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Acta Agronómica

Print version ISSN 0120-2812

Acta Agron. vol.63 no.4 Palmira Oct./Dec. 2014

https://doi.org/10.15446/acag.v63n4.39111 

Doi: http://dx.doi.org/10.15446/acag.v63n4.39111


Fitomejoramiento y Recursos Genéticos


Uso medicinal do óleo de copaíba (Copaifera sp.) por pessoas da melhor idade no município de Presidente Médici, Rondônia, Brasil

Medical use of copaiba (Copaifera sp.) oil by better age people of Presidente Médici municipality, Rondônia, Brazil

Santina Rodrigues Santana1*, Rute Bianchini-Pontuschka1, Fernanda Bay Hurtado1, Cristiana Aparecida de Oliveira1, Lucinei Pereira Rodrigues Melo1 y Geovanni Jesus dos Santos1

1Universidade Federal de Rondônia, Campus de Presidente Médici, Rua da Paz, 4376, Bairro Lino Alves Teixeira, CEP:76.916-000, Presidente Médici, Rondônia, Brasil. *Autor para correspondência: santina@unir.br

Rec.: 30.07.2013 Acep.: 22.05.2014

Resumo

O Brasil é o maior produtor do óleo extraído da Copaifera sp. (Caesalpiniaceae), uma das plantas medicinais mais estudadas do mundo, encontrada principalmente na região amazônica. Uma abordagem etnobotânica sobre plantas medicinais pode facilitar a seleção de espécies potencialmente ativas e utilizadas pela população de determinada região, abrindo portas para o desenvolvimento de novos medicamentos, aos quais poderão ter acesso um maior número de pessoas. Desta forma, neste trabalho foi caracterizado o uso medicinal do óleo de copaíba junto à população da melhor idade do município de Presidente Médici, Estado de Rondônia, na Amazônia brasileira, já que faltam dados quanto ao emprego dessa planta com tal finalidade nessa região. As informações etnobotânicas foram obtidas através de entrevistas semiestruturadas aplicadas a 27 pessoas, utilizando a técnica "bola de neve" para incluir participantes. As indicações etnofarmacológicas levantadas quanto ao óleo foram: tratamento de infeções (63%); cicatrizante (48%); antitetânico (18.5%) e antitumoral (11%). O chá da casca do caule foi recomendado por 11% dos entrevistados para lavagem de ferimentos e como depurativo sanguíneo. Portanto, esta planta é muito usada entre pessoas da melhor idade daquele município por seu caráter medicinal, chamando a atenção para a necessidade de estudos que confirmem cientificamente sua eficácia terapêutica.

Palavras chave: Etnobotânica, antimicrobiano, cicatrizante, anti-inflamatório, plantas medicinais.

Abstract

Brazil is the largest producer of extracted oil from 'copaíba' Copaifera sp. (Caesalpiniaceae), one of the most studied medicinal plants in the world, found mainly in the Amazon region. Ethnobotany approach can facilitate selection on potentially active species used by the local people, opening doors for the development of new drugs, in which can have assessment a higher number of people. Then, in this study the medicinal use of 'copaíba' oil by better age people of Presidente Médici, Rondônia State (Brazilian Amazon) was characterized, since there is a lack of data on the use of this plant for such purposes in the region. Ethnobotanical data were collected through semi-structured interviews from 27 persons by using the "snowball" technique for the indication of new respondents. The main ethnopharmacological use found were treatment of infections (63%), wound healing (48%), tetanus prevention (18.5%) and antitumoral agent (11%). The stem-bark tea was recommended for washing and cleansing wounds and as a blood depurative (11%). Therefore, the plant is widely used among the better age people of that municipality owing to its medicinal characteristics, what draws attention to the need for studies to scientifically confirm its therapeutic efficacy.

Key words: ethnobotany, antimicrobial, wound healing, anti-inflammatory, medicinal plants

Introdução

A prática da utilização de plantas com finalidade medicinal é bastante antiga e perpetua-se ao longo da história da humanidade, especialmente entre as pessoas da melhor idade (idosos). A etnobotânica é a ciência que estuda a interação homem-planta e busca, entre outros, o resgate de conhecimentos transmitidos de uma geração a outra. Como nem sempre o acesso aos medicamentos industrializados e serviços de saúde é possível às populações economicamente desfavorecidas, é natural o movimento destas em busca de plantas medicinais, muitas vezes de fácil obtenção e com tradição de serem benéficas e seguras.

Dentre as plantas medicinais mais estudadas do mundo encontram-se as pertencentes ao gênero Copaifera, as copaibeiras, típicas das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Amazônica do Brasil, que possuem também importância madeireira e ornamental (Reis et al, 2012). As copaibeiras são árvores com altura de 10 a 40 metros, com folhagem densa e constituída de folhas compostas pinadas alternas (Lorenzi e Matos, 2002). Os frutos são do tipo legume bivalvo, secos deiscentes; sementes pretas envoltas por arilo amarelo (Figura 1a y Figura 1b).

Através de incisão no tronco da copaíba extrai-se um produto chamado "bálsamo", "óleo-resina" ou "óleo de copaíba" (Figura 1c y Figura 1d). Trata-se de um líquido transparente, viscoso, de sabor amargo, de amplo e tradicional emprego medicinal popular como anti-inflamatório, antisséptico, cicatrizante, antimicrobiano, além de outras indicações. O Brasil é o maior produtor e exportador do óleo de copaíba e a região amazônica é a principal fornecedora (Masson, 2011).

Estudos que buscam conhecer os princípios ativos do óleo indicam que há variabilidade natural na composição qualitativa e quantitativa daqueles em virtude da heterogeneidade das espécies de copaíba, além da influência das condições de solo e clima. Pieri et al. (2012) também apontam para o fato de muitas vezes o produto ser obtido simultaneamente de várias espécies de Copaifera, o que certamente dificultaria o estabelecimento de uma identidade composicional de acordo com a espécie.

Estudiosos apontam sesquiterpenos e diterpenos como os componentes predominantes e responsáveis pela atividade biológica do óleo (Veiga Jr. et al, 2005). Montes et al. (2012) advertem a respeito da citotoxicidade do produto, ainda por ser esclarecida. Assim, é certo que há necessidade de estudos para se descobrir o verdadeiro potencial terapêutico da planta.

As observações populares sobre a eficácia das plantas medicinais certamente contribuem para a divulgação das virtudes terapêuticas dos vegetais. Assim, a importância da copaíba aliada à falta de dados sobre seu uso no município de Presidente Médici, Estado de Rondônia, na Amazônia brasileira, torna relevante o conhecimento do emprego popular medicinal dessa planta naquela região.

Pelo exposto, o trabalho objetivou caracterizar a utilização da copaíba (em especial o óleo) como produto medicinal junto a habitantes de melhor idade do município de Presidente Médici, já que na região amazônica há enorme riqueza cultural proveniente do conhecimento popular.

Material e Métodos

Caracterização da área de estudo

O município de Presidente Médici ocupa uma área de 1.758 Km2. Está localizado a uma latitude de 11°10'33" S e a uma longitude de 61°54'03" W, a uma altitude de 185 metros acima do nível do mar (Figura 2).

O clima, segundo a classificação de Köopen é do tipo Am (clima de monção), com médias anuais de temperatura de 24.5°C, precipitação entre 2.000 e 2.500 mm e umidade relativa do ar de 89%. O solo predominante é o podzólico vermelho-amarelo, de textura média. A vegetação do tipo floresta sub-caducifólia, amazônica, com pequenas manchas de cerrado nos altiplanos e floresta aberta. Atualmente existem poucos remanescentes de florestas e cerrados, com o predomínio de pastagens e presença de áreas para lavouras, com resquícios da cobertura vegetal natural somente nas áreas de matas ciliares.

Sua população estimada pelo IBGE (IBGE, 2013) era de 23.017 (vinte e três mil e dezessete) habitantes. Segundo informações fornecidas pela Secretaria de Assistência Municipal de Presidente Médici, há atualmente 108 idosos cadastrados e que recebem benefícios desta instituição, porém não há dados oficiais quanto ao número total de idosos no município.

O processo de colonização do município é relativamente recente, expandindo-se a partir da década de 70, com a migração de pessoas oriundas especialmente das regiões Sul e Sudeste do Brasil.

Coleta dos dados etnobotânicos e análises dos dados

O trabalho de campo para a coleta das informações etnobotânicas sobre o uso do óleo de copaíba (Copaifera sp.) foi realizado no período de março a maio de 2012, através de entrevistas semi estruturadas. O grupo escolhido foi selecionado por meio de amostra não probabilística de seleção racional, na qual um grupo específico é selecionado. Dentro do grupo a ser pesquisado a ampliação da amostra foi feita utilizando-se o método "bola de neve". Este método consiste em que um informante indique uma ou mais pessoas que ele acredita ter experiência ou conhecimento sobre o assunto abordado (Albuquerque e Lucena, 2004).

A primeira entrevista foi marcada com uma pessoa de melhor idade e esta por sua vez indicou outra, e assim sucessivamente. Durante as entrevistas os informantes fizeram relatos dos conhecimentos que detinham sobre a espécie como as doenças que podem ser tratadas, as partes da planta utilizadas, as formas de preparo como medicamento, e como obtiveram o aprendizado do uso da planta.

Para análise dos resultados, foi elaborada uma base de dados com as informações obtidas. Esses dados foram analisados utilizando o programa Excel, uma vez que o trabalho se inclui dentro da etnobotanica descritiva, e não etnobotânica quantitativa.

Resultados e discussão

Dos 23.017 (vinte e três mil e dezessete) habitantes, 108 de melhor idade estão cadastrados no município. Destes, foram entrevistados 25%, na faixa etária entre 60 e 90 anos. Todos são provenientes de outros Estados e regiões brasileiras, e 94% vivem no município há mais de vinte anos. A maioria dos informantes é natural de Minas Gerais (região Sudeste) e Paraná (região Sul), 29% cada um, um total de 58%. Os 42% restantes estão distribuídos entre os Estados da Bahia (região Nordeste), São Paulo, Espírito Santo (região Sudeste) e Goiás (região Centro Oeste).

Estes dados mostram que o óleo também é utilizado em outras regiões do país; além disso, evidenciam que o conhecimento tradicional é transmitido de forma prática, através do uso.

A transmissão do conhecimento entre gerações sobre a utilidade dessa planta foi comprovada por 94% dos entrevistados, que disseram ter aprendido "com pessoas mais velhas", da própria família ou não. Os demais ouviram a respeito por parte de vendedores do óleo de copaíba, uma vez que é um dos produtos mais comuns entre os oferecidos em estabelecimentos do gênero.

Dentre os entrevistados, 35% não conhecem a planta propriamente dita, mas têm ciência de seu potencial medicinal, de modo que todos fazem ou fizeram uso do óleo da copaíba. O chá preparado com a casca (Figura 1e) da planta foi citado por 11% dos idosos. Veiga Jr. e Pinto (2002), em ampla revisão, registraram o consumo desse chá em populações da Amazônia brasileira, venezuelana e colombiana como anti-hemorroidal, purgativo, e para o tratamento de moléstias pulmonares e asma. No presente estudo, constatou-se seu emprego para lavar ferimentos (resposta dada por 6% dos informantes).

O uso do óleo para tratamento de infecções (garganta, ouvido, urinária e dentária) foi feito por 47% dos entrevistados. Tal uso tem fundamento, pois a ação antimicrobiana desse produto já foi evidenciada por autores como Masson (2011), que comprovaram esse efeito contra bactérias gram-positivas. Já Pieri et al. (2012) obtiveram resultado também contra três bactérias gram-negativas. Esses autores reportam que as diferenças na composição do óleo certamente interferem na sua eficácia, explicando as variações nos resultados.

Um percentual de 41% dos idosos refere-se ao óleo como cicatrizante, indicando aplicação direta no local afetado, inclusive na região umbilical de recém-nascidos. Resultados promissores neste aspecto foram observados por Masson (2011) em úlceras cutâneas em ratos e coelhos.

Foi mencionado ainda o consumo tendo em vista tratamento contra câncer (11.7%) e tétano (17.6%). Montes et al. (2012) mencionaram que há comprovação da ação antitetânica desse óleo. Yamaguchi e Garcia (2012) revisaram sobre as propriedades medicinais da copaíba e, com base nos estudos mencionados, a atividade antitumoral também está elencada entre os benefícios por ela proporcionados, com diferentes relatos de ação inibitória no crescimento de tumores. Porém, mais uma vez, os mecanismos de ação carecem ser esclarecidos.

Em relação à posologia, os entrevistados disseram ingerir de uma a três gotas na forma pura (76%) ou misturada a outro alimento como leite, café, chá ou pão (24%). Nas respostas foi comum usarem expressões como "bem pouquinho", "bem pouco", "muito pode fazer mal". A preocupação dos entrevistados quanto ao uso em baixas doses é sustentada por estudos revisados por Yamaguchi e Garcia (2012), que descrevem irritações gastrointestinais, vômitos, náuseas, sialorréia, diarréia e depressão do sistema nervoso central diante de doses elevadas.

Para aquisição do produto, 47% dos entrevistados informaram que compram o óleo de copaíba, 29% que o extraem diretamente da planta e 24% declararam que o recebem como doação. Um dos informantes afirmou que durante a extração do óleo "não se pode conversar, a pessoa tem que estar sozinha". A desconfiança quanto à legitimidade do óleo comprado de terceiros foi manifesta por alguns, pois "não foi tão bom", acreditando eles que havia "mistura". Veiga Jr et al. (2005) informam em sua revisão que a adições de outros óleos de valor inferior são comuns na região Amazônica e podem ser detectadas através de métodos específicos além, é claro, da interferência da variação natural dos princípios ativos.

Conclusão

  • Os dados obtidos indicam que o óleo de copaíba é conhecido e utilizado por seu caráter medicinal entre pessoas da melhor idade do município de Presidente Médici, na Amazônia brasileira. Entretanto, a despeito das indicações etnofarmacológicas, essa planta carece de estudos que visem confirmar cientificamente sua eficácia terapêutica em humanos, já que em animais proporcionam resultados bastante promissores.

Agradecimientos

Ao sr. Clemente Pereira dos Santos, Maurílio Pereira dos santos e Maurício Pereira dos Santos, pelas informações e colaboração prestada aos autores deste trabalho; a todas as pessoas que concederam entrevistas, e ao sr. Maigon Nacib Pontuschka, pela revisão do abstract.

Referências

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