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Semestre Económico

Print version ISSN 0120-6346On-line version ISSN 2248-4345

Semest. Econ. vol.12 no.23 Medellín Jan./June 2009

 

A atuação das elites políticas regionais e sua repercussão no desenvolvimento do Planalto Médio Gaùcho no Brasil, 1930-1945*

 

The action of regional political elites and its impact in the development of la Meseta Media Gaucha in Brasil, 1930-1945

 

La acción de las elites políticas regionales y su repercusión en el desarrollo de la Meseta Media Gaucha en el Brasil, 1930-1945

 

 

Maria Eloisa Cavalheiro**

** Graduada em Administração de Empresas; Especialista em Mercosul e Desenvolvimento Regional; Mestra em História Regional, Universidade de Passo Fundo (UPF) e Doutora em Desenvolvimento Regional, Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). Docente e Pesquisadora da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Grupo de pesquisa Agronegócio. Rua João Rosa Góes, n° 835, apto. 1104, Cep: 79804020, e-mail: mecavalheiro@yahoo.com.br; mariacavalheiro@ufgd.edu.br.

 

 


Resumo

Este artigo procurou demonstrar como as elites políticas regionais gaúchas atuaram no cenário da é poca abrangendo um recorte temporal entre os anos de 1930 a 1945. Efetuou-se uma abordagem referente aos fatores sociais, políticos e econômicos que possibilitaram o desenvolvimento e ou crescimento dessa região, preenchendo as lacunas deixadas pela história nacional com documentos, notícias, notas e inserções que demonstram as particularidades e a identidade local. Ainda analisamos através dos coeficientes locacionais as potencialidades dos municípios de Passo Fundo e Carazinho, e com base no Censo de 1940 elencamos os fatores de especialização em nível regional e local. Concluiu-se que as elites políticas faziam parte do contexto institucional de modo direto ou indireto, e davam suporte ao governo, especialmente ao federal, ao passo que as elites econômicas atuavam nos diversos segmentos da sociedade, destacando-se em diferentes ocupações e profissões.

Palavras-Chave

Economia do Setor Público; regional desenvolvimento; historia do regional desenvolvimento; análises do regional desenvolvimento. Classificação JEL: H80; N96; O18; R11

Conteúdo

Introdução; 1. Aspectos metodológicos; 2. As decisões políticas -nacional e estadual- e seu alcance econômico no estado do rio grande do sul; 3. As decisões políticas e o alcance econômico no município de passo fundo; 4. As decisões políticas e o alcance econômico no município de carazinho; 5. Especialização: análise do desenvolvimento econômico no rio grande do sul, carazinho e passo fundo com base no censo de 1940; 6. Conclusão; bibliografia.


Abstract

This article intends to demonstrate how “gaucho” regional political elites had an incidence in the arena of the epoch between 1930 and 1945. Social, political and economic factors which made the development and growth of the region possible were tackled. They filled the gap left throughout national history with documents, news, and notes, which demonstrate particular events and local identity. At the same time, through location coefficients, the potentiality of Passo Fundo, and Carazinho municipalities was analyzed, and based on 1940 census, specialization factors at regional and domestic level are related. It was concluded that political elites belonged to the institutional context in a direct and indirect way, and supported the government, specially the federal one, while economic elites acted in different segments of society, outstanding in several occupations and professions.

Key Words

Public sector economy, regional development; history of regional development; analysis of regional development. JEL Classification: H80; N96; O18; R11

Content

Introduction 1. Methodological Aspects 2. National and State Political Decisions. and their Economic Scope in Rio Grande del Sur State. 3. Political Decisions and the Economic Scope in Passo Fundo Municipality. 4. Political Decision and the Economic Scope in Carazinho Municipality; 5. Specialization: Analysis of Economic Development in Rio Grande del Sur, Carazinho, and Passo Fundo based on 1940 census; 6. Conclusion; Bibliography.


Resumen

Este artículo intenta demostrar como las elites políticas regionales gauchas incidieron en el escenario de la época entre 1930 y 1945. Se efectuó un abordaje referente a los factores sociales, políticos y económicos que posibilitaron el desarrollo y el crecimiento de esta región, llenando los vacios dejados por la historia nacional con documentos, noticias, notas e inclusiones que demuestran las particularidades y la identidad local. Al mismo tiempo, se analizó, a través de los coeficientes de localización las potencialidades de los municipios de Passo Fundo y Carazinho, y en base al censo de 1940 se relacionan los factores de especialización a nivel regional y local. Se concluyo que las elites políticas hicieron parte del contexto institucional de manera directa o indirecta, y daban soporte al gobierno, especialmente al federal, al mismo tiempo que las elites económicas actuaban en los diversos segmentos de la sociedad, destacándose en diferentes ocupaciones y profesiones.

Palabras Clave

Economía del sector público; desarrollo regional; historia del desarrollo regional, análisis del desarrollo regional. Clasificación JEL: H80; N96; O18; R11

Contenido

Introducción 1. Aspectos metodológicos 2. Las decisiones políticas –nacionales y estatales- y su alcance económico en el estado de rio grande del sur. 3. Las decisiones políticas y el alcance económico en el municipio de Passo Fundo 4. Las decisiones políticas y el alcance económico en el municipio de Carazinho; 5. Especialización: análisis del desarrollo económico en rio grande del sur, Carazinho y Passo Fundo en base al censo de 1940; 6. Conclusión; Bibliografía.


 

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem a finalidade de demonstrar como as elites políticas regionais atuaram no cenário da época abrangendo um recorte temporal entre os anos de 1930 a 1945. Nesse sentido, evidenciamos através da análise de dados com base nos jornais e documentos por entendermos que se constituem em fontes originárias na comprovação de como ocorriam e repercutiam às decisões políticas tomadas, na economia de Passo Fundo e Carazinho, a partir da prática política, bem como a forma como o poder econômico continuava a influenciar a tomada de decisão dos representantes do poder político.

Durante a Era Vargas, a economia cresceu e se transformou especialmente em relação aos setores agrícola, industrial e intervencionista do Estado, demonstrando que essa época se caracterizou pelo poder crescente de decisão e influência do estadista, confundindo-se com o conteúdo polêmico das políticas promovidas, que por sua vez, encontravam-se inseparáveis da discussão sobre o modelo de Estado que Vargas ajudou a implantar (Camargo, 1999, p. 13-14). Os sucessivos desdobramentos no recorte temporal apresentado têm nas ações econômicas, políticas e sociais praticadas pelos detentores do poder, conotações reveladoras de ações individuais que vinham ao encontro das tendências da época, como também revelam a forma como eram conduzidos os dilemas da sociedade em que viviam.

Não é sem motivo que Weber (1979, p. 10) estabeleceu diferenças entre a dominação carismática e a rotineira, destacando nas primeiras formas excepcionais de controle e de comando. O carisma, na visão marxista, seria provocado por situações socialmente instáveis, perturbadoras, em momentos de transição, de destruição ou decomposição das instituições, bem como de rápidas mudanças de estrutura. Nesse contexto, o líder pessoal, tal qual Vargas, atuou como uma força de coesão e unidade, ao criar, por um processo de transferência, a identidade entre o indivíduo e a sociedade, aliança do líder (Cutler, 1980). Diante da fragilidade social que gerou um estado de insegurança, devido à perda dos vínculos tradicionais, o líder é “afastado do homem comum e é tratado como se possuísse qualidades supernaturais, super-humanas, ou no mínimo excepcionais” (Camargo, 1999, p.14).

 

1. ASPECTOS METODOLÓGICOS

A área de estudo deste trabalho corresponde aos municípios de Passo Fundo e Carazinho, no Estado do Rio Grande do Sul do Brasil. Essa região do estudo pode ser considerada segundo IBGE (2005) homogênea, já que são áreas que agrupam, dentro de um mesmo Estado, municípios com características físicas, sociais e econômicas aproximadas. O procedimento metodológico adotado nesse estudo foi a pesquisa histórica. O procedimento técnico utilizado se deu pela pesquisa bibliográfica. Salientamos que a análise foi efetuada em fontes de obras principais que tratam direta e indiretamente do tema analisado, as fontes primárias. O recorte temporal foi de 1930 a 1945. Os critérios estabelecidos para análise dessa região são: decisões políticas e alcance econômico em âmbito nacional, regional e local. Também efetuamos pela análise dos quoeficientes locacionais com base no Censo de 1940 os fatores de especialização em nível regional e local.

 

2. AS DECISÕES POLÍTICAS -NACIONAL E ESTADUAL- E SEU ALCANCE ECONÔMICO NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

No plano econômico, as elites, em seu conjunto, caracterizam-se como aspectos mais significativos o desenvolvimento industrial, comercial e agrícola da economia. Assim, embora tenha saído vencedora da Revolução de 1930, a Aliança Liberal não apresentou alterações significativas na estrutura econômica da sociedade brasileira, assim como o controle do Poder político nacional não tenha mudado de classe. Tal controle passou da fração cafeicultora dos latifundiários para uma composição diferente da mesma classe de latifundiários, na qual predominavam os segmentos ligados ao mercado interno, apresentado em 1930 (Gorender, 2004, p. 62-63).

No Rio Grande do Sul, se inventou as condições para a elaboração de um capitalismo tardio, mas possível de desenvolver-se em áreas originarias de uma formação, basicamente, colonial e historicamente dependentes e subordinadas. Observando as especificidades das condições das áreas coloniais que foram originadas e arquitetadas com o intuito de proporcionar uma sobra econômica as áreas centrais, foram, portanto as colônias as principais contribuintes para fazer funcionar o processo de acumulação primitiva que aí se verificou.

No Brasil, país periférico-dependente, o café cumpriu um papel relevante nesse processo, assim tanto a agricultura como o comércio desempenharam a função de proporcionar a acumulação de capital nessa fase, também a indústria se mostrou como uma função do setor exportador, criada em seu interior (Silva, 1976).

O governo instaurado por Vargas1 demonstra adotar um novo tipo de sociedade agrária, ao mesmo tempo em que nos remete ao desmantelamento de valores e de modos de vida. Institui a reciclagem do sistema agroexportador, cuja crise cafeeira de 1929 apressou a tomada dos caminhos para a industrialização. No entanto, passados os anos, a história reconhece que as medidas adotadas para minimizar os efeitos negativos da crise cafeeira foram, na verdade, o caminho aberto para uma reorientação de metas sociais e de valores políticos, num processo de transformação econômica que os tempos exigiam. Vargas promoveu, a um só tempo, práticas temporalmente diversas, ajustando aos seus métodos de ação onde os detentores do poder conseguiam operacionalizar e manipular de conformidade com seus interesses (Camargo, 1999, p. 15).

No Rio Grande do Sul a República Nova permaneceu com o mesmo modelo de desenvolvimento, ou seja, baseado na agropecuária. Dessa forma, os agropecuaristas continuaram no poder e o principal desafio dessa nova fase foi encontrar saídas para a crise da agropecuária que se instalara no Estado. O governo central, a partir de 1930 buscou soluções para amenizar os problemas dos estados, desde que estes mantivessem os mesmos interesses do país como um todo. Nesse sentido, os objetivos eram basicamente dois: a) a integração do mercado pela articulação das economias regionais e b) a diversificação da estrutura produtiva da nação. Os dois, na realidade, podiam ser resumidos num único, que era a garantia da continuidade do processo de acumulação capitalista no país (Pesavento, 1994, p. 106).

Assim, pode-se dizer que no decorrer da República Nova a economia brasileira foi reorientada quanto ao rumo do processo de desenvolvimento capitalista em curso. Diante da configuração da crise da agroexportação, que era até então o eixo ativo da acumulação de capital no país, foram tomadas inúmeras medidas no sentido de encontrar uma saída para a situação que se apresentava. No final do período, o novo padrão de acumulação já apresentava seus contornos: a industrialização passara a ser o novo modelo de desenvolvimento capitalista no país (Pesavento, 1983, p. 173).

A mudança de uma base agrícola para uma base industrial é considerado o passo mais difícil, mas indispensável, para o crescimento econômico. Não há nada que impeça que a população e a renda per capita cresçam em uma região cuja base de exportação seja agrícola.

O envolvimento nas grandes economias de mercado, apesar das vicissitudes decorrentes, tem sido o caminho clássico pelo qual as economias regionais se expandiram. Isso resultou na especialização, economias externas, desenvolvimento das indústrias locais, e o aumento da “desintegração” vertical, como resultado da expansão do mercado. Apenas um comércio de exportação agrícola, bem sucedido, pode e realmente tem induzido a urbanização, os aperfeiçoamentos do mercado de fatores, e uma alocação mais eficiente dos recursos para investimento (North, 1959, p. 333).

O que se chamou de modelo histórico de acumulação de riqueza e de capital e de dominação política evidencia, nesta fase, o esplendor de sua estruturação orgânica, no sentido econômico, político e ideológico. A esse respeito, tem-se que a maneira como os fatores de produção se desenvolveram no Rio Grande do Sul, guardam semelhanças formais com esse modelo histórico, sendo que o orgânico se refere à integração e ao crescimento, através do desdobramento das atividades agropecuárias com as industriais, comerciais e outras atividades de serviços ligadas à agroindústria.

Na verdade, a economia gaúcha da pecuária se revelou impossibilitada de produzir uma acumulação que desse espaço para implementar uma empresa capitalista absolutamente configurada e que transformasse os meios de produção pecuária com recursos estritamente locais.

Na visão de Love (1975), no decorrer de toda a República Velha, a economia do Rio Grande do Sul esteve voltada para o mercado interno. Em oposição a São Paulo, que dependia dos compradores de outros países. Os produtos alimentícios representavam cerca de dois terços do valor total das mercadorias enviadas para fora do Estado entre os anos de 1920 a 1930, ou seja, a pecuária e as indústrias ligadas a ela se sobrepunham.

De modo geral, a consolidação da indústria não representou o abandono da política de sustentação aos produtos agroexportadores, na medida em que estes propiciavam a entrada de divisas. O que se percebia era que a economia nacional precisava ser diversificada, além do que havia urgência na integração do mercado interno, bem como ênfase nas “indústrias naturais” (Pesavento, 1983, p. 173).

Em se tratando das “indústrias naturais”, o Rio Grande do Sul se destacava com a fabricação da farinha, produto obtido pelo beneficiamento simples, que valorizava a matéria-prima nacional, enquanto 'indústria natural', possibilitando a integração do mercado interno, na medida em que se buscava a exportação para o centro do país; além de possibilitar a diversificação da economia nacional e, no caso de limitar a importação de artigos estrangeiros (caso do trigo), propiciava a economia de divisas (Pesavento, 1983, p. 174).

O governo federal olhava para o Rio Grande do Sul como um estado importante na complementação da economia central, uma vez que o mesmo fornecia ao resto do país gêneros de subsistência para o consumo nacional. (Love, 1975, p. 119). Nessa mesma concepção, vale salientar que as elites políticas regionais que conduziram o curso do desenvolvimento, estavam alijadas no poder formal ou, informal, dessa maneira, suas ações eram conduzidas pela esfera econômica dentro de um processo produtivo capitalista. Estas relações de poder se estabeleciam e funcionavam, em um primeiro momento, no âmbito dos interesses políticos e, num segundo momento, econômicos sempre com base na atuação do Estado como resultante de uma confluência de fatores em que lógicas globais e processos de ordem regional, local e nacional se entrecruzavam, em algumas vezes se complementando e em outras se contrapondo.

Neste contexto, os atores que intervieram nos processos políticos, ora confluindo acerca de um mesmo objetivo ainda que com interesses divergentes, ou bem competindo por ganhar uma determinação de um maior sentido em suas ações, pretendendo articular a política com a abertura de mercados de forma a integrar o movimento de valorização dos bens pelos capitalistas.

Os mecanismos de poder instituem o indivíduo como objeto de poder, visando gerir sua vida e, portanto, controlar suas ações, para assim tornálos mais úteis política e economicamente. Nesse sentido, estas relações de poder não podem ser estabelecidas, nem funcionar sem uma produção, circulação e bom êxito dos discursos que propagam as normas pelas quais os indivíduos são avaliados e até mesmo julgados. O poder se relaciona pela maximização da produtividade econômica e pela intenção do controle que está sempre presente na obtenção de um lucro político pela minimização da capacidade de sublevação, ou resistência à força opressora. Assim o discurso do empresariado e do Estado era de conciliação para com os empregados: “negociando, concedendo pequenas reivindicações, compensando com práticas assistenciais e tentando fazer passar, como senso comum, a ideologia dominante da 'harmonia das classes' para os grupos subalternos” (Pesavento, 1988, p. 132).

O Rio Grande do Sul, no início do século XX, apresentava um crescimento econômico acelerado que o tornara o centro comercial e industrial, sendo eleita a Capital do Estado o lugar de escoamento dos produtos provenientes da zona colonial, onde se estabeleceram empresas comerciais que se transformaram em empresas industriais se tornando as maiores e mais importantes do Estado (Vargas, 1992, P. 22).

O dinamismo da economia gaúcha nessa é poca se assentava nas exportações, requerendo uma participação significativa do Estado, não somente como prestador de serviços, mas também como patrocinador de serviços produtivos. Se nos anos de 1920 o Estado construía portos e ferrovias, nos anos de 1930 e 1940 ele precisou ampliar sua participação nesse sentido através da implementação dos transportes rodoviários e da energia elétrica, exigências provenientes das necessidades de crescimento interno da estrutura rio-grandense (Müller, 1993, p. 370).

Para Fonseca, o norte do Rio Grande do Sul aparecia no início da República Nova, como um território altamente povoado, em que o crescimento populacional acompanhou também sua valorização econômica de conformidade com o fator expansionista não apenas regional, porém ao ponto de ter um significativo peso na economia do Estado (Fonseca, 1983, p. 67).

No Rio Grande do Sul, o processo que se verificou não foi isolado do que ocorreu no restante do país, já que desde as últimas décadas do século XIX, porém particularmente, nas primeiras décadas do século XX, fecundaramse as condições especificas e históricas para a formação do capitalismo (Ianni, 1972). Para que o capitalismo fosse concretizado, algumas condições foram necessárias, tais como a acumulação de capital, a disponibilidade de mão-de-obra livre, um consolidado mercado interno ou ainda em constituição, a existência de matéria-prima e de escassos quesitos tecnológicos que deram lugar a partida inicial.

O charque era o principal produto sulino de exportação, embora seu sindicato não conseguisse impedir a oscilação do preço do produto no mercado interno, que se mostrava extremamente competitivo. Os frigoríficos estrangeiros estabelecidos no Rio Grande do Sul também haviam concentrado parte de suas atividades no charque, ao passo que seus congêneres estabelecidos no Prata, concentravam suas atividades na frigorificação (Pesavento, 1980a, p. 272-273).

Em relação à indústria de alimentação, tanto os pecuaristas como o governo conjugavam esforços para a frigorificação e transformação da carne suína e da produção de banha. Em 1937, por exemplo, a firma Oderich inaugurava em Canoas os 'Frigoríficos Nacionais Sul-Brasileiro'. Esse empreendimento demonstrava, tal como o estabelecimento de Renner em Montenegro, o maior poder de acumulação da área colonial sobre a pecuária extensiva. Ou seja, o comerciante da área colonial, atuando como intermediário na distribuição dos gêneros agropecuários no mercado, fora capaz de capitalizar mais que o pecuarista. Uma das maneiras de aplicação deste capital se deu exatamente na produção da banha e dois demais produtos suínos (Pesavento, 1994).

Ressaltamos que os produtores e comerciantes de banha, reunidos no Sindicato Sul-Rio-Grandense da Banha, representavam um dos expressivos setores de acumulação de capital do estado do Rio Grande do Sul, acumulação esta que ocorria em relação aos suinocultores coloniais. Igual processo ocorria em relação à fabricação de vinho, onde os grandes comerciantes e industriais, também organizados em Sindicato, controlavam a produção de uva no estado (Pesavento, 1980a).

As divergências entre os interesses dos pecuaristas do sul e os do governo central ficavam cada vez mais evidentes. Podemos exemplificar através da própria situação dos charqueadores. Embora houvesse divergências ideológicas entre os pecuaristas gaúchos e o governo central, este apoiou a iniciativa dos criadores sulinos no que se referem à idéia de frigorização das carnes. Isso porque a idéia tinha cunho nacionalista, na proporção em que se propunha a extinguir as manobras sutis dos frigoríficos estrangeiros que se localizavam no Estado. Ademais, o frigorífico nacional era considerado também “uma indústria natural”, tal qual a de produção de farinha, pois utilizava matéria-prima local e por isso deveria ser incentivada (Pesavento, 1994).

No principio dos anos de 1930, o Rio Grande do Sul ocupava a posição-periférico dependente de maior importância do país, visto que sua economia, baseada fundamentalmente na agropecuária, era considerada a fonte abastecedora do mercado interno nacional e, em contra partida, em menor valor, do comércio internacional. De acordo com Pesavento, Flores da Cunha, interventor federal, ligado à atividade agropecuária, pondera salientando que não aconteceu, em âmbito regional, a relativa autonomia do político com relação ao econômico, tal como acontecera no centro, pois, na medida em que a mesma classe que ocupara a supremacia política e a influência econômico-social conservara seus postos, se manifestando apenas quanto à ascensão de novos nomes (Pesavento, 1980b).

Buscava-se oportunizar a existência de uma nova camada industrial inserida dentro do modelo econômico vigente, no entanto, submissa aos agropecuaristas, que constituíam o grupo dominante no estado, tanto em âmbito central, quanto local do país, possibilitando e impulsionando ao capitalismo rural (Singer, 1968).

Nesse sent ido, a presença da força modernizadora do Estado se fazia perceber em todos os âmbitos, já que o desenvolvimento da nova forma de organização de Estado pósséculo XIX, coincidiu em todos os setores com o desenvolvimento e contínua expansão do capitalismo. Salientamos que no Estado do Rio Grande do Sul, exército, partidos políticos, empresas econômicas, organizações de toda espécie, associações particulares, clubes e muitas outras se desenvolviam através da utilização de métodos econômicos na produção ou transformação de bens, o que se tornou indispensável que o sistema econômico fosse organizado em bases capitalistas.

Durante os anos compreendidos entre 1930 e 1945, a economia política gaúcha caracterizouse por ter atingido o apogeu do modelo histórico de desenvolvimento, constituído no transcurso de um século. A zona rural passou por três fases: a) a assinalada pela produção da pecuária e de seus produtos históricos, o comércio, as cidades e as charqueadas e os frigoríficos; b) a zona rural marcada pela pequena produção agropecuária e seus produtos históricos, comércio, cidades, artesanatos e manufaturas e c) a zona rural marcada pelas explorações de arroz, trigo e gado e seus produtos históricos e da intermediação, conhecida como 'mercado sul-rio-grandense' (Müller, 1993, p. 363).

Em 1930, o governo buscou criar uma economia forte que pudesse alavancar o desenvolvimento do Rio Grande do Sul e que o colocasse em lugar de destaque entre os demais estados membros da federação. Dessa forma, o estado gaúcho se tornou o condutor na batalha em defesa da economia regional. Nesse período, importava para Vargas que o Rio Grande do Sul, abastecesse o mercado interno com gêneros alimentícios a baixo valor/ valia. Tomava parte desta forma, na economia brasileira, o estado gaúcho, que cada vez se tornava mais dependente do centro do país e, conseqüentemente, a nova representação política centralizadora que estava embasada na indústria. A subserviência política ao governo central era necessário como preceito para que a economia brasileira fosse remida e reorientada.

Pode-se dizer que no plano econômico, no decorrer da década de 1930, o Rio Grande do Sul foi tomado pelo desenvolvimento do sindicalismo cooperativista. A sindicalização foi incentivada pelo governo federal por representar uma forma eficiente de encaminhamento dos problemas econômicos e de mediatizar as relações entre as classes sociais e o Estado. Os produtores sindicalizados, para retribuir os favores recebidos, apoiavam politicamente o governo. Esta era uma das formas encontradas para coibir qualquer manifestação política das classes dominantes, que pudesse remeter às antigas práticas oligárquicas. Em relação às classes subalternas, a sindicalização tinha por finalidade anular as suas pretensões políticas, de modo a mantê-las submissas e controladas pelo governo (Pesavento, 1994).

O Rio Grande do Sul possuía auto-suficiência em grãos, podemos citar como exemplo o arroz, feijão, lentilha, milho, aveia, centeio, cevada, trigo2, outros produtos agrícolas se destacaram no Estado gaúcho, tais como a erva-mate, cebolas, alho, alfafas, batatas, uvas, mandioca, fumo entre outros. No norte do Estado, os produtos que mais estiveram na pauta das exportações foram a ervamate, o feijão, o fumo, o milho, a batata e o trigo.

A esse respeito, Pesavento (1994, p. 108) observa que no Rio Grande do Sul, no período denominado de República Nova, foi tomando lugar a idéia de que o investimento na agricultura era mais rendoso do que na pecuária. Assim é que, ao lado do arroz, também se deu ênfase à cultura do trigo, da cebola, das frutas de sobremesa e do milho, sendo que este último associado à suinocultura como ração. Flores da Cunha, governador do Estado do Rio Grande do Sul, concedeu empréstimos aos setores da agropecuária que foram atingidos pela crise de 1930, que se estendeu à produção de arroz e a todos os produtos da agropecuária, como conseqüência da acentuada concorrência no mercado. Quanto aos produtos industriais, a ajuda foi oferecida àqueles produtos tidos como “ naturais”, porque beneficiavam matéria-prima local e por isso atingiu: vinho, banha, conservas de frutas, óleos vegetais, produtos têxteis, farinha de trigo, etc.

A banha foi à propulsora para que o norte do Rio Grande do Sul se incorporasse na economia estadual. A diversidade na produção agrícola, bem como as vantagens comparativas da economia, se transformou, na mais intensa e forte subsidiária do centro do país. Outros produtos derivados da agricultura e merecedores de relevo são a farinha de mandioca e o vinho, sendo que a primeira obteve o lugar primeiro em grau de importância de produto exportado desligado da criação. O Planalto, começa a se distinguir frente as exportações através da madeira (pinho e cedro notavelmente), movimentando o tráfego ferroviário no Rio Grande do Sul (Fonseca, 1983).

A partir de 1930, a economia brasileira passou a ser regida por um novo modelo, ou seja, o de substituição de importações em oposição ao modelo agroexportador. De Mello (1982, p. 110) denominou “a industrialização restringida” essa nova fase da economia brasileira. Vargas primava pela internalização dos bens de produção. Com o processo de substituição de importações fortemente intensificado, originou-se no Brasil um novo rumo na economia nacional, impulsionada pelo setor industrial. Esse novel modelo de economia adotado pelo governo central, fez com que o empresariado industrial se mobilizasse através da constituição de grupos de interesses, onde se fizeram ouvir por Vargas bem como, influenciaram o modelo econômico em vigência.

A organização política dos grupos industriais na década de 1930 se caracterizou pela necessidade de tradução de um poder socialmente definido em poder politicamente definido, materializada na redefinição das alianças em 1930, acompanhando o início da industrialização do país como um grupo de interesses claramente diferenciados em relação aos das elites rurais tradicionais, que comandaram o processo político na República Velha. Dessa forma, o quadro que se delineia a partir de 1930 é o do novo grupo social surgido, o dos industriários, tentarem consolidar os espaços políticos que haviam conquistado recentemente. Nos anos subseqüentes, o conteúdo e a natureza da prática política dos industriais iriam se modificar, evoluindo para a especificação, na proporção em que os interesses se mostravam mais complexos e diferenciados ao longo do tempo.

A consolidação do espaço político do grupo dos industriários foi sendo conquistada através da ampliação de sua representação em associações de classe, sem muita preocupação com a qualidade dos interesses representados e, sim, com a quantidade de membros que poderiam dar suporte a essa nova classe. Ao invés de se orientarem no sentido de associações com interesses específicos e definidos, a tendência à visibilidade condicionou a criação de uma organização de base nacional. Como resultado, essa organização se transformaria num foro de demandas amplamente definidas, mas que na realidade não eram especificadas claramente sob forma de políticas ou de meios para sua implementação (Boschi, 1979).

No Rio Grande do Sul, na década de 1930, salienta-se o Centro da Indústria Fabril do Rio Grande do Sul. Esse Centro tinha como fim impulsionar a industrialização no Estado, aliando esforços com o intuito de obter condições melhores para que as empresas já existentes fossem incentivadas e conseqüentemente se gerassem novos investimentos.

Assim, as indústrias gaúchas se organizaram no Centro da Indústria Fabril do Rio Grande do Sul, que reunia as maiores empresas do estado e objetivava tanto possibilitar um maior crescimento industrial quanto harmonizar as relações entre patrões e empregados. Ademais, esse Centro buscava entrosar mais a classe empresarial com os poderes públicos, ampliando a sua participação no governo (Pesavento, 1994).

Mais tarde, em 1933, o Centro Industrial do Brasil se transformou na Confederação Industrial do Brasil (CIB), numa tentativa de unificar as federações existentes nas diversas regiões brasileiras. A iniciativa dessa criação teve origem nas quatro maiores associações existentes na época, localizadas nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. O CIB seria mais tarde a base da estrutura corporativa criada no ano de 1943 e que persiste até os dias de hoje como Confederação Nacional da Indústria.

Sal ientamos que, embora houves s e concordância entre o governo federal e o estadual quanto à necessidade de integração do Rio Grande do Sul no mercado nacional, parte da classe dominante não aceitava que as medidas centralizadoras postas em prática pelo governo federal no pós-30, a exemplo da isenção do pagamento de impostos de muitos produtos industriais, que beneficiavam o setor, prosseguissem. Na verdade, o atendimento aos problemas econômicos das regiões periféricas por parte do governo central tinha como contrapartida a submissão política das oligarquias regionais. No entanto, alguns pecuaristas gaúchos pretendiam à hegemonia política do país ou queriam resguardar a independência do poder da oligarquia regional diante do Centro (Pesavento, 1994, p. 108).

No Rio Grande do Sul, o desenvolvimento da economia industrial era dependente, em parte, do mercado instituído por produtos provenientes dos municípios e colônias. Assim, surgiu uma economia de subsistência, sendo no início deficiente, porém mais tarde, capaz de proporcionar excedentes comerciáveis e um desenvolvimento na agricultura comercial, que possuía na produção de gêneros alimentícios sua especialização o que tornou possível sua inserção no mercado nacional. O desenvolvimento desse modelo de agricultura comercial possibilitou aos proprietários produtores das colônias, possuir uma capacidade maior na aquisição externa, ou seja, na forma de recursos monetários. A indústria gaúcha participa embora em escassa quantidade, da formação da indústria de base no Brasil (Singer, 1968).

Nesse contexto a partir da década de 1930 e entrando na década de 1940, o Brasil passou a se organizar na construção do capitalismo industrial, entrando na fase desenvolvimentista, na medida em que as intervenções estatais ocorriam para impulsionar a industrialização de um país que se encontrava em desvantagem aos que já haviam aderido ao capitalismo. O reflexo dessas idéias se concretizou no reconhecimento da necessidade de que deveria existir um elo entre o progresso e crescimento do Estado e das regiões, de modo que Passo fundo e Carazinho, considerados pólos de desenvolvimento, salientavam-se na região Norte como prósperos e impulsionalizadores do desenvolvimento e crescimento econômico do estado do Rio Grande do Sul, corroborando com as idéias de Vargas.

 

3. AS DECISÕES POLÍTICAS E O ALCANCE ECONÔMICO NO MUNICÍPIO DE PASSO FUNDO

O grande incremento dado à produção de trigo na época em Passo Fundo (1930-1950), bem como o surgimento de cooperativas e de granjas, o que oportunizaram o aumento de novos proprietários de terra e de arrendatários, redefinindo, em parte, a estrutura pecuarista da região, além da utilização mercantil de parte do latifúndio pecuarista de trigo (Tedesco, 2005).

Nesse sentido, no setor da pecuária, parte dos criadores passou a formar cooperativas para beneficiar, eles mesmos, seus rebanhos, eliminando a figura dos charqueadores tradicionais. Por outro lado, outros pecuaristas lançavam as bases para a formação de frigoríficos próprios. Idéia que contava com apoio do governo gaúcho, que amparou e incentivou tanto um como outro grupo de pecuaristas. Apesar das divergências políticas, situação e oposição se mostravam favoráveis à idéia máxima que catalisava as atenções dos pecuaristas gaúchos: a construção de um frigorífico nacional. O Instituto Sul-Rio-Grandense de Carnes, criado em julho de 1934, buscava, entre outros objetivos, tornar realidade no estado o projeto da frigorificação (Pesavento, 1994).

O governo do estado concedeu empréstimo para a concretização do frigorífico, assim como construiu um matodouro-modelo na Serraria e um entreposto frigorífico no cais do porto da capital. Além do que encomendou vapores-frigoríficos, resolvendo dessa maneira o problema de transporte adequado para as carnes. Coincidentemente, os charqueadores também viam vantagem na frigorificação e por isso o sindicato dessa categoria optou pela sua transformação paralela, embora não integrada ao Instituto de Carnes (Pesavento, 1980a, p. 274).

Em nível local, havia a urgente necessidade da ampliação de estações da Viação Férrea, a liberação de um maior número de vagões para escoamento da produção, mas também a construção de novas estradas. Os líderes políticos passofundenses defendiam melhorias nos transportes. Em Passo Fundo as cooperativas, associações, sindicatos, centros, sociedades, clubes e grêmios ocupavam um espaço importante e corroboravam para o desenvolvimento e crescimento desses municípios e também eram os condutores da economia da região.

No processo de industrialização regional, destacamos a importância ocupada pelas madeireiras, devido à sua relevância na economia dos municípios da região norte do Estado. Iniciaram-se pela instalação de serrarias no interior dos municípios, bem como das empresas exportadoras. Isso demonstra a abrangência das formas de relacionamento dos madeireiros com os mecanismos do poder, possibilitando uma melhor compreensão das transformações sociais ocorridas. É a partir do estudo da produção madeireira nos seus diferentes ramos –extração, serragem, exportação– que se pode compreender a atuação e os interesses dos grupos sociais envolvidos, bem como a forma como se posicionavam em relação ao poder instituído e como se organizavam segundo as conveniências específicas (Wentz, 2004, p.12).

Os madeireiros formaram na época uma 'elite madeireira' que, conforme Pesavento (1988, p. 106): “sob uma capa de aparente neutralidade [...] sempre correspondeu aos interesses dos detentores do capital”. Para tanto, basta acompanhar a trajetória do industrial madeireiro na sociedade civil, através das notas jornalísticas dos meios de comunicação da época, para constatar que ele traçava alianças e composições no sistema do poder, de modo a conseguir viabilizar seus interesses específicos. Para Gramsci (1979, p. 4), “a elite dos empresários deve possuir a capacidade de organizar a sociedade em geral, em todo o seu complexo organismo de serviços, inclusive no organismo estatal, em vista de criar as condições mais favoráveis à expansão da própria classe”.

Para um melhor entendimento da importância das madeireiras no contexto local, reproduzimos os dados do censo econômico do ano de 1940, onde consta que de um total de 1060 madeireiras instaladas no estado, empregando 3614 operários, 296 estavam, operando na região, o que significava aproximadamente 30% do total de serrarias do Rio Grande do Sul. Assim ao lado da comercialização da banha e dos produtos agrícolas como o milho e o trigo, plantados pelos nativos (negros e caboclos), surgiram as atividades ligadas ao preparo de tábuas, barrotes e demais tipos de madeiras, assim como a indústria de móveis e de transformação da madeira, introduzidas pelos imigrantes europeus que começavam a se instalar no estado (Tedesco, 2000).

Com relação a Passo Fundo sabe-se que a ferrovia também representou um grande impulso para o seu crescimento econômico, sendo a mesma responsável pela fixação de muitos imigrantes no município. Tanto é que a cidade se consolidou como pólo regional norte e teve um aumento expressivo de estabelecimentos comerciais e industriais. Conforme Topik (1987) as ferrovias pertenciam à União e por isso mesmo serviam como incentivadoras do poder político, desde a escolha dos locais onde deveriam ser construídas como da designação das pessoas que deveriam ocupar os postos de destaque na administração das mesmas. Era ao lado do interesse econômico uma incentivadora do crescimento e centralização das relações capitalistas.

O contexto acima citado evidencia a importância dos municípios da região, pois com a estagnação econômica da Campanha, ocorreu a elevação do Planalto e Serra. Importante destacar que os produtos do norte, tais como a banha e a maior parte da produção agrícola, pouca relevância tinham nas exportações. No decorrer do século XIX, os produtos que anteriormente não possuíam destaque algum, começaram gradativamente a alcançar valor numa cultura de subsistência local. Para Fonseca (1983, p. 57), “o trigo que se constituiu em uma possível exceção, no início do século XIX, haja vista que a maior parte da produção agrícola não se destinava a exportações”.

Em Passo Fundo, no pós 1930, a banha, carne verde, couros suínos, vinho, batatas, mel, madeira, farinha de mandioca, milho, trigo e outros cereais foram os produtos alavancadores do desenvolvimento e crescimento desses municípios. O Norte do Rio Grande do Sul, pelo seu valor econômico se tornou um fator de crescimento, tanto econômico quanto populacional, não apenas regional, mas com capacidade de ter expressiva força na economia do Estado.

Na década de 1930 foi dado início ao incremento à produção do trigo. A partir disso foram surgindo cooperativas e granjeiro, arrendatários e novos proprietários de terra, bem como a redefinição, em parte, da estrutura pecuarista da região. Data de 1938 o surgimento da Estação Experimental Engenheiro Luiz Englert (Estação Experimental Passo Fundo, posterior Embrapa) cuja finalidade foi a de desenvolver a cultura do trigo, através da participação pública na pesquisa agropecuária brasileira e o incentivo da produção de trigo. Para Tedesco (2005, p.142 ), “foi a instalação dessa estação de trigo que fez com que proliferassem na cidade e região moinhos de todo o calibre, destacando-se os moinhos São Luiz e Rio-Grandense, que depois passou a chamar-se Passo- Fundense, e o Moinho da Viúva Della Mea”.

Para North (1959), a organização econômica existente opera melhor dentro ou perto do centro de uma determinada matriz de desenvolvimento econômico ou também, naquelas partes agrícolas favoravelmente situadas em relação a tal centro; e opera menos satisfatoriamente naquelas partes de agricultura que estão situadas na periferia da matriz. Por causa do crescimento da população e dos rendimentos decrescentes da agricultura e das outras indústrias extrativas, a região é, forçada a se industrializar. Os primeiros estágios de industrialização baseiam-se, tipicamente, em produtos agrícolas e florestais e incluem atividades como processamento de alimentos, artefatos de madeira e preparação de fibras têxteis.

Observando a situação industrial em Passo Fundo, podemos concluir que o setor se caracterizava por um grande número de pequenas empresas, ao lado de outras que mais tarde se tornaram grandes. Os índices de crescimento industrial dessa época demonstram números significativos, especialmente entre os anos de 1933 e 1939 que foi ao redor de 8,4% ao ano, enquanto que a agricultura crescia cerca de 2,2% ao ano (Boschi, 1979).

A importância agrícola do município de Passo Fundo foi devidamente relatada por ocasião da primeira exposição agropecuária industrial e feira, no qual foi salientada a excelência das terras do município, bem como a imensa área apropriada para o cultivo agrícola, o que assegurava a Passo Fundo uma posição privilegiada dentre as demais comunas do estado do Rio Grande do Sul, figurando no certame agrícola riograndense como o município líder na cultura do trigo. Além do trigo, Passo Fundo se coloca em relevante posição na cultura de outros cereais, indicativo seguro de um futuro promissor (MPF, 1939, s.p.).

Eram cultivados em grande quantidade em todos os lugares do município de Passo Fundo, o milho, arroz, batata-inglesa, mandioca, soja, girassol, alfafa, amendoim e feijão. A produção de cereais para o ano de 1938 foi a seguinte em sacos: trigo, 350.000; milho, 850.000; feijão, 150.000; arroz, 20.000; cevada, 100.000; linho, 3.000 e batata, 10.000 (MPF, 1939, s.p.).

A pecuária também era bastante desenvolvida, principalmente, em dois distritos de Passo Fundo, Sarandi e Campo do Meio, nos quais existiam importantes estabelecimentos pastoris, em que os fazendeiros pecuaristas, buscavam cruzar seus rebanhos, importando raças de touros e efetuando melhorias nas pastagens em seus campos (MPF, 1939, s.p.).

Com referência a indústria e comércio, Passo Fundo exercia preponderância entre os demais municípios do Estado, visto que existiam inúmeros estabelecimentos industriais e também era centro de trabalho e de empreendimentos, dentre eles os agrupamentos fabris. Como exemplo, podemos citar Marau, onde se encontravam instalados um moderno frigorífico, uma fábrica de camas e fogões de ferro, fábricas de móveis, oficinas mecânicas, fábricas de queijo, manteiga e, etc. Em Sarandi, um frigorífico para matança de suínos, e um moinho para a fabricação de farinha de trigo. Já em Vila Teixeira, existiam duas oficinas mecânicas e fábricas de trilhadeiras. Coxilha contava com um elevado número de serrarias, porém em todos os demais distritos de Passo Fundo se podia contar com várias e múltiplas indústrias (MPF, 1939, s.p.).

O comércio, tanto em Passo fundo quanto nos seus distritos, ocupava lugar de destaque, já que se encontravam casas de diversos ramos de atividades os quais trabalhavam com um avultado capital em que outorgavam largos créditos aos colonos, os quais podiam esperar, tranqüilamente, pelo resultado das diversas colheitas para saldar suas dívidas contraídas durante os meses em que se dedicaram a colheita dos campos e a exploração de outras indústrias.

O município de Passo Fundo era atravessado pela via -férrea São Paulo- Rio Grande e estavam situadas dentro do território as seguintes estações ferroviárias; Passo Fundo, Pulador, Coxilha, Engenho Luiz Englert e Sertão, vale lembrar que todas eram grandes centros de atividades comerciais e industriais. Nessas estações, os produtores exportavam considerável volume de cargas que eram representados por diversas qualidades e tipos de produtos, tais como o trigo, feijão, arroz, banha, erva-mate dentre outros. Com referência as rodovias, Passo fundo contava com inúmeras estradas, com excelentes condições de trafegabilidade ligando todos os distritos a sua sede e também, servindo de acesso fácil e seguro aos municípios vizinhos.

O número de estabelecimentos comerciais em Passo fundo no ano de 1939, de acordo com o relatório, era de 578, empregando 2.853 operários, sendo que o capital que era empregado na indústria perfazia um total de 18.445:342$000 (Dezoito mil e quatrocentos e quarenta e cinco contos de réis)3 e o valor da produção industrial foram de 25.612:734$820 (Vinte e cinco mil e seiscentos e doze contos de réis). Chamava atenção para a inovação na agricultura que iniciaria o plantio de linho, girassol, mamona dentre outras oleaginosas. Ainda com referência apo comércio de Passo Fundo, se somados os distritos do mesmo como Marau, Vila Teixeira e Sertão, o número crescia para 645 estabelecimentos empregando 1651 operários e perfazendo um capital de 16.231:000$000 (Dezesseis mil e duzentos e trinta e um contos de réis)4.

Pelo descrito no texto, entre os anos de 1930 e 1945, Passo Fundo ocupou uma espécie de “entreposto comercial e político”, na região do Planalto Médio, convivendo com a precariedade das estradas para o escoamento da produção agro-industrial. Mas, ao mesmo tempo evidenciou o progresso resultante do centro mais dinâmico da Região Norte gaúcha.

 

4. AS DECISÕES POLÍTICAS E O ALCANCE ECONÔMICO NO MUNICÍPIO DE CARAZINHO

O ano de 1931 assinalou a elevação do 4° distrito de Passo Fundo, Carazinho, à categoria de município. No entanto ele já se encontrava em plena fase de desenvolvimento, pois as serrarias se multiplicavam, a agricultura prosperava, as indústrias se instalavam, o sistema ferroviário recebia incentivos e, as rodovias estavam sendo construídas. Em Carazinho a madeira, a erva-mate e a banha também se constituíam nos produtos industriais de grande força para o setor exportador, colaborando para o crescimento econômico estadual.

Diante desse quadro de desenvolvimento, cabe destacar que no ano de 1934 Carazinho instituiu a 1ª exposição Agropastoril e Industrial, que foi realizada em 10 de maio. Documentos posteriores dão conta que essa exposição continuou existindo até o ano de 1937.

Percebe-se a significação da feira para Carazinho, de modo que a união dos interesses políticos e econômicos do município, congregava a prefeitura e as associações representativas dos diversos segmentos agropecuário e industrial. Consoante com Pesavento (1983, p. 173), o novo padrão adotado pela República Nova, enfatizava a necessidade da diversificação da economia nacional, a integração do mercado interno e a ê nfase nas indústrias “naturais”. Dessa forma, era possível conciliar a estrutura agrária predominante com o esforço industrial substitutivo, promovendo as empresas que beneficiassem a matéria prima nacional, sobretudo as que se utilizavam dos gêneros agropecuários.

No entanto, o problema com o desenvolvimento do município de Carazinho esbarrava na questão da luz e força. O transporte ferroviário representava a espinha dorsal da economia exportadora, tanto para o Brasil como para os estados da federação. O governo investia muito nas ferrovias por ser o meio de transporte indicado para o comércio e também para que a colonização pudesse avançar para as á reas mais afastadas dos cursos navegáveis. As colônias que se localizavam próximas às ferrovias eram as que mais se destacavam, pois em seu entorno logo surgiam a bodega, a igreja, as casas, a escola, etc. Exemplo disso é a cidade de Carazinho. No entanto com o processo de industrialização, as ferrovias foram perdendo espaço para um novo meio de transporte alternativo, mais rápido para o escoamento da produção. O foco se voltou para a construção de estradas e rodovias, porém sem desconsiderar o transporte ferroviário (Corrêio do Povo, 1931).

Assim como o problema da luz e força, Carazinho também sofria com as péssimas condições de trafegabilidade das estradas para escoamento da produção. Com a chegada dos novos veículos automotores, que a indústria lançava na atividade dos transportes, as estradas necessitavam ser reconstruídas tendo em vista a lenta substituição das carroças no transporte de pessoas e de cargas. A criação do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DAER) veio auxiliar essa deficiência do estado e foi criada a mentalidade rodoviária. Com isso, pode-se dizer que foi no ano de 1938 que se inaugurou a era rodoviária do Rio Grande do Sul, antes concentrada na ferrovia e na navegação (Ferreira, 1978).

Carazinho apresentou vários exemplos de cooperativas e assemelhados responsáveis pela condução da economia local. O surto cooperativista foi uma reação dos sindicatos que contavam com a proteção do governo e gozavam de isenção no pagamento de impostos, especialmente entre a população colonial. Dessa forma, as cooperativas de pequenos produtores buscavam encontrar meios de dissolver o monopólio da produção e comercialização dos produtos estabelecidos pelos Sindicatos. Com isso queriam beneficiar a matériaprima por eles produzida e comercializar o produto acabado. Eles acreditavam que mesmo sendo pequenos proprietários conseguiriam somente com a conjugação de esforços competir com os grandes sindicatos (Pesavento, 1994).

Cabe aqui referendar a importância de Carazinho no quesito exportações, visto que era considerada no estado do Rio Grande do Sul como a mais importante cidade em nível de exportações. O desenvolvimento comercial acentuou-se extraordinariamente nos primeiros seis meses de 1938 em Carazinho, quando a exportação do primeiro semestre superou grandemente a de igual período em 1937.

Conforme North (1959), o desenvolvimento de um artigo de exportação refletia uma vantagem comparativa nos custos relativos da produção, incluindo custos de transferência. Os custos de transferência de distribuição serviram para limitar a extensão do mercado exportador. Do ponto de vista da região, a demanda pelo artigo de exportação era um fator exógeno, mas tanto o processamento como os custos de transferência não o eram. Historicamente, as regiões novas procuraram reduzir esses custos, num esforço combinado para promover o seu bem-estar econômico.

A medida que as regiões cresciam em torno de uma base de exportação, desenvolviam-se as economias externas, o que melhorava a posição do custo competitivo de seus artigos de exportação. Assim, até que se desenvolva renda suficiente para suprir uma parte substancial de seu próprio capital de investimento, uma região tem de contar com fontes externas (North, 1959).

A sensibilidade da região às flutuações depende das elasticidades-renda dos produtos primários de exportação. O caráter da força de trabalho será fundamentalmente influenciado pelas indústrias de exportação. Os tipos de especialização exigidas, a periodicidade e estabilidade do emprego e as condições de trabalho moldarão as atitudes sociais da força de trabalho.

 

5. ESPECIALIZAÇÃO: ANÁLISE DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO NO RIO GRANDE DO SUL, CARAZINHO E PASSO FUNDO COM BASE NO CENSO DE 1940

A especialização, em sentido amplo, é um indício importante do potencial de uma região. Supondo que os agentes econômicos são racionais, a alocação social e economicamente consolidada de recursos, pode ser entendida como o resultado da identificação, por parte dos agentes econômicos regionais, de nichos economicamente competitivos. Dessa forma, ela representa um fator significativo da presença de vantagens regionais, diante da disponibilidade relativa de recursos e fatores, além da emergência de economias de aglomeração (Paiva, 2004, p. 19).

Em sentido restrito, o ponto de partida para o cálculo das medidas de especialização é a organização das informações em uma matriz que leva em conta a distribuição setorial-espacial de uma variável-base (Haddad, 1989). Se considerarmos as atividades e a percentagem das pessoas ocupadas, num determinado tempo, conforme a tabela 7, o í ndice de especialização refletirá a predominância das pessoas que se ocupavam das atividades relacionadas.

O Censo de 1940 apresentou os dados do Rio Grande do Sul no que se referia ao tipo de atividade exercida pelas pessoas, por ramos, nos setores agropecuário, silvícola, serviços e industrial, bem como particularizou os municípios da época, dentre os quais salientaremos Passo Fundo e Carazinho, através de uma análise comparativa da especialização.

No ano de 1940 a distribuição das pessoas ocupadas por ramos de atividades no Rio Grande do Sul era da seguinte forma:

Tabela 1. Pessoas ocupadas por ramos de atividades, no Rio Grande do Sul, 1940

Conforme mostra Tabela 1 a maior parte das pessoas ocupadas estava distribuída entre o setor da agropecuária e dos serviços. Aproximadamente 49% estavam ocupadas nos setores dos serviços, sendo que as atividades domésticas, escolares, as atividades sociais e o comércio de mercadorias eram os que mais ocupavam. Em seguida vinha a agropecuária com quase 35% de ocupação. Já, a população total do Estado e dos municípios de Carazinho e Passo Fundo pode ser visualizada na Tabela 2.

Tabela 2. População por situação do domicílio, de Carazinho, Passo Fundo e RS, 1940

Tanto nos municípios em análise como no Estado a maior parte da população residia no meio rural, no ano de 1940, conforme apresenta Tabela 2. Com uma população superior de 80.138, Passo Fundo apresentava maior parte das pessoas no meio rural (74,31%), mas comparativamente com Carazinho, tinha mais pessoas residindo no meio urbano (25,69%). Carazinho contava com 50.866 pessoas sendo destas 79,36% no meio rural e 20,64% no meio urbano. Sendo a população rural superior em ambos os municípios, questiona-se: como era a distribuição fundiária nesses municípios? Era constituída por pequenos estabelecimentos? A Tabela 3 responde a esse questionamento.

Tabela 3. Número de estabelecimentos por grupo de área total, em ha, em Carazinho e Passo Fundo, 1940

Conforme mostra Tabela 3 a maior parte dos estabelecimentos estava no grupo de com menos de 50 ha, cerca de 80,98% dos estabelecimentos de Carazinho tinham menos de 50 ha, enquanto em Passo Fundo esse número era de 74,56%. Assim, o município que apresentava maior percentual de estabelecimentos no grupo com maior área total era Passo Fundo. Nesse município 25,44% dos estabelecimentos tinham mais de 50 ha, sendo em Carazinho 19,02% se enquadravam nesse grupo. Já, em se tratando da distribuição da população ocupada entre os setores urbanos e rural, verificase que nos municípios de Carazinho e Passo Fundo a distribuição era relativamente similar à Estadual, sendo Passo Fundo o mais semelhante com o RS, conforme apresenta Tabela 4.

Passo Fundo possuía um total de 75.292 pessoas ocupadas, enquanto em Carazinho esse número era de 49.992. Ambos os municípios tinham no setor de serviços a maior parte das pessoas ocupadas. Da mesma forma que no Estado, as atividades domésticas, escolares, comércio de mercadorias e atividades, eram as mais representativas na agregação de pessoas. No caso de Passo Fundo, as atividades de transporte e comunicações e defesa nacional também se destacavam. Comparando com Carazinho essas duas atividades eram bem mais representativas nesse município. Já, o setor industrial tinha em Carazinho o maior percentual, sendo que Passo Fundo era superior em valores absolutos. A indústria de transformação tinha o maior percentual na agregação de pessoas em ambos os municípios. Carazinho tinha a maior parcela relativa no setor agropecuário.

Quando se analisa o Produto Interno Bruto – o PIB, municipal, ou seja, o volume de riquezas produzidas no ano de 1939 verifica-se que havia em Carazinho uma participação maior do setor agropecuário no PIB total (60,73%) se comparado com Passo Fundo (36,69%) e o RS (44,31%). No setor de serviços Passo Fundo possuía quase o dobro de participação que Carazinho. Enquanto no primeiro município essa participação era de 41,84%, no segundo esse percentual era de 22,03%. Esses dados parecem apontar Passo Fundo como um maior centro de serviços se comparado com Carazinho. Já, no setor industrial a participação no total municipal de ambos os municípios não era tão discrepante.

Tabela 4. Pessoas ocupadas por ramos de atividades, em Carazinho e Passo Fundo, 1940

Tabela 5. Produto Interno Bruto, setorial, de Carazinho, Passo Fundo e RS, 1939

A representatividade desses setores na distribuição setorial das pessoas ocupadas se refletia nas especializações municipais, conforme mostra Tabela 6. Ressalta-se que as especializações são definidas a partir do Quociente Locacional (QL), um dos indicadores mais difundidos pela literatura, e mostra, a partir da comparação com uma região de referência, no nosso caso com o Estado do RS, a representatividade de cada setor em cada um dos municípios. O QL sempre será positivo se igual ou maior que zero, e quando for superior a unidade, indicará que tal atividade é mais especializada (uma potencialidade) no município em comparação com o Estado5.

Tabela 6. Quocientes locacionais, por atividade, de Carazinho e Passo Fundo, 1940

Conforme dados demonstrados na Tabela 6 Carazinho possuía especializações nos setores da agropecuária e indústria. Neste último eram as indústrias de transformação as que mais se destacavam. Passo Fundo possuía o setor industrial e, em especial, as indústrias de transformação como representativas no rol de suas especializações. Porém, diferentemente que Carazinho, tinha um setor de serviços em destaque, com várias atividades especializadas. Os destaques desse setor eram: o setor de transporte e comunicação, defesa nacional e segurança pública, profissões liberais e as atividades domésticas e escolares. Essas informações apontam para a caracterização de Passo Fundo como um centro de serviços na região, comprovando os dados da Tabela 5. O setor da agropecuária não se apresentava como especializado nesse município.

 

6. CONCLUSÃO

Nesse estudo, procuramos evidenciar alguns fatores que consideramos de grande relevância no desenvolvimento do Rio Grande do Sul, mas também dos municípios de Passo Fundo e Carazinho, municípios esses que fazem parte do Planalto Médio Gaúcho. Ressaltamos como fator que contribuiu para o desenvolvimento do estado o incentivo dado ao cooperativismo e associativismo. Vargas desde o Governo Provisório estabeleceu que as classes produtoras deveriam organizar-se sob a forma de “consórcios profissionais cooperativos”, com o objetivo de defender os interesses dos associados. No Rio Grande do Sul a forma que predominou foram as cooperativas e os sindicatos, apesar de Flores não simpatizar com o sistema das cooperativas.

Passo Fundo figurou no cenário da região como um centro econômico e político que coordenava a região do Planalto Médio, da mesma forma que a madeira, a erva-mate e a banha também se constituíam nos produtos industriais de grande força para o setor exportador de Carazinho, colaborando para o crescimento econômico estadual.

Nessa mesma concepção, vale efetuar um adendo para salientar que as elites políticas regionais que conduziram o curso do desenvolvimento, estavam alijadas no poder formal ou, informal, dessa maneira, suas ações eram conduzidas pela esfera econômica dentro de um processo produtivo capitalista. Estas relações de poder se estabeleciam e funcionavam, em um primeiro momento, no âmbito dos interesses políticos e, num segundo momento, econômicos sempre com base na atuação do Estado como resultante de uma confluência de fatores em que lógicas globais e processos de ordem regional, local e nacional se entrecruzavam, em algumas vezes se complementando e em outras se contrapondo.

A participação das elites econômicas na condução dos negócios públicos através da criação de órgãos ou conselhos técnicos tinha a finalidade de favorecer a expansão do capitalismo. Nesse sentido, era dada preferência às elites industriais em detrimento das elites rurais, por serem consideradas politicamente mais capazes.

Abordamos, também, a ascensão da indústria até 1941, quando diante da Guerra ela se sobrepõe à s atividades agrícolas e se torna mais abrangente e complexa. Nesse cenário surgem novos líderes industriais e a intervenção do Estado nessa atividade repercutiram nos municípios elencados, através da chegada do progresso e da diversidade de empresas e associações e sindicatos, figuras decisivas para a manutenção do poder econômico e político locais.

O modelo de desenvolvimento da Era Vargas se pautava no desenvolvimento autárquico e intervencionista, que na sua época assegurou o progresso e permitiu a industrialização do país. Em Passo Fundo e Carazinho, as elites econômicas ligadas ao comércio e indústria, especialmente da madeira e do trigo, também se fizeram representar no cenário político, pois para investir na indústria era preciso abrir novas estradas, aumentar as linhas ferroviárias, melhorar as comunicações. Tudo isso para que as matérias-primas pudessem chegar até as fábricas. E, depois, para que os produtos das fábricas pudessem chegar até os consumidores finais de todo o país. Afinal o Planalto Médio era o celeiro do Rio Grande o que lhe garantia certos privilégios condizentes com a sua importância econômica diante do abastecimento interno e externo do país. Nesse sentido, para Vargas, o Rio Grande do Sul era importante porque assegurava o abastecimento do mercado interno nacional.

 

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Recibido: febrero 18 de 2009; Aprobado: mayo 14 de 2009

 

* Este estudo é parte da Tese de Doutoramento. Trabalho investigativo financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), com duração de 3 anos e dois meses, insere-se na linha de pesquisa Sociedade, políticas públicas e desenvolvimento regional.

1 Getúlio Dorneles Vargas foi um personagem de grande relevância na história do Rio Grande do Sul e do Brasil. Gaúcho de São Borja foi membro atuante da Revolução de 1930 e presidente do Brasil de 1930 até 1945, sendo reeleito em 1950 até 1954 quando de sua morte.

2 Para Fonseca (1983, p. 63), o trigo, apesar de ser uma cultura não regular, no entanto chegou a abastecer o mercado estadual e também chegou ao ponto de ser exportado para outros estados brasileiros.

3 As cifras se referem a moeda brasileira em vigor em 1930, ou seja, Réis. Importante destacar que se faz necessário manter as cifras no original. Vale destacar que os valores após os dois pontos não eram escritos, assim está nos documentos originais.

4 Relatório apresentado ao cel. Oswaldo Cordeiro de Farias ,Interventor do Estado do Rio Grande do Sul, pelo prefeito de Passo Fundo, Arthur Ferreira Filho, n. 0118, em 1939. p. 13.

5 Para maiores detalhes sobre a forma de cálculo do QL ver PAIVA (2004).

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