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Avances en Enfermería

versão On-line ISSN 0121-4500

av.enferm. vol.35 no.1 Bogotá jan./abr. 2017

https://doi.org/10.15446/av.enferm.v35n1.43682 

DOI: 10.15446/av.enferm.v35n1.43682

Artículo de Investigación

Amamentação na primeira hora de vida: conhecimento e prática da equipe multiprofissional

Lactancia materna en la primera hora de vida: conocimiento y práctica del equipo multiprofesional

Breastfeeding within the first hour after birth: knowledge and practice of multidisciplinary team

Marcos Benatti Antunes1, Marcela de Oliveira Demitto2, Larissa Gramazio Soares3, Cremilde Aparecida Trindade Radovanovic4, Ieda Harumi Higarashi5, Sueli Mutsumi Tsukuda Ichisato6, Sandra Marisa Pelloso7

1 Doutorando em Enfermagem. Coordenador da Estratégia Saúde da Família - ESF no Município de Sarandi-PR. Maringá, Brasil. E-mail: bena771@gmail.com
2 Doutora em Enfermagem. Professora contratada, Departamento de Medicina, Unicesumar. Maringá, Brasil. E-mail: mar_demitto@hotmail.com
3 Doutoranda em Enfermagem. Professora Colaboradora, Universidade Estadual do Centro -Oeste/UNICENTRO. Curitiba, Brasil. E-mail: lari_gramazio@hotmail.com
4 Doutora em Ciências da Saúde. Professora Assistente, Departamento de Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá. Maringá, Brasil. E-mail: kikanovic2010@hotmail.com
5 Doutora em Educação. Professora Associada, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá. Maringá, Brasil. E-mail: ieda1618@gmail.com
6 Doutora em Enfermagem. Professora Associada, Departamento de Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá. Maringá, Brasil. E-mail: sichisato@hotmail.com
7 Doutora em Enfermagem. Professora Titular, Departamento de Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá. Maringá, Brasil. E-mail: smpelloso@uem.br

Recibido: 26/05/2014 Aprobado: 10/02/2017


Resumo

Objetivo: Verificar o conhecimento e prática sobre a amamentação na primeira hora de vida entre membros da equipe multi-profissional de um hospital do município de Maringá, Paraná.

Metodologia: Trata-se de um estudo descritivo-exploratório com abordagem qualitativa. Os dados foram coletados entre os meses de outubro e novembro de 2013, por meio de entrevistas gravadas com 11 participantes. Para o tratamento dos dados, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo.

Resultados: Encontrou-se deficiência no conhecimento dos profissionais sobre a amamentação na primeira hora de vida; além disso, a prática não acontece na instituição, desvelando desafios e sugestões para a implantação desse passo.

Conclusão: Sugere-se aderir esta prática às políticas hospitalares de promoção e proteção ao aleitamento materno, que valorizem a equipe multiprofissional e o trabalho colaborativo entre seus membros.

Descritores: Aleitamento Materno; Recém-Nascido; Equipe de Assistência ao Paciente; Pesquisa Qualitativa (fonte: DeCS BIREME).


Resumen

Objetivo: Evaluar el conocimiento y la práctica sobre la lactancia materna en la primera hora de vida entre los miembros del equipo multidisciplinario de un hospital en la ciudad de Maringá, Paraná.

Metodología: Estudio descriptivo-exploratorio con enfoque cualitativo. Los datos fueron recolectados entre octubre y noviembre del 2013 mediante entrevistas grabadas con 11 participantes. Para el procesamiento de los datos, se utilizó la técnica de análisis de contenido.

Resultados: Se encontró que los profesionales de la salud tienen deficiencias en el conocimiento acerca de la lactancia materna en la primera hora de vida; además, la práctica no suele realizarse en la institución, a partir de lo cual surgen desafíos y recomendaciones para establecer esta actividad.

Conclusión: Se sugiere incluir esta práctica en las políticas del hospital para la promoción y protección de la lactancia materna, que consoliden el equipo multidisciplinario y el trabajo colaborativo entre sus miembros.

Descriptores: Lactancia Materna; Recién Nacido; Grupo de Atención al Paciente; Investigación Cualitativa (fuente: DeCS BIREME).


Abstract

Objective: To evaluate the knowledge and practice about breastfeeding within the first hour after birth among members of the multiprofessional team of a hospital in the municipality of Maringá, Paraná.

Methodology: Qualitative, descriptive, and exploratory study. The data were collected between October and November of 2013, through interviews recorded with 11 participants. For the data treatment, the content analysis technique was used.

Results: Weaknesses in the knowledge of health professionals about breastfeeding within the first hour after birth were found. On the other hand, the practice does not take place in the health institution, revealing challenges and suggestions for the implementation of this custom.

Conclusion: It is recommended that this practice be included in hospital policies to promote and protect breastfeeding, which strengthen the multiprofessional team and the collaborative working among its members.

Descriptors: Breast Feeding; Newborn; Patient Care Team; Qualitative Research (source: DeCS BIREME).


Introdução

A amamentação na primeira hora de vida do recém-nascido (rn) é considerada como fator protetor para a mortalidade neonatal (1). Estudos científicos comprovam que a amamentação na primeira hora de vida tem efeito protetor, devido à colonização intestinal de bactérias saprófitas encontradas no leite materno e aos fatores imunológicos bioativos adequados para o recém-nascido, presentes no colostro materno (2).

No Brasil, a prevalência de aleitamento materno na primeira hora de vida ainda é baixa: entre crianças menores de um ano, é de 67,7% (3), o que indica a necessidade de ações que envolvam os profissionais de saúde para a melhoria dessa taxa. Atualmente, pouco se sabe sobre a vivência dos profissionais que atendem a mulher e o recém-nascido no âmbito hospitalar em relação à amamentação na primeira hora de vida, porém sabe-se que estes exercem papel fundamental na concretização da amamentação na primeira hora de vida (4).

A prática de colocar o recém-nascido para ser amamentado logo após o nascimento, ainda na sala de parto, desde que mãe e filho estejam bem, corresponde ao 4° Passo da Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC). Este passo preconiza o contato pele a pele ininterrupto entre a mãe e seu filho, adiando qualquer procedimento rotineiro de atenção ao recém-nascido que venha separar os dois (5). O contato precoce da mãe com o bebê facilita a redução da hipotermia e da sepse, além da diminuição da permanência no hospital e do risco de mortalidade na alta hospitalar (6).

A literatura faz referências a alguns entraves para que a amamentação na primeira hora ocorra. Certas características maternas são relacionadas, tais como a cor preta, primíparas, a não realização do pré-natal (7) e o processo de trabalho inadequado em maternidades e no modelo de atenção ao parto brasileiro, no qual impera o excesso de intervenções e a submissão feminina ao profissional que a assiste (8). Além disso, as características do RN, como o baixo peso ao nascer, são fatores que estão associados a um risco elevado de não amamentação precoce (9).

Desta forma, surgiu a seguinte questão de pesquisa: Qual é o conhecimento da equipe multiprofissional em relação à amamentação na primeira hora de vida? Ainda, no sentido de subsidiar estratégias futuras que permitam a amamentação na primeira hora de vida, o presente estudo teve como objetivo verificar o conhecimento e a prática sobre amamentação na primeira hora de vida entre membros da equipe multiprofissional de um hospital do município de Maringá, Paraná.

Metodologia

Estudo descritivo-exploratório com abordagem qualitativa, realizado com a equipe multidisciplinar que presta assistência à parturiente e ao recém-nascido em um hospital de médio porte localizado no município de Maringá, Paraná. Esta instituição, que presta atendimentos ao Sistema Único de Saúde (SUS), atualmente não é reconhecida como Amiga da Criança, porém ações estão sendo implementadas com vistas a tal acreditação.

A equipe multidisciplinar é composta por médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e fonoaudiólogos. Essa equipe atua nos setores da maternidade, berçário e sala de parto. O critério único de inclusão neste estudo foi ser profissional de saúde que prestasse assistência à mulher no evento do parto; como critério de exclusão, estar em período de férias ou afastado da instituição por tempo superior a 15 dias. Inicialmente, os participantes foram abordados individualmente pelos pesquisadores e convidados a participar da pesquisa; posteriormente, as entrevistas foram agendadas de acordo com a disponibilidade e o interesse de cada profissional em participar do estudo. As entrevistas foram realizadas em uma sala reservada na própria instituição e cada uma teve duração de aproximadamente 40 minutos.

Em relação ao número de participantes, este foi determinado pelo critério de saturação teórica, que ocorre quando os objetivos do estudo são contemplados, dando início à repetição de dados e à ausência de novas informações pertinentes ao objeto de estudo (10). Deste modo, foram onze os entrevistados da pesquisa em questão.

Os dados foram coletados no período outubro-novembro de 2013 por meio de entrevistas gravadas que foram guiadas por um roteiro semiestruturado. O roteiro é composto por duas seções: uma voltada à caracterização dos participantes -categoria profissional, idade, tempo de formação, tempo de serviço no setor de atendimento à parturiente e especialização na área- e outra contendo a seguinte questão norteadora: O que você conhece sobre amamentação na primeira hora de vida e como ela acontece nessa instituição?

Para a análise dos dados, as entrevistas foram transcritas na íntegra e submetidas à técnica de análise de conteúdo (11), seguindo as fases de pré-análise, exploração do material, análise e interpretação referencial. No tratamento dos resultados, tais elementos foram então agrupados, de acordo com a semelhança, para a formação de três categorias temáticas: Conhecimento da equipe multiprofissional, Desafios para a implantação da amamentação precoce e Sugestões para efetivação da amamentação na primeira hora de vida. Esta etapa final compreendeu as fases de inferência e interpretação, fundamentada à luz de outros achados da literatura pertinente.

Para respeitar o sigilo dos participantes, foram utilizadas as iniciais da categoria profissional, associada a um número entre 1 e 4 atribuído de acordo com a sequência das entrevistas. As categorias profissionais entrevistadas foram enfermeiros, médicos, fonoaudiólogos e técnicos de enfermagem.

Esta pesquisa respeitou todas as recomendações da Resolução n° 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovada pelo Comitê Permanente de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá, sob parecer n° 449.631/2013. Além disso, cada um dos participantes, ao aceitar fazer parte da pesquisa, assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Resultados e Discussão

Os sujeitos do estudo foram quatro enfermeiros, três médicos, um fonoaudiólogo e três técnicos de enfermagem. A idade dos sujeitos variou entre 24 e 47 anos. Quanto ao tempo de formação acadêmica, a média foi de oito anos, tendo como limites inferior e superior dois e 25 anos, respectivamente. Em relação ao tempo de atuação no setor de atendimento à parturiente, a média foi de três anos, com sete meses e oito anos como limites inferior e superior, respectivamente. Destaca-se que apenas quatro profissionais possuíam algum tipo de curso que aprimorasse sua prática profissional na área de saúde da mulher e da criança.

Este dado reflete a necessidade de investir no aprimoramento técnico-científico, sobretudo nas residências multiprofissionais e/ou especializações para a equipe de saúde com vistas a um maior engajamento no processo de trabalho dentro das unidades materno-infantis. É consenso que, para que o profissional de saúde seja um promotor eficaz do aleitamento materno, este deve estar munido de conhecimento técnico e científico acerca das questões que permeiam esse processo (12).

Apresentam-se a seguir as categorias temáticas que emergiram da análise das entrevistas.

Conhecimento da equipe multiprofissional

Esta categoria revela o déficit no conhecimento dos profissionais sobre a Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC) que estabelece entre suas prerrogativas -os dez passos para promover a amamentação- a implementação do quarto passo, representada pela amamentação na primeira hora de vida:

    Não, nunca ouvi falar, não [TE2].
    Eu não conheço os dez passos da IHAC [M2].
    Mais ou menos. Não ter uso de bico artificial, aleitamento na primeira hora. A gente até consegue fazer algumas coisas aqui; nem todas [F1].

As diversas dificuldades para a implantação da IHAC podem estar associadas à falta de conhecimento dos profissionais. A carência de preparo da equipe acaba tornando-se um empecilho para o sucesso dessa iniciativa, o que indica a necessidade de capacitação de todos os profissionais envolvidos (7).

No que tange à ótica da parturiente, por sua vez, não basta apenas existir o desejo de amamentar, tampouco o conhecimento acerca das vantagens e recomendações do AM; a mulher precisa de apoio e compreensão de sua realidade para que possa vivenciar o processo de amamentação da melhor forma possível (4). Assim, se faz necessário que os profissionais de saúde estejam disponíveis e preparados técnica e cientificamente para amparar e encorajar a mulher nesse processo.

Os dez passos da IHAC propõem uma transformação na rotina hospitalar por meio de ações que priorizam o aleitamento materno. As ações referem-se a início precoce da amamentação em livre demanda, alojamento conjunto, proibição de propaganda e distribuição de fórmulas infantis, bicos e chupetas e uso de leite artificial (1).

A equipe multiprofissional tem revelado o déficit no conhecimento sobre a amamentação na primeira hora e destacado que tal ação não acontece com frequência na instituição. Ainda assim, os profissionais destacam a importância de colocar o recém-nascido para ser amamentado precocemente para a formação de vínculo entre o binômio mãe-recém-nascido:

    Eu sei que é essencial, que é o início do vínculo da mãe com a criança, mas que geralmente não é feito mesmo; aqui não é feito [M2].
    Mantêm vinculo e fortalece a criança naquele primeiro momento em que ela sai do ventre da mãe. Isso repercute lá na frente pra ela, seria a coisa mais ideal de estar se fazendo [E4].

Dentre os inúmeros benefícios da amamentação na primeira hora de vida, está o estímulo ao vínculo entre a mãe e o recém-nascido. Esta relação se estabelece por meio do contato pelea-pele, pela troca de olhares e pelo próprio ato de amamentar (13, 14).

O contato precoce entre a mãe e o recém-nascido na primeira hora após o parto evidencia sua importância, pois oportuniza a mulher de olhar, tocar, pegar e começar a amamentar seu filho, suprindo toda a expectativa que ocorre durante a gestação; além disso, proporciona o fortalecimento do vínculo afetivo existente entre os dois. Portanto, ao nascimento, após avaliação inicial e verificada a vitalidade da criança, esta deve ser colocada junto à mãe para receber os estímulos adequados e proporcionar que a amamentação ocorra na primeira meia hora de vida após o nascimento (15).

Entretanto, a falta de conhecimento em relação à IHAC não foi impeditiva para que os profissionais da instituição pesquisada não implementassem o quarto passo. Mas deve-se ampliar a discussão acerca da iniciativa para que as ações sejam fortalecidas e evidenciadas a partir das práticas já executadas.

Desafios para a implantação da amamentação precoce

A divergência de opiniões e condutas entre os membros da equipe de saúde -especialmente o profissional médico- foi citada como um dificultador para a prática da amamentação precoce:

    A dificuldade nossa é com relação à aceitação, por vezes, da própria equipe médica, né?; de abrir esse espaço pra que a gente fique com o bebê nesse momento, lá na sala [de parto][EI].
    Precisa sim de o médico apoiar a equipe toda, porque daí se todo mundo aceitar, fica tranquilo [FI].

Essa mesma realidade foi verificada em outra pesquisa realizada em um hospital privado de Porto Alegre. A investigação mostrou que a assistência de saúde inflexível e "presa" às normas, às regras institucionais e à cultura da competência biomédica são fatores que limitam a prática da amamentação na primeira hora, corroborando os relatos apresentados (16).

A alta demanda de partos e o número insuficiente de funcionários foram também destacados pela equipe como uma justificativa para a não realização do quarto passo da IHAC:

    Teve um dia que a gente teve cinco partos normais, um atrás do outro [... ] é um número reduzido de funcionários [TEI].
    Colocar o bebê pra sugar na sala de parto não é fácil; às vezes eles não "pegam" e você precisa de tempo, e geralmente a gente não tem esse tempo porque a gente faz sala de parto uma atrás da outra. Mas acho que se for uma coisa que começasse a estimular; acho que a gente até possa conseguir [M2].

Essa sobrecarga de trabalho, evidenciada pelos participantes, foi verificada por puérperas em outra pesquisa que buscou compreender a percepção das mulheres em relação à sua prática de amamentação. O estudo considerou a inserção delas no cenário de um Hospital Amigo da Criança (HAC) e da Rede Básica de Atenção (RBA) na promoção do aleitamento materno, sendo que essas apontaram como a presença e disponibilidade do profissional de saúde um fator crítico para o aleitamento materno (17).

Os relatos permitem identificar uma rotina assistencial pautada no cumprimento de tarefas, a qual não considera a individualidade e a necessidade de cada binômio. Além disso, esta prática expõe o recém-nascido aos procedimentos desnecessários para o momento, ou seja, que podem ser postergados, elevando o tempo entre o nascimento e a primeira mamada:

    Tem uma rotina: o banho é dado imediatamente depois do nascimento [... ] é feito a vacinação [... ] é meio ruim; a mãe não participa. Eu acredito que poderia ser postergado e adiantado a amamentação [MI].

Adicionalmente, observa-se a execução de uma rotina fragmentada, principalmente entre os membros da equipe de enfermagem. Nessa rotina, um profissional é responsável pelos cuidados com as puérperas e o outro com os recém-nascidos, o que impossibilita a visão holística da díade mãe-bebê:

    O nosso interesse é futuramente cuidar a maternidade como um binômio; cuidar tanto da mãe quanto da criança. Mas, por enquanto, a gente tem isso separado [E4].
    As meninas do berçário é que cuidam dos bebês. A gente cuida das mães antes e depois [do parto] [TEI].

Nesse sentindo, alguns autores reiteram a necessidade de uma mudança na prática assistencial, especialmente para que o contato precoce entre a mãe com seu recém-nascido aconteça logo na primeira hora após o parto. Esta prática demonstra-se favorável para a obtenção de desfechos positivos na continuidade da amamentação, evidenciando os benefícios do alojamento conjunto e rompendo com o modelo assistencial ainda praticado na separação da mãe após o nascimento do filho (18). A separação da mãe e filho ocorre na realidade do cenário pesquisado através dos berçários, pois o alojamento conjunto ainda não é totalmente executado, o que poderia fortalecer as práticas de aleitamento.

Em uma pesquisa realizada no Jersey Shore University Medical Center em Neptune, o objetivo foi discutir as barreiras encontradas por um hospital e as estratégias utilizadas para se tornar Hospital Amigo da Criança. O estudo encontrou que, para o sucesso do aleitamento materno, é fundamental a adoção de estratégias que criem um ambiente que privilegie a amamentação e que as mudanças no processo de trabalho favoreçam o contato precoce pós-parto entre mãe e filho (19).

No alojamento conjunto, é possível que a equipe de enfermagem, juntamente com a equipe do Banco de Leite Humano (BLH), repassem as informações sobre a amamentação e sobre o manejo clínico da lactação, além das orientações e técnicas para prevenções das dificuldades que podem surgir no início da amamentação (20).

O tipo de parto foi destacado pelos profissionais de saúde como barreira para a amamentação na primeira hora, especialmente o parto cesáreo, como pode ser verificado nas seguintes falas:

    Quando é parto normal, [a amamentação] é mais ou menos na primeira hora. É porque a mãe já está assim: em boas condições. Quando é cesárea, é três horas depois que o neném vem do berçário para a mãe, porque a mãe já passou aquela fase da anestesia [TEI].
    Agora, se fosse um parto normal, que a mãe consegue segurar a criança; aí tudo bem. Mas, parto cesárea, eu acho mais difícil [TE3].
    Muitas vezes no parto normal a mãe se cansa muito, então ela não tem força nem pra dar de mamar [E2].
    Na cesárea é bem difícil, até daria para tentar; mesmo com três horas já é com dificuldade [...]. A gente não pode nem virar a paciente, por causa da cefa-leia pós-raqui. Se ela começa a conversar, dá gases. Muito difícil... , até a posição do bebezinho é desconfortável. A mãe está fraca, em jejum i2 horas, está morrendo de dor, não consegue nem mexer a perna [E5].

Algumas pesquisas afirmam que um dos principais entraves para o cumprimento do quarto passo está diretamente relacionado com o modelo de atenção ao parto (4). Um inquérito, realizado no Brasil em 2014, apontou que as taxas de cesarianas do Brasil são de 52% no setor público e 88% no setor privado; e que os partos vaginais que acontecem estão permeados por intervenções desnecessárias. Além disso, este inquérito afirma que o parto por cesariana contribui para a separação da mãe do bebê, em contraste com os partos vaginais em que houve a permanência maior entre eles. Portanto, o tipo de parto contribui significativamente para que o quarto passo aconteça (21).

A cesárea é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um fator de risco para a amamentação ao nascimento. A OMS preconiza que nos hospitais amigos da criança pelo menos 80% das mães com parto normal e 50% daquelas submetidas ao parto cesáreo devem ser ajudadas a colocarem o bebê em contato pele a pele para iniciar a amamentação (5). Este dado demonstra a necessidade da presença de um profissional de saúde capacitado para auxiliar a parturiente na primeira mamada, tendo em vista o esforço depreendido no caso do parto normal e do desconforto anestésico no caso do parto cesárea.

Diante de tantos desafios, destaca-se a necessidade da instituição hospitalar de aderir às políticas de promoção e proteção o aleitamento materno, permitindo a ação conjunta de todos os membros da equipe de saúde para a real efetivação da amamentação na primeira hora.

Sugestões para efetivação da amamentação na primeira hora de vida

Os profissionais enfermeiros relataram a importância de iniciar o preparo da mulher para a amamentação na Unidade Básica de Saúde (UBS), durante as consultas de pré-natal:

    O grande trabalho que deveria ser feito é o trabalho da equipe de saúde do posto. A gente pega as pessoas "cruas" e convive com elas por 24 horas, 36 horas, 48 horas no máximo" [E4].
    A coisa mais errada que eu vejo é que as pacientes não têm um pré-natal correto [...]; elas chegam aqui no hospital e tudo ela aprende aqui [...]. O certo seria um pré-natal correto; estar fazendo curso de gestantes; estar tendo todas as informações no começo pra ela chegar aqui e já ter uma bagagem [E5].

Em análise sobre os fatores que influenciam a decisão sobre o aleitamento materno exclusivo em crianças, constatou-se que mulheres que realizam três ou mais consultas no pré-natal com aconselhamento sobre am apresentam maior predisposição a iniciar a amamentação precoce (9). Os profissionais sugeriram, ainda, a reorganização do atendimento à mulher e ao recém-nascido, de modo a estabelecer uma nova rotina, priorizando o aleitamento materno:

    Eu acho que a gente deve reunir com a equipe de pediatra, fonoaudiólogo, ginecologista, obstetra, pra a gente tentar implantar, porque é muito bom para o bebê, né?; mudar um pouco a rotina [F1].
    Uma remodulação do atendimento, acho que isso por primeiro. Não só do médico, mas dos demais profissionais envolvidos também. Acho que seria o primeiro passo [M3].

Alguns autores compartilham da opinião dos participantes ao apontarem para a dificuldade imposta entre os níveis de decisão no que se refere à burocracia que torna o processo de implantação de novas estratégias de ação, moroso e complicado. Além disso, a baixa adesão de profissionais de outras equipes, em especial da equipe médica na sala de parto -bem como a falta de um maior comprometimento destes com as mudanças propostas- acabam por gerar sobrecarga de trabalho sobre aqueles envolvidos com este processo de adoção do quarto passo (22).

Os dados refletem a importância de ações de todos os níveis de atenção para a promoção ao aleitamento materno. É durante o pré-natal que as gestantes devem ser informadas e empoderadas para a amamentação, pois tal ação irá refletir no sucesso no momento do parto e sobretudo na primeira hora de vida. Ademais, as instituições que almejam o reconhecimento como Hospital Amigo da Criança, devem rever o processo de trabalho, tanto físico-estrutural, como de recursos humanos, a fim de consolidar os dez passos.

Pesquisas recentes sugerem que, para implantar a Iniciativa Hospital Amigo da Criança, esta exige uma abordagem interdisciplinar. As instituições devem identificar médicos ou enfermeiros líderes que compartilham paixões, visões e valores semelhantes ao da iniciativa (23). Além disso, este modelo compartilhado entre os profissionais melhora a qualidade da assistência e o clima institucional ao envolver todos os membros da equipe e os principais interessados para otimizar as mudanças culturais nas práticas de cuidado (24).

É preciso um novo paradigma para garantir que todas as mães do mundo possam ter um parto seguro e digno; não basta simplesmente fornecer cuidados obstétricos de emergência para recém-nascidos dentro das quatro paredes do hospital/ centro de saúde. À medida que os líderes mundiais planejam qual a melhor maneira de atender a comunidade, aqueles que cuidam de mães e recém-nascidos devem repensar como garantir que as mães recebam cuidados de qualidade culturalmente apropriados, dignos e seguros. Faz-se necessário um pacote transversal a todas as políticas e ações dos profissionais envolvidos na atenção materno -infantil (25).

Considerações finais

Foi possível observar os déficits ainda existentes no conhecimento acerca da amamentação na primeira hora de vida entre os profissionais que prestam assistência à parturiente e ao recém-nascido. Ademais, encontraram-se fragilidades para a não realização de tal prática na instituição de estudo.

A divergência de opinião e as condutas entre os profissionais, a alta demanda de partos e o número insuficiente de funcionários, bem como a prevalência do parto cesariano, somada a uma rotina assistencial fragmentada e pautada no cumprimento de tarefas, foram considerados desafios para a efetiva implantação do quarto passo da IHAC. Frente a tantas dificuldades, os profissionais sugeriram uma atenção pré-natal mais eficiente, capaz de sensibilizar e preparar a mulher para a amamentação, bem como a reorganização das rotinas hospitalares com vistas à prática da amamentação na primeira hora.

Essas são contribuições importantes que devem ser reconhecidas por instituições que almejam a acreditação do Hospital Amigo da Criança. Evidenciam ações que visam mudanças técnico-estruturais necessárias para a concretização dos dez passos da IHAC, sobretudo ações educativas para a equipe multiprofissional que presta assistência materno-infantil.

Em que pesem os limites do estudo, a abordagem qualitativa restringe generalização dos resultados obtidos. Ademais, sugere-se que outras abordagens metodológicas sejam realizadas, como estudos longitudinais que poderão esclarecer outras questões pertinentes à temática central do estudo.

Diante da importância da amamentação na primeira hora de vida para a redução da mortalidade neonatal, faz-se necessário a adesão de políticas. Um exemplo disso é a Política Nacional de Humanização o Humanizases, o qual atua a partir da formação do Grupo de Trabalho de Humanização institucional e da Rede Cegonha. Essas ações favorecem a promoção e a proteção ao aleitamento materno e valorizam a equipe multiprofissional ou o trabalho em equipe, permitindo a realização de uma assistência de qualidade ao binômio mãe-re-cém-nascido na primeira hora do nascimento.


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