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Investigación y Educación en Enfermería

Print version ISSN 0120-5307

Invest. educ. enferm vol.32 no.3 Medellín Sept./Dec. 2014

 

ARTÍCULO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE/ ARTIGO ORIGINAL

 

O uso de filmes como ferramenta didática para o processo ensino-aprendizagem em bioética

 

The use of films as a teaching tool for the teaching-learning process in bioethics

 

Utilización de las películas como herramienta didáctica para el proceso enseñanza-aprendizaje de Bioética

 

 

Camila Maria Pereira Rates1; Larriny Maciel Silva2; Lívia Moura Pereira3; Juliana Dias Reis Pessalacia4

 

1Mestranda em enfermagem. Universidade Federal de São João Del Rei -;UFSJ-, Divinópolis, Minas Gerais, Brasil. email: camila.rates@yahoo.com.br.

2Enfermeira. UFSJ, Divinópolis, Minas Gerais, Brasil. email: larriny_maciel@hotmail.com.

3Graduanda em enfermagem. UFSJ, Divinópolis, Minas Gerais, Brasil. email: liviamoura2@hotmail.com.

4Enfermeira, Doutora. Professora UFSJ, Divinópolis, Minas Gerais, Brasil. email: juliana@pessalacia.com.br.

 

Fecha de Recibido: Noviembre 20, 2013. Fecha de Aprobado: Junio 3, 2014.

 

Artículo vinculado a investigación: Contribuições do uso de filmes para o processo ensino-aprendizagem em Bioética na graduação e verificar as facilidades e dificuldades na utilização deste recurso didático.

Subvenciones: ninguna.

Conflicto de intereses: ninguo.

Cómo citar este artículo: Rates CMP, Silva LM, Pereira LM, Pessalacia JDR. The use of films as a teaching tool for the teaching-learning process in bioethics. Invest Educ Enferm. 2014; 32(3): 421-429.

 


RESUMO

Objetivo. Identificar a contribuição do uso dos filmes no processo ensino -aprendizagem em bioética e verificar as facilidades e dificuldades na utilização deste recurso didático. Metodologia. Estudo qualitativo, analisado a partir do referencial de Bardin. Realizaram-se entrevistas semiestruturadas, que foram gravadas e transcritas em sua totalidade. O critério utilizado para a definição da mostra foi o de repetição. Participaram no estudo 21 alunos dos cursos de Enfermagem e Bioquímica, integrantes de um Núcleo de Ensino e Investigação em Bioética de uma universidade pública federal do município de Divinópolis, Minas Gerais, Brasil. Durante a análise das entrevistas emergiram duas categorias temáticas e duas subcategorias. Resultados. Os estudantes indicaram em suas respostas a importância de visualizar o problema bioético para a reflexão e a tomada de decisões na prática profissional. Muitos informaram que a partir da vivência nos debates dos filmes abordados, geraram-se mudanças na posição ética. Conclusão: O uso do cinema como recurso didático contribui ao processo de ensino-aprendizagem da bioética em alunos de graduação. Os debates dos filmes são estimulantes e proporcionam um espaço para a reflexão e o diálogo sobre os problemas bioéticos que podem encontrar na prática profissional.

Palavras chave: materiais de ensino;instituições de ensino superior; aprendizagem; temas bioéticos.


ABSTRACT

Objective. Identifying the contribution of using films in the process of teaching-learning in bioethics and verifying the facilities and difficulties in using this teaching resource. Methodology. A qualitative study analyzed from the Bardin referential. Semi-structured interviews were carried out, recorded, and transcribed in full. For definition of the sample was used the criteria of repetition. In total, participated in the study 21 students of Nursing and Biochemistry, members of a Center for Teaching and Research in Bioethics of a public federal university in the city of Divinópolis, Minas Gerais, Brazil. During the analysis of interviews, two thematic categories and two subcategories emerged. Results. In their responses, students indicated the importance of viewing the bioethical problem for the reflection and decision-making in professional practice. Many reported that from the experience in discussions of the films showed, were made changes in the ethical position. Conclusion: The use of films as a teaching resource contributes to the process of teaching-learning in bioethics for undergraduate students. The discussions of the films are stimulating and provide a space for reflection and dialogue on bioethical problems that students may encounter in their professional practice.

Key words: teaching materials; higher education institutions; learning; bioethical issues.


RESUMEN

Objetivo. Determinar la contribución del uso de las películas en el proceso enseñanza -aprendizaje en bioética, así como las ventajas y desventajas en la utilización de este recurso didáctico. Metodología. Estudio cualitativo, analizado a partir del referencial de Bardin. Se realizaron entrevistas semiestruturadas, que fueron grabadas y transcritas en su totalidad. El criterio utilizado para la definición de la muestra fue el de repetición. En el estudio participaron 21 alumnos de los cursos de Enfermería y Bioquímica, integrantes de un Núcleo de Enseñanza e Investigación en Bioética de una universidad pública federal del municipio de Divinópolis, Minas Gerais, Brasil. Durante el análisis de las entrevistas emergieron dos categorías temáticas y dos subcategorías. Resultados. Los estudiantes indicaron en sus respuestas la importancia de visualizar el problema bioético para la reflexión y la toma de decisiones en la práctica profesional. Muchos informaron que a partir de la vivencia en los debates de las películas abordadas, se generaron cambios en la postura ética. Conclusión: El uso de películas, como recurso didáctico, contribuye al proceso de enseñanza-aprendizaje de la bioética en alumnos de pregrado. Los debates sobre el contenido de las películas son estimulantes y proporcionan un espacio para la reflexión y el diálogo sobre los problemas bioéticos que pueden encontrar en la práctica profesional.

Palabras clave: materiales de enseñanza; instituciones de enseñanza superior; aprendizaje; temas bioéticos.


 

INTRODUÇÃO

A bioética é um novo campo de conhecimento e uma corrente de pensamento que, desde a década de 90, se desenvolve largamente pelo Brasil.1 Além de a bioética trabalhar com muitas discussões e reflexões nas mais variadas áreas do saber está relacionada, também, aos problemas éticos advindos dos avanços científicos e tecnológicos da atualidade. Tais problemas tornam-se mais evidentes na área da saúde devido à vasta aplicação das novas descobertas científicas e tecnológicas relacionadas à manutenção da vida e da saúde humana. Neste contexto, surgem questões de difícil abordagem, por envolverem valores e opiniões diferentes, as quais podem ocasionar situações conflituosas na tomada de decisão por profissionais de saúde. Em situações envolvendo problemas de ordem bioética, quando se exige uma tomada de decisão, faz-se necessário o diálogo entre as partes envolvidas a fim de se alcançar o consenso.

Considerando que em sua carreira, o profissional de saúde, dentre eles o enfermeiro, poderá ter dificuldade para se posicionar frente às suas experiências práticas com situações conflituosas envolvendo a vida e a morte as quais, muitas vezes, remetem a valores adquiridos através da família e religião, por exemplo, torna-se relevante a constante melhoria das estratégias de ensino-aprendizagem em bioética durante a graduação em enfermagem e em todos os outros cursos da área da saúde. Tais estratégias poderão possibilitar ao futuro profissional, espaços de reflexão e debate acerca dos problemas bioéticos em saúde, fornecendo subsídios para a tomada de decisão pautada em um posicionamento ético que considere suas crenças, valores, além dos aspectos legais envolvidos.2 Atualmente, em meio a tantos avanços tecnológicos, observam-se novas formas de acesso e grande variedade de instrumentos e processos de assimilação cognitiva para o processo ensino-aprendizagem como, por exemplo, o computador, a televisão e o cinema. Sendo assim, este estudo buscou conhecer as contribuições que o uso de filmes, como ferramenta didática, proporciona para o processo ensino-aprendizagem em bioética na graduação. Partiu-se do pressuposto de que o uso de filmes influencia positivamente no ensino de bioética na graduação.

Este estudo proporcionou benefícios diretos aos participantes, visto que foram oferecidos espaços de reflexão e debate relacionados às questões atuais de bioética em saúde. Além disso, trouxe benefícios para a ciência, à medida que, forneceu subsídios para melhorias nas metodologias de ensino-aprendizagem em bioética na graduação. Sabe-se que é importante que a bioética seja trabalhada integralmente, sem exclusão de conteúdos, em todos os cursos de graduações, contudo, cabe ressaltar que a enfermagem possui a peculiaridade de ter um grande vínculo com os pacientes e, consequentemente, enfrenta inúmeros problemas de ordem bioética em seu cotidiano. Sendo assim, é importante salientar que, na enfermagem, em especial, o ensino de bioética oferece inúmeras contribuições para a formação do posicionamento ético dos sujeitos.

Etimologicamente, a palavra bioética significa ética da vida e é um conceito derivado do grego bios = vida e ethos = ética, que remete aos hábitos, costumes e condutas dos seres humanos. Configura-se como um ramo da ética aplicada que tem despontado no cenário acadêmico e profissional, sendo utilizada como instrumento para discussões e debates voltados para a consolidação da democracia, da cidadania, dos direitos humanos e também da justiça social.3 Trata-se de uma ética prática, aplicada a situações em saúde e fundamentada na descrição de fatos consistentes, conflitos e problemas morais existentes.4 Em 1970, o oncologista americano Van Rensselaer Potter propôs o neologismo bioética para expressar uma nova ciência que deveria ser o elo entre as ciências humanas e empíricas, mais especificamente uma ética com o objetivo de preservar a vida no planeta, já que o desenvolvimento científico sem sabedoria poderia colocar em risco a própria vida na terra. Assim, considera-se a bioética como um novo campo do conhecimento, uma nova área do saber e também uma corrente de pensamento que, desde a década de 90, vem se desenvolvendo amplamente no Brasil.1 Sendo a bioética a ética prática voltada para os problemas éticos originados no âmbito da saúde e da vida, ela tem como objetivo oferecer subsídios para decisões de referentes à vida, saúde e morte. Portanto, foi em função da necessidade de humanização do atendimento em saúde que surgiu no cenário da educação, o ensino da bioética, que se constitui um encontro de campos de conhecimento a partir da necessidade de discutir questões éticas, legais e sociais advindas dos avanços na ciência, medicina e biotecnologia.5

De modo geral, o campo da educação é também uma forma de evidenciar alguns aspectos do processo de mudanças das políticas sociais públicas no Brasil. O ensino superior nos cursos de graduação incorpora dimensões próprias ao contexto histórico educacional brasileiro, bem como dimensões políticas sobre o contexto econômico supranacional.6 No Brasil, o início do ensino de bioética ocorreu por volta do final da década de 80. Desde então, vem sendo lenta do mesmo nos bancos acadêmicos. Para entender a bioética é preciso que o processo de ensino-aprendizagem esteja pautado na tomada de decisões frente aos problemas que se apresentam. Sendo assim, o ensino da bioética não deve se restringir simplesmente à transmissão do conhecimento, pois se trata de uma área de discussão, reflexão e interação de pessoas interessadas em debater os princípios e valores envolvidos em cada situação problema.5

O desenvolvimento tecnológico do final do século XX possibilitou à atividade docente o uso de instrumentos que muito auxiliam os profissionais da educação viabilizando o aprimoramento de estratégias pedagógicas. Com o objetivo de socializar e tornar atraentes os conteúdos muitas vezes considerados monótonos, muitos professores utilizam em suas aulas aparelhos de DVD (Digital Versatile Disc), televisão, computadores, data-shows, entre outros aparelhos que servem como importante suporte às diferentes estratégias metodológicas. Prova disso é que a eficácia na transmissão de conteúdos não impressos, em sala de aula, enriqueceu significativamente as práticas pedagógicas.7

Neste contexto, o uso de filmes tem sido citado como importante recurso didático no processo ensino-aprendizagem. Os filmes surgiram paralelamente ao desenvolvimento do cinema, criado no final do século XIX e da televisão que se desenvolveu e tornou-se ainda mais popular, passando a ser o grande instrumento de mídia do século XX. Devido a tal popularização, a partir dos anos 60, outros recursos audiovisuais têm se mostrado eficazes para o ensino e são usados nas mais variadas áreas do conhecimento. Sabe-se que a associação entre diversos recursos visuais e sonoros torna-se um instrumento muito atrativo para alunos e professores, pois imagens em movimento, falas, músicas, legendas, dentre outros, colaboram entre si para que a transmissão do conhecimento seja facilitada.8

No meio universitário, em cursos como Direito, Medicina, Enfermagem, dentre outros, são estruturadas disciplinas que trabalham os temas de bioética. A atualidade desse campo de conhecimento e a produção de extenso material audiovisual, voltados para o debate acadêmico em torno das questões bioéticas, fez com que filmes e documentários se tornassem fontes de reflexão e pesquisa a serem exploradas no espaço da sala de aula.7 O filme é uma ferramenta didática que auxilia na construção do conhecimento e atrai os alunos para os assuntos a serem estudados e por ser associado, muitas vezes, à forma de lazer, os alunos passam a ver o estudo sob outro ponto de vista.9 Sendo assim, este estudo objetivou identificar as percepções de acadêmicos acerca das contribuições do uso de filmes e de mesas debatedoras como estratégias para o processo ensino-aprendizagem de bioética na graduação, bem como verificar as facilidades e dificuldades relacionadas a estas estratégias.

 

METODOLOGIA

Tratou-se de um estudo descritivo e de natureza qualitativa compreensiva estudo de caso. A abordagem qualitativa permite uma compreensão mais ampla e profunda a respeito dos comportamentos humanos, e sua associação com os valores, sentimentos, crenças e atitudes.10 Os dados foram analisados seguindo-se as orientações de Bardin para a análise de conteúdo. Tal análise é definida como um conjunto de instrumentos de cunho metodológico em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a discursos tais como conteúdos e continentes, muito diversificados.11 Para as discussões bioéticas utilizou-se como referencial o Modelo Principialista de Tom Beauchamp e James Childress, que propõe que durante uma situação prática envolvendo uma questão de bioética, sejam aplicados os princípios da autonomia, beneficência, não maleficência e justiça, prima facie.12

O presente estudo foi realizado em uma universidade pública federal do município de Divinópolis, Minas Gerais, Brasil. O universo de estudo foi o de 26 acadêmicos dos cursos de Enfermagem e Bioquímica, participantes das atividades do Núcleo de Ensino e Pesquisa em bioética (NIBio) da citada universidade. Trata-se de um núcleo que, em suas reuniões, adota a metodologia de filmes e mesas de discussão para o ensino, reflexão e debate acerca das questões problemáticas em saúde. São convidados a participar do NIBio, acadêmicos dos cursos de Medicina, Enfermagem, Bioquímica e Farmácia de um campus da saúde, além de profissionais da saúde e docentes de várias áreas do saber. Os critérios de inclusão/exclusão de participação neste estudo foram: estar matriculado nas atividades do NIBio, ter participado dos encontros do núcleo no período de outubro de 2012 a junho de 2013 e ter aceito, por escrito, participar do estudo.

No período de coleta de dados, foram realizadas onze reuniões do NIBio e utilizados cinco filmes, os quais abordaram problemas bioéticos frequentes em nossa sociedade, tais como pesquisas com populações vulneráveis, eutanásia, desumanização da assistência em saúde, aborto e transfusão de sangue em Testemunhas de Jeová. Após assistirem aos filmes, os acadêmicos foram divididos em dois grupos, sendo que cada grupo deveria apresentar argumentos contrários e favoráveis à questão bioética abordada no encontro. Cada discussão possuía um mediador.  Os dados foram coletados no período de novembro de 2012 a maio de 2013, por meio de uma entrevista contendo duas questões norteadoras acerca do processo de ensino-aprendizagem de bioética através do uso de filmes, a saber: Qual é sua percepção quanto à contribuição do recurso didático ''filmes'' para o ensino da bioética? Em sua opinião, quais foram os pontos facilitadores e dificultadores vivenciados durante a apresentação do filme e discussão em mesa de debate?

Os relatos foram gravados utilizando-se um aparelho MP4 e, posteriormente, transcritos na íntegra para análise. Os dados serão armazenados em sigilo por um período de cinco anos. O material transcrito foi submetido à análise de conteúdo11, a qual permitiu a identificação de duas categorias temáticas: ''O filme e a aproximação com a realidade da prática profissional'' e ''O filme como facilitador para a formação do posicionamento ético''. A partir do critério de definição da amostra adotado, foram abordados ao todo 21 acadêmicos que foram identificados pelas siglas A1 para acadêmico 1'' e assim, sucessivamente. Os demais acadêmicos não participaram por indisponibilidade de horários. Foram coletadas as percepções dos acadêmicos acerca das contribuições do uso do filme como ferramenta para o processo ensino-aprendizagem em bioética na graduação e também alguns dados de caracterização com o objetivo de conhecer o perfil dos participantes.

Para o tratamento dos dados, procedeu-se primeiramente a uma leitura flutuante de todo o material transcrito, seguida de uma pré-análise para identificar o perfil dos participantes. Posteriormente foi realizado o recorte, a agregação e a enumeração dos dados, permitindo esclarecer os indícios de categoria. Passou-se à categorização propriamente dita, onde as informações contidas nas falas dos participantes formaram o corpus de análise que levou à elaboração de indicadores que foram submetidos aos procedimentos analíticos e posterior inferência, comparando-se com os dados da literatura.11

A seguir, procedeu-se a seleção das unidades de análise que resultou em duas categorias e duas subcategorias temáticas que foram quantificadas de acordo com o número de vezes em que foram relatadas pelos sujeitos. Cabe dizer que antes de iniciar a coleta de dados os participantes foram esclarecidos quanto aos objetivos da pesquisa, riscos e benefícios, métodos a serem empregados e gravação da entrevista. Foi obtida a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) dos acadêmicos que aceitaram participar da pesquisa, o qual foi elaborado em duas vias, sendo que uma delas foi entregue ao participante e a outra devolvida aos pesquisadores. Antes de se iniciar a coleta de dados, também foi solicitada a avaliação minuciosa do projeto de pesquisa pelos membros do Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da instituição proponente. Após avaliação, o projeto foi aprovado com número de Protocolo 89.436.

 

RESULTADOS

Sobre os dados de caracterização, constatou-se que a média de idade dos acadêmicos foi de 22.19 anos, com idade mínima de 19 anos e máxima de 35 anos. Acerca do gênero das participantes, encontrou-se que todos os acadêmicos eram do sexo feminino. Sobre a graduação, 18 (84.6%) cursavam enfermagem e 3 (14.4%) cursavam bioquímica. Em relação ao estado civil, percebeu-se que todos eram solteiros. Acerca da religião, 12 (57.6%) católicos, 4 (19.2%) espíritas, 1 (4.8%) evangélico, 1 (4.8%) ateu, 1 (4.8%) relatou crer em Deus, 1 (4.8%) informou ser cristão e 1 (4.8%) não respondeu. Durante a análise das entrevistas emergiram duas categorias temáticas: ''O filme e a aproximação com a realidade da prática profissional'' e ''O filme como facilitador para a formação do posicionamento ético'' e duas subcategorias que serão discutidas a seguir.

O filme e a aproximação com a realidade da prática profissional

Essa categoria reflete a importância que os acadêmicos atribuíram ao filme como fator contribuidor para a aproximação dos problemas bioéticos com a realidade profissional. Percebeu-se que 19 (90.5%) acadêmicos consideraram existir relação entre o filme e a aproximação com a realidade profissional, visto que apontaram em suas respostas a importância da visualização do conteúdo, no caso, a visualização do problema a ser estudado. Tais percepções levantadas por esse estudo podem ser notadas nas falas: Eu gosto muito dessa forma de estudo, porque é uma forma didática e porque é uma forma que o participante da reunião tem pra vivenciar o tema [A2]; Eu acho que aumenta o nosso conhecimento, tornando a apresentação do dilema proposto mais interativo e... é... a gente pode visualizar melhor a situação dilemática através do filme [A3]; Na minha opinião, o filme contribuiu muito, por causa que você tem a aproximação, você imagina, ai quando você vivencia, você assiste o filme, é como se você adentrasse naquele contexto. Ai da pra você viver... é como se você estivesse lá, assim... você pensa assim: se eu tivesse naquela situação o que eu, o que que eu iria fazer? [...] E como que eu iria agir? Neste ponto eu acho que contribui para discutir os dilemas da bioética [A5]; Eu acho que o filme ele é muito bom [...] a gente consegue ver de maneira prática os dilemas e tentar ter uma percepção crítica sobre o assunto [A6]; Eu acho que é importante usar os filmes, que é através dos filmes que a gente consegue ver com clareza as... as... questões dilemáticas, os problemas bioéticos que a gente pode... é... encontrar ao longo da nossa profissão [A9]; Os filmes são muito importantes, pois eles trazem para nós uma visualização do tema do dia né?! [...] muito melhor você ver uma questão, você sabe debater e falar mais dela [A10].

O filme como facilitador para a formação do posicionamento ético

Essa categoria abrange as falas que remeteram à importância do filme para facilitar a formação do posicionamento ético. Todos os 21 acadêmicos alegaram que o filme foi um facilitador para a formação do posicionamento ético e para os debates e discussões acerca das questões bioéticas, além de ter contribuído muito para o processo ensino-aprendizagem. As contribuições elencadas pelos acadêmicos foram divididas nas duas subcategorias:

O filme como facilitador da reflexão bioética e do autoconhecimento para a atuação profissional. Observou-se que todos os 21 acadêmicos fizeram referência ao filme como sendo facilitador da reflexão bioética e do autoconhecimento em relação ao posicionamento ético. Ao utilizarem o filme como recurso didático para o processo de ensino-aprendizagem em bioética, os acadêmicos passaram a apresentar novas reflexões e novos posicionamentos éticos, como descrito nas falas: Os pontos positivos foram que é... ajuda bastante a gente na percepção, na discussão dos temas dilemáticos que estão acontecendo no dia-a-dia ajudando a gente ter um melhor posicionamento [A2]; Abriu a minha concepção em relação ao tema e até minha percepção mudou [A3]; [...] Permite mais a gente ver o dilema e discutir ele na nossa realidade, isto é, permite, futuramente, na minha prática profissional, quando me deparar com esse dilema eu já ter um posicionamento [A5]; Pontos positivos, foi justamente fazer com que a gente reflita sobre os temas bioéticos e aumentar a nossa autocrítica em relação a esses, a esses dilemas né, que a gente vai encontrar muito na saúde [A6].

A importância do diálogo e do debate interdisciplinar em bioética. Após a visualização do filme, os acadêmicos foram convidados a participar de uma mesa de debates, composta por profissionais da saúde e docentes como mediadores. Durante estes debates, os acadêmicos tiveram a oportunidade de discutir e dialogar temas bioéticos a partir de diferentes posicionamentos e argumentos. Durante as entrevistas, os participantes informaram que o filme e as mesas de debate foram recursos didáticos facilitadores do processo ensino-aprendizagem. A importância do debate interdisciplinar em bioética foi elencada por 19 (90.5%) acadêmicos, conforme apontam os relatos: A própria discussão e o debate com outras pessoas torna possível a gente saber a opinião das pessoas, o posicionamento delas de acordo com o tema [A4]; O filme me proporcionou um conhecimento em relação a esse dilema, de forma que quando eu deparar na prática profissional, futuramente, com esse dilema eu vou ponderar o dois lados [A5]; Bom, os pontos positivos foram que eu pude ver que os... a opinião contrária, e aos poucos remodelar minha opinião ou até mesmo aumentar aquilo que eu já pensava, aquilo que eu já tinha em mente [A10]; Bom, eu acho que o filme é uma ótima maneira da gente poder discutir os dilemas bioéticos e nessa discussão entre pessoas numa mesa de debates a gente ter uma outra visão daquilo que a gente defende, enxergar o outro lado, então eu acho que o filme é essencial nessas discussões [A11]; Eu acho que os filmes tornam o ensino mais didático e é uma forma de tornar mais real os dilemas [A15]; Acho que o ponto positivo é que faz a gente repensar [...] as coisas que a gente já traz sobre isso, ouvir a opinião do outro, [...] acaba incorporando um pouco da opinião do outro no que a gente pensava e faz repensar mesmo [A20]; Bom, o ponto positivo [...] é a gente poder é... entender um pouco esse outro lado, olha eu tenho meu posicionamento, eu penso isso, mas se eu estivesse no lugar dessa pessoa será que eu me posicionaria dessa forma? Então isso é um ponto positivo, acredito que esses debates trazem muito isso né?! E um ponto negativo, eu acho que às vezes a gente na tentativa de defender alguma coisa, a gente é muito radical no que pensa né?! Então é bom esse outro lado pra gente ampliar um pouco a nossa visão [A21].

 

DISCUSSÃO

Inicialmente, serão discutidos os resultados relacionados aos dados de caracterização dos sujeitos. Uma pesquisa cujo objetivo foi analisar a relação entre normas percebidas e uso de drogas entre estudantes universitários em uma instituição especializada nas carreiras de saúde apontou que a média de idade dos universitários foi de 22.37 anos, ou seja, uma média de idade semelhante à encontrada neste estudo. Sobre ao fato de todos os participantes serem mulheres e a grande maioria cursar enfermagem, sabe-se que a predominância do sexo feminino pode ser justificada pela procura por cursos, como o de enfermagem, ainda ocorrer predominantemente por mulheres.13

O fato de o grupo de discussões ter sido composto por acadêmicos de enfermagem e bioquímica e por profissionais de saúde convidados permitiu que a discussão interdisciplinar se fizesse presente nas reuniões. É importante que a interdisciplinaridade exista no ensino de bioética, pois os inúmeros desafios associados aos avanços das ciências da vida devem ser apreendidos integralmente.14 A predominância de acadêmicos de enfermagem também é bastante relevante, pois é fundamental que os futuros enfermeiros estejam aptos a discutirem questões bioéticas, uma vez que poderão enfrentar situações conflituosas que exigirão um posicionamento ético. Possivelmente, a estruturação do curso exerce influência no perfil dos alunos, ou seja, de todas serem solteiras, pois exige dedicação em tempo integral e, além disso, possui aulas e estágios distribuídos desigualmente pelos períodos de manhã e tarde, o que dificultaria para o indivíduo casado.15 A preponderância da religião católica encontrada nesse estudo vai de encontro ao censo demográfico realizado em 2010, o qual apontou que a maioria dos brasileiros (64.6%) são católicos, seguidos de evangélicos (22.2%) e irreligiosos (8%).16

Em relação aos relatos remeterem à importância da visualização do conteúdo, da aplicação da teoria, sabe-se que embora o aluno se depare com o conhecimento teórico ao ingressar no meio acadêmico ainda apresenta certa dificuldade em relacionar teoria e prática quando não vivencia momentos reais em que poderá analisar o cotidiano.17 É indispensável a existência de relação entre teoria e prática, pois toda teoria precisa confrontar-se com a prática e esse confronto possibilita a percepção dos pontos concordantes e discordantes, o que leva a um aprimoramento de ambas.18

Sabe-se que, principalmente na área da saúde, o campo prático exige que competências e habilidades sejam desenvolvidas instantaneamente e, muitas vezes, os estudantes ainda não estão preparados para tal.19 Desta forma, cabe dizer que o ensino de bioética contribui para a formação de profissionais atuantes, com senso crítico e com capacidade de relacionar teoria e prática em seu cotidiano, levando ao desenvolvimento de visões críticas sobre as práticas de saúde.20

O fato de os acadêmicos terem feito referência à reflexão e até mesmo à mudança de seu posicionamento ético após terem participado dos debates, mostra a necessidade de proporcionar a reflexão bioética ao aluno durante o curso de graduação. Tal reflexão deve ser oferecida o mais precocemente possível e é mais bem aproveitada quando ofertada de forma contínua, isto é, ao longo da graduação.19 É papel das instituições de ensino superior, sobretudo as voltadas para a área da saúde, oferecerem espaços para discussões e práticas para o ensino de bioética.14 Sobre os acadêmicos entrevistados terem feito referência ao fato de que ao conhecerem outros pontos de vista puderam refletir sobre o que defendiam e o que outras pessoas defendem, nota-se o quanto a bioética contribui para a formação do posicionamento ético do sujeito. Além disso, o ensino de bioética proporciona um aprendizado a respeito do outro, fornece um momento para que a identidade, a dignidade e a própria cultura das outras pessoas sejam conhecidas.21

Na área da saúde a qual trabalha com a multidisciplinaridade, com o trabalho em equipe, é indispensável saber lidar e aceitar outras opiniões, principalmente no que se refere a questões bioéticas por contarem com a diversidade e o pluralismo presentes nos debates bioéticos. Além disso, a bioética remete a sistemas de pensamento diversificados que convêm ser integrados nas sociedades pluralistas.14 A partir do momento em que o indivíduo tem seu posicionamento ético definido e reconhece que existem outros posicionamentos diferentes do seu, o trabalho em equipe torna-se mais fácil, afinal, muitas vezes, o trabalho em equipe conta com profissionais de diferentes áreas e cada um deles tem suas atribuições definidas. No trabalho em equipe cada profissional é estimulado a participar do processo de trabalho coletivo e, portanto, é importante haver articulação entre as ações e os profissionais.22 No que se refere à análise bioética das falas presentes nas categorias e subcategorias encontradas, notou-se, a prima facie que, que dentre os quatros princípios da bioética principialista, os acadêmicos remetem, em suas falas, à autonomia como sendo um produto do uso de filmes e debates no ensino de bioética. O próprio autoconhecimento e a formação do posicionamento ético dos acadêmicos são exemplos de tal autonomia, uma vez que as características de uma pessoa autônoma estão voltadas para habilidades gerais de se autogovernarem, além de entenderem, equacionarem, deliberarem e escolherem independentemente.12

Concluiu-se com esse estudo que o uso de filmes e mesas debatedoras são importantes estratégias para o processo ensino-aprendizagem de bioética na graduação. O filme e as mesas de discussão estimularam os debates, uma vez que os temas abordados em cada um deles gerou polêmica nas discussões, portanto, proporcionou aos acadêmicos momentos e espaços para reflexões e diálogo acerca dos problemas bioéticos com os quais poderão se deparar na prática profissional. O recurso audiovisual filme, por permitir a visualização da questão estudada, permitiu a aproximação com a prática profissional e foi um facilitador para a formação do posicionamento ético e para o autoconhecimento dos sujeitos. Como aspecto dificultador em relação ao uso de filmes para o ensino, cita-se o fato de alguns acadêmicos não terem assistido ao filme na íntegra antes de comparecerem aos encontros, pois, de certa forma, comprometia o entendimento do enredo apresentado.

Ao utilizar o filme no ensino da bioética sugere-se que, assim como feito nesse estudo, sejam enfatizadas a necessidade e a importância de se assistir o filme previamente, caso no momento da aula não seja passado o filme na íntegra, ou seja, utilizada apenas a sinopse. Isto se deve, muitas vezes, às pequenas cargas horárias que são atribuídas aos conteúdos referentes ao ensino de bioética. É necessário também contar com uma sala que tenha iluminação e sonoplastia adequadas, além de assentos confortáveis para os participantes. Cabe dizer que por mais que o ensino de bioética na graduação ainda seja um grande desafio, é importante que o foco das instituições de ensino superior seja oferecer uma boa formação para o sujeito e não apenas oferecer informação. Em se tratando do ensino de bioética, sugere-se, portanto, que para que a informação contribua de fato para a formação ética dos futuros profissionais sejam utilizados recursos didáticos que permitam discussões, reflexões, troca de ideias, pois a própria bioética exige esta dinamicidade, por se tratar de um ramo da ética aplicada.

 

REFERÊNCIAS

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