúde da criança: nutrição infantil: aleitamento materno e alimentação complementar'', publicado pelo Ministério da Saúde em 2009. Esta referência é atual e abrangente em relação à promoção do aleitamento materno no Brasil. Está inserida em um trabalho do Ministério da Saúde que visa a sensibilizar e subsidiar os profissionais da atenção primária, além de trazer estratégias atuais de abordagem do aleitamento materno num contexto de redes de atenção, a partir da atenção primária. Seu objetivo é potencializar as ações de promoção ao aleitamento materno dentro da visão integral de cuidado à saúde.1

A variável-resposta considerada no estudo foi a média de acertos no teste de conhecimento sobre aleitamento materno. As variáveis-explanatórias foram: tempo de atuação na equipe de saúde da família (em meses) e as variáveis dicotômicas amamentação dos filhos, participação em cursos sobre aleitamento materno, percepção quanto à própria competência para atuação em aleitamento materno, sendo as respostas possíveis sim ou não. Os dados foram armazenados em uma planilha eletrônica, no software Excel, e passaram por validação via dupla digitação.

Para a análise estatística utilizou-se o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 16.0. As variáveis de caracterização dos profissionais foram apresentados na forma de distribuição de frequências absolutas e relativas, e para as variáveis quantitativas, foram calculados valores de média e mediana (medidas de tendência central), desvios-padrão e valores máximo e mínimo (medidas de variação). Empregou-se a análise bivariada para identificar a relação entre a variável-resposta e as variáveis-explanatórias. Realizou-se a comparação da média de acertos entre as diferentes categorias que compõem cada uma das variáveis, sendo aplicado o teste t-Student. Para a análise da correlação entre a média de acertos e o tempo de atuação dos profissionais nas equipes foi utilizado o Coeficiente de Correlação Linear de Pearson (r). Para os testes realizados adotou-se o nível de significância α igual à 0.05.

O projeto desta pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (Processo n° 1035/2009), atendendo a determinação da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. A pesquisa foi desenvolvida dentro dos padrões éticos, respeitando-se a dignidade humana e recorrendo-se ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

RESULTADOS

A idade dos 85 profissionais variou entre 22 e 55 anos, com média de 34.2±8.7 anos. A maioria era do sexo feminino (82 – 96.5%) e 43 (50.6%) não tinham filhos. Todos os 42 (49.4%) profissionais que tinham filhos eram do sexo feminino, e destas 38 (90.5%) passaram pela experiência de amamentar os filhos. Verificamos que 75 (88.2%) profissionais de enfermagem participaram, ao menos uma vez, de cursos sobre aleitamento materno.

Quanto à percepção dos profissionais de enfermagem sobre a própria competência para avaliar uma mamada e orientar a nutriz quanto à técnica correta da amamentação, 76 (89.4%) participantes se consideraram preparados para desempenhar tal função. O tempo de atuação nas equipes de saúde da família onde estavam alocados no momento da coleta dos dados variou de um mês a 11 anos, com média de dois anos e seis meses (DP=3.3) e mediana de cinco meses. A diferença encontrada entre média e mediana se deve ao fato de que a primeira foi desviada por valores extremos de tempo de atuação dos profissionais de enfermagem, considerando-se que a maioria deles (45 – 52.9%) estava inserida nas equipes há menos de seis meses.

As respostas dos profissionais de enfermagem do estudo a cada uma das dez questões, tipo verdadeiro ou falso, que caracterizaram seu conhecimento sobre aleitamento materno, são apresentadas na Tabela 1. Dentre as dez questões, tipo verdadeiro ou falso, quatro (40%) apresentaram um percentual de respostas incorretas maior que o de respostas corretas. Os assuntos abordados nestas quatro questões referem-se à higiene dos mamilos com água e sabão antes e após as mamadas, ao manejo clínico do ingurgitamento mamário, à necessidade de complementação alimentar caso não haja apojadura até três dias pós-parto e à necessidade de amamentação em períodos regulares de tempo.

Considerando os resultados provenientes do teste de conhecimento sobre aleitamento materno, os participantes obtiveram uma média geral de acertos de 6.6 ±1.8 dentre os dez possíveis.

Tabela 1. Distribuição dos profissionais de enfermagem das equipes de saúde da família, segundo as respostas a cada uma das dez questões. Uberaba, Minas Gerais, Brasil, 2010

Tabela 1.

As comparações entre as médias de acertos no teste de conhecimento das diferentes categorias definidas pelas variáveis dicotômicas amamentação dos filhos, realização de cursos sobre aleitamento materno e percepção quanto à própria competência para atuação em aleitamento materno, são apresentadas na Tabela 2. O estudo fornece evidências de que há diferença entre as médias de acertos no teste de conhecimento dos profissionais de enfermagem que participaram de cursos sobre aleitamento materno e daqueles que não participaram. Ou seja, há evidências de que a participação em cursos sobre aleitamento materno aumenta o conhecimento dos profissionais de enfermagem sobre o tema (p<0.01).

Tabela 2. Média de acertos dos profissionais no teste de conhecimento, segundo as variáveis explanatórias. Uberaba, Minas Gerais, Brasil, 2010

Tabela 2.

Verificamos que houve uma não significativa correlação negativa (r=-0.02) entre a média de acertos no teste de conhecimento e o tempo de atuação dos profissionais de enfermagem nas equipes de saúde da família (p=0.855).

 

DISCUSSÃO

A média de acertos dos profissionais de enfermagem na presente investigação, foi de 6.6, inferior à encontrada em estudo multicêntrico,13 que utilizou o mesmo instrumento do presente estudo, em que a média foi de aproximadamente 7.5 acertos, desempenho considerado razoável pelo autor. Dentre as quatro questões do teste de conhecimento que apresentaram o percentual de respostas incorretas maior que o de respostas corretas, três são consideradas essenciais para a promoção do aleitamento materno.13 Estas três questões abordam o manejo clínico do ingurgitamento mamário, a necessidade de complementação alimentar, caso não haja apojadura até três dias pós-parto, e a necessidade de amamentação em períodos regulares de tempo.Em relação à amamentação dos filhos, a maioria (90.5%) das profissionais de enfermagem que eram mães passou pela experiência de amamentar. Tal resultado corrobora os encontrados nos estudos realizados em Montes Claros (MG)8 e Coimbra (MG),14 onde mais de 80% dos profissionais afirmaram ter tido experiência pessoal com aleitamento materno, seja como mãe ou como companheiro de mulheres que amamentaram. A experiência da amamentação pode favorecer o estabelecimento de empatia entre profissional de enfermagem e usuária, na medida em que as experiências vividas podem ser compartilhadas.

O estudo não evidenciou diferenças entre as médias de acertos, no teste de conhecimento, das profissionais que amamentaram seus filhos e das que não amamentaram. Tal resultado coincide com os encontrados em estudo desenvolvido no Reino Unido,15 onde não encontrou-se diferença significativa entre o conhecimento sobre aleitamento materno das mulheres que amamentaram e o das que não tiveram esta vivência. Por outro lado, um estudo de abordagem qualitativa revelou que grande parte dos conhecimentos repassados pelos profissionais às mulheres advinha da sua vivência em aleitamento materno ou da observação de terceiros, o que indica uma limitação na capacitação e educação desses profissionais.14 Estudo desenvolvido na Austrália revelou que um grande número de profissionais que vivenciaram a experiência da amamentação tiveram um elevado escore de acertos nos testes que avaliaram seu conhecimento sobre aleitamento materno, o que contraria os resultados encontrados no presente estudo.16

No que se refere aos cursos sobre aleitamento materno, a maioria (88.2%) dos enfermeiros e técnicos de enfermagem afirmou que participou ao menos uma vez, o que difere dos resultados encontrados em estudo desenvolvido no município de Coimbra (MG), com profissionais de uma unidade de saúde da família, onde 82.4% nunca haviam participado de cursos específicos sobre aleitamento materno.14 A importância deste achado é evidenciada pois em nosso estudo os profissionais que participaram de cursos sobre aleitamento materno tiveram uma média de acertos maior no teste de conhecimento quando comparados aos que não participaram.

Uma revisão de literatura revelou que a formação continuada em aleitamento materno para profissionais de enfermagem aumenta seu conhecimento, o qual é um precursor necessário para a melhora das habilidades e práticas profissionais.17 Pesquisa realizada no município de Montes Claros8 demonstrou um aumento nos índices de aleitamento materno após atividades educativas voltadas aos profissionais da atenção primária. Em investigação desenvolvida no Reino Unido, os valores médios dos escores de conhecimento sobre aleitamento materno dos profissionais de enfermagem revelaram que houve um aumento significante do conhecimento após o treinamento da Iniciativa Hospital Amigo da Criança, o qual foi mantido por seis meses após o treinamento.15 Estudo clínico randomizado, realizado na Dinamarca, mostrou que 52 profissionais de saúde que receberam treinamento por meio de um curso de aconselhamento em amamentação da Organização Mundial da Saúde tiveram um aumento no seu conhecimento sobre a prática da amamentação e em sua competência para ajudar as mulheres a superar os problemas mais comuns deste processo.18

Diante do fato de que a maioria dos participantes do estudo participou ao menos uma vez de cursos sobre aleitamento materno e de que as questões do teste de conhecimento que apresentaram um maior percentual de respostas incorretas são consideradas essenciais para o acompanhamento das mães que amamentam, supomos que haja uma limitação nos cursos realizados pelos profissionais.

Neste contexto, apesar de o presente estudo não possuir uma abordagem que permita compreender a natureza e a proposta metodológica dos cursos realizados pelos sujeitos participantes, diversas estratégias direcionadas à formação continuada em aleitamento materno foram e vêm sendo implementadas no Brasil para o pessoal de saúde. Atualmente, a educação permanente em saúde ganha relevância ao propor a estruturação da capacitação dos profissionais de saúde a partir da problematização do processo de trabalho. Ela parte do pressuposto da aprendizagem significativa, a qual acontece quando o material de aprendizagem relaciona-se com o conhecimento prévio dos profissionais. Assim, propõe a transformação das práticas profissionais, a partir da reflexão crítica da realidade, e a reorganização do trabalho, baseando-se nas necessidades de saúde dos usuários, na gestão setorial e no controle social em saúde. Nesta concepção crítico-reflexiva, os profissionais se desenvolvem de maneira ativa, reflexiva, crítica e solidária, por meio da problematização da realidade e explicitação de suas contradições.19

A educação crítico-reflexiva e a educação permanente em saúde compõem a base da prática pedagógica problematizadora que leva a uma nova forma de ensinar questões concernentes ao setor saúde, como é o caso do aleitamento materno. Desta forma, para que os profissionais de enfermagem das equipes de saúde da família ofereçam uma assistência integral e resolutiva, é necessária sua participação em processos de educação permanente que os façam refletir criticamente sobre suas atuações nos cenários da prática. Isto contribuirá para a organização da assistência prestada nos serviços de saúde e para a qualidade do produto final.19,20 No entanto, estratégias pontuais de ensino, apesar de distanciar os profissionais de um conhecimento ampliado que considera o binômio mãe-filho dentro de um contexto social, cultural e familiar, não são inválidas. A educação permanente pode abranger em seu processo diversas ações específicas de atualização de conhecimentos, desde que estejam articuladas à estratégia geral de mudança institucional.19 Nesta lógica, em 2008, o Ministério da Saúde, por meio da adoção de linhas de cuidado dirigidas à promoção do aleitamento materno na atenção primária, propôs a Rede Amamenta Brasil, a qual se pauta na educação permanente em saúde dos profissionais e visa a integrar-se às demais redes e iniciativas de apoio e estímulo ao aleitamento materno.

No que diz respeito à percepção dos profissionais quanto à própria competência para avaliar uma mamada e orientar a nutriz quanto à técnica correta da amamentação, 76 (89.4%) deles consideravam-se preparados para desempenhar tal função. Nos Estados Unidos, um estudo que investigou o conhecimento e as práticas em aleitamento materno de profissionais de enfermagem mostrou que 60% deles se sentiam aptos para assistir mulheres em processo de amamentação.21 O presente estudo não evidenciou diferença entre as médias de acertos no teste de conhecimento no que refere a auto-avaliação quanto à competência para atuação em aleitamento materno. Este achado difere de uma investigação desenvolvida na Austrália, que encontrou que profissionais que se consideravam capacitados para a atuação em aleitamento materno obtiveram melhor avaliação quanto ao seu conhecimento sobre o tema.16

A mediana do tempo de atuação dos profissionais de enfermagem nas equipes de saúde da família onde estavam alocados no momento da coleta dos dados foi de cinco meses. Este tempo, de certa forma, representa uma elevada rotatividade dos profissionais nos serviços, considerando-se que a Estratégia de Saúde da Família foi implantada em 1996 no município de estudo. Em Francisco Morato (SP), um estudo revelou que o tempo médio de atuação dos profissionais nas equipes de saúde da família foi de um ano e seis meses, sendo superior à média encontrada na presente investigação.7

Houve uma não significativa correlação entre a média de acertos e o tempo de atuação dos profissionais nas equipes de saúde da família. Esperava-se que, com o aumento do tempo de trabalho nas equipes, houvesse um acréscimo nos níveis de conhecimento sobre aleitamento materno dos profissionais de enfermagem. Dados de investigação realizada na Austrália contrariam os encontrados no presente estudo, ao revelarem elevados escores no conhecimento sobre aleitamento materno de profissionais de saúde que tinham um maior tempo de atuação em seus campos de trabalho.16 Outro estudo, desenvolvido na região metropolitana de São Paulo verificou maior concentração de acertos entre os profissionais que trabalhavam entre 24 e 30 meses na Estratégia de Saúde da Família.7

Um quadro de profissionais estável e qualificado sustenta o processo de cuidar, garante a qualidade dos serviços ofertados e amplia o vínculo com os usuários, propondo soluções mais facilmente.22 Para o caso específico da promoção do aleitamento materno, a rotatividade dos profissionais de enfermagem nas equipes de saúde da família dificulta o estabelecimento do vínculo com a comunidade e, consequentemente, o aprofundamento de seu conhecimento sobre o contexto social, cultural, histórico e econômico do binômio mãe-filho. Esta situação dificulta a compreensão do processo de amamentação além de suas determinações biológicas e o acompanhamento das mulheres desde o início do pré-natal até o período pós-parto, fragmentando a assistência e a abordagem do aleitamento materno.23

O presente estudo foi o primeiro, a nível nacional, a fazer o diagnóstico primário do conhecimento sobre aleitamento materno de profissionais de enfermagem da Estratégia de Saúde da Família e analisar a influência dos aspectos pessoais, profissionais e de auto avaliação sobre tal conhecimento. A maioria das pesquisas visa comparar os níveis de conhecimento antes e após a realização de alguma estratégia de ensino direcionada a toda a equipe e não exclusivamente à enfermagem.

Considerações finais

A partir desta investigação, encontramos que a participação em cursos sobre aleitamento exerce algum efeito nos níveis de conhecimento dos profissionais de enfermagem, sobre o tema. Tal identificação nos permite propor estratégias de atualização e qualificação que se adequem às necessidades dos profissionais de enfermagem e às das gestantes e nutrizes em processo de amamentação, sob seus cuidados.

Para o estabelecimento e manutenção do aleitamento materno, é necessário o oferecimento de orientações adequadas e acessíveis, por parte dos profissionais de enfermagem, às gestantes, nutrizes e familiares, com o intuito de prevenir as dificuldades e intercorrências comuns a este período. Para que isto aconteça, é necessário que enfermeiros e técnicos de enfermagem estejam devidamente qualificados para a atuação na promoção do aleitamento materno desde a gestação até os dois anos de vida da criança ou mais, seja na unidade de saúde da família ou na comunidade.

Destarte, partindo-se da ideia de que a qualificação profissional contribui para um incremento no conhecimento sobre o aleitamento materno, sua associação com a educação permanente em saúde proverá maior conhecimento sobre o assunto e permitirá aos profissionais uma mobilização reflexiva e crítica, a problematização da realidade do serviço e a identificação das necessidades do binômio mãe-filho, promovendo sua saúde e permitindo que se tornem cada vez mais capacitados para seu autocuidado.

 

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