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Historia Crítica

versão impressa ISSN 0121-1617

hist.crit.  no.72 Bogotá jan./abr. 2019

https://doi.org/10.7440/histcrit72.2019.06 

Tema abierto

Teoria e práxis revolucionária dos trotskistas brasileiros (São Paulo, 1930-1945)*

Teoría y praxis revolucionaria de los trotskistas brasileños (São Paulo, 1930-1945)

Brazilian Trotskyists Revolutionary Theory and Praxis (São Paulo, 1930-1945)

Alzira Lobo de Arruda Campos** 

Marília Gomes Ghizzi Godoy*** 

Rafael Lopes de Souza**** 

** Docente do programa de Mestrado em Ciências Humanas da Universidade de Santo Amaro (Brasil). Mestra e Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo (Brasil). Livre-docente em Metodologia da História pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Neto” (Câmpus de Franca, São Paulo-Brasil). Artigos publicados, em coautoria, “Cotidiano e magia na ordem escravocrata”. Portuguese Studies Review 25 (2018): 107-125; “Memória e História da esquerda: a organização da massa trabalhadora em São Paulo, Brasil”. CLIO 35 (2017): 89-113; e “Autocríticas e expurgos nos círculos revolucionários paulistas (1928-1935)”. Antíteses 9 (2016): 115-135. loboarruda@hotmail.com

*** Docente do programa de Mestrado em Ciências Humanas da Universidade de Santo Amaro (Brasil). Mestra em Antropologia da Universidade de São Paulo e Doutora em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Brasil). Participa dos Grupos de Pesquisa Movimentos Sociais e Imaginação, Arte e Cultura. Suas últimas publicações são, em coautoria: “Imaginário e representações míticas: as belas palavras (Ayvu Porã) dos cantos divinos (Mborai) Guarani Mbya”. Espaço Ameríndio 11 (2017): 167-185; “Memória e História da esquerda: a organização da massa trabalhadora em São Paulo, Brasil”. CLIO 35 (2017): 89-113; e “Autocríticas e expurgos nos círculos revolucionários paulistas (1928-1935)”. Antíteses 9 (2016): 115-135. mgggodoy@ yahoo.com.br

**** Docente do programa de Mestrado em Ciências Humanas da Universidade de Santo Amaro (Brasil). Mestre em História Social da Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”, Câmpus de Assis (Brasil) e Doutor em História Social da Universidade Estadual de Campinas (Brasil). Participa do Grupo de Pesquisa Movimentos Sociais. Suas últimas publicações são, em coautoria: “Esquecendo o vivido e lembrando o imaginado: as rememorações da folha de S. Paulo e do Estadão sobre o Golpe Militar de 1964”, em Esquecendo o vivido e lembrando o imaginado: as rememorações da Folha de S. Paulo e do Estadão sobre o Golpe Militar de 1964, organizado por Leandro Pereira Gonçalves e Vinícius Liebel, vol. 13 (Porto Alegre: ediPUCRS, 2018): 99-122; “Memória e História da esquerda: a organização da massa trabalhadora em São Paulo, Brasil”. CLIO 35 (2017): 89-113; “Notícias do Outubro Vermelho: a Revolução Russa nas páginas do jornal O Estado de S. Paulo”. Projeto História. Revista do Programa de Estudos Pós-graduados de História 60 (2017): 44-77. canoeiros2008@gmail.com


Resumo

Objetivo/contexto:

Verifica-se o papel desempenhado pelos primeiros ativistas dissidentes do stalinismo, com o objetivo de auferir o impacto da teoria marxista-leninista e da Revolução Russa sobre a organização do pensamento e da militância de esquerda, na capital paulista. As ideias e a atuação dos trotskistas brasileiros, nas décadas de 1920 e 1930, são reavaliadas a partir da análise de documentos de primeira mão, a fim de entender as interpretações que os dissidentes deram a acontecimentos históricos dos quais foram protagonistas ativos e fervorosos. Espera-se, assim, chegar a uma interpretação mais rigorosa sobre a formação e o desenvolvimento do PCB (Partido Comunista do Brasil).

Originalidade:

Os estudos sobre o PCB assumem usualmente o viés stalinista, menosprezando os trotskistas, como covardes ou traidores da Revolução Proletária. Esta análise traz à tona a interpretação dos trotskistas sobre os acontecimentos dos quais participaram, com o apoio de uma farta documentação, em grande parte inédita, conservada nos arquivos operários e nos policiais.

Metodologia:

Esta abordagem utiliza-se de conceitos consagrados pelo método dialético marxista-leninista, estendidos à categoria dos “saberes sujeitados”, entendidos como blocos de conhecimentos históricos que estavam presentes e disfarçados no interior dos conjuntos funcionais e sistemáticos, e que se encontravam desqualificados como saberes não conceituais, hierarquicamente inferiores. Trata-se de uma abordagem que põe em questão as sistematizações formais de autores consagrados, e traz à tona as narrativas de indivíduos silenciados pelo poder. Ao focalizar ações humanas e significados que passam despercebidos nos grandes quadros analíticos, tem-se por objetivo extrair de fatos aparentemente corriqueiros uma dimensão sociocultural relevante, com o apelo ao recurso da narrativa.

Conclusões:

Fortemente influenciados pelos imigrantes e pelo anarquismo, os movimentos operários brasileiros estruturaram-se em sindicatos e partidos próprios, do qual o mais importante foi o Partido Comunista do Brasil, fundado em 1922. Em pouco tempo, como consequência da luta mortal travada entre Stalin e Trotsky, os camaradas brasileiros divergiram fortemente sobre os rumos da revolução, dando origem a uma disputa árdua para o domínio da direção partidária, considerando que ela se afastava do materialismo histórico e condenava, por esse procedimento, a marcha do proletariado a desvios e à derrota. O grupo mais operante dos opositores, reunido na Liga Comunista Internacionalista, travou uma luta constante contra os dirigentes do partido e a polícia política, transformando-se em vítimas preferenciais da repressão, nos tempos difíceis da ditadura varguista.

Palavras-Chave: Palavras-chave:; cotidiano revolucionário; embates doutrinários; práxis revolucionárias; trotskistas brasileiros

Resumen

Objetivo/contexto:

Se estudia el papel desempeñado por los primeros activistas disidentes del estalinismo con el objetivo de identificar el impacto de la teoría marxista-leninista y de la Revolución Rusa sobre la organización del pensamiento y de la militancia de izquierda en la capital de São Paulo. Las ideas y la actuación de los trotskistas brasileños, en las décadas de 1920 y 1930, son revaluadas a partir del análisis de fuentes primarias, con el fin de entender las interpretaciones que los disidentes han dado a los sucesos históricos de los cuales han sido protagonistas activos y fervorosos. Se espera, de esa manera, llegar a una interpretación más rigurosa sobre la formación y el desarrollo del PCB (Partido Comunista de Brasil).

Originalidad:

Las investigaciones sobre el PCB suelen asumir un sesgo estalinista y menosprecian a los trotskistas como cobardes o traidores de la Revolución Proletaria. Este análisis trae a la luz la interpretación de los trotskistas sobre los sucesos en los cuales han participado, con el apoyo de una documentación abundante, mayoritariamente inédita, conservada en los archivos obreros y policiales.

Metodología:

Se emplean conceptos consagrados por el método dialéctico marxista-leninista, elevados a la categoría de “saberes sujetos”, entendidos como bloques de conocimientos históricos que estaban presentes y ocultos en el interior de conjuntos funcionales y sistemáticos, y que se encontraban descalificados como saberes no conceptuales, jerárquicamente inferiores. Se trata de un enfoque que cuestiona las sistematizaciones formales de autores consagrados y trae a la luz las narrativas de individuos silenciados por el poder. Al enfocarse en acciones humanas y significados que pasan desapercibidos para las grandes estructuras analíticas, el objetivo es extraer de hechos aparentemente ordinarios una dimensión sociocultural relevante, con el uso del recurso de la narrativa.

Conclusiones:

Fuertemente influenciados por los inmigrantes y por el anarquismo, los movimientos obreros brasileños se han estructurado en sindicatos y partidos propios, de los cuales el más importante ha sido el Partido Comunista de Brasil, fundado en 1922. En poco tiempo, a consecuencia de la lucha mortal entre Stalin y Trotsky, los camaradas brasileños discreparon considerablemente sobre los rumbos de la revolución, lo que inició una difícil disputa del dominio de la dirección partidaria, al considerar que esta se alejaba del materialismo histórico y condenaba, por dicho procedimiento, el progreso del proletariado a la dispersión y a la derrota. El grupo más activo de opositores, reunido en la Liga Comunista Internacionalista, empezó una lucha constante contra los dirigentes del partido y la policía política, y se convirtieron en víctimas preferenciales de la represión, en los difíciles tiempos de la dictadura de Getúlio Vargas.

Palabras clave: cotidianidad revolucionaria; disputas doctrinarias; praxis revolucionarias; trotskistas brasileños

Abstract

Objective/context:

It is possible to verify the role performed by the first activist dissidents from Stalinism aiming at noticing the impact from Marxist-Leninist theory and Russian Revolution on the organization of thinking and left-wing militancy in the capital of São Paulo. The Brazilian Trotskyists ideas and action, during the 1920s and 1930s, are re-evaluated from the analysis of primary sources, in order to understand the interpretations that the dissidents have given to historical events in which they were active and fervent protagonists. In that manner, we expect to get to a more rigorous interpretation of the formation and development of PCB (Brazilian Communist Party).

Originality:

The studies on PCB usually assume a Stalinist bias, despising Trotskyists as cowards or traitors of Proletarian Revolution. This analysis reveals the Trotskyists interpretation of the events in which they participated, with the support of vast documentation, mostly unpublished, preserved in workers and police archives.

Methodology:

This approach uses concepts consecrated by the Marxist-Leninist dialectical method, raised to the category of “subject knowledge”, understood as blocks of historical knowledge that were present and disguised in the interior of functional and systematic sets, and that were disqualified as non-conceptual knowledge, hierarchically inferior. This is an approach that questions the formal systematizations from consecrated authors and raises the narratives of individuals who were silenced by power. By focusing on human actions and meanings that go unnoticed in broad analytical frameworks, the goal is to extract from facts that are apparently common a relevant sociocultural dimension, with the use of the narrative as a resource.

Conclusions:

Strongly influenced by immigrants and by anarchism, the Brazilian labor movements created their own labor unions and parties, and the most important was the Brazilian Communist Party, founded in 1922. In no time, as a consequence of the mortal fight between Stalin and Trotsky, the Brazilian comrades strongly disagreed about the course of the revolution, originating a severe dispute for the dominance of the party’s direction, considering that it was moving away from historical materialism and condemned, for this procedure, the proletarian progress to deviance and defeat. The opponent most operating group, gathered in the International Communist League, started a constant fight against the party’s direction and political policy, becoming the repression preferential victims during the difficult times under the dictatorship of Getúlio Vargas.

Keywords: Brazilian trotskyists; doctrinaire dispute; revolutionary praxis; revolutionary everyday life

Introdução

Um dos pontos cruciais do estudo da formação da esquerda no Brasil refere-se às fontes teóricas produzidas ou retransmitidas pelo Partido Comunista do Brasil (PCB), na situação e na oposição. Em especial, no que concerne aos documentos produzidos pela oposição, deliberadamente negligenciados pela historiografia dominante, presa a compromissos partidários1 mais do que ao seu ofício. A respeito, a observação de Robert Alexander sobre ter descoberto não existir nenhum estudo sobre o trotskismo internacional2, quando se lançou à tarefa de escrever sua análise enciclopédica sobre o tema, continua, em grande parte atual para o caso brasileiro. Esse silêncio vem sendo quebrado em trabalhos específicos sobre o trotskismo, surgidos nos finais do século XX e neste século, mas que ainda são insuficientes em número e natureza para dar uma resposta plausível a problemas relacionados aos primeiros anos do trotskismo, quando uma parcela de camaradas aderiu ao internacionalismo marxista-leninista, denunciando desvios e erros da Terceira Internacional. A fim de responder à questão que se coloca a respeito do significado das dissidências e dos dissidentes na organização da massa trabalhadora e no estabelecimento do comunismo no Brasil este artigo apoia-se em testemunhos dos próprios revolucionários, cujas experiências são consideradas como mediadoras necessárias entre os conceitos de consciência e ação coletiva de classe nas relações de produção3 vigentes na primeira metade do século XX.

A fim de contribuir para o esclarecimento dessa questão, enfocam-se aqui os debates teóricos entre as militâncias stalinista e trotskista, a partir dos pontos de vista da última. Trata-se de tarefa complexa, pois não basta identificar obras e ideias: é preciso ter em conta os meios de produção e difusão dos textos literários utilizados pelos revolucionários brasileiros. Os arquivos documentais vêm em nosso auxílio. A ação das Delegacias de Ordem Política e Social de São Paulo, sob o regime getulista4, realizou uma coleta de livros, jornais, revistas, opúsculos, boletos, entre outros, que auxilia a resolução desse problema, mas que diz pouco sobre as circunstâncias em que esse material foi produzido. Circunstâncias essas melhor especificadas nos documentos lavrados pelos próprios militantes, em suas cartas e atas de reuniões. Nelas, encontram-se registrados os aspectos mais inesperados de um cotidiano, passado no gueto físico e moral da dupla clandestinidade que enfrentavam, como perseguidos pela polícia política e como renegados pelo PCB: nexos que mantinham com editoras, estratégias por eles operadas para a difusão da teoria revolucionária, problemas financeiros, gostos e estilos do grupo a que pertenciam. Enfim, um conjunto de assuntos esclarecedor do decantado estereótipo da tibieza teórica das primeiras lideranças de esquerda no Brasil, que, estranhamente, caminha ao lado da posição consensual assumida pela historiografia de que a revolução no Brasil resultou das núpcias entre o movimento operário e a teoria revolucionária, fortalecida, após 1917, pelo exemplo histórico da “pátria proletária”. Ao abrir mão de procurar na historiografia tradicional interpretações sobre a produção, circulação e consumo da teoria marxista, assumimos uma abordagem metodológica, que incorpora à narrativa historiográfica a voz dos trotskistas e permite que, na condição de atores sociais, apresentem a sua versão dos acontecimentos, efetuada no calor de sua práxis revolucionária. Documentos de primeira mão produzidos pela polícia ou pelos trotskistas ajudam a compor um quadro que incorpora os debates dos dissidentes comunistas à história do Partido Comunista do Brasil, apresentando a teoria e a prática revolucionárias no viés da Oposição de Esquerda. Com tais procedimentos, busca-se contribuir para o conhecimento sobre os dissidentes, em seu cotidiano de lutas contra a Comissão Central do Partido e a polícia política de Vargas.

O estado atual do conhecimento: a bibliografia especializada

Quanto à bibliografia especializada, International Trotskyism. 1929-1985. A Documented Analysis of the Movement, de Robert J. Alexander, com suas mais de mil páginas, constitui a única história geral sobre os numerosos movimentos, com seus figurantes respectivos, que compuseram a Oposição de Esquerda Internacional. Com perfil enciclopédico, essa obra é definitivamente referência obrigatória para os interessados em compreender um movimento que, por mais de meio século, teve impactos significativos na cultura política de países situados nas mais diversas partes do mundo. Por meio de uma massa expressiva de material, reunido a partir de múltiplas fontes, da qual sobressaem entrevistas realizadas com algumas das mais expressivas lideranças trotskistas, Alexander apresenta uma história documentada sobre as origens, desenvolvimento e natureza dos movimentos trotskistas em todo o mundo, incluindo, necessariamente, o nosso país. As explicações por ele fornecidas a respeito do primeiro trotskismo no Brasil encontram-se, neste artigo, amplificadas (e emendadas, em alguns pontos), como consequência do caráter exaustivo que esta pesquisa assumiu. A crítica apresentada à obra de Alexander, de que se trataria de um trabalho altamente descritivo e sem elaboração histórica, não parece se sustentar, quando confrontada com a vasta bibliografia que apoia os fatos apurados, com rigor e tenacidade5.

Dainis Karepovs é o historiador nacional que mais se tem dedicado a estudar os trotskistas. Em sua dissertação sobre o cisma de 1937-1938, declara que a historiografia das cisões no PCB ocupa poucos parágrafos das obras que tratam daquele período e, em geral, mantêm a interpretação oficial dos stalinistas. Essa visão estilizada, pouco sistematizada, pouco lastreada por fontes de primeira mão, acaba por desclassificar a visão dos dissidentes, encerrando os saberes no aspecto institucional e burocrático da direção partidária e da Internacional Comunista. Karepovs observa que os partidos comunistas sempre tiveram o hábito de reescrever suas próprias histórias de acordo com a orientação política por eles praticada no momento histórico em que tais textos foram produzidos -a cada mudança de linha política, muitos episódios tiveram sua interpretação completamente alterada. Nos anos de 1970, as dissidências voltaram a ser abordadas e subsidiadas por documentos, como faz Edgard Carone. No entanto, ao assumir a explicação oficial que responsabiliza personalidades -que teriam errado na avaliação do momento histórico e na condução do partido- pelas cisões ocorridas, Carone tende a impedir o aprofundamento do exame e discussão da política comunista nos anos de 19306. É preciso arrolar, ainda, Ricardo Figueiredo de Castro, que trata da oposição de esquerda brasileira (1928-1934), dos pontos de vista da teoria e da práxis brevolucionária, nos anos cruciais da formação e desenvolvimento dos primeiros trotskistas (1928-1924)7.

Alzira Lobo de Arruda Campos elaborou ampla pesquisa sobre o trotskismo em São Paulo, a qual exauriu fontes produzidas pelos revolucionários e pela repressão, procurando entender, na vida particular dos Opositores de Esquerda, o papel que as dissidências operaram na organização do Partido Comunista do Brasil8. No âmbito do materialismo histórico, a autora realiza uma história da classe trabalhadora encarando os destinos pessoais dos militantes à luz da luta dialética do trabalho contra o capital9.

Murilo Leal Pereira Neto contribui para esclarecer determinadas posições e trajetórias dos aderentes da Liga Comunista em São Paulo. Ao mostrar o que foi o trotskismo no Brasil no período de 1952-1966, sua análise acaba por incorporar circunstâncias de vidas dos trotskistas na época de Vargas. No campo teórico-metodológico, Pereira Neto desenvolve críticas à historiografia nacional, que se tornam quase inevitáveis para os estudiosos das dissidências do PCB. Pereira Neto denuncia as obras que pretendem reduzir a história do proletariado brasileiro à história do partido e a tendência acadêmica que reproduz acriticamente essa visão, “reduzindo a importância de outras correntes e práticas políticas e empobrecendo a compreensão da pluralidade real de influências, práticas, tentativas e projetos que constituem a história da esquerda brasileira”10. Como exemplo, são citadas as numerosas obras de Carone dedicadas ao estudo do movimento operário no Brasil e à história do PCB, que esquecem ou desqualificam a ação dos trotskistas, sumária e erroneamente. Daniel Aarão Reis -continua a crítica- exclui os trotskistas das organizações comunistas no Brasil “pela sua pequena expressão política e social”, restringindo-se a estudar os grupos que “assumiram o ‘legado’ marxista-leninista e a contribuição da III Internacional”11.

Entre as obras coletivas relativas ao tema, vale destacar Trotsky hoje, livro comemorativo do 50° aniversário do assassinato de Trotsky, que apresenta, a partir “do balanço das ideias e da trajetória desse líder, os problemas do socialismo ao longo de nosso século, em especial no presente”12. Esse livro reúne reflexões sobre pontos importantes do revisionismo que se seguiu à morte de Stalin, como no caso de Wladimir Billik, historiador soviético, que escreveu ao comitê central do Partido Comunista da União Soviética e apontou a necessidade de se reexaminar a historiografia sobre o tema, uma vez que:

“no imenso legado ideológico de Trotsky há muitas indicações extremamente úteis que dizem respeito às nossas tarefas mesmo atuais, tanto nos domínios político e econômico quanto nos campos nacional social e de ideias. [...] nos anos 20, a fórmula “Lenin e Trotsky” -demonstrando que, entre os colaboradores de Lenin, Trotsky era o mais importante, o de maior autoridade e popularidade- era bastante conhecida tanto pelos amigos quanto pelos inimigos da revolução. Mas esse verdadeiro lado de Trotsky foi, até hoje, dissimulado às gerações posteriores. Durante décadas, seu nome esteve ligado a tantas acusações sem fundamento que ele se tornou, para muitos, um termo negativo13”.

José Castilho Marques Neto, por sua vez, estuda as origens do trotskismo no Brasil, buscando ensinamentos na dimensão social das vidas de militantes do “contrafluxo”, especialmente em Mário Pedrosa. Com esse procedimento, Castilho traz relevantes aportes a visões que se têm preocupado, talvez em demasia, com o significado puramente político do assunto ou com personalidades já consagradas pela historiografia sobre o PCB.

Um pouco no prisma de Castilho, esta análise procura verificar o papel desempenhado pelos primeiros ativistas dissidentes do stalinismo, auferindo o impacto que a teoria marxista-leninista e a Revolução Russa (em seus triunfos e vicissitudes) tiveram na organização do pensamento e da militância de esquerda, na capital paulista. Fundamentalmente, preocupa-se com os trotskistas -reunidos efemeramente na Liga Comunista Internacionalista-, atendendo à necessidade de reavaliação do que significaram as presenças de Mário Pedrosa, Lívio Barreto Xavier, Aristides da Silveira Lobo, João da Costa Pimenta, João Matheus, Victor de Azevedo Pinheiro, Plínio Gomes de Mello -do grupo a que Fúlvio Abramo denominou de “primeiro trotskismo”- no processo subsequente do movimento revolucionário: da semente então plantada e cujos resultados são muito mais significativos e promissores do que geralmente se considera14.

Além dessas obras mais diretamente conectadas aos proto-trotskistas, são imprescindíveis para o estudo de questões que levaram parte dos camaradas à oposição determinados autores que cuidaram da formação do Partido Comunista, de seus conflitos e integração nos primeiros anos da sua história. Estão nessa linha, entre outros: Ronald H. Chilcote15, John W. F. Dulles16, Eliana Regina de Freitas Dutra e Yonne de Souza Grossi17, Paulo Sérgio Pinheiro18, E. P. Thompson19 e Moisés Vinhas20.

É preciso lembrar que os revolucionários das décadas de 1920 e 1930 consideravam que o perfeito conhecimento da teoria marxista, expressa pelo bolchevismo-leninismo, implicava a vitória da revolução. A teoria científica e a prática revolucionária caminhariam juntas, rumo à sociedade sem classes. Motivo, pois, suficiente para explicar o empenho com que as lideranças paulistas traduziam obras, organizavam seminários e cursos, promoviam debates, editavam livros e jornais, veiculando reflexões teóricas internacionais e locais básicas às “estratégias da ilusão” desse momento histórico. Essas atividades, que podem ser acompanhadas nos registros da revolução/repressão, espantam pelo volume e resultados alcançados, quando analisados no quadro das possibilidades de leitura que teriam os militantes nesse momento histórico. Os intelectuais constituíam figuras-chave e óbvias dessa esfera, mas não a esgotavam, pois os conceitos apreendidos por eles eram rapidamente transmitidos ao operariado, o verdadeiro dono da revolução. Os operários, por sua vez, “intelectualizavam-se” ao absorverem a fundamentação doutrinária que lhes era transmitida por meio de jornais, livros, cursos, conferências.

Raízes bolcheviques

O desenvolvimento internacional da Oposição de Esquerda deita raízes na Revolução Russa de 1917, nos seus 12 primeiros anos e, principalmente, na Internacional Comunista. Robert J. Alexander nota que, 55 anos depois de Karl Marx estabelecer a Primeira Internacional em Londres, em 1864, e 30 anos depois de os discípulos de Marx organizarem a Segunda Internacional (Socialista) em Paris em 1889, Vladimir Ilyitch Lenin e Leon Trotsky fundaram a Terceira Internacional. Esta organização, formalmente conhecida como Internacional Comunista, foi o primeiro grupo que teve a ambição objetiva de criar o partido da revolução mundial, um partido internacional com seções nacionais. Nos primeiros tempos de sua existência, o comunismo internacional atraiu um grupo heterogêneo de entusiastas, como os socialistas, que se sentiram identificados com os ataques do Comintern ao sistema capitalista; os pacifistas, que se juntavam à oposição do Comintern à guerra; e os anarquistas, que confundiram inteiramente a natureza da Revolução de 1917 com as suas próprias ideias a respeito do comunismo internacional. Por sua vez, os líderes bolchevistas pretendiam criar um partido internacional governado pelos mesmos princípios de “centralismo democrático” -o Partido Comunista da União Soviética- e o estabelecimento de uma “ditadura do proletariado”, como etapa necessária para a construção da sociedade socialista21.

O ano de 1923 foi, na Europa, um ano de refluxo da revolução, que apresentou uma curva ascendente de 1917-1919 e descendente em 1920 e 1921. Em setembro de 1923, explodiram greves em diversas fábricas da Rússia. Ao mesmo tempo, no partido, surgiram agrupamentos ilegais hostis ao comunismo, como uma oposição anarco-sindicalista e uma oposição menchevique, que foram dissolvidas. Em outubro, Trotsky dirigiu ao Comitê Central uma carta que insistia na aplicação da democracia interna do partido e na aplicação estrita e imediata das teses sobre o plano econômico. O Partido Comunista era dirigido pela chamada “troika” (constituída por Kamenev, Stalin e Zinoviev), que combatia Trotsky. Assim nasceu a Oposição de Esquerda Internacional contra Stalin e liderada por Trotsky. Este e um grupo de velhos bolcheviques acusaram o partido bolchevique de degenerescência, da extinção de sua democracia interna e do nascimento de uma burocracia privilegiada, que monopolizava os poderes do Estado e do partido22.

À morte de Vladimir Ilyitch Lenin, ocorrida em 1924, seguiu-se uma luta sangrenta pela sucessão ao poder, entre Leon Trotsky, o sucessor óbvio de Lenin, visto internacionalmente como a segunda figura da revolução, e Stalin, o poderoso secretário-geral do partido. Trotsky, além de haver organizado e liderado o exército vermelho (com o qual pôs fim à guerra civil de 1918-1921), era um teórico genial e um grande orador. Entretanto, deparou-se com a capacidade de conspiração e de manobras políticas de Josip Djugashvili (nome de partido, Joseph Stalin), um dos mais importantes líderes da revolução em 1922. Note-se, ademais, que Trotsky tinha uma fragilidade fatal: ele fora um dos últimos a se aliar aos bolcheviques, alguns meses apenas antes da queda do governo de Aleksandr Kerensky, em 7 de novembro de 1917, e, nos anos anteriores à Primeira Guerra Mundial, ele fora um crítico de Lenin e dos bolcheviques. Consequentemente, foi sempre compelido a demonstrar que era melhor bolchevique do que outros que se aliaram precocemente a Lenin. Na verdade, Trotsky elaborou uma das mais brilhantes análises sobre a natureza e os prováveis resultados da teoria de Lenin sobre o “centralismo democrático” e a “ditadura do proletariado”. Ele previu a vitória da ditadura do partido sobre a ditadura do proletariado, do Comitê Central do partido sobre o próprio partido, e de um homem sobre o Comitê Central.

Na última fase da doença de Lenin, Stalin manobrou para ser o secretário-geral do partido, virtualmente o “guardião de Lenin”. Trotsky, afastado da organização, deu início à Oposição de Esquerda em 30 de janeiro de 1924, alguns meses antes da morte de Lenin. Nesse momento, nasceu uma aliança destinada a afastar Trotsky do poder e formada pela “Primeira Troika”: Stalin, o secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética; Grigori Zinoviev, chefe do partido na região de Petrogrado e do setor internacional do partido; e Lev Kamenev, líder do partido na região de Moscou. Essa troika afastou Trotsky do poderoso posto de Comissário da Guerra. No entanto, Zinoviev e Kamenev começaram a se incomodar com o crescente poder de Stalin, e, na primavera de 1926, uniram-se com Trotsky -a Oposição de Leningrado- para formar uma Segunda Troika, a chamada Oposição Unificada, acusada de fracionismo e vítima de boicotes nos debates partidários. Afastados facilmente de seus postos de liderança, Trotsky e Zinoviev foram expulsos do Partido Comunista no Congresso de novembro de 1927. Nos meses seguintes, o mesmo aconteceu a Kamenev. Posteriormente, Trotsky sofreu um exílio interno, próximo à fronteira chinesa, e finalmente em janeiro de 1929 foi expulso da União Soviética. Zinoviev e Kamenev capitularam diante de Stalin23.

A fase final da luta interna teve lugar em 1928-1929, quando Stálin transformou Nikolai Bukharin, o líder da Direita do partido, em seu principal aliado na luta contra a Oposição Unificada. Bukharin sucedeu a Zinoviev como chefe do Comintern e presidiu o seu Sexto Congresso em agosto de 1928. Entretanto, ele se opôs às abruptas mudanças na política agrária e industrial forçadas por Stalin e ao exílio de Trotsky. Em fins de 1929, Bukharin estava totalmente derrotado e controlado por Stalin. Muitas personalidades se envolveram na luta travada pelo poder, nesses cinco anos, particularmente na controvérsia entre Stalin e Trotsky. As discussões provenientes dessa luta centraram-se nas políticas internas da União Soviética e em questões que envolviam o Comunismo Internacional. Trotsky, por exemplo, era contrário à Nova Economia Política (NEP), pregava a coletivização da agricultura e enfatizava os perigos para o regime que representaria a existência prolongada de pequenos proprietários de terra. A posição de Stalin sobre o “socialismo num único país” era veementemente combatida por Trotsky, que propunha, em substituição, a teoria da Revolução Permanente.

Duas diretrizes dos assuntos estrangeiros constituíam também matéria de discussão na luta pelo poder na União Soviética, nos anos 1920. Uma era a “aliança” que os sindicatos soviéticos formaram com o Congresso Sindical Britânico em meados de 1920, e que recebia oposição de Stalin. Outra era a continuação da aliança do Comintern e do Partido Comunista Chinês com o Partido Nacionalista Chinês (Kuomintang), à qual se opunha Trotsky. Em maio de 1927, Chiang Kai-shek, o principal líder do Kuomintang e fortemente anticomunista, exterminou o Partido Comunista Chinês.

Ora, esses conflitos afetavam inevitavelmente o Comintern e os partidos comunistas, membros dessa organização. Trotsky foi um dos principais fundadores do Comunismo Internacional. Nos primeiros anos da década de 1920, ele estava encarregado das relações soviéticas com os países latinos: França, Espanha, Portugal, Itália e, tangencialmente, América Latina. Nessa função, envolveu-se pessoalmente em muitas das numerosas controvérsias internas que surgiram nas seções nacionais do Partido Comunista, muitas das quais ainda não sabiam o que estava acontecendo na União Soviética. Ademais, embora muitos líderes comunistas estrangeiros fossem mal informados e, na realidade, pouco interessados na briga interna do Partido Comunista da União Soviética, havia um grande número de líderes comunistas estrangeiros que mantinha relações com um ou outro dos líderes de facções daquele partido. Esses líderes, com a intensificação da luta, trataram de obter apoio nos partidos estrangeiros. Com esse objetivo, Trotsky deu a conhecer uma cópia do chamado “Testamento Político de Lenin”, escrito na fase final de sua doença, no qual, entre outras coisas, ele diz ser urgente a remoção de Stalin do cargo de secretário do Partido Comunista da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

Por outro lado, Zinoviev, na direção do Comintern Internacional (CI), inaugurou um processo do bolchevização desse órgão, enquanto figurava como membro da Primeira Troika, antitrotskista. O controle de Moscou sobre os partidos nacionais resultou na expulsão de muitos camaradas em diversos países. Entretanto, com a formação da Oposição Unificada na União Soviética, e a consequente substituição de Zinoviev como presidente do Comintern, muitos zinovievistas tornaram-se aliados naturais dos trotskistas, embora estes estivessem bastante ressentidos com o papel que Zinoviev e seus amigos estrangeiros tiveram na expulsão de Trotsky do movimento comunista24.

Em 1928, Trotsky e outros membros do partido deportados para a Sibéria e para a Ásia Central organizaram-se fracionalmente, mantendo por carta uma discussão sobre os princípios e as perspectivas da Revolução. Para pôr cobro a essa atividade, Stalin expulsou Trotsky da União Soviética e interrompeu a correspondência entre os deportados. Trotsky fora até então o teórico e o chefe de uma fração do partido, que se considerava como membro legítimo dele e que lutava para nele ser reintegrado. Em razão da brutal repressão aos fracionistas soviéticos, ele considerou que o impulso para a regeneração da Internacional Comunista e do partido teria que vir do exterior -impulso esse considerado como capaz de retomar o movimento revolucionário, traído por Stalin e seus epígonos. Em seu exílio, Trotsky dedicou-se à reconstrução da fração internacional da Oposição de Esquerda, atraindo comunistas e ex-comunistas oponentes ao regime stalinista. Para tanto, uma de suas maiores tarefas foi tentar definir com exatidão o corpo de ideias em torno do qual ele organizava o movimento internacional.

A ideologia trotskista mudou de maneira considerável no pouco mais de uma década em que Trotsky a expôs, e muitos de seus seguidores a mudaram parcialmente nas cinco décadas que se seguiram à sua morte. Trotsky havia definido o trotskismo entre 1929-1932, baseado particularmente em três oposições: ao socialismo num único país; à política anglo-russa do Comitê de Unidade Sindical, e à política de Stalin-Bukharin na Revolução Chinesa. A proposta fundamental dessa teoria refere-se à teoria e prática da Revolução Permanente: só o proletariado (apoiado pelo campesinato) poderia resolver todos os problemas da revolução democrática no curso do estabelecimento da ditadura socialista do proletariado. A teoria do “desenvolvimento desigual e combinado”, como uma extensão do conceito de revolução permanente, é também um conceito básico do trotskismo, assim como a noção das “demandas transitórias” e a tática da frente única. Mais problemática era a insistência de Trotsky de que a União Soviética continuava a ser um Estado operário. Ele analisou extensamente o que chamava de “degenerescência” da União Soviética, mas continuou a defender o que Robert Alexander chama de sua “bona fides”, mesmo quando um grupo importante de seus seguidores mudou de posição. Após a sua morte, essa ideia foi a base de muitas controvérsias entre trotskistas.

Outro elemento básico do trotskismo, depois de 1929, foi a aceitação do leninismo. Isso envolveu os conceitos de partido de vanguarda, centralismo democrático e a ditadura do proletariado. Relacionada à aceitação do leninismo, Trotsky e seus seguidores fizeram uma leitura da democracia política, o que ocasionou conflitos evidentes em relação a esse assunto25. Em resumo, Trotsky propôs aos excluídos do Partido Comunista que assumissem posição a respeito das três questões capazes de definir uma verdadeira oposição de esquerda na Internacional Comunista, claramente distinta da direita blanderiana e do centro stalinista: o comitê sindical anglo-russo, a Revolução Chinesa -destruída pela submissão do Partido Comunista ao Kuomintang- e a política da União Soviética ligada à teoria da construção do socialismo num só país.

O problema crucial, entretanto, da Oposição de Esquerda prendia-se à natureza do Estado soviético, visto como não mais um Estado operário ou socialista, mas como uma nova forma social de exploração. Muitos oposicionistas consideravam que a revolução só seria salva por um novo partido, distinto e concorrente do Partido Comunista, e, com o tempo, uma nova Internacional, que poderia ser a IV. Estavam nessa posição Maurice Paz, na França, Hugo Urbahns, na Alemanha, e Henk Snnevliet, na Holanda, motivo pelo qual Trotsky com eles rompeu. No entanto, conseguiu obter sucesso na França, onde reuniu em torno do semanário La Vérité membros de oposição de origem diversa. Também na Alemanha, na Bélgica, na Espanha, na Itália, nos Estados Unidos, na Tchecoslováquia e na China, Trotsky conseguiu adeptos de suas teses, que organizaram, em seus países, frações da Oposição de Esquerda Internacional, constituídas por centenas dos melhores quadros dos partidos comunistas. O Brasil era o principal polo de influência da Oposição de Esquerda na América Latina, seguido pelo México. No Brasil, o Estado de São Paulo -o mais desenvolvido industrialmente- constituiu o foco da Oposição de Esquerda, abrigando as maiores lideranças dissidentes do Partido26.

O socialismo científico na práxis revolucionária da Oposição de Esquerda

“[...] cada homem de partido tem o direito e o dever de exigir dos chefes explicações claras, definições completas e análises teóricas acabadas. Os operários devem ser tratados como seres pensantes e não como gado. [...] Não basta enunciar os problemas: é preciso dar-lhes reformulação teórica, desenvolvê-los, esclarecê-los e indicar-lhes soluções adequadas. O rádio não é o melhor veículo para um trabalho dessa natureza. O livro continua sendo o grande instrumento de cultura. Os líderes partidários devem demonstrar que leram alguma coisa e que são capazes de transmitir aos seus adeptos aquilo que aprenderam”27.

O pensamento acima expressa a importância que os militantes davam ao discurso político e ao livro, como ferramentas necessárias à difusão da teoria marxista entre os operários, o que nos ajuda a compreender as estratégias que desenvolveram nos embates que travaram contra os stalinistas. Os dirigentes do partido deveriam adquirir, para a sua formação ideológica, os livros seguintes: História do Partido Bolchevique da URSS e Duas táticas, de Lenin, Os fundamentos do leninismo, de Stalin, e o Manifesto comunista, de Engels e Marx28. Proibia-se a leitura de autores comprometidos direta ou indiretamente com a Oposição de Esquerda ou com o anarquismo, o que, de alguma forma, ajuda a conferir a identidade política aos donos de bibliotecas confiscadas pela polícia. Mesmo jornais não comunistas figuravam no índex stalinista.

Menos dogmáticos nas leituras, os oposicionistas realizaram esforços ingentes para se inteirarem de uma teoria complexa e de difícil aplicação ao “caráter da revolução brasileira”. Para eles, os oito grandes clássicos do socialismo científico eram Marx, Engels, Lenin, Rosa Luxemburgo, Trotsky, Plekhanov, Kautsky e Bukharin29. Porém, como a identidade da oposição se afirmava no combate a “desvios stalinistas”, as obras da “situação” integravam o rol das leituras dos membros da liga. A preocupação pelos estudos teóricos baseava boa parte da correspondência dos opositores de esquerda. Assim, Edmundo Moniz escreve a Lívio Barreto Xavier, de Ribeirão Preto, informando que desenvolvia uma ativa propaganda literária, procurando fazer os operários lerem o mais possível Princípios, Dez dias, Socialismo Utópico etc., e que, na vizinha cidade de Altinópolis, já existia um pequeno número de indivíduos interessados em ler livros básicos sobre a dialética marxista, “pois tudo que tinham lido era desordenadamente”30. Em nova missiva, manifesta o desejo de renovar as assinaturas de La Verité e de La Lutte de Classe, ao mesmo tempo que critica as traduções do Pintaúde, necessitadas de revisões, pois era impossível ler livros como Socialismo Utópico e Socialismo Científico em razão “dos muitos erros e linhas puladas”. Por fim, intima Lívio a lhe escrever sobre “as únicas cousas que me põem ao par do movimento em hora tão safada, como a que corremos por culpa da burocracia”31.

Outra carta de Edmundo Moniz informa que, no interior paulista, a situação piorara muito, porque a grande maioria do operariado, que estava mais inclinada a ler e a refletir sobre os assuntos da classe, aderira ao Partido Socialista, fundado pelo “fascista” Juarez Távora. Para os trabalhadores, o Partido Comunista era “uma espécie de mistério, de mito, pois por aqui só vagamente se falava nele”32.

Proselitismo político no cotidiano dos trotskistas: o papel dos livros e dos jornais

Na produção teórica dos oposicionistas, é preciso incluir as numerosas pesquisas que eles realizavam sobre a realidade social brasileira. Victor de Azevedo Pinheiro, por exemplo, no período em que permaneceu em Bariri (São Paulo), elaborou dois trabalhos que serviram para caracterizar a situação brasileira no complexo problema da revolução mundial. Essas pesquisas denotam atividades de campo, a revelar um trabalho anterior de entrevistas junto aos trabalhadores. O texto de Pinheiro levanta um quadro minucioso e sombrio das condições de vida do campesinato, corrigindo a ideia de que as lideranças revolucionárias não se preocupavam em analisar as condições objetivas para a revolução nacional33.

Às voltas com dificuldades financeiras constantes, os opositores de esquerda eram assíduos frequentadores da Biblioteca Municipal de São Paulo. Nessa qualidade, Victor Pinheiro, em 1930, dirige uma carta a Eurico de Góes, diretor daquela biblioteca, dizendo que, desde 1928, quando a Biblioteca fora franqueada ao público, acostumara-se a consultar nela diversas obras que foram, posteriormente, subtraídas da consulta do público, por ordem de Anhaia Mello. Assim, ao fazer o pedido de duas obras de Karl Kautsky La Revolution Socialiste e Socialismo e Malthusianismo, teve a primeira cedida, mas a segunda tinha sido retirada da biblioteca por ordem do prefeito municipal. Na mesma ocasião, Pinheiro pedira O Estado e a Revolução, de Lenin, e diversas obras de Trotsky, “de excelente tradução espanhola”, que ele costumava consultar “nos terríveis tempos do PRP [Partido Republicano Paulista] e da reação policial do delegado Laudelino de Abreu”, mas todas elas tinham também sido retiradas de circulação, salvando-se apenas as edições em idioma francês. Nessa manobra, Pinheiro identificava ação repressiva, destinada a afastar os operários da teoria revolucionária34.

Desde os primeiros momentos de sua existência, a Oposição de Esquerda cuidou de publicar o jornal A Luta de Classe e o Boletim da Oposição. Uma nota fiscal, emitida em 21 de março de 1931, registra que Aristides Lobo havia pago à vista 225$000 por 1.000 exemplares de A Luta de Classe, cada um deles com seis páginas35. Da sua fundação à morte de Trotsky, A Luta de Classe foi o porta-voz das diversas organizações dissidentes nacionais. O seu nome era um homônimo do jornal francês La Lutte de Classe, dirigido por Pierre Naville, que exerceu grande influência sobre a Oposição de Esquerda brasileira, a começar pela cooptação de Pedrosa às ideias trotskistas.

A edição de A Luta de Classe era tarefa prioritária dos trotskistas. Apesar das grandes dificuldades financeiras que enfrentavam e da situação de clandestinidade permanente em que se viam, os opositores sempre imprimiram o seu jornal, uma vez que muitos deles eram gráficos que se utilizavam dos horários mortos de seus locais de trabalho para editá-lo. Em 1934, o grupo Fernando-Alves, liderado por Aristides Lobo, Victor de Azevedo Pinheiro e João Matheus, passou a publicar o jornal A Luta de Classes, do qual, por referências internas da liga, sabemos que foram publicados pelo menos dois números36. A Luta de Classes deveria ser mensal, mas, sujeito às agruras de seus editores, possuía periodicidade muito irregular. Tem-se notícia de 45 números desse jornal37.

Os dissidentes também publicaram O Proletário e O Homem Livre. O último destinava-se a servir à linha política das frentes únicas -em especial, a Antifascista-, assumida pela Liga, em 1933. Todos os elementos da Liga obrigavam-se, na medida do possível, a colaborar no jornal O Homem Livre, especialmente Aristides Lobo e um camarada designado por “italiano” (provavelmente Gofredo Rosini)38. Os opositores de esquerda, ao assumirem posições contrárias à direção nacional do PCB, esmeraram-se no estudo e veiculação da teoria marxista, uma vez que entendiam que os fracassos da esquerda revolucionária decorriam do falso entendimento daquela teoria. Dessa forma, confirmavam a sua qualidade de intelectuais e apontavam para a necessidade de definição teórica e prática da situação brasileira e da sul-americana. Eles “não queriam ser apenas literatos, pois o tempo do romantismo já passara”39.

Imbuídos do pragmatismo intelectual acima mencionado, os opositores liam, produziam e discutiam obras revolucionárias, denunciando os erros que viam na direção nacional, na Internacional Comunista e no stalinismo. A célebre obra Agrarismo e Industrialismo, de Octávio Brandão, desde 1928, recebia duras críticas dos oposicionistas, como produto de “puro idealismo progressista” e não de “marxismo realista”40. Agrarismo e Industrialismo teria reeditado velhos erros oportunistas e surgido para tornar a situação mais confusa, aumentando ainda a obscuridade da massa, do partido e da classe operária. O Partido Comunista sofria as consequências de sua “doença de nascimento”. Fundado pelo meio de 1922, ele vivera, na realidade, até o fim de 1923, como um inofensivo “grupo de oprimidos, assembleia heterogênea de anarquistas”. Em consequência da “extrema indigência teórica” do pequeno número de seus fundadores e da reação policial que o acompanhou desde o berço, o Partido Comunista só se formou verdadeiramente em 1924, após a morte de Lenin. O longo período de reação contra o pensamento e a obra de Lenin, que se seguiu após a sua morte, só chegou ao conhecimento dos camaradas brasileiros no início de 1928.

As informações que se podiam obter sobre a luta da oposição russa eram confusas e unilaterais, uma vez que a burocracia que controlava o partido agia livremente, escudada pela ausência quase completa de literatura revolucionária. Fora precisamente em 1928 que um grupo de camaradas mais esclarecidos tentara opor uma barreira aos atentados que se cometiam contra os princípios marxistas, mas fracassaram por não terem elaborado uma plataforma que definisse seu ponto de vista. Foi apenas pela metade de 1930, com a fundação do Grupo Comunista Lenine, que se criaram as premissas de uma análise crítica da situação. Com base nessas premissas, Lívio Xavier e Mário Pedrosa, em outubro daquele ano, redigiram um esboço sobre a situação nacional, à luz da teoria marxista e da experiência nacional da luta de classes41.

Debates teóricos entre trotskistas e stalinistas

O ano de 1931 foi marcado por embates teóricos que criticavam a falta de entendimento do partido e de seus representantes junto à Internacional Comunista sobre a situação nacional. De acordo com os opositores, a propaganda de conscientização da massa implicava o uso de conceitos simples, expressos com didatismo. Um longo manuscrito a lápis, preparado para publicação (com linhas e páginas contadas), existente no prontuário de Mário Pedrosa, condena pesadamente a religião e revela influências do anarquismo e do positivismo na óptica dos dissidentes. Como os trotskistas tentavam aumentar sua influência na Federação Operária, manobrada pelos anarquistas, é possível que esse documento tenha adotado conscientemente uma linguagem que pudesse encontrar audiência entre libertários42.

As posições assumidas pelas correntes comunistas produziram análises teóricas discrepantes, não raro antagônicas, saídas das penas de trotskistas e stalinistas. Assim, em 3 de fevereiro de 1930, Pedrosa critica o famoso manifesto dos intelectuais -Pela revolução agrária e pela revolução anti-imperialista-, saído em A Classe Operária, como um caso típico de miséria ideológica, que não era nem menchevismo, muito menos comunismo ou marxismo. Os opositores de esquerda recusaram-se a assinar, mas intelectuais revolucionários subscreveram o tal manifesto, desde Di Cavalcanti e José Neves, até Plínio Mello, Everardo Dias e Antônio Mendes de Almeida, entre outros43. O jornal Auto-Crítica era lido por todos os comunistas, pois trazia as teses do partido sobre a situação, com as perspectivas e palavras de ordem, que serviam muitas vezes de base para as críticas dos opositores. Pedrosa recomenda a leitura de dois livros “excelentes” do Istrati: Soviets, 1929 e La Russie Nue. Pedrosa achava que os literatos iam de mal a pior. Conhecera a Tarsila, que considerou muitíssimo mais interessante que “sua pintura sem importância”, e o Oswald de Andrade, “sujeito simpático e engraçado”, que o procurava para conversar e afirmar os pontos de contato da antropofagia com o comunismo44.

A literatura revolucionária abrangia romances e poemas, comuns nas referências policiais. O bom crioulo, de Adolpho Caminha, é citado numerosas vezes, especialmente no caso de militantes negros. Judeu sem dinheiro, de Michael Gold, cumpre funções semelhantes para os judeus revolucionários. Poemas proletários, do trotskista Paulo Torres, é provavelmente a obra do gênero mais encontrada nas bibliotecas dos subversivos. Jorge Amado recebeu duras críticas, estendidas à literatura modernista: “Segundo os pseudos escritores ‘proletários’ do Brasil, fazer literatura é escrever errado, empregar mal todas as palavras e ter uma profunda ingenuidade pelas coisas da vida. É assim o Cacau. [...] Jorge Amado pensa que a revolução proletária será feita com as prostitutas [...]”45.

Teoria, Agitação e Propaganda

Das leituras aconselhadas para os militantes da Liga, Dez dias que abalaram o mundo era essencial. Tratava-se de entender a primeira experiência vitoriosa dos proletários, numa época em que as esperanças e os temores dos comunistas eram inseparáveis da Revolução Russa, pois, “todo partido comunista foi filho do casamento -realizado tanto por amor quanto por conveniência- de dois parceiros mal-ajustados: uma esquerda nacional e a Revolução de Outubro”46. Aristides Lobo, tradutor e prefaciador de Dez dias que abalaram o mundo observa que qualquer que fosse o desenlace do drama histórico começado a 7 de novembro, a Revolução Russa era definitivamente um fato de grande importância incorporado à história do mundo, independentemente do combate de ideias e de interesses em torno47. Um recibo datado de 4 de junho de 1931 e assinado por Aristides Lobo refere-se ao livro No caminho da insurreição, de Lenin, por ele traduzido, e que estava sendo editado sob a sua responsabilidade48. Na mesma ocasião, Victor Pinheiro traduzia A Revolução Desfigurada, um artigo do “Ogum” (Trotsky) e pensava dar início à tradução dos trechos mais oportunos do 190549.

Em julho de 1931, publicou-se um folheto de 21 páginas, de autoria de Lenin: Os objetivos do proletariado na Revolução. Aristides Lobo assina a tradução, feita da edição francesa de Victor Serge, de conformidade com a 2.ª edição russa das Obras Completas de Lenin. Em epígrafe, a frase: “As ‘legiões revolucionárias’, com a sua mentalidade pequeno-burguesa e a sua demagogia, foram organizadas para a corrupção e a mistificação do proletariado”50. Permanentemente perseguidos pela polícia, nos vários esconderijos em que se abrigavam, os intelectuais da Liga Comunista desdobravam seus esforços teóricos. Fora do campo das traduções, Lobo escreveu uma resposta ao “cavaleiro”51 (palavra sempre grafada com “c” minúsculo), encomendada por Xavier, enquanto este produzia um folheto sobre o caráter da revolução na Espanha. Lobo ainda elaborou um folheto sobre a Constituinte, “destinado à massa e servindo também para alguns dos nossos camaradas”52.

Lobo e Pinheiro, compartilhando o mesmo esconderijo e iguais preocupações, associavam-se nas traduções. A de Feurbach, iniciada por Lobo, foi concluída por Pinheiro, enquanto o primeiro terminava a de Cafiero. O que Salvador Pintaúde pagasse seria dividido entre ambos. O Cafiero estava “por linhas”, mas era preciso mais papel, que ele pede a Xavier53. Dias depois, Lobo agradece o envio da encomenda, com texto jocoso:

“Bravos! Já agora temos papel,

ao menos para escrever aos

mais próximos do nosso coração...

‘Quando eu, rua, por vós vou,

Todolos traques que dou

São suspiros de saudade!’” 54.

Informa, ademais, que lera o artigo do Bronstein, que Pedrosa enviara, e escreveria ao último para “conversar sobre coisas de interesse”. Para Lívio, na carta que escrevia, não queria dizer nada, “pois quero que seja toda amor e em amor termine”55. Em 6 de janeiro de 1932, Lobo comunica a Lívio ter enviado a tradução do Cafiero, insistindo para que Xavier “cavasse” com “Sérgio” (Pintaúde) o pagamento urgente56. Com o pedido atendido, ele e Pinheiro passariam a traduzir o discurso de Stalin, a resposta de Trotsky e o projeto de plataforma para a União Soviética. Dariam o título aos três de A URSS em 1931. Isso serviria para a Liga Comunista, e a Unitas poderia editar57. Vez ou outra, as publicações causavam mal-estar entre os oposicionistas. Os meios eram poucos e as obras muitas. A decisão sobre o que publicar agravava-se com o “como” e o “quando” das edições. Sobre o projeto “L.D.T.” (a publicação das obras completas de Trotsky), há uma carta de Lobo a Xavier, extremamente elucidativa dessas questões:

“Pelos motivos constantes de minha carta anterior, eu pretendia não voltar ao assunto. [...] O argumento de disciplina a que você recorre é um disparate nesta questão. Mesmo antes da discussão interna, o ‘projeto’ de L.D.T. pode e deve, como projeto, tornar-se conhecido da massa, e aqui no Brasil o único meio é entregá-lo a um editor”58.

As respostas aos stalinistas ocupavam necessariamente as preocupações editoriais dos oposicionistas, que resolveram, em janeiro de 1932, publicar um contramanifesto a Prestes59. Quanto à publicação de folhetos e manifestos da liga, vigorava o centralismo democrático, isto é, os camaradas deveriam obter a permissão do grupo para editá-los. Lobo, ao publicar por sua conta e responsabilidade, o folheto “Em socorro de Trotsky e em Socorro de Rakowsky” causou um mal-estar entre os companheiros da CE, mas o problema se resolveu, pois havia apresentado o projeto ao grupo a que pertencia -o “G.B.2”60.

Para o endereço do Macedo, Lobo enviou a Plataforma, em espanhol, que ele lera quando ainda se encontrava em Botucatu, só tendo deixado de encaminhá-la antes “por falta de cobre”. Pede a Xavier que lhe mandasse, como prometera, o Maladie, pois precisava dele para fazer umas citações. Ele e Pinheiro remetiam, para o endereço da Unitas, um calhamaço a que deram o título de A URSS em 193161. Para a Conferência Nacional, iria escrever alguma coisa subordinada ao tema: Nossas tarefas para com o Partido62. Lobo e Pinheiro também se declararam dispostos a traduzir o Maladie, mas, antes de começar, queriam saber se haveria possibilidade de editá-lo e se não eram reservados os direitos de reprodução63.

Em 1931, Aristides Lobo traduziu e Pèret prefaciou O Encouraçado Potemkin, de Fritz Slang, editado pela Lux. Quando faltava o apoio de editoras como a Lux e a Unitas, a edição de livros, folhetos, jornais e boletins valia-se de fundos arrecadados entre aderentes e simpatizantes da Liga Comunista. No mesmo ano, surgiram as editoras Pax64 e Unitas destinadas à impressão e divulgação de livros comunistas. A Gráfico-Editora UNITAS Limitada65, pertencente a Pasquale Petraccone -membro da LC- publicou quase todos os textos de Trotsky no Brasil durante os anos 1930. Com o aparecimento de No caminho da insurreição, a Unitas e a Liga Comunista firmaram um acordo para a publicação de obras marxistas revolucionárias, segundo um plano elaborado por Aristides Lobo, Lívio Xavier, Mário Pedrosa e Victor de Azevedo Pinheiro66. A análise documental atesta que os opositores controlavam a Unitas. Uma nota dessa editora, no valor de 239$300, arrola livros que custavam de 4$000 a 7$000, comprados por aderentes e simpatizantes da liga. O conjunto dessas obras inclui alguns dos principais autores de esquerda, lidos nas décadas de 1920 e 1930, o que atesta as preocupações teóricas dos trotskistas67.

Embora destinada à publicação de livros comunistas, em geral, a Gráfico-Editora UNITAS Limitada, de Pasquale Petraccone, e a Pax, de Salvador Pintaúde, eram controladas pelos trotskistas, já que os seus donos pertenciam à Liga Comunista. Assim, Plínio Mello, em 5 de novembro de 1932, pede a Lívio Xavier que propusesse a Pintaúde a distribuição de edições da liga com 50% de abatimento. Estava pronto para sair do prelo um folheto de 80 páginas -O que é o Trotskismo?-, e já na tipografia estava Comunismo e Casamento. Mello aproveitou para pedir a Pintaúde o original de Revolução desfigurada68. Em 10 de agosto de 1938, Pasquale Petraccone informa a Lívio Xavier ter vendido o estoque da Casa Editora Unitas para a Companhia Editora Nacional e ter cedido as traduções à Brasil Editora, pois nada de certo sabia relativamente ao seu destino69. A Livraria José Olympio acabou por ocupar a vaga da Unitas, comprando “o Trotsky” em 28 de março de 1941, quando ofereceu a Lívio Xavier “três contos” [de réis] pela tradução70.

Política editorial e educação teórica dos camaradas

Existe no Fundo Lívio Barreto Xavier uma lista de livros, talvez relativa à “Biblioteca Circulante Aurora”, que fornece indicações sobre os objetivos da educação teórica idealizada pela oposição. As obras de Trotsky continuam a ser predominantes, seguidas por outras clássicas do marxismo-leninismo. Leitura essencial, o Manifesto Comunista mereceu da Unitas uma edição de 2.000 exemplares, entregues em consignação às livrarias Garraux (100), Universal (70), Loja de Cultura (30), Teixeira (40), Globo (30) e Zenith (10), todas pontos de venda de livros subversivos, depois “estourados” pela polícia71. Antes de sua adesão ao PCB, Luís Carlos Prestes financiou uma edição de O Manifesto Comunista e de mais sete obras, que saíram em nome de A Luta de Classe72.

A Liga Comunista gastou com a edição do Manifesto 2:800$000 (dois contos e oitocentos mil réis), enquanto No caminho da insurreição, também editado, custou 5:600$00073 (cinco contos e seiscentos mil réis). Esforço notável, se considerarmos as dificuldades de caixa da liga e de seus aderentes, expressas em farta documentação, como nas anotações de “caixa”, “saídas” e “despesas” registradas por Aristides Lobo em caderneta pessoal. Esses dados informam que os esforços dos Opositores de Esquerda concentravam-se em publicações sobre o marxismo revolucionário e as posições que defendiam, diante do Partido Comunista e de acontecimentos nacionais e internacionais. Os camaradas de São Paulo e do Rio organizavam-se para o aumento de suas bibliotecas. Com esse objetivo, a LC realizou um acordo com a Região do Rio comprando a edição do grupo “A Verdade” por 300$000 (trezentos mil réis), que seriam pagos em obras editadas pela Gráfico-Editora UNITAS, pelo preço de custo74.

Editoras menores cooperavam na obra de divulgação ideológica, como a Editorial Udar, de propriedade de Osório César, companheiro de Tarsila do Amaral, e que também atuava como cobrador da clandestina Biblioteca Ruy Barbosa. A trajetória política de Osório César, teórico do PCB e o fundador, em 1925, do seu órgão A Classe Operaria75, relata as tarefas difíceis dos intelectuais comunistas para se inteirarem da doutrina revolucionária e veiculá-la junto aos camaradas e à sociedade. Em seu círculo de relações, figurava Nize da Silveira, sua amiga de muitos anos, e o alemão Ernesto Joske, que o pôs em contato com o Socorro Vermelho Internacional. Osório César escreveu o livro Onde o proletariado dirige, ilustrado por fotos e desenhos de Tarsila do Amaral e prefaciado por Barbusse. Nesse momento, tornou-se vítima do secreto “Guarany”, responsável principal pela “deduragem” dos intelectuais de São Paulo e testemunha involuntária do efervescente ambiente intelectual das esquerdas da época. Osório César acabou por cair na rede de “Guarany”, convidando-o para uma “assembleia de Esperantismo”, que pretendia realizar no Salão dos Artistas, e para ir à sua residência76. As atividades de Osório César, como intelectual do Partido, produziram obras diversas de defesa apaixonada do modelo soviético. O volume 2 de seu prontuário é ocupado exclusivamente por originais dessas obras, confiscados pela polícia. O volume 3 coleciona cópias de documentos e mais originais de livros77.

O prontuário do jornalista Pedro Motta Lima, diretor de O Internacional, “Órgão dos Empregados em Hotéis, Restaurantes, Cafés, Bares e Similares”, reúne informações importantes sobre a indústria cultural dos comunistas -da situação ou da oposição. Dele consta que em reunião do Centro de Cultura Proletária, na sede da União dos Trabalhadores Gráficos (UTG), Motta Lima verberou a atitude das autoridades apreendendo edições de livros de cultura sociológica e prendendo os seus editores. Falaram, a seguir, Oswald de Andrade, Di Cavalcanti, Plínio Mello, Antônio Mendes de Almeida, João Bueno e outros, além de Pagu78. Existe, ainda, uma carta de Francisco Mangabeira a Motta, em que menciona o envio de exemplares de A concepção materialista da História, de Plekanov, traduzido por Octaviano Galvão -um folheto de 40 páginas, que deveria ser vendido a 2$ (dois réis) e 1$ (um real) para operários. Mangabeira ainda informa haver traduzido de Beer Karl Marx, sua vida sua obra, mas não havia dinheiro para publicá-lo79.

Livros apreendidos pela polícia política e social abundam no Arquivo do Departamento de Ordem Política e Social (DEOPS). Muitos foram desviados, pois há alusões a obras que não se encontram nos processos. Não obstante, os numerosos exemplos de bibliotecas ou livros esparsos citados nos autos de busca e apreensão nas livrarias, bancas de jornais ou residências de “agitadores” fornecem o perfil intelectual da Revolução. A literatura “subversiva” compunha-se de obras marxistas, socialistas e libertárias. A Lei 38, de 4 de abril de 1935, no parágrafo único do artigo 26, combinado com o artigo 25 e seus parágrafos, determinou a apreensão de livros de ideologia comunista ou subversiva. Em obediência a essa lei, Venâncio Ayres, delegado da Ordem Social, enviou ao superintendente da Ordem Política e Social o resultado das diligências que realizou, do ano de 1935 ao de 1937. Da massa falida da Gráphica Editora Unitas Ltda., foram apreendidos 25.696 livros, o que constituiu terrível golpe para os trotskistas paulistanos.80

Residências particulares alojavam bibliotecas que circulavam entre intelectuais e operários da esquerda. Mário Pedrosa possuía uma das maiores bibliotecas confiscadas em São Paulo. Uma lista manuscrita, existente em seu prontuário, arrola 112 livros, classificados por temas e provavelmente destinados à consulta pública. Entre eles encontramos obras que dizem respeito à formação política do militante ou simpatizante da causa proletária, livros infantis e didáticos, romances, ciências físicas e naturais, educação física etc., o que revela o ecletismo de uma biblioteca destinada à educação revolucionária das massas81.

É relevante notar que as coleções de livros apreendidos possuem poucos títulos comuns. A precaríssima situação financeira da quase totalidade dos comunistas da oposição e o hábito de trocar livros entre si explicariam esse fato, pois, por princípio revolucionário, esperava-se que a teoria marxista, com seus desdobramentos, fosse de absoluto domínio dos camaradas. Os esforços para a edição de obras teóricas que servissem à revolução podem ser avaliados pela correspondência trocada entre os oposicionistas, exame que ajuda a elucidar a crucial questão sobre as condições e os limites da produção da literatura marxista, no Brasil. Victor Pinheiro, acoitado em Bariri, revia as provas de Os objetivos do proletariado na revolução, trabalho que daria uma “brochura barata, em papel de jornal”, para distribuição entre os camaradas operários. Pretendia, também, deixar revista a brochura do “Ogum-Guassu” (Trotsky)82. Ele e Aristides enviavam, para o endereço da Unitas, a tradução do Feuerbach. A do Cafiero seria a próxima. Lobo e Pinheiro esperavam receber dois volumes de Lenin e as citações pedidas por “Leônidas” (um dos cognomes usados por Aristides Lobo)83.

De Bariri, Aristides Lobo envia, para apreciação da liga, as oito primeiras páginas impressas do folheto “Revolução Espanhola”, além da segunda via do conhecimento para a retirada do Cafiero. Com o “cobre” do Cafiero, Lobo solicita que Xavier lhe compre um exemplar do Anti-Stálin, informando que havia despachado para o endereço de Plínio Mello o folheto sobre a Constituinte84. Para reprimir a propaganda ideológica “subversiva”, a polícia desenvolveu um contradiscurso baseado em informações retiradas dos próprios prisioneiros e de seus livros, digeridos em mistura com textos fascistas ou para-fascistas, nos quais o próprio Goebels aparece como teórico de base85.

Conclusão

O movimento operário apareceu e se solidificou nas primeiras décadas do século passado, assistindo à criação de clubes e partidos integrados na visão revolucionária de uma sociedade sem classes. Fortemente influenciado pelos imigrantes e pelo anarquismo, os trabalhadores politizados na teoria e prática revolucionária do marxismo-leninismo estruturaram-se em sindicatos e partidos próprios, do qual o mais importante foi o Partido Comunista do Brasil, fundado em 1922. Em pouco tempo, como consequência da luta mortal travada entre Stalin e Trotsky, os camaradas brasileiros divergiram fortemente sobre os rumos da revolução, dando origem a uma disputa árdua para o domínio da direção partidária, considerando que ela se afastava do materialismo histórico e condenava, por esse procedimento, a marcha do proletariado a desvios e à derrota.

A Oposição de Esquerda nacional acompanhava os passos de sua matriz internacional, liderada por Trotsky, após o seu primeiro exílio, em 1928, até a sua morte, em 1940, no México. Nesse trajeto, os primeiros trotskistas brasileiros denunciaram a ditadura da Comissão Executiva do Partido, que teria substituído a ditadura do proletariado, e que seguia subserviente às ordens de Stalin, veiculadas pela Terceira Internacional Comunista. O grupo mais operante dos opositores organizou-se na Liga Comunista Internacionalista, cujo primeiro secretário-geral foi o jornalista Aristides da Silveira Lobo. Em luta constante contra os dirigentes do partido, os oposicionistas de esquerda foram vítimas preferenciais da repressão policial, nos tempos difíceis da ditadura varguista.

Nos primórdios da organização dos trabalhadores em partidos que passaram a reivindicar os direitos do trabalho sobre o capital, comunistas ortodoxos e heterodoxos participavam da crença de que o conhecimento da teoria era necessário para apressar a revolução proletária, vista como inevitável, mas sujeita a desvios que poderiam ser evitados pelo entendimento profundo do marxismo-leninista. Em suas biografias pessoais, como teóricos e militantes, os dissidentes comunistas denunciaram fortemente os erros de Stalin, considerados por eles como fatais para os destinos da massa trabalhadora. Com sede principal em São Paulo, eles realizaram um esforço tenaz para compreender e disseminar o marxismo dialético, na versão trotskista. Para tanto, editaram as principais obras dessa teoria, realizaram traduções e produziram textos de enorme importância para que se entenda essa época a partir da óptica dos seguidores de Trotsky. O copioso material existente sobre o assunto pode trazer novas luzes sobre a questão crucial da importância de homens e de ideias que não seguiram as diretrizes da Terceira Internacional, em seu cotidiano e nas relações que estabeleciam com outros camaradas e com a sociedade global.

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Como citar: Campos, Alzira Lobo de Arruda, Marília Gomes Ghizzi Godoy y Rafael Lopes de Souza. “Teoria e práxis revolucionária dos trotskistas brasileiros (São Paulo, 1930-1945)”. Historia Crítica n.° 72 (2019): 115-137, doi: https://doi.org/10.7440/histcrit72.2019.06

* O artigo resulta de pesquisas dos autores, professores da Universidade Santo Amaro (Brasil), e não contou com financiamento.

1Eric Hobsbawm, Edgard Carone, Caio Prado Júnior, entre outros, não incluem em seus estudos os trotskistas, por pertencerem, todos os três, “à velha esquerda” do Partido Comunista, interessando-se, por conseguinte, apenas pelos camaradas que permaneceram presos à disciplina partidária.

2Robert J. Alexander, International Trotskyism. 1929-1985: A Documented Analysis of the Movement (Durham/Londres: Duke University Press, 1991), IX.

3Edward Thompson, La formación histórica de la clase obrera. Inglaterra: 1780-1832 (Barcelona: Editorial Laia, 1977).

4Termo que remete a Getúlio Vargas, presidente do Brasil entre 1930 e 1945, ditador de fato desde a sua tomada do poder, embora só tenha implementado uma ditadura formal em 1937, o chamado “Estado Novo”, que desbaratou as fileiras da oposição ao regime, enviando para prisões, campos de concentração, tortura, exílio e morte os partidários da Esquerda Revolucionária (além de anarquistas e integralistas, os comunistas da linha stalinista e os trotskistas da Liga Comunista Internacionalista).

5Lisboa e Konrad, por exemplo, destacam o imenso valor documental da obra de Alexander, mas ressaltam o aspecto negativo dessa obra por falta de elaboração histórica, o que teria, como consequência, acarretado um trabalho altamente descritivo. Em Roberto Borges Lisboa e Gláucia Vieira Ramos Konrad, “O Trotskismo no Brasil da década de 1930: a historiografia recente e suas fontes” (ponencia presentada em Anais Eletrônicos do XI Encontro Estadual de História, Porto Alegre, 23 a 27 de julho, 2012), 1251-1261.

6Dainis Karepovs, “Nos subterrâneos da luta (Um estudo sobre a cisão no PCB em 1937-1938)” (Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo, 1996), 2-14.

7Ricardo Figueiredo de Castro, “A oposição de esquerda brasileira (1928-1934): teoria e práxis” (Dissertação de mestrado, Universidade Federal Fluminense, 1993).

8Quando da fundação do PCB, em 1922, houve discussões acaloradas a respeito do nome adotado, por ele poder sugerir que o partido não passava de uma seção da Terceira Internacional Comunista. Nesse contexto, usou-se a designação “Partido Comunista Brasileiro”, em períodos históricos diversos, até se tornar definitivo no ano de 1961. Em 1962 foi fundado o Partido Comunista do Brasil.

9Alzira Lobo de Arruda Campos. “‘Tempos de Viver’: Dissidentes Comunistas em São Paulo (1931-1936)” (Tese de Livre-docência, Universidade Estadual Paulista, 1998).

10Murilo Leal Pereira Neto, “Outras histórias. Contribuição à história do trotskismo no Brasil-1952/1966. O CASO DO POR (Partido Operário Revolucionário)”, vol. 1 (Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo, 1997), 8-9.

11Pereira Neto, Outras histórias, 10.

12Osvaldo Coggiola, org., Introdução a Trotsky hoje, vol. 6 (São Paulo: Ensaio, 1994), 13.

13Wladimir I. Billik, “Acordos e divergências Lenin/Trotsky. Entrevista concedida a Sobesednik, suplemento de Komsomolskaia Pravda, em agosto de 1989”, em Trotsky hoje, organizado por Osvaldo Coggiola, vol. 6 (São Paulo: Ensaio, 1994), 51-61.

14“Depoimento de Fúlvio Abramo”, O Trabalho, História 9, [Ano IV, n.º 132], 18-24 de janeiro de 1981.

15Ronald H. Chilcote, O Partido Comunista Brasileiro. Conflito e integração. 1922-1972, tradução de Celso Mauro Paciornik, vol. 22 (Rio de Janeiro: Edições Graal, 1982).

16John W. F. Dulles, O comunismo no Brasil, 1935-1945, tradução de Raul de Sá Barbosa (Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985).

17Eliana Regina de Freitas Dutra e Yonne de Souza Grossi, “Historiografia e movimento operário: o novo em questão”. Revista Brasileira de Estudos Políticos n.º 65 (1987): 3-25.

18Paulo Sérgio Pinheiro, Estratégias da ilusão. A Revolução Mundial e o Brasil. 1922-1935 (São Paulo: Companhia das Letras, 1992).

19E. P. Thompson, La formación histórica de la clase obrera. Inglaterra: 1780-1832 (Barcelona: Editorial Laia, 1977).

20Moisés Vinhas, O Partidão. A luta por um partido de massas. 1922-1974 (São Paulo: HUCITEC, 1982).

21Alexander, International Trotskyism. 1929-1985, 1.

22“As primeiras lutas da Oposição Russa a partir de 1923”, em Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (CEDEM-UNESP), São Paulo-Brasil, Fundo Lívio Barreto Xavier (FLBX). Todos os documentos deste fundo são datilografados y sem numeração. Não há outras referências arquivísticas sobre os documentos consultados, além daquelas citadas neste artigo.

23Jacob Gorender, “A Revolução de Outubro: Revolução ou Golpe de Estado?”, em Trotsky hoje, organizado por Osvaldo Coggiola, vol. 6 (São Paulo: Ensaio, 1994), 37-47.

24Alexander, International Trotskyism. 1929-1985, 4.

25Alexander, International Trotskyism. 1929-1985, 1-6.

26“As primeiras lutas da Oposição Russa”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

27Aristides Lobo, “Palavras e conceitos de um discurso”, Vanguarda Socialista, 14 de setembro, 1945.

28“Resoluções do Pleno do Comitê Municipal de São Paulo do PCB”, 16 e 17 de dezembro de 1945, em Arquivo Público do Estado de São Paulo (APESP), São Paulo-Brasil, fundo Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (DEOPS), Dossiê 30-C-1. Comunicado do Serviço Secreto, f. 963. Todos os documentos deste fundo são datilografados.

29Aristides Lobo, “Definições e diretrizes”, São Paulo, 9 de outubro de 1946, em Vanguarda Socialista, 18 de outubro, 1946, 2.

30“Carta de Edmundo Moniz a Lívio Xavier”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

31“Carta de Edmundo Moniz a Lívio Xavier”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

32“Carta de Edmundo Moniz a Lívio Xavier”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

33Victor de Azevedo Pinheiro, “A situação nas lavouras” e “Questão agrária (apontamentos)”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

34“Carta de Victor Pinheiro a Eurico de Góes”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

35“Nota n.º 2.892, emitida pela Graphica Paulista Editora, de João Bentivegna”, 21 de março de 1931, em CEDEM-UNESP, FLBX.

36Dainis Karepovs, “Trotsky n’ A Luta de Classe”, Boletim Bibliográfico [vol. 3], 1985, 1-18.

37Campos, “Tempos de Viver”, 197.

38“Proposta de ‘Frederico’ (João Matheus) para a edição do jornal O Homem Livre”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

39“Carta de Mário Pedrosa a Lívio Xavier”, 14 de maio de 1928, em CEDEM-UNESP, FLBX.

40“Carta de Plínio Mello a Lívio Xavier”, São Paulo, 7 de maio de 1928, em CEDEM-UNESP, FLBX.

41“Texto em francês, de autoria de Aristides Lobo, destinado à Organização da Esquerda Internacional”, São Paulo, 18 de abril de 1931, em CEDEM-UNESP, FLBX.

42“Manuscrito de Mário Pedrosa falando sobre as relações entre política e religião. Prontuário de Mário Pedrosa, n.º 2.030”, em APESP, DEOPS-SP, ff. 5-14.

43Crítica a artigo de intelectuais publicado pelo jornal A Classe Operária. Prontuário de Mário Pedrosa, n.º 2.030, em APESP, DEOPS-SP.

44“Carta de Mário Pedrosa a Lívio, aludindo à teoria e a intelectuais”, São Paulo, 1930, em CEDEM-UNESP, FLBX.

45“Ainda sobre ‘Cacau’ de Jorge Amado”, artigo de Eneida Moraes, publicado no jornal O Homem Livre, em 3 de janeiro, 1934, 4.

46E. J. Hobsbawm, Revolucionários (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985), 12.

47Aristides Lobo, “Palavras explicativas”, em Dez dias que abalaram o mundo, editado por John Reed (São Paulo: Editora Nacional “LUX”, 1931), 5-7.

48“Recorte do jornal O Homem Livre”. Prontuário de Aristides Lobo, n.º 37, em APESP, DEOPS-SP.

49“Carta de Victor Pinheiro a Lívio Xavier”, Bariri, 8 de junho de 1931, em CEDEM-UNESP, FLBX.

50“Carta de Lobo a Xavier”, Botucatu, 12 de dezembro de 1931, em CEDEM-UNESP, FLBX.

51Luís Carlos Prestes, que se tornou o principal chefe do PCB, era conhecido como o “cavaleiro da Esperança” pelo seu papel de líder da Coluna Prestes, formada após a derrota da revolução tenentista de 1924. O emprego do “c” minúsculo remete ao menosprezo com que os trotskistas viam Prestes, criticado por sua tibieza teórica e pelos erros estratégicos que cometera na condução da Revolução Proletária.

52“Carta de Lobo a Xavier”, Botucatu, 12 de dezembro de 1931, em CEDEM-UNESP, FLBX.

53“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 2 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

54“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 15 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

55“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 15 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

56“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 6 de junho de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

57“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 9 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

58“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 26 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX, ff. 1-2.

59“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 26 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

60“Aos camaradas do G.B.2. Circular da CE”, São Paulo, 11 de junho de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

61“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 15 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

62“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 15 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

63“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 15-17 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

64Em 1935, no processo de Genny Gleiser, a “Pax” é citada como pertencente a Samuel Wainstein. Em: Maria Luiza Tucci Carneiro, Livros proibidos, idéias malditas. O Deops e as minorias silenciadas (São Paulo: Estação Liberdade/Arquivo do Estado/SEC, 1997), 60. Nos documentos do FLBX, o proprietário citado é Salvador Pintaúde.

65“A ordem de compra”, 29 de junho de 1934, em 15 de janeiro de 1932, CEDEM-UNESP, FLBX. Observe-se que a matriz da editora localizava-se na Rua S. Bento, 11, e o depósito na Alameda Barão de Limeira, 113. Possuía filiais no Rio de Janeiro, Porto Alegre e Salvador.

66Dainis Karepovs, “Benjamin Pèret: surrealismo e Trotskismo no Brasil”, em Trotsky hoje, organizado por Osvaldo Coggiola (São Paulo: Ensaio, 1994), 229.

67“Nota Fiscal n.º 7.353, emitida pela Unitas”, 14 de junho de 1933, em CEDEM-UNESP, FLBX.

68“Carta de Plínio Mello a Lívio Xavier”, São Paulo, 5 de novembro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

69“Carta de Petraccone a Xavier”, Rio de Janeiro, 10 de agosto de 1938, em CEDEM-UNESP, FLBX.

70“Cartas enviadas do Rio de Janeiro a Lívio Xavier”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

71Documentos avulsos existentes no CEDEM-UNESP, FLBX.

72Karepovs, “Benjamin Pèret”, 229.

73“Anotações de Aristides Lobo em caderneta a ele pertencente”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

74“Documento assinado por Escobar”, em CEDEM-UNESP, FLBX.

75“Prontuário de Octávio Brandão”, falando sobre o intelectual Osório César, em APESP, DEOPS-SP, n.º 358.

76A moda do esperantismo parece ter feito sucesso entre os comunistas e anarquistas de São Paulo, talvez por acenar com a perspectiva de fornecer uma língua veicular para a revolução e seus ideais, facilitando enormemente a ação dos camaradas.

77Informe reservado do agente infiltrado entre artistas e intelectuais, “Guarany”, em “Prontuário de Osório César”, em APESP, DEOPS-SP, n.º 1.936, vol. 1, ff. 28, 29, 57, 68, 85, 119 e 125.

78Informe reservado de Antônio Ghioffi a Ignácio da Costa Ferreira, em “Prontuário de Pedro Motta Lima”, em APESP, DEOPS-SP. n.º 511.

79“Carta de Francisco Mangabeira a Motta Lima”, Rio de Janeiro, 1 de agosto de 1931, em “Prontuário de Pedro Motta Lima”, APESP, DEOPS-SP, n.º 511, f. 7.

80Informação sobre diligências policiais, em “Prontuário da Livraria Odeon”, APESP, DEOPS-SP, n.º 278.

81Inventário da biblioteca de Mário Pedrosa, em “Prontuário de Mário Pedrosa”, APESP, DEOPS-SP, n.º 2.030.

82“Carta de Pinheiro a Xavier”, Bariri, 31 de julho de 1931, em CEDEM-UNESP, FLBX.

83“Carta de Pinheiro a Xavier”, Bariri, 22 de dezembro de 1931, em CEDEM-UNESP, FLBX.

84“Carta de Lobo a Xavier”, Bariri, 23 de janeiro de 1932, em CEDEM-UNESP, FLBX.

85“Relatório do delegado adjunto de Santos”, 12 de fevereiro de 1937”, contendo ideias policiais fascistas, prontuário de José Stanchim ou Stacchini, em APESP, DEOPS-SP, n.º 3.005, ff. 7-1.

Recebido: 04 de Maio de 2018; Aceito: 25 de Setembro de 2018

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