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Lingüística y Literatura

versión impresa ISSN 0120-5587versión On-line ISSN 2422-3174

Linguist.lit.  no.84 Medellìn jul./dic. 2023  Epub 01-Dic-2023

https://doi.org/10.17533/udea.lyl.n84a10 

Estudos literários

O PREFÁCIO ANTES DO ROMANCE: GERMINIE LACERTEUX NO BRASIL*

THE FOREWORD BEFORE THE NOVEL: GERMINIE LACERTEUX IN BRAZIL

Zadig Mariano Figueira Gama1 

1Universidade Federal Fluminense (Brasil), e-mail: zadiggama@id.uff.br


Resumo:

O artigo apresenta e analisa a inscrição sociodiscursiva do romance Germinie Lacerteux (1865), escrito pelos irmãos Edmond (1822-1896) e Jules (1830-1870) de Goncourt, no campo literário brasileiro. Em um primeiro momento, observam-se as condições de produção do romance na França. Isso permite, em seguida, investigar sua circulação e recepção crítica no Brasil. Finalmente, tenta-se compreender o processo de incorporação de valores estéticos, reconhecidos pela crítica francesa e brasileira como característicos do estilo dos irmãos Goncourt e marcadamente presentes em Germinie Lacerteux, aos romances O pajé(1887), de Marques de Carvalho, e Flor de sangue(1897), de Valentim Magalhães.

Palavras-chave: irmãos Goncourt; Germinie Lacerteux; prefácio; campo literário brasileiro; tradução

Abstract:

The article presents and analyzes the sociodiscursive inscription of the novel Germinie Lacerteux (1865), written by brothers Edmond (1822-1896) and Jules (1830-1870) de Goncourt, in the Brazilian literary field. In a first moment, the conditions of production of the novel in France are observed. This allows, then, to investigate its circulation and critical reception in Brazil. Finally, we try to understand the process of incorporation of aesthetic values, recognized by French and Brazilian critics as characteristic of the Goncourt brothers' style and markedly present in Germinie Lacerteux, to the novels O pajé (1887), by Marques de Carvalho, and Flor de sangue (1897), by Valentim Magalhães.

Keywords: Goncourt brothers; Germinie Lacerteux; foreword; Brazilian literary field; translation

1. Introdução

Em 1865, com uma escrita orientada pela observação, os irmãos Edmond (1822-1896) e Jules (1830-1870) de Goncourt escrevem o quinto romance de suas carreiras, Germinie Lacerteux, e o publicam pela editora Charpentier. As críticas feitas à época de seu lançamento o leem como uma obra realista e seu prefácio como um manifesto dessa estética. Nas últimas décadas do século xix, este romance passa a ser considerado precursor de valores naturalistas em literatura, e seus autores, mestres desse movimento. Em 1886, em uma reedição do romance pela editora Quentin, Edmond de Goncourt acrescenta um segundo prefácio -pouco explorado pelos estudos críticos-, que dá lastro à imagem de romance naturalista avant la lettre. A partir da segunda metade do século xx, ainda que de maneira comedida, Germinie Lacerteux foi alvo de um interesse particular no meio acadêmico por seu caráter iniciador de determinados valores estéticos na prosa. O prefácio do romance, publicado em 16 de janeiro de 18651, fez parte da incessante redefinição de objetos de estudos críticos. É a partir dele que Erich Auerbach (2021) aborda um dos aspectos da representação da realidade na literatura. Gérard Genette (1987) e Pierre Bourdieu (1996), cada um à sua maneira, o leem como um manifesto do romance realista.

No Brasil, a circulação de Germinie Lacerteux se restringiu à importação de edições francesas e à tradução de parte do capítulo 37 e de todo o capítulo 38, no jornal maranhense Pacotilha, em 1887. No âmbito da crítica, Germinie Lacerteux é pouco lembrado, havendo não mais do que ideias dispersas sobre o romance em críticas sobre o movimento naturalista ou em notas sobre romances brasileiros comparados a esta obra. Seu prefácio, contudo, tem certo destaque quando comparado ao romance, tendo sido lido pela crítica brasileira como uma profissão de fé literária dos irmãos Goncourt e como a descrição de um novo paradigma de escrita para a prosa, baseado no investimento no gênero romance, na observação e na documentação. O prefácio da primeira edição de Germinie Lacerteux é citado por Marques de Carvalho, no prefácio do romance O pajé(1887), e por Valentim Magalhães, no prefácio do romance Flor de sangue (1897), servindo de fiador para a produção da obra desses dois escritores. Ele não somente precede a narrativa, mas também vem em primeiro lugar e com maior destaque na imprensa brasileira.

A retomada da questão sobre « o que fazem os prefácios? », levantada por Jacques Derrida (1972) e desenvolvida por Gérard Genette (1987), para inquirir os prefácios de Germinie Lacerteux, em uma perspectiva narratológica, terá sua resposta limitada ao estudo do gênero: texto preliminar, autoral e referencial à obra (Genette, 1987, p. 150). Nesse sentido, o prefácio de 1865 seria um prefácio original, cuja função é a de assegurar uma boa leitura do romance, e o prefácio de 1886 um prefácio tardio, que visa apresentar sua gênese. Sob uma perspectiva sociodiscursiva, entretanto, é possível inquirir não somente o gênero em questão, mas também a inscrição sociodiscursiva dos prefácios de Germinie Lacerteux no campo literário. A questão que ora se impõe é, portanto, de ordem sociológica e enunciativa, interessando-se pelas sucessivas posições ocupadas pelos autores no campo literário francês ao longo de suas trajetórias (Bourdieu, 1996, p. 243) e pela dimensão figurativa do escritor e da encenação deste em sua obra, sobretudo no que diz respeito ao gerenciamento da memória interna de textos, em função de um futuro (Maingueneau, 2004, p. 113). A serviço de que interesse(s), então, esses prefácios foram escritos? Ou ainda: a serviço de que interesse(s) esses prefácios foram citados nos romances O pajé e Flor de sangue?

2. À época do prefácio manifesto

A publicação de Germinie Lacerteux acontece em pleno Segundo Império (1851-1870), em um momento cujos valores dominantes na regulação do campo literário francês eram conservadores e coibiam qualquer desvio da ordem moral que regia o campo social. Nesse contexto político, Germinie Lacerteux passa pelo crivo de uma censura austera e pela avaliação de uma crítica que analisa o romance segundo os parâmetros da época. Trata-se de uma leitura crítica balizada por gêneros, temas e estilos triunfantes na prosa desde 1848, presentes nos romances-folhetins e nos romances ditos « decentes » para mulheres (Becker, 1998, p. 151). Contudo, Germinie Lacerteux será comparado a um romance em particular, que inseria, no rol de referências literárias, novos valores estéticos. Em grande parte das críticas feitas na imprensa francesa à época de seu lançamento, o romance é comparado a Madame Bovary(1856-1857), de Gustave Flaubert. O mesmo romance que nove anos antes havia rendido a Flaubert a acusação em processo penal de atentado à moral cristã e de exaltar o adultério, tendo sido por isso considerado, pela censura, uma leitura perigosa (Sapiro, 2013). O romance de Flaubert estabelece, assim, certos critérios para a crítica analisar a trama e as personagens de Germinie Lacerteux, tanto para críticos partidários quanto para detratores da obra. Esses últimos, de acordo com Reverzy (2014) em seu estudo sobre a recepção do romance na França, serão a maioria. As avaliações negativas, de maneira geral, reconhecem em Germinie Lacerteux uma escrita pautada na feiura, uma preferência pelo pitoresco e, sobretudo, na trama, um caráter imoral, bem como um arrefecimento da narrativa em detrimento da valorização das passagens descritivas. As críticas considerarão a dissolução do romanesco como um recurso que o destitui de verossimilhança -palavra-chave do realismo. Segundo Reverzy (2014), as críticas, baseando-se em ideias expressas no prefácio da primeira edição, questionarão a possibilidade de situações semelhantes àquelas representadas no romance acontecerem fora de um registro literário (p. 314).

A leitura de Germinie Lacerteux que aponta certos aspectos do romance e de seu prefácio como sendo um passo adiante no realismo e um manifesto literário é feita sobretudo por coetâneos e amigos dos irmãos Goncourt. Gustave Flaubert (1927), por exemplo, referindo-se à gradação de efeitos e à progressão psicológica da protagonista Germinie, considera, em carta datada de janeiro de 1865, que a grande questão do realismo nunca havia sido tão solidamente colocada (p. 163). O ainda estreante nas letras Émile Zola -que conhecerá os irmãos Goncourt pessoalmente apenas em dezembro de 1868- retoma, em tom elogioso, na crítica publicada no Le Salut Public de Lyon, algumas ideias presentes no prefácio. Em sua crítica, Zola destaca a atualidade do romance e o direito de representação das « classes baixas » por esse gênero. Para sustentar sua argumentação, afirma: « os srs. Goncourt escreveram para os homens da atualidade; sua Germinie não poderia viver em outra época senão a nossa; ela é a filha do século » (Le Salut Public, 24 fev. 1865, p. 3). As relações de apoio mútuo e as inclinações literárias semelhantes que se manifestam nas leituras desse romance se tornam, no início de 1868, alvo dos ataques do jornalista Louis Ulbach que, sob o pseudônimo de Ferragus, condena Germinie Lacerteux e Thérèse Raquin(1867), romance de Zola.

A anteposição, em 1865, de um texto introdutório a Germinie Lacerteux já é, por si só, um manifesto em defesa do Romance -retomo a palavra com letra maiúscula do próprio prefácio-. Germinie Lacerteux é o primeiro romance escrito pelos irmãos Goncourt a possuir tal distinção, que até então era exclusiva de uma de suas obras de história, La Femme au xviii e siècle(1862). Isso significa que, para Edmond e Jules de Goncourt, àquela época, o romance se equiparava à História dentro de uma hierarquia de gêneros lidos e muitas vezes praticados pela comunidade letrada na qual estavam inseridos. Soma-se a isso o fato de estes escritores virem de uma série de insucessos literários, sobretudo no romance, com narrativas fragmentadas e linguagem rebuscada -características do que Edmond, alguns anos mais tarde, chamará écriture artiste (escrita artista). O prefácio da primeira edição de Germinie Lacerteux é, finalmente, uma forma de responder às instituições de legitimação do campo literário, sobretudo à Academia Francesa, cujos primeiros reconhecimentos de romancistas acontece pela acolhida de Jules Sandeau (1811-1883), em 1858, e de Octave Feuillet (1821-1890), em 1862, autores representantes de romances que os irmãos Goncourt julgavam ligados ao divertimento e de leitura anódina.

3. À época do prefácio-documento

Após um período de luto que segue a morte de Jules, em 1870, Edmond continua a escrever os habituais estudos históricos e sobre arte, assim como romances, participando ativamente dos debates estéticos no campo literário francês. A partir de meados da década de 1870, as obras do Goncourt sobrevivente passam a ser publicadas quase que exclusivamente pela editora de Geroges Charpentier que, dentro de seu projeto editorial, cria uma espécie de panteão de escritores de vanguarda, de que fazem parte Gustave Flaubert, Émile Zola, Alphonse Daudet, Joris-Karl Huysmans, dentre outros escritores naturalistas. O relativo sucesso de alguns títulos escritos somente por Edmond, como La Fille Élisa(1877), Les Frères Zemganno(1879) e Chérie(1884), assim como a reedição de obras escritas em parceria com seu irmão, colocam o nome dos Goncourt sob os holofotes da crítica, e eles -Jules em caráter retroativo- passam a ser considerados mestres da literatura realista, precursores e figuras de proa do naturalismo, ao lado de Émile Zola e de Alphonse Daudet. A publicação do segundo prefácio na reedição de 1886 de Germinie Lacerteux acontece, então, quando o nome dos Goncourt já é associado aos grandes nomes da literatura moderna naturalista, durante a Terceira República francesa (1870-1940), período de avanços no debate político, de recuperação de direitos políticos e de maior liberdade de expressão.

O artifício de que Edmond lançou mão para apresentar a gênese do romance foi incluir, no prefácio de 1886, passagens do Journal, diário íntimo que escreveu junto com seu irmão Jules entre 1851 e 1870, e sozinho até 1896. Essa escolha não parece ter sido feita ao acaso. As datas das passagens do diário evocam os desdobramentos de uma reflexão e de um método que vinham sendo empreendidos desde o início da década de 1860. O registro das impressões do declínio físico, mental e moral da empregada dos irmãos Goncourt, Rosalie Malingre, também chamada de Rose, que inspirou a personagem Germinie, por sua vez, é uma maneira de mostrar ao leitor um processo de escrita baseado na observação. As passagens do Journal seriam, então, o « embrião documental » do romance. Esse prefácio também pode ser visto como uma resposta às críticas que questionaram a possibilidade de que tal situação acontecesse fora de uma representação literária. Já a escrita do quotidiano, quando vista em seu conjunto no prefácio do romance, encontra como corolário um projeto literário voltado para a representação de impressões de experiências concretas -e foi com este projeto que os irmãos Goncourt « estanciaram do dia 24 de julho ao dia 14 de agosto de 1863 na floresta de Fontainebleau. Alojaram-se em Grez, em uma estalagem da cidade que se destacava, pensavam eles, por seu desconforto » (Cabanès & Dufief, 2020, pp. 313-314). Conforme assinala Reverzy (2014), pode-se ainda observar o prefácio de 1886 como uma tentativa de suscitar o interesse do público leitor pelo Journal, cujo primeiro volume, de uma série de nove, será publicado no ano seguinte pela editora de Charpentier (p. 309).

Nesse sentido, é possível levantar a hipótese de que o prefácio da reedição de 1886 de Germinie Lacerteux seria uma tentativa de endossar o caráter precursor dos valores e temas naturalistas neste romance, como a escrita pautada na observação do real e na documentação de fatos. O prefácio leva o leitor a recuar no tempo até 1862 e acompanhar a tomada de notas sobre a degeneração da saúde de Rose até a descoberta da vida dupla que ela levava antes de morrer ou, como descrito naquele texto, a revelação de uma « existência desconhecida, odiosa, repugnante, lamentável » (Goncourt, 1886, p. xvi)2.

4. Germinie Lacerteux e seus prefácios no Brasil

Em dezembro de 1918, no artigo « Dor e glória: uma leitura em casa de Edmond de Goncourt », a revista Bahia Ilustrada lembra ao leitor que Germinie Lacerteux havia feito certo « ruído », « quase escândalo » (Bahia Ilustrada, dez. 1918, p. 8). De fato, é possível observar o ruído feito pelo romance ao qual o articulista da revista se refere, mas não uma iminência de escândalo no Brasil. Ao contrário de certos romances franceses de escritores que pertenciam ao mesmo grupo dos irmãos Goncourt, Germinie Lacerteux teve uma circulação e uma recepção pouco expressivas no país. Madame Bovary, romance com o qual foi comparado na França, por exemplo, ao final do século xix, contou com certo aplauso da crítica e com uma circulação mais expressiva no campo literário brasileiro (Müller, 2012). O romance dos irmãos Goncourt, pelo contrário, na imprensa brasileira, não contou com anúncios de venda das edições publicadas na França, tampouco com críticas ou com uma tradução integral. No acervo da Fundação Biblioteca Nacional é possível encontrar apenas um exemplar desse romance (FBN iii-66, 2, 7) e dois exemplares de Préfaces et manifestes littéraires (FBN iii-66, 2, 11 e iii-112, 2, 6.), obra de 1888 na qual Edmond de Goncourt reúne textos, dentre os quais os prefácios de Germinie Lacerteux, que representam uma espécie de profissão de fé literária. No Real Gabinete Português de Leitura encontra-se igualmente apenas um exemplar do romance (RGPL 12, B, 5). A presença do romance dos Goncourt nestas instituições de prestígio de certo modo confirma a exiguidade da circulação desse título em livro no Brasil, que provavelmente ocorre na segunda metade do século xix.

4.1. «Esta é verdadeiramente uma histérica»: Germinie Lacerteux na imprensa brasileira

Apesar da ausência de anúncios de venda de Germinie Lacerteux e de sua presença limitada a raros volumes na FBN e no RGPL, bem como de sua aparição tardia nas páginas de jornais e de revistas brasileiros -cerca de quinze anos após sua publicação na França-, não houve um desconhecimento do romance por parte da imprensa. Uma das primeiras menções ao romance dos Goncourt acontece em 2 de março de 1880, no jornal Gazeta de Notícias, em um breve parágrafo da continuação do artigo intitulado « As endemoniadas de hoje. Histeria e sonambulismo ». Trata-se da tradução de um longo texto de Charles Robert Richet (1850-1935), publicado entre 29 de fevereiro e 10 de março de 1880 no jornal carioca, no qual o médico francês tece uma série de considerações sobre distúrbios psicológicos observados no hospital da Salpetrière, em Paris, ao longo de três séculos. O romance dos irmãos Goncourt aparece nesse texto enquanto exemplo de representação dos sintomas de histeria em literatura:

Os srs. E. e J. de Goncourt contaram a história tocante, miserável, da pobre Germinie Lacerteux. Esta é verdadeiramente uma histérica: natureza inculta, apaixonada, ardente na dedicação e na infâmia, inteligência débil, joguete cego das paixões de que ela quase não tem consciência, e que a agitam como o vento balança os cata-ventos nos cumes dos edifícios (Gazeta de Notícias, 2 mar. 1880, p. 2).

Esta, que pode ser considerada uma das primeiras referências a Germinie Lacerteux na imprensa brasileira, adianta a maneira pela qual o romance será abordado pelos jornais e revistas dos últimos anos do Brasil Império e primeiros da República: um romance que representa um caso de histeria feminina na literatura. Sob esse ponto de vista, Germinie Lacerteux é mencionado na seção das « Publicações a pedido », do jornal maranhense Pacotilha, em 24 de fevereiro de 1884. Nessa ocasião, o romance é utilizado pelo advogado e escritor piauiense Higino Cunha (1858-1943) como argumento para inflamar ainda mais uma querela instaurada entre um certo escritor maranhense e seu conterrâneo chamado Georgiano Horácio Gonçalves. Apesar de ser difícil precisar quando a troca de farpas entre estes dois homens de letras começou, ao final de 1883 é possível identificar o que motivou tal polêmica: Higino Cunha, em seu panfleto intitulado Pro-veritate, havia feito uma crítica à pequena brochura de Georgiano Gonçalves, intitulada Páginas acadêmicas (1883), sobre a vida intelectual na Academia do Recife: « Tenho [Georgiano Gonçalves] aqui por mira unicamente provar a incompetência intelectual e moral do sr. Higino Cícero da Cunha para criticar as minhas Páginas acadêmicas, no seu Pro-veritate [...] » (Pacotilha, 31 dez. 1883, p. 2).

O debate, cada vez mais acalorado, muitas vezes se afasta do tema que o originou. É em um dos novos caminhos que a discussão toma que Germinie Lacerteux é mencionado, cumprindo a função de parâmetro de comparação para a personagem que dá nome ao poemeto « Judith », de autoria de Higino Cunha:

Agora o inverso. O mendigo sem pão nem teto, o criminoso dilacerado pelos remorsos, são ordinariamente os mais fervorosos devotos. A tia, que já nenhuma esperança alimenta de casar-se, isto é, de ser feliz, por isso que o casamento antolha-se às donzelas como a suprema felicidade, a tia, cujos órgãos vão se atrofiando cada dia e cujas energias vitais vão se enfraquecendo pouco a pouco, vai no confessionário entregar-se de corpo e alma aos conselhos do sacerdote, que em nome de Deus promete-lhe uma vida melhor. A rapariga infeliz pela fatalidade das coisas, sem pais, nem protetor, lutando com a mais dura adversidade, é naturalmente propensa para a religião. E, se além de tudo, encontra um padre amigo, que sabe tirar proveito daquela predisposição latente, ela esquece-se do mundo para cismar nos doces arcanos da eternidade. Tal era Judith. Germinie Lacerteux dos irmãos Goncourt achava-se quase no mesmo estado psicopatológico quando entregou-se aos mistérios do confessionário. Mas Germinie Lacerteux perdeu-se no abismo da prostituição, ao passo que Judith permaneceu sempre ilesa graças às influências hereditárias e à educação que recebeu « daqueles seres bons que deram-lhe a existência ». Aquela sucumbiu ao peso do infortúnio, esta encontrou um dia a felicidade « sob o teto feliz de teu gentil esposo ».

Do momento que sentiu-se ditosa no meio dos bailes e confortos da família, Judith « esqueceu-se do céu pensando na vida ».

Aí está em resumo todo o meu poemeto [...] (Pacotilha, 24 fev. 1884, p. 4).

A ideia de que Germinie Lacerteux seria um estudo de psicopatologia é igualmente retomada por Valentim Magalhães em longo artigo sobre o romance naturalista na França, que traduz e sintetiza as principais ideias contidas no livro L’Évolution naturaliste (1884), do polêmico escritor francês Louis Desprèz (1861-1885). Publicado na edição do dia 28 de setembro de 1884 da Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, o texto assinado por Magalhães parte da ideia de que, até meados do século xix, o romance era uma forma « esgotada », a fim de colocar em perspectiva a renovação do gênero a partir das produções de escritores como Honoré de Balzac, Gustave Flaubert, Émile Zola e os irmãos Goncourt. O texto insiste na ideia de que o romance, outrora « inútil depois de lido uma vez », passara a ser « sério, meditado, proveitoso, que se guarda na estante, que se estuda, que se lê muitas vezes » (Gazeta de Notícias, 28 set. 1884, pp. 1-2). É após esse texto que as ideias contidas no primeiro prefácio de Germinie Lacerteux, sobretudo no que diz respeito ao gênero romance, começam a aparecer no campo literário brasileiro de maneira mais pronunciada:

Há 20 anos diziam os Goncourt que o romance começava a ser a grande forma séria, apaixonada, viva, do estudo literário e da investigação social, que ele se tornava pela análise e pela inquirição psicológica -a História moral contemporânea que, havendo chamado a si os estudos e deveres científicos, reivindicava para si as liberdades e franquezas da ciência (Germinie Lacerteux; prefácio) [...] (Gazeta de Notícias, 28 set. 1884, pp. 1-2).

Ao final da década de 1880, coexistem duas formas de referenciar Germinie Lacerteux na imprensa brasileira. A primeira delas se dá por meio de notícias e sínteses de críticas feitas na imprensa francesa à adaptação do romance para o teatro. O Diário de Belém de 24 de outubro de 1888 avisa àqueles que « tiverem a sorte de passar o inverno de 1888 a 1889 em Paris » que a peça em dez quadros adaptada por Edmond de Goncourt estaria em cartaz no Odéon. Em 4 de março do ano seguinte, a Gazeta de Notícias adverte que a adaptação do romance dos Goncourt havia sido um « fiasco » e, no dia 18 de outubro daquele ano, o Jornal do Commercio do Rio de Janeiro lembra que « a terceira representação de Germinie Lacerteux tivera lugar perante um público composto de bancos vazios » devido a uma crítica de Jules Prével. Uma notícia sobre a representação da adaptação do romance na França, da Gazeta de Notícias do dia 4 de março de 1889, recupera a obra que lhe deu origem e insiste na questão patológica da personagem:

Germinie Lacerteux é um dos mais pungentes entre os dolorosos romances dos Goncourt. Talvez mesmo o mais doloroso, porque é o mais humilde e desconsolado. É a história de uma criatura a quem foi dada, por único legado de miséria, uma dose excessiva de affectiveness. No animal bruto isso é um instinto de aproximação, amparo e defesa, corolário ou manifestação do instinto da conservação individual ou específica. No homem, o instinto transformado em sentimento atua em bem da espécie, prejudicando o indivíduo. Amar é viver em outrem ou por outrem. Porém quem vive demais em outrem, vive menos em si. O amor afetando essa agudeza de manifestação chama-se paixão, é um desequilíbrio e constitui um estado patológico (Gazeta de Notícias, 4 mar. 1889, p. 2).

A segunda forma pela qual Germinie Lacerteux se fez presente nas páginas da imprensa brasileira foi a constante recordação da representação de um caso de histeria em literatura: « Germinie Lacerteux, a humilde criada, vítima inconsciente de um temperamento de histérica » (O Paiz, 9 set. 1885, p. 2).

As poucas referências ao romance dos irmãos Goncourt lançam mão de um léxico ligado à ciência, relacionando com certa constância a obra à ideia de estudo. É o caso do artigo publicado que sintetiza as obras dos irmãos Goncourt, publicado no Diário de Pernambuco em 17 de dezembro de 1885 -« notável romance, cuja aparição produziu grande ruído no mundo literário, devido às suas penetrantes observações e análises psicológicas »- e dos « Apontamentos esparsos » da Quinzena de 16 de abril de 1888 -« Em Germinie Lacerteux, dos Goncourt, o mal físico só se revela pelos seus efeitos, determinando as ações da paciente, subjugando a cada instante a razão, nada de anatomia, de dissertação fisiológica ».

Se, por um lado, Germinie Lacerteux não contou com críticas na imprensa brasileira, as menções e referências ao romance permitem apreender em alguma medida como esse romance se afigura no imaginário do meio letrado. No Brasil, seria um romance fruto de observação e de documentação, que se apresenta como um estudo de um caso de psicopatologia feminina, cuja composição seria facultada pelo gênero romance. Isso aponta para algumas ideias defendidas pelos irmãos Goncourt no prefácio de 1865, que, nas últimas décadas do século xix, prolongam-se no campo literário brasileiro por meio de citações, em 1887 em prefácio de Marques de Carvalho, e, em 1897, em prefácio de Valentim Magalhães. Antes, porém, em 1886, surge « Uma página dos irmãos Goncourt », tradução de um excerto do romance.

4.2 « Uma página dos irmãos Goncourt »: a tradução de Germinie Lacerteux

A evocação de Germinie Lacerteux na imprensa brasileira, por ter sido esporádica e dispersa, não foi suficiente para que houvesse um investimento em tradução para o português do Brasil -uma tradução para o português de Portugal que tivesse chegado ao Brasil tampouco teria sido realizada. A circulação de Germinie Lacerteux em língua portuguesa no campo literário brasileiro se restringiria, assim, à tradução de parte do capítulo 37 e de todo o capítulo 38, na edição do dia 18 de setembro de 1887 do jornal maranhense Pacotilha.

Ocupando pouco mais de duas colunas da parte superior da segunda página do jornal, essa tradução dividiu o espaço da folha com « Os jornais », rubrica que dava conta das publicações de outras folhas, com os « Boatos », sobre temas diversos, com as « Publicações a pedidos », que trazia um longo artigo sobre espiritismo, e com um anúncio da programação de devoção à N. sra. do Livramento. Já na seção folhetim daquela edição, o leitor podia ler a tradução do capítulo 5 do romance A morta (La Morte, 1886), de Octave Feuillet (1821-1890), no qual o conde Vaudricourt vai a cavalo suplicar ao dr. Tallevaut que este operasse sua filha doente.

Apesar de não ser possível precisar certas informações sobre a tradução de Germinie Lacerteux, como o nome do tradutor, o conjunto de elementos que a cerca pode esclarecer mais alguns aspectos sobre a recepção desse romance no Brasil. É o caso, por exemplo, do que poderia ter ocasionado o interesse de se traduzir um trecho de Germinie Lacerteux em 1886. Sem descartar a possibilidade de que este tenha sido um evento fortuito, ao se confrontar as datas de publicação do excerto traduzido com as datas das reedições do romance na França, é possível levantar a hipótese de que essa tradução tenha sido animada pelo lançamento de uma reedição, na primeira semana de junho de 1886, na coleção Chefs-d’œuvre du roman contemporain3 da editora Quantin -a mesma edição na qual Edmond inclui o que chamei anteriormente de prefácio-documento:

Boletim bibliográfico Foram lançados esta semana:

Pela editora Quantin -Germinie Lacerteux, por J. e E. de Goncourt, edição ilustrada com dez composições de Jeanninot, gravadas em água-forte por Muller, destacadas do texto; volume da bela coleção « as Obras-primas do romance contemporâneo » [...] (Le Temps, 7 jun. 1886, p. 3)4.

A tradução do excerto de Germinie Lacerteux no Pacotilha aparece cerca de três meses após a publicação da reedição do romance na França, refletindo certo alinhamento do periódico com as últimas novidades de Paris. O mesmo ocorre com o romance A morta, de Octave Feuillet que estava sendo publicado na seção folhetim do jornal maranhense e que havia aparecido na França, na Revue des Deux Mondes, entre 15 de dezembro de 1885 e 15 de janeiro de 1886, e em livro pela editora Calmann-Lévy, em fevereiro de 1886 -tendo mais de setenta reimpressões em menos de um ano. A escolha de se traduzir apenas um excerto do romance dos irmãos Goncourt e o romance de Feuillet em sua íntegra fica, então, mais manifesta. Enquanto o primeiro, à época, era a reedição de um romance de autores de escândalo e de relativo sucesso no campo literário francês, o segundo era um escritor que, desde 1862, publicava sob a chancela da Academia Francesa, com uma obra consolidada junto ao público feminino, e celebrado no âmbito da crítica, fatores que se expressam no êxito de vendas do título na França.

Ainda que a imprensa brasileira não mencione ideias marcadamente presentes nas críticas francesas de Germinie Lacerteux, algumas concepções sobre o romance ecoaram no campo literário brasileiro. Enquanto na França ele foi considerado um romance que procede por meio de uma escrita orientada por questões que transcendem os valores morais correntes e por um certo cientificismo que despertava em literatura à época de seu lançamento, no Brasil, essas imagens se projetam, em alguma medida, nas poucas referências ao romance na imprensa, como na tradução do texto de Charles Richet e no já mencionado debate entre Higino Cunha e Georgiano Gonçalves. A escolha de se traduzirem os capítulos 37 e 38 do romance, por sua vez, oferece ao leitor brasileiro uma amostra dessas ideias em seu conjunto.

Esse trecho da narrativa traz mais um dos episódios de obediência irrestrita de Germinie a Jupillon, homem mais novo a quem entregava suas economias em troca de relações carnais. Àquela altura da narrativa, Germinie já não tinha dinheiro algum. Após Julillon lhe pedir 10 francos, ela os rouba das economias de Madame de Varendeuil, sua patroa. Essa passagem do romance, entretanto, não parece ter sido escolhida ao acaso, pois ela dá conta, por um lado, do deslumbramento de Germinie por Jupillon, que a impelia à perversão moral e se opunha aos princípios cristãos que balizavam os valores da época: « [Germinie] atraía-o à força de presentes [...], comprava-lhe a amabilidade satisfazendo-lhe os caprichos e fantasias, pagava aquele homem que negociava com as carícias que devia fazer e pedia gorjetas ao amor » (Pacotilha, 18 set. 1886, p. 2). Por outro lado, o excerto traduzido aponta para o caráter depravado de Jupillon, que se aproveitava da compleição à indulgência de Germinie: « Jupillon podia fazer dela o que quisesse, insultá-la, dar-lhe pancada, ela ficaria sempre debaixo de seus tamancos! » (Pacotilha, 18 set. 1886, p. 2). A tradução parcial de Germinie Lacerteux no Brasil coloca em evidência, assim, uma concepção de que a trama do romance traria uma relação de causa e efeito, na qual a condição de histérica motivaria as ações de Germinie, que desafiavam os princípios de decência correntes no século xix, passíveis de serem representadas na literatura porque se apresentam sob a forma de « estudo » -termo recuperado por Marques de Carvalho e por Valentim Magalhães nos prefácios de seus respectivos romances, O pajé e Flor de sangue.

4.3. « A grande forma séria » e os romances O pajé e Flor de sangue

Em 1887, um excerto do primeiro prefácio de Germinie Lacerteux é citado pelo homem de letras e diplomata paraense Marques de Carvalho no prefácio do romance O pajé, e, dez anos depois, em 1897, pelo escritor carioca Valentim Magalhães, no prefácio do romance Flor de sangue. Ambos os escritores se valem em alguma medida do mesmo trecho do primeiro prefácio do romance dos irmãos Goncourt:

O pajé

[...] Ele (o público), é apaixonado pelas obrinhas brejeiras, pelas memórias de prostitutas, pelas porcarias eróticas, pelo escândalo que uma estampa ostenta nas vitrines das livrarias -e aquilo que vai ler é severo o puro. Que não espere a fotografia decotada do Prazer: o estudo que aí vai é a clínica do Amor.

...e com a sua triste e violenta distração, este livro foi feito para contrariar-lhe os hábitos e prejudicar-lhe a higiene.

Agora, que seja caluniado este livro, pouco lhe importa. Hoje que o Romance alarga-se e cresce; hoje que começa a ser a grande forma séria, apaixonada, viva, do estudo literário e da inquirição social; hoje que se muda, pela pesquisa psicológica e pela análise, na História moral, contemporânea, hoje que o Romance tomou sobre si os estudos e tarefas da ciência, pode reivindicar as liberdades e franquezas dela (A República, 18 jan. 1887, p. 3).

Flor de sangue

[...] Hoje, que o romance se alarga e cresce, que vai sendo a grande forma séria, apaixonada, viva, do estudo literário e do inquérito social, que se vai tornando, pela análise e pela pesquisa psicológica, a História moral contemporânea, hoje que o romance se impôs aos estudos e aos deveres da ciência, ele pode também reivindicar suas liberdades e privilégios (Magalhães, 1897, p. xiv).

É possível observar, nesses excertos traduzidos uma expressão basilar para a argumentação de Marques de Carvalho e de Valentim Magalhães que parece importante de ser interpretada. Assim como fizeram os irmãos Goncourt -« Aujourd’hui que le Roman s’élargit et grandit, qu’il commence à être la grande forme sérieuse… » (Goncourt, 1865, p. xii)-, a evocação da « grande forma séria5» nos prefácios dos escritores brasileiros pode ser compreendida como uma maneira de chamar a atenção para a prosa -em oposição ao verso- e de reconhecê-la enquanto expressão literária de grande penetração durante a segunda metade do século xix. O termo « séria », utilizado para caracterizar essa prosa literária, por sua vez, parece se referir à interface da literatura com a medicina, a « clínica », por seu método pautado na observação e na tomada de notas, dentro de uma hierarquia de gêneros literários. A obra dita « séria », de acordo com os irmãos Goncourt no prefácio de Germinie Lacerteux -e consequentemente com Marques de Carvalho e Valentim Magalhães- seria, então, aquela que lançou mão de métodos analíticos da medicina para representar disposições e atitudes de qualquer ordem, apoiando-se em uma certa imparcialidade do discurso científico. E, nesse sentido, a « seriedade » da obra residiria em sua elevação ao nível de « estudo », que a liberaria de certos julgamentos da crítica. É sob essa perspectiva que procede a escrita de O pajé e de Flor de sangue. Uma leitura detida dessas obras, contudo, revelará que cada romance se vale de diferentes interpretações da ideia de « grande forma séria ».

Já nas primeiras linhas do prefácio de O pajé, Marques de Carvalho reclama para si o pioneirismo em escrever um estudo « fisiopsicológico » nas letras paraenses. Trata-se, segundo o escritor, de deixar de lado os « abusos » e a « prolixidade » do romantismo e orientar-se por uma escrita baseada em documentos humanos e pela tomada de notas (A República, 18 jan. 1887, p. 3). Isso significa inserir-se em um grupo de escritores da então província do Grão-Pará e Rio Negro, e confrontá-lo. O levantamento feito por Silva (2020) sobre a produção de romances de escritores radicados em Belém e publicados na seção folhetim de jornais da capital paraense dá uma ideia dos títulos e autores aos quais Marques de Carvalho, ao menos em parte, contrapunha-se: O homem das serenatas(1882), de Paulino Brito (1858-1919); Por causa de uma loucura(1882), de Teodorico Magno (1866-1885); Através do desconhecido: o romance da terra(1883), de Múcio Javrot (?-1904); e Um lazaro moral (esboço realista)(1884), de Paulino Brito; e Maria Clara, de Pontes de Carvalho (?-?). Os dados levantados por Silva revelam que, de modo geral, esses romances lançam mão de recursos narrativos característicos dos romances escritos para a seção folhetim, como efeitos de suspense e peripécias, assim como dos melodramas, com a tipificação exagerada de personagens. Nesse sistema de referências literárias, O pajé se define, em primeiro lugar, pela oposição a outros romances de escritores paraenses que Marques de Carvalho, em busca de legitimação no campo literário, visava superar, em um desafio cínico a seus predecessores.

Em vista disso, Marques de Carvalho enuncia, no segundo parágrafo de seu prefácio, o modo pelo qual O pajé diferiria dos romances paraenses que o precedem: « À força de muito labutar consegui levantar uma obra sobre ‘documentos humanos’ autênticos e notas tomadas longa e pacientemente em diversos lugares e épocas » (A República, 18 jan. 1887, p. 3). Os documentos humanos, aos quais Marques de Carvalho se refere, parecem remeter ao parágrafo final do segundo prefácio de Germinie Lacerteux, no qual Edmond, após uma longa reprodução de passagens de seu diário, as descreve como o « embrião documental » do que veio a ser o romance que escreveu em parceria com seu irmão (Goncourt, 1886, p. xix). Entretanto, é no primeiro prefácio do romance dos irmãos Goncourt que Marques de Carvalho encontrará as duas ideias fundamentais de seu próprio prefácio. A primeira diz respeito à antecipação de possíveis represálias de detratores de seu romance, assim como fizeram os irmãos Goncourt no prefácio de 1865: « Tenho quase que uma certeza dos ataques violentos que me vão ser dirigidos pelos conservadores românticos » (A República, 18 jan. 1887, p. 3). A segunda ideia é a de que, para responder às prováveis críticas negativas, é preciso demonstrar que O pajé é um romance que procede por um método de escrita científico, que se vale dos referidos documentos humanos. A citação da passagem do primeiro prefácio de Germinie Lacerteux aparece, assim, para desempenhar uma função tanto de « remate » para o prefácio de O pajé, como assinala Marques de Carvalho, quanto de fiador para seu romance, amparando-se provavelmente no capital simbólico dos irmãos Goncourt no campo literário brasileiro.

Estudos recentes sobre O pajé não discutem a importância dessa citação no prefácio do romance e, às vezes, parecem não a reconhecer enquanto um valor. Ferreira Barbosa (2011) observa que a citação do primeiro prefácio de Germinie Lacerteux -ainda que o romance não seja nomeado pelo autor- « empresta argumentos » ao prefácio de O pajé, sem se aprofundar no assunto. Silva e Sales (2012), por sua vez, consideram que essa citação seria para o escritor um modo de demonstrar seu conhecimento dos « princípios naturalistas », o que o enquadraria « no grupo de romancistas eruditos e sábios » (pp. 112-113). Silva (2021), observa ainda que «O pajé representa a virada de Marques de Carvalho a favor da ‘escola literária dos documentos humanos’ » (p. 510), sem se referir à citação do prefácio de Germinie Lacerteux.

Mais do que isso, a citação do prefácio dos irmãos Goncourt cria uma via de mão dupla para o reconhecimento, na qual o escritor paraense usufruiria do capital simbólico dos escritores franceses e, estes garantiriam mais uma forma de circulação no campo literário brasileiro. Seria uma estratégia de gerenciamento da projeção de Marques de Carvalho -e em alguma medida a dos irmãos Goncourt- no campo literário brasileiro, ou pelo menos no raio de atuação do escritor paraense enquanto agente desse campo. Finalmente, a citação do prefácio dos irmãos Goncourt, na qual a ideia de « grande forma séria » é central, circunscreve O pajé a uma estética ligada à modernidade em literatura à época, isto é, ao romance naturalista. É com esta concepção que Marques de Carvalho procede na escrita de seu romance, alternando uma certa ironia com uma perspectiva estética preconizada no prefácio de Germinie Lacerteux. Trata-se da simulação do discurso científico, na voz do personagem do médico, e da aplicação de um método científico, o da « inquirição social » (« enquête sociale ») (A República, 18 jan. 1887, p. 3), na voz do narrador.

Antes será preciso notar que, tanto no título do romance quanto em seu prefácio, o escritor aponta para um possível protagonismo do pajé: « Desejei fazer um romance que fosse simplesmente um estudo fisiopsicológico desse personagem [o pajé] astucioso e hipócrita que é o terror dos espíritos fanáticos do povo de minha província » (A República, 18 jan. 1887, p. 3). Contudo, este personagem não aparece ao longo da narrativa, certamente pelo fato de o romance não ter sido finalizado pelo escritor, havendo não mais do que uma menção a « Pedro, o pajé do Surubiú » (A República, 20 fev. 1887, p. 3).

É verdade que o estudo fisiopsicológico sobre o personagem pajé, anunciado no prefácio do romance, não ocorre. Entretanto, um estudo é de fato realizado, tendo como objeto a personagem Generosa (ou somente Rosa):

Um ano antes da cena que abre este volume-, em 1884, Generosa entrou a ficar magra e pálida, a sentir atordoamentos súbitos, que tiravam-lhe a vista por instantes, nos quais umas invencíveis náuseas lhe agitavam o estômago: perdeu o apetite, a vontade de rir e brincar. O velho Mathias, já curvado à carga de sessenta e quatro anos, sentiu um golpe dolorosíssimo no grande amor que tinha à filha; teve uns pressentimentos indefinidos de desgraças futuras e apressou-se a chamar um médico de sua confiança para inspecionar lhe a Generosa (A República, 21 fev. 1887, p. 3).

Adalgiso da Costa, médico da cidade, está longe de ser aquele que protagonizará um embate, junto ao pajé Pedro, sobre a ciência em oposição a métodos alternativos ou crendices populares. Pelo contrário. No romance há uma eufemização do discurso do médico, que torna seus diagnósticos menos precisos e fragiliza sua legitimidade enquanto profissional da saúde: « - Pois bem, disse o médico, ainda com os temores pudibundos enchendo-lhe as frases de reticências, sua filha tem um leve desarranjo nas máquinas vitais... Um leve incômodo... sintomático de... de transições naturais a que está sujeita uma menina! » (A República, 21 fev. 1887, p. 3). O médico, figura que em princípio tem liberdade para abordar certos temas, evita nomear a menarca de Rosa, relegando o caráter científico do romance ao narrador:

Dois meses depois, Generosa estava restabelecida. Daquela criança robusta, mas criança apenas, formava-se uma donzela em toda a sua voluptuosa opulência de encantos e mistérios. O colo, ainda um tanto baixo, adquirira, contudo, essa elevação suave, essa rotundidade esplêndida que formam os seios nascentes [...]. No ano seguinte, a Rosa [...] estava mais bela ainda. Os seios assumiram o volume proporcional, o corpo tomou a flexibilidade da mulher quase em seu todo desenvolvimento, nuns contornos da mais apurada estética, as feições acentuaram as suas linhas, produzindo um dos rostos mais lindamente encantadores do Pará (A República, 21 fev. 1887, p. 3).

Está claro o bom manejo, por Marques de Carvalho, de concepções estéticas presentes nos textos antepostos a Germinie Lacerteux, que em parte corroborariam a filiação de O pajé a um certo naturalismo que o prefácio dos irmãos Goncourt inaugura. A citação de um excerto deste prefácio é, contudo, condição e produto das ideias defendidas no prefácio de O pajé, fornecendo a base de sua argumentação, ao mesmo tempo que é imprescindível para sustentá-la. Isso significa que a evocação do prefácio de Germinie Lacerteux está a serviço de uma consolidação da relação de O pajé com o naturalismo dos irmãos Goncourt, que assumem o papel de fiadores desta obra.

Em 1897, quando Valentim Magalhães publica Flor de sangue, é possível constatar procedimentos de referenciação semelhantes àqueles já observados em O pajé, mas que, entretanto, guardam suas especificidades. O prefácio do romance de Valentim Magalhães, mais extenso e mais robusto em referências a outros homens de letras, congrega alguns escritores já consagrados. Trata-se não somente dos irmãos Goncourt, mas também dos franceses Marcel Prévost (1862-1941) e Paul Bourget (1852-1935) -este último contando com diversas menções e com uma longa citação do prefácio de seu romance Physiologie de l'amour moderne(1890)- e do português Guerra Junqueiro (1850-1923). Valentim Magalhães não somente apresenta suas afinidades literárias, como também evoca figuras detentoras de um discurso de autoridade no campo literário -« Estou bem apadrinhado, como veem » (Magalhães, 1897, p. xix)-, cada uma cumprindo certa função em sua argumentação. Junqueiro é aquele que traz uma reflexão sobre o público ao qual são destinadas determinadas leituras. Prévost traz uma crítica a seus precursores, ao afirmar que a literatura abranda as representações de sua época. Bourget, finalmente, é apresentado como aquele que traz uma reflexão moderna sobre a moralidade na literatura e, por esse motivo, tem autoridade para contestar uma parcela mais conservadora da crítica. Resta ainda saber a serviço de que interesses o prefácio de Germinie Lacerteux foi citado, no prefácio de Flor de sangue.

Antes, porém, é preciso esclarecer a concepção de Valentim Magalhães sobre a « grande forma séria » que sustenta em grande parte a argumentação de seu prefácio. Essa ideia aparece logo nos primeiros parágrafos do texto, quando o escritor retoma as críticas feitas à sua atuação nas letras brasileiras, sobretudo na imprensa que, segundo ele, não escondiam seu « pesar » pelo fato de o escritor ainda não ter produzido uma « obra de fôlego » ou um « trabalho sério », isto é, « um poema, um romance, um livro de crítica profunda » (Magalhães, 1897, p. viii). A ideia de « grande forma » ganha, assim, novos contornos, abarcando não somente a prosa, mas também o verso. O caráter « sério », no que lhe diz respeito, estaria ligado à profissionalização do homem de letras, não como escritor, mas como jornalista, que pratica gêneros mais curtos e sob encomenda:

O tempo que me deixavam livre as ocupações de que provinha o pão quotidiano e o meu estado de saúde, precário sempre, chegava apenas para escrever o conto, a notícia crítica, a crônica faceta, o artiguinho diário a que me comprometera em um ou vários jornais; não havia possibilidade de realizar o meu sonho, satisfazendo a exigência dos críticos -escrever uma obra de fôlego (Magalhães, 1897, p. viii).

A « grande forma séria », para Valentim Magalhães, deixa de ser relacionada somente a um gênero, o romance, e passa a compreender igualmente a poesia e a crítica, condicionando seu caráter sério não somente a seu método de observação e de escrita, mas também à extensão, a « obra de fôlego ». É nesse sentido que Valentim Magalhães procede em Flor de sangue.

Não parece ser por acaso que a última cena do romance congregue um cronista, um poeta e um romancista, cada um representando uma das facetas do homem de letras evocado no prefácio do romance. O romancista aparece como o personagem que conhece o passado de Corina, cuja história, segundo ele, « [daria] decerto matéria para um romance de primeira ordem » (Magalhães, 1897, pp. 381-382). O personagem do romancista demonstra ainda a intenção de representar em um romance Corina -mulher casada da alta sociedade carioca, que havia se envolvido com Paulino, médico recém-chegado de Paris e amigo de seu marido- e de dar-lhe o título de Flor de sangue. Essa representação de um personagem romancista retoma, resume e, em alguma medida, ratifica a ideia apresentada por Valentim Magalhães em seu prefácio de que Flor de sangue é um romance fruto de observação: « Todos os tipos que nele fiz mover-se, e não sei se viver, encontrei-os na vida social, não só fluminense, não só brasileira, mas de todos os países » (Magalhães, 1897, pp. x-xi).

Valentim Magalhães, ao construir a apresentação de seu romance, a fim de responder previamente a certos questionamentos da crítica, o distancia de tendências em voga na literatura à época: « Não resolvi fazer um romance naturalista, nem de aventuras, nem de psicologia, nem simbolista, nem idealista; resolvi simplesmente fazer um romance » (Magalhães, 1897, p. x). Isto é, a concepção de romance de Valentim Magalhães não passaria pelo romance naturalista, provavelmente por seu caráter escandaloso, tampouco pelas formas já gastas de romances folhetinescos ou das formas mais modernas à época, ainda em busca de legitimação.

É nesse contexto que os irmãos Goncourt são evocados enquanto figuras de autoridade e a citação de Germinie Lacerteux aparece no prefácio de Flor de sangue. Algumas linhas mais adiante, Magalhães acrescenta que se o interpelassem, diria que seu romance é filiado à « escola da verdade », « a única, que como os Goncourt, [acredita] real e fecunda em Arte » (Magalhães, 1897, p. x). A citação do trecho do prefácio de Germinie Lacerteux, por sua vez, é apresentada como « a razão mais poderosa para que o romancista desdenhe preocupações de moralista banal » (Magalhães, 1897, p. xiv). Nesse sentido, é possível interpretar as menções feitas por Valentim Magalhães aos irmãos Goncourt como uma maneira de o escritor justificar a representação de atitudes de seus personagens que a moral da época condenaria, sob a chancela de nomes já consagrados no campo literário.

Pesquisas recentes sobre Flor de sangue, assim como ocorre com O pajé, têm identificado a citação do prefácio de Germinie Lacerteux como um elemento que desempenha algum papel na argumentação presente no prefácio do romance de Valentim Magalhães. É o caso de Cano (2011), em seu artigo sobre o romance Dom Casmurro(1899), de Machado de Assis, que traz uma trama semelhante à de O pajé: « Sempre estribado em Goncourt, Magalhães encontrava reunidos no romance o estudo literário, o inquérito social, a pesquisa psicológica e a própria ‘história moral contemporânea’ » (p. 93). Mesmo sem se aprofundar nessa questão, que não faz parte de seu objeto de estudo, Cano (2011) reconhece a função da citação do prefácio de Germinie Lacerteux enquanto representante de um valor estético ligado à prosa. Halaburda (2020), por usa vez, faz uma leitura diferente e observa a citação do prefácio como uma maneira que Valentim Magalhães encontrou para representar sua « visão do papel social do romance ». O autor afirma: « Inspirado pelos Goncourt, Magalhães viu o romance como uma forma narrativa capaz de compartilhar a autoridade da ciência para estudar o campo social brasileiro e criar um cidadão modelo » (Halaburda, 2020, p. 167). O reconhecimento de um caráter pedagógico no romance e o alargamento da ideia de estudo parece não proceder, pois ignora as convenções no interior das quais O pajé foi escrito e os valores estéticos que o sustentavam.

5. Conclusão

Durante os onze anos que separam a escrita e publicação do primeiro e do segundo prefácios de Germinie Lacerteux, a posição que os irmãos Goncourt ocupavam no campo literário francês mudou significativamente. O gênero romance se tornou uma espécie de estandarte dos valores estéticos que esses escritores defendiam na prosa, o que chamou a atenção da crítica e os aproximou de outros agentes do campo literário francês com valores semelhantes, dentro de uma lógica de reconhecimento dos pares. Os prefácios de Germinie Lacerteux, dando conta da visão de Edmond e Jules de Goncourt sobre esses valores, ocupou um lugar relativamente central nas discussões sobre literatura não somente na França, mas também no Brasil.

A circulação de Germinie Lacerteux no Brasil, ainda que bastante comedida, garantiu a inclusão do prefácio de sua primeira edição no campo literário brasileiro enquanto uma espécie de conjunto de preceitos e exemplos de concepções sobre o romance moderno. Assim, Marques de Carvalho e Valentim Magalhães traduzem e citam esse prefácio, cada um à sua maneira, em romances que parecem ter sido escritos balizados pelas ideias expressas no texto anteposto pelos irmãos Goncourt ao romance. A citação do prefácio de Germinie Lacerteux nos prefácios de O pajé e de Flor de sangue é, ao mesmo tempo, um caso representativo e particular do poder de consagração no campo literário. Por um lado, o efeito de se colocar um excerto do prefácio dos irmãos Goncourt nos prefácios destes romances brasileiros é, em grande medida, semelhante àquele em que um escritor consagrado redige e assina o prefácio de um autor mais jovem, que por sua vez o consagra como mestre ainda relevante para um grupo de agentes (Bourdieu, 1996, p. 260). Por outro lado, este não é o caso exato, pois os irmãos Goncourt -ou somente Edmond- não tiveram uma participação ativa na escrita do prefácio dos escritores brasileiros. Contudo, é inegável que a citação do prefácio do romance dos irmãos Goncourt, em razão de seu valor fiduciário reconhecido somente na e pela estrutura relacional própria dos campos literários, indique um reconhecimento de uma posição central dessa obra nas discussões estéticas ligadas ao naturalismo. Não por acaso a vemos enquanto fiadora de um discurso que sai em defesa da « grande forma séria » enquanto « estudo », em O pajé, e « romance moderno », em Flor de sangue.

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Vicaire, G. (1895). Manuel de l'amateur de livres du xix e siècle (1801-1893). T. iii. A. Rouquette. [ Links ]

1.« 17 janvier [1865] - Notre Germinie Lacerteux a paru hier » [« 17 de janeiro de 1865 - Nosso Germinie Lacerteux foi publicado ontem »] (Goncourt, 1989, p. 1131).

2. « [...] une existence inconnue, odieuse, répugnante, lamentable ».

3. Essa coleção, além de ser composta por volumes de encadernação ricamente ornada, que comumente traziam em seu interior dez gravuras, contava com títulos de autores de relativo sucesso à época de seu lançamento. A lista de títulos que Georges Vicaire reúne no terceiro tomo de seu Manuel de l'amateur de livres du xix e siècle (1801-1893) (1895) revela que a coleção da Editora Quantin congregava diferentes gerações de escritores, com concepção diversas do gênero romance: Cinq-Mars(1826), de Alfred de Vigny; Le Père Goriot(1835) e La Cousine Bette(1846), de Balzac; Mauprat(1837) e La Mare au diable(1846), de George Sand; Gerfaut (1838), de Charles de Bernard ; Raphaël(1849), de Alphonse de Lamartine; Madame Bovary(1857) e Salambô (1862), de Flaubert; Germinie Lacerteux (1865), dos irmãos Goncourt ; Monsieur de Camors (1867), de Octave Feuillet; Sapho(1881), de Alphonse Daudet; Monsieur le Ministre (1881), de Jules de Claretie.

4. « Bulletin bibliographique. Ont paru cette semaine : Chez Quantin - Germinie Lacerteux, par J. et E. de Goncourt, édition illustrée de dix compositions par Jeanninot, gravées à l’eau-forte par Muller, tirées hors-texte ; volume de la belle collection ‘les Chefs-d’œuvre du roman contemporain’ […] ».

5. O cotejo entre os primeiros prefácios de Germinie Lacerteux, publicados em 1865 e em 1886, permite observar uma revisão feita por Edmond de Goncourt, que suprime o adjetivo « grande » em 1886, o que me permite presumir que Marques de Carvalho e Valentim Magalhães tenham lido a edição de 1865.

*Cómo citar: Figueira Gama, Z. M. (2023). O prefácio antes do romance: Germinie Lacerteux no Brasil. Lingüística Y Literatura, 44(84), 231-251. https://doi.org/10.17533/udea.lyl.n84a10

Recebido: 03 de Outubro de 2022; Aceito: 02 de Dezembro de 2022

*Autor para correspondência: Zadig Mariano Figueira Gama, e-mail: zadiggama@id.uff.br

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