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Investigación y Educación en Enfermería

Print version ISSN 0120-5307On-line version ISSN 2216-0280

Invest. educ. enferm vol.34 no.3 Medellín Dec. 2016

https://doi.org/10.17533/udea.iee.v34n3a12 

Articles

Estrutura representacional de profissionais de saúde sobre cuidar de pessoas que vivem com HIV/Aids

Camila Rodrigues-Barbosa1 

Elizabeth Teixeira2 

Denize Cristina de-Oliveira3 

1 RN, M.Sc. Professor, Universidade Federal do Amapá - UNIFAP, Macapá - AP, Brazil. email: camilarodriguesb08@hotmail.com

2 RN, Ph.D. Professor, Universidade do Estado do Rio de Janeiro -UERJ, Rio de Janeiro - RJ, Brazil. email: etfelipe@hotmail.com

3 RN, Ph.D. Professor, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro - RJ, Brazil. email: dcouerj@gmail.com


Resumo

Objetivo

. Analisar a estrutura da representação social de profissionais de saúde sobre cuidar de pessoas vivendo com HIV/aids e refletir sobre tal estrutura à luz da Política Nacional de Humanização.

Métodos

. Estudo exploratório que teve suporte na Teoria das Representações Sociais, com ênfase na abordagem estrutural. Foi desenvolvido com a participação de 114 profissionais de saúde de Belém-Pará/Brasil, em quatro unidades de atendimento especializado em HIV/aids, no período de agosto de 2011 a abril de 2013. Os dados foram coletados por meio de evocações livres ao termo indutor “Cuidar da pessoa com HIV/aids” e analisados pelo software Ensemble de Programmes Permettant L'analyse des Évocations-EVOC2003.

Resultados

O conjunto de sujeitos apresenta uma estrutura representacional positiva, organizada em torno das categorias cuidar sensível, cuidar técnico e cuidar educativo. Refletindo sobre a estrutura das representações observam-se quatro dos cinco princípios da Política Nacional de Humanização (principio 1- valorização da dimensão subjetiva e social, principio 2- estímulo a produção de saúde e de sujeitos, principio 3- trabalho em equipe e, principio 5-construção de autonomia e protagonismo).

Conclusão.

A estrutura da representação social dos profissionais de saúde sobre o cuidado de pessoas que vivem com HIV/aids aponta dimensões afetiva, conceitual e informacional, bem como é convergente com a maioria dos princípios da política de humanização do país

Palavras chave: HIV; síndrome de imunodeficiência adquirida; humanização da assistência.

Abstract

Objective.

To analyze the social representation structure of health professionals about care delivery to people living with HIV/AIDS and to reflect on that structure in the light of the National Humanization Policy.

Methods.

Exploratory study based on the Social Representations Theory, with emphasis on the structural focus. In total, 114 health professionals from Belém, Pará/Brazil participated in the development of the study, working at four services specialized in HIV/AIDS care, between August 2011 and April 2013. The data were collected through free evocations of the inducing term "Taking care of HIV/AIDS patient” and analyzed using the software Ensemble de Programmes Permettant L'analyse des Évocations-EVOC2003.

Results.

The group of subjects has a positive representation structure, organized around the categories: sensitive care, technical care and educative care. When reflecting on the representations structure, four out of five principles of the National Humanization Policy are observed (principle 1 - valuation of the subjective and social dimensions, principle 2 - stimulus for the production of health and subjects, principle 3 - teamwork and principle 5 - construction of autonomy and empowerment).

Conclusion.

The social representation structure of the health professionals about care for people living with HIV/AIDS signals the affective, conceptual and informative dimensions, converging with most principles of the Brazilian humanization policy.

Key words: HIV; acquired immunodeficiency syndrome; humanization of assistance.

Resumen

Objetivo.

Analizar la estructura de la representación social de los profesionales de la salud sobre el cuidado de las personas que viven con el VIH/SIDA y reflexionar sobre dicha estructura a la luz de la Política Nacional de Humanización.

Métodos.

Estudio exploratorio que tuvo el apoyo de la Teoría de las Representaciones Sociales, con énfasis en el enfoque estructural. Fue desarrollado con la participación de 114 profesionales de la salud de Belém, Pará/Brasil en cuatro unidades de atención especializada en VIH/SIDA, desde agosto de 2011 hasta abril de 2013. Los datos se recolectaron a partir de evocaciones libres del término inductor" Cuidando a la persona con VIH/SIDA " y se analizaron con el software Ensemble de Programmes Permettant L'analyse des Évocations-EVOC2003.

Resultados.

El grupo de profesionales tiene una estructura de representación positiva, organizada en torno a las categorías de: cuidado sensible, cuidado técnico y cuidado educativo. Al reflexionar sobre la estructura de las representaciones se observan cuatro de los cinco principios de la Política Nacional de Humanización (principio 1-valorización de la dimensión subjetiva y social, principio 2- estímulo a la producción de salud y de sujetos, principio 3- trabajo en equipo y, principio 5- construcción de autonomía y protagonismo).

Conclusión.

La estructura de la representación social de los profesionales de la salud sobre el cuidado de las personas que viven con VIH/SIDA señala las dimensiones afectiva, conceptual e informativa, siendo convergente con la mayoría de los principios de la política humanización del país.

Palabras clave: VIH; síndrome de inmunodeficiencia adquirida; humanización de la atención.

Introdução

A representação original da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Acquired immunodeficiency syndrome - Aids) nos anos 80 apareceu como contraponto da moralidade sexual dominante em diversas partes do mundo. Assim, a síndrome foi elaborada e metaforizada como uma epidemia da imoralidade e também como consequência da perda de padrões morais e sociais, o que influenciou a assistência prestada à essas pessoas no mundo e no Brasil.1 A partir dos anos 90 as transformações do significado social da aids começam a ser reveladas, e também a assistência passa a ser influenciada por novos aportes. As pessoas vivendo com Vírus da Imunodeficiência Humana (Human Immunodeficiency Virus - HIV)/aids começam a se posicionar e exigir também transformações no agir dos profissionais, com vistas a um cuidado humanizado.

Nesta perspectiva, destaca-se que nos anos 90 no Brasil, a prática e o ensino na saúde, norteados pelas ciências humanas e sociais, proporcionaram as bases para o estabelecimento de uma política de humanização da assistência no começo da década seguinte.2 Nos anos seguintes, algumas profissões da área da saúde passaram a considerá-la como foco da sua assistência. Na enfermagem este movimento se consolidou ainda nos anos 90. Tal concepção reconhece o ser humano como um ser social em constante relação com outros seres humanos e com seu meio, transformando-o e sendo transformado por ele, isto é, um protagonista da ação de saúde.2 Este aporte está, em consonância com as transformações ocorridas no próprio significado social da aids.

Sabe-se, no entanto, que as pessoas vivendo com HIV ainda são muito discriminadas, o que pode interferir no cuidado prestado, pois os valores morais dos profissionais envolvidos em seu atendimento se fazem bastantes presentes no momento do cuidado.3 As representações sociais guiam as práticas desses profissionais, bem como seus modos de cuidar de pessoas vivendo com HIV/aids. É necessário conhecê-las para pensar ações de capacitação para potencializar a ação/atuação humanizada dos profissionais, inclusive os de enfermagem. A enfermagem está integrada à equipe e o cuidar é integrado entre todos. Há que se favorecer a qualificação dos profissionais nas unidades de referência para se potencializar o agir educativo-cuidativo humanizado. A enfermagem não pode ficar à margem desse processo de reflexão sobre o cuidar de pessoas vivendo com HIV/aids na perspectiva da prática de humanização. Proposta em 2003, a Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do Sistema Único de Saúde (PNH) diz que humanizar é “ofertar atendimento de qualidade articulando os avanços tecnológicos com acolhimento, com melhoria dos ambientes de cuidado e das condições de trabalho dos profissionais”.4)

Estudos de representações sociais realizados especificamente pela enfermagem buscam compreender e dar sentido às práticas assistenciais, as características da profissão, e também aos aspectos do processo saúde-doença. Permitindo apreender as relações que se estabelecem entre os sujeitos e o fenômeno, pacientes e equipes multiprofissionais, evidenciando quem é o profissional, quais seus conhecimentos, o tipo de cuidado ofertado e a construção do significado deste cuidado.5) O objetivo deste estudo foi analisar a estrutura da representação social de profissionais de saúde sobre cuidar de pessoas vivendo com HIV/aids e refletir sobre tal estrutura à luz da Política Nacional de Humanização.

Métodos

Trata-se de um estudo do tipo exploratório, tendo como suporte teórico a Teoria das Representações Sociais (TRS) na perspectiva estrutural. A TRS foi formulada por Serge Moscovici no final dos anos 50, recebeu visibilidade a partir da publicação, de seu estudo LaPsychanalyse: Son image et son public em 1961, marcando o estabelecimento de uma percepção inovadora sobre a integração entre os fenômenos perceptivos individuais e sociais.6) O conceito-fenômeno representações sociais revela-se para Moscovici se diferenciando de outras formas de conhecimento (intelectual ou sensorial) por estabelecer uma relação específica entre sujeito e objeto de conhecimento. Este sujeito se auto-representa ao representar o objeto, imprimindo sua identidade naquilo que representa.7) A abordagem estrutural foi proposta por Jean Claude Abric no ano de 1976, este afirmou que toda representação social se organiza em torno de um núcleo central, determinando seu significado e organização interna, sendo um subconjunto da representação, composto de um ou mais elementos que caso não existissem desestruturaria a representação ou lhe atribuiria um significado totalmente diferente.8

A pesquisa foi desenvolvida em Belém-Pará/Brasil, em quatro unidades de atendimento especializado em HIV/aids: Clinica de Infectologia do Hospital Universitário João de Barros Barreto, Centro de Testagem e Aconselhamento, Unidade de Referência em Doenças Infecto Parasitárias Especiais e Centro de Atenção à Saúde em Doenças Infecciosas Adquiridas. Foram participantes 114 profissionais de saúde, que atuam nas referidas unidades de referência e prestam cuidados a pessoas que vivem com HIV/Aids, estes foram abordados em seus locais de trabalho. Todos os profissionais de saúde abordados aceitaram participar do estudo. Não havia nenhuma relação estabelecida com os participantes antes do estudo. A amostragem seguiu a metodologia estabelecida no projeto multicêntrico que definiu uma amostra de conveniência, e considerou como exigência mínima para o desenvolvimento desse estudo uma amostra de 100 profissionais por município.

Quanto ao perfil dos profissionais, destaca-se que 100 (87.7%) eram do sexo feminino. Quanto à idade, 34 (29.8%) profissionais até 35 anos, 39 (34.2%) profissionais de 36 até 45 anos e 41 (36%) de 46 anos ou mais de idade. Quanto ao tempo de atuação no programa Doenças Sexualmente Transmissíveis (DTS) e Aids, 69 (60.5%) atuam há menos de 5 anos no programa e 45 (39.5%) há mais de 5 anos. Quanto ao tempo de formação, 36 (31.6%) até 5 anos de formados, 60 (52.6%) 6 a 15 anos de formados e 18 (15.8%) 16 anos ou mais de formados. Quanto à categoria profissional, 24 (21%) técnicos de enfermagem, 13 (11.4%) assistentes sociais, 13 (11.4%) enfermeiros, 13 médicos (11.4%), 7 (6.1%) psicólogos, 7 (6.1%) farmacêuticos, 2 (1.8%) auxiliares de enfermagem, 1 (0.8%) odontólogo e 34 (30%) técnicos em odontologia, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, e não especificados.

A coleta de dados foi realizada no período de agosto de 2011 a abril de 2013, por meio de um formulário, que continha a técnica de associação livre de palavras (TALP). O formulário foi aplicado por um grupo de colaboradores/entrevistadores vinculados ao projeto multicêntrico, estes colaboradores foram capacitados e treinados para aplicação do formulário. Foi aplicado conforme disponibilidade dos profissionais de saúde participantes, com horário e local preestabelecido em comum acordo. A coleta de dados foi realizada nos turnos da manhã e tarde, nos próprios locais de trabalho e em outros lugares sugeridos pelos profissionais de saúde. Cada entrevista durou cerca de 40 a 60 minutos, em um local reservado, no qual estavam presente apenas um colaborador/entrevistador e o profissional de saúde participante, sendo precedida da leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, com a devida explicação do objetivo da pesquisa e solicitação da assinatura em duas vias para obter anuência dos sujeitos.

A TALP consistiu em solicitar aos sujeitos a produção de cinco palavras ou expressões que lhes viessem imediatamente à lembrança ao pensar no termo indutor “Cuidar da pessoa com HIV/Aids”, configurando a produção de respostas em situação de normalidade de expressão, quando o sujeito fala em seu nome. Para a produção do corpus, foi utilizada a ordem de produção das palavras, para garantir a espontaneidade das evocações, pois se supõe que as palavras mais importantes são citadas em primeiro lugar. Essa técnica de coleta de dados permite colocar em evidência o universo semântico que está associado ao termo-objeto estudado, assim como a sua dimensão imagética de forma mais rápida e dinâmica que outros métodos com igual objetivo.8

Os dados foram trabalhados e codificados por um colaborador do projeto multicêntrico no laboratório da Universidade do Estado do Rio de Janeiro sobre a liderança da coordenadora geral e nacional do projeto. Adotou-se análise quantitativa das evocações, com base em frequências e médias e análise qualitativa do conteúdo dos termos e palavras evocadas. Para a análise quantitativa dos dados foi utilizado o software Ensemble de Programmes Permettant L'analyse des Évocations (EVOC) 2003. O EVOC2003 calculou e informou a frequência simples de ocorrência de cada palavra evocada, a média ponderada de ocorrência de cada palavra em função da ordem de evocação e a média das ordens médias ponderadas do conjunto dos termos evocados. A partir do resultado do processamento foi obtido um quadro de quatro casas, que corresponde a quatro quadrantes com quatro conjuntos de termos. O software não identifica representações sociais e não se crê em cálculo de representações sociais; ao processar as palavras evocadas, o software limita-se a apresentar uma provável estrutura central e periférica das representações sociais com base no quadro de quatro casas, na perspectiva da abordagem estrutural das representações sociais.

Para a análise qualitativa foi realizada análise semântica e de conteúdo dos termos contidos no quadro de quatro casas e buscou-se agrupar os termos em categorias associadas ao objeto de estudo, de acordo com o universo semântico empregado pelos sujeitos. A pesquisa obedeceu à Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, que estabelece diretrizes e normas regulamentadoras quanto aos aspectos éticos da pesquisa envolvendo seres humanos. O projeto multicêntrico ao qual este subprojeto está vinculado foi apreciado e aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Protocolo Nº 048.3.2010 e Comitê de Ética da Universidade do Estado do Pará, Protocolo N° 0069.0.321.000-10. Todos os sujeitos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

Os 114 profissionais de saúde evocaram um total de 557 palavras associadas ao termo indutor “Cuidar da pessoa com HIV/aids”, e destas, 139 eram diferentes. A Tabela 1 apresenta a distribuição dos termos evocados no Quadro de Quatro Casas; este foi obtido com um ponto de corte com frequência mínima 14, frequência média 20 e Ordem Média de Evocações (OME) 3.0 (dentro e uma variação de 1 a 5). Temos 12 palavras ou termos evocados que se distribuem nos quatro quadrantes.

Tabela 1 Estrutura representacional do objeto “cuidar da pessoa com HIV/aids”. Belém, 2015 

No provável núcleo central (quadrante superior esquerdo) têm-se os termos amor, cuidado e educação-saúde. Os elementos do núcleo central comportam os elementos que para as representações sociais são cognições provavelmente centrais, por serem os mais frequentes e os considerados hierarquicamente mais importantes entre as evocações.9 Estes termos ou palavras neste estudo expressam-se em uma frequência igual ou superior a 20 e, ao mesmo tempo, obtiveram médias de evocação inferior a 3, ou seja, sendo evocados mais prontamente. O termo com maior destaque é amor, com uma frequência de evocação igual a 34 e OME 2.618. Tem origem do latim e possui múltiplos significados na língua portuguesa: “elemento que preenche de sentido a existência e humaniza as relações na medida em que abre espaço de existência para o outro junto a si”.10 Outro termo central é cuidado, palavra com duplicidade de sentidos, referente tanto ao cuidado como ação de assistência a pessoas vivendo com HIV/aids, como o cuidado no sentido de proteção profissional diante da exposição à infecção pelo HIV no trabalho. Sua frequência foi de 28 e OME 2.714. O termo educação-saúde também presente no núcleo central está associado às atividades educativas realizadas pelos profissionais em contexto HIV/aids, podendo estar relacionadas tanto aos usuários, quanto aos próprios trabalhadores de saúde. Apresenta frequência de 25 e OME 2.800.

Na primeira periferia (quadrante superior direito) têm-se os termos atenção e capacitação profissional. Elementos periféricos de maior relevância, possuindo maiores frequência de evocação, mas, menor importância segundo os entrevistados.11 Estes termos ou palavras neste estudo expressam-se em uma frequência igual ou superior a 20 e, obtiveram médias de evocação superior a 3. Na segunda periferia (quadrante inferior direito) têm-se os termos apoiar, atendimento humanizado e respeito. Neste quadrante estão os elementos com baixa frequência e baixa prioridade. Estes elementos guardam mais relação com a realidade vivenciada, elementos possivelmente recentes da representação, associados ao contexto mais imediato que agregam as características mais particularizadas da representação no contexto prático.

O sistema periférico promove a interface entre a realidade e o sistema central e é mais sensível às condições do contexto permitindo a integração das experiências e histórias. Serve de para-choque entre uma realidade que a questiona e um núcleo central que não deve mudar facilmente. Os desacordos da realidade são absorvidos pelos esquemas periféricos, que, assim, asseguram a estabilidade (relativa) da representação.11) Na zona de contraste (quadrante inferior esquerdo) têm-se os termos acolhimento, autoproteção-profissional, informação e solidariedade. Este quadrante é composto dos elementos de contraste, elementos com frequência baixa, mas alta prioridade. Na zona de contraste se localizam elementos que caracterizam variações da representação em função de subgrupos, no entanto, não modificam os elementos centrais e a própria representação, indicam mudanças ou transição de uma representação social.11) O conjunto de sujeitos apresenta uma estrutura representacional positiva, organizada em torno das categorias: cuidar sensível (com os termos, amor, atenção, apoiar, solidariedade e respeito); cuidar técnico (com os termos, cuidado, acolhimento, autoproteção profissional e atendimento-humanizado); cuidar educativo (com os termos, educação-saúde, capacitação-profissional e informação).

Na categoria cuidar sensível, “cuidar de pessoas com HIV/aids” revela-se ligado a uma dimensão afetiva. O cuidado é uma ação que se dá entre pessoas, por isso, não pode ser separado das emoções como amor e não pode ter neutralidade em relação a valores humanos, deve ser um processo bilateral entre o profissional de saúde e o ser cuidado.3) Ao refletirmos sobre a categoria cuidar sensível à luz da Política Nacional de Humanização - PNH, constatamos um dos princípios norteadores, o primeiro de cinco, que enfatiza e valoriza a dimensão subjetiva e social na assistência.4) Na categoria cuidar técnico, “cuidar de pessoas com HIV/aids” revela-se ligado a uma dimensão conceitual, no qual estes profissionais já com mais conhecimento conseguem se distanciar dos estigmas e preconceitos e focar em uma assistência mais holística. Ao refletirmos sobre a categoria à luz da PNH, revelam-se mais dois princípios norteadores: o segundo, que estimula o comprometimento com a produção de saúde e a produção de sujeitos; o terceiro, que busca fortalecer o trabalho em equipe multiprofissional.4) Na categoria cuidado educativo, “cuidar de pessoas com HIV/aids” revela-se ligado a um dimensão informacional, no qual a informação pode potencializar/empoderar tanto o profissional quanto à pessoa vivendo com HIV/aids. Ao refletirmos sobre a categoria à luz da PNH, revela-se mais um princípio norteador, o quinto princípio da PNH, que dá ênfase à utilização da informação, da comunicação e da educação per manente.4

Discussão

A presença dos termos amor, atenção, solidariedade, apoiar e respeito (categoria cuidar sensível) na estrutura da representação social dos profissionais de saúde nos remete as discussões sobre a presença de uma dimensão afetiva no campo das representações sociais.12) A representação é um conhecimento estruturado, determinante no modo como os indivíduos vêm e reagem face à realidade, e por ser dotado de cargas afetivas, é atravessado por um componente afetivo. A subjetividade ressaltada no primeiro princípio da PNH é definida como capacidade do ser humano em ser único.13 O cuidar ocorre no encontro de subjetividades, estabelecendo um diálogo aberto entre profissional de saúde e usuário do serviço de saúde, em que sentimentos, ações e reações se complementam. A valorização da subjetividade não deve ter como foco apenas o usuário do serviço de saúde, entende-se que a humanização do atendimento depende da consideração de que a dimensão subjetiva do profissional também é componente vital do processo do cuidar. 14

Em situações de doença em que o usuário do serviço de saúde se encontra mais fragilizado, torna-se necessário a adoção de um maior grau de sensibilidade por parte dos profissionais de saúde, pois esta facilitará uma melhor compreensão das necessidades subjetivas dos usuários, garantindo um cuidado mais integral.14 Ao nosso ver é importante uma dimensão afetiva entre a relação profissional de saúde e usuário, entendendo o processo de humanização como um processo de diálogo que possibilita e estimula a integração entre o cuidar técnico e os projetos de vida do usuário.15) A presença dos termos cuidado, acolhimento, autoproteção profissional e atendimento humanizado (categoria cuidar técnico) na estrutura da representação social dos profissionais de saúde aponta para uma dimensão conceitual. As representações sociais são guias para a ação. As RS funcionam como uma forma de interpretar a realidade, que dita as relações do indivíduo com seu contexto social e físico, determinando seus comportamentos e práticas, orientando as ações e as relações sociais.8) É possível afirmar que os profissionais de saúde do estudo, apresentam um cuidar mais arraigado no conhecimento técnico científico conseguindo representar este cuidar para além da doença e seus estigmas.

A autoproteção profissional figura como importante elemento do cuidado em HIV/aids. Com a descoberta da aids passou-se enfatizar a exposição dos profissionais de saúde ao sangue.16) Cabe salientar que os profissionais da equipe de enfermagem são os profissionais de saúde que mais se acidentam, principalmente auxiliares e técnicos de enfermagem por estarem constantemente assistindo o paciente, manipulando agulhas, cateteres venosos, e administrando medicamentos.17) O acolhimento de pessoas vivendo com HIV/aids deverá ter como base a escuta, permitindo o favorecimento da adesão ao tratamento. O profissional de saúde precisa ser uma fonte de informações e incentivo sobre a continuidade da vida, precisa construir uma estrutura afeto - cognitiva entro profissional e usuário.

O segundo princípio da PNH ressalta a importância do comprometimento com a produção de saúde e com a produção de sujeito. Põe-se sob a ótica da PNH gestores, profissionais de saúde e usuários do serviço de saúde, os principais responsáveis pela mudança nos modelos de atenção em saúde e gestão do processo de trabalho, priorizando as necessidades dos cidadãos.18) O usuário do serviço de saúde não deve ser excluído no seu processo terapêutico. Todos devem estar inseridos na ação do cuidar em saúde. O terceiro princípio da PNH evidencia a necessidade de fortalecimento de trabalho em equipe multiprofissional. A execução do cuidar realizada por vários profissionais de saúde favorece a qualidade desta assistência, pois uma única categoria profissional não é capaz de cuidar da totalidade do usuário do serviço de saúde durante o processo saúde-doença.14

A presença da expressão educação em saúde, capacitação profissional e informação (categoria cuidar educativo) na estrutura da representação social dos profissionais de saúde aponta para uma dimensão informacional. A educação em saúde é um aporte estratégico nas práticas de saúde voltadas ao HIV/aids, tornando-se uma ferramenta fundamental frente ao aumento do número de casos de HIV/aids e as mudanças no perfil epidemiológico.19) O desenvolvimento de ações educativas não só com as pessoas vivendo com HIV/aids, mas também com a população em geral, é uma forma de prevenção e promoção à saúde, que não deve ser apenas voltada à transmissão vertical de informações, mas sim uma possibilidade de transformação do indivíduo em sujeito crítico quanto aos problemas de saúde. Nesse contexto de educação em saúde evidencia-se o papel da equipe de saúde, que passa a ser estratégico para conjugar informações que emergem da interação entre os diferentes profissionais com a população. Os cursos de formação dos profissionais de saúde devem ser reorientados para possibilitar a aquisição de competência educativa a fim que os profissionais realizem práticas de educação em saúde, tendo em vista a relação com a realidade vivida pelo usuário.

O quinto princípio da PNH evidencia a informação, a comunicação e a educação per manente. Os profissionais de saúde em contexto HIV/aids entendem educação em saúde como uma tarefa de orientar e informar, associada à uma forma de cuidar, guiada por conteúdos clínico-terapêuticos e de responsabilidade de toda equipe. Este ato de orientar e informar está atrelado a precaução-prevenção (auto e hetero proteção) que envolve as pessoas vivendo com HV/aids e as pessoas que destas cuidam. Os profissionais de saúde também consideram importante a educação no trabalho, pois mesmo o profissional com mais experiência ainda tem dúvidas.20

Este estudo concluiu que a estrutura da representação social aponta dimensões afetivas, conceituais e informacionais, é “positiva”, e se organiza em torno das categorias cuidar sensível, cuidar técnico e cuidar educativo, indicando uma nova postura frente a este cuidar. A reflexão à luz da Política Nacional de Humanização possibilitou concluir que a estrutura da representação social é convergente com a maioria dos princípios da política de humanização. Assim, predominantemente desenvolvido segundo tais princípios, o agir cuidativo se fortalece. Identificamos quatro dos cinco princípios, indicando que há um cuidado humanizado em curso, há avanços nas formas de cuidar, com o entrelaçamento da subjetividade dos profissionais com a dos usuários, a valorização do protagonismo destes, a consciência da necessidade de processos educativos permanentes com o objetivo de qualificar cada vez mais esse cuidar, e a importância de um cuidar pautado em saberes científicos atualizados por toda a equipe multiprofissional.

Os resultados indicaram a ausência de um dos princípios, o que se refere a atuação em rede com alta conectividade, de modo cooperativo e solidário, em conformidade com as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). Ressaltamos com base nisso, que a política de humanização é um ideal possível e inesgotável, mas também um processo contínuo de construção e reconstrução sob a ótica do trabalho em saúde e do cuidar. Torna-se crucial uma delimitação criteriosa do conceito de Humanização, para que seus princípios norteadores sejam verdadeiramente aplicados, avaliando quais as formas possíveis de se executar essa humanização, que estejam de acordo com a realidade dos serviços de saúde. A multiplicidade de conceitos de humanização reforça a necessidade de discutir e refletir sobre sua delimitação, para que a proposta seja efetivamente implantada no cotidiano da prática assistencial.

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Recebido: 15 de Abril de 2016; Aceito: 31 de Agosto de 2016

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