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Avances en Enfermería

Print version ISSN 0121-4500

av.enferm. vol.36 no.2 Bogotá May/Aug. 2018

https://doi.org/10.15446/av.enferm.v36n2.68705 

Artículos de investigación

Perfil epidemiológico dos detentos: patologias notificáveis

Perfil epidemiológico de los detenidos: patologías notificables

Prisoners' epidemiological profile: notifiable pathologies

Eliana Lessa Cordeiro1 

Tânia Maria da Silva2 

Liniker Scolfild Rodrigues da Silva3 

Carlos Eduardo de Araújo Pereira4 

Fernanda de Barros Patricio5 

Camila Mendes da Silva6 

1 Mestre em Neurociências pelo Departamento de Neuropsiquiatria e Ciência do Comportamento da Universidade Federal de Pernambuco. Gestora do Departamento de Enfermagem da Universidade Salgado de Oliveira, campus Recife. Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: elianalesa18@hotmail.com

2 Mestre em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco. Docente do Departamento de Enfermagem da Universidade Salgado de Oliveira, campus Recife. Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: taniamaria55@gmail.com

3 Residente no Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva pela Faculdade de Ciências Médicas/Universidade de Pernambuco. Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: liniker_14@hotmail.com

4 Enfermeiro. Universidade Salgado de Oliveira, campus Recife. Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: cadu_clone13@hotmail.com

5 Residente em Saúde da Mulher pela Universidade Federal de Pernambuco. Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: fernanda10002009@hotmail.com

6 Residente no Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva pela Faculdade de Ciências Médicas/Universidade de Pernambuco. Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: camila_mendes@hotmailcom


Resumo

Objetivo:

Analisar as principais patologias que acometem os detentos de um Complexo Prisional de Recife (estado de Pernambuco, Brasil), refletindo, à luz da literatura, sobre as concepções de enfermagem que permeiam tais agravos.

Metodologia:

Trata-se de um estudo documental, de natureza exploratória e descritiva, com abordagem qualitativa. Os dados foram coletados em um Complexo Prisional localizado em Recife e analisados a partir dos critérios preestabelecidos por meio de um questionário fechado com 113 prontuários de detentos que se encontravam em regime fechado. Após o preenchimento dos formulários, o banco de dados foi formatado, e os dados analisados por meio do Programa Epi Info 2007.

Resultados:

Foi possível detectar que, em relação ao perfil epidemiológico dos detentos, verificou-se que 66,73 % têm de 18 a 31 anos, 8,85 % convivem com o vírus do HIV/Aids, e 13,27 % possuem transtorno mental.

Conclusões:

O cenário do sistema prisional é de condições subumanas, que fere com os direitos humanos básicos de cidadania. Nessa situação, a vulnerabilidade aumenta, e a emergência para a atuação de políticas, estratégias e ações que intervenham nesses locais são evidentes. São necessárias intervenções educativas com os detentos, maior número de profissionais de saúde, principalmente enfermeiros, capacitados e sensibilizados para atuar nessa realidade, a fim de garantir ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde.

Descritores: Enfermagem; Epidemiologia; Perfil de Saúde; Prisões (fonte: Decs Bireme)

Resumen

Objetivo:

Analizar las principales patologías que acometen los detenidos de un Complejo Carcelario de Recife (departamento de Pernambuco, Brasil), reflejando a la luz de la literatura las concepciones de enfermería que permean tales agravios.

Metodología:

Se trata de un estudio documental, de naturaleza exploratoria y descriptiva, con abordaje cualitativo. Se recogieron los datos en un complejo carcelario de Recife-Pernambuco y se analizaron por medio de los criterios preestablecidos de un cuestionario con 113 registros de detenidos en régimen cerrado. Después del diligenciamiento de los formularios, se formateó la base de datos y se analizaron los datos utilizando el Programa Epi Info 2007.

Resultados:

Fue posible detectar que, en relación con el perfil epidemiológico de los detenidos, se encuentra el 66.73 % con edad de 18 a 31 años, el 8.85 % conviven con el virus VIH/Sida y el 13.27 % tiene trastorno mental.

Conclusiones:

El escenario del sistema penitenciario es de condiciones sobrehumanas, que hiere con los derechos humanos básicos de ciudadanía. En esta situación, la vulnerabilidad aumenta y la emergencia para la actuación de políticas, estrategias y acciones que intervienen en esos lugares son evidentes. Se necesitan intervenciones educativas con los detenidos, mayor número de profesionales de salud, principalmente enfermeros, capacitados y sensibilizados para actuar en esa realidad, con el fin de garantizar acciones de promoción, prevención y recuperación de la salud.

Descriptores: Enfermería; Epidemiología; Perfil de Salud; Prisiones (fuente: Decs Bireme)

Abstract

Objective:

To analyze the main pathologies that affect the inmates of a Prison Complex of Recife-PE (Brazil), reflecting, in the light of the literature, about the nursing conceptions that permeate such diseases.

Methodology:

This is a documental study, of an exploratory and descriptive nature, with a qualitative approach. Data were collected in the Prison Complex located in Recife, Pernambuco State, and analyzed from preset criteria through a questionnaire with 113 records of prisoners in closed regime. After the completion of forms, the database was formatted, and data were analyzed using the Epi Info Program 2007.

Results:

It was possible to note that, regarding the prisoners’ epidemiological profile, it was found that 66.73% are aged between 18 to 31 years old, 8.85 % live with the HIV/ AIDS virus and 13.27 % have mental disorder.

Conclusions:

The scenario of the prison system consists of subhuman conditions, which violates the basic human rights regarding citizenship. In this situation, vulnerability increases, and the emergency for the implementation of policies, strategies and actions that intervene at these locations is evident. Educational interventions with inmates are needed, as well as a greater number of health professionals, especially nurses, trained and sensitized to act in these realities, ensuring actions for the promotion, prevention and recovery of health.

Descriptors: Epidemiology; Health Profile; Nursing; Prisons (source: Decs Bireme)

Introdução

Dados mais recentes do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (2017) evidenciam que o Brasil possui a quarta maior população carcerária por habitante do mundo, com 666 detentos para cada 100 mil habitantes, o que indica um aumento de 258 % em apenas 20 anos 1.

O cenário é preocupante, pois a população carcerária está submetida às condições que a deixam vulnerável à aquisição e transmissão de doenças, devido às estruturas inadequadas, como celas superlotadas com condições insalubres e precárias, à subnutrição, ao uso de drogas lícitas e/ou ilícitas, à higiene insuficiente e à assistência médico-jurídica fragilizada 2,3.

Legalmente, desde 1984, é assegurada ao detento uma assistência à saúde de caráter preventiva e curativa, que abrange o atendimento médico, farmacêutico e odontológico, através da Lei de Execução Penal 7.210, de 11 de julho, em seu artigo 14. Portanto, nos casos em que o estabelecimento penal não prover condições estruturais/instrumentais para uma assistência médica, esta deverá ser referenciada para outro serviço resolutivo 4.

Associado a isso, a Portaria Interministerial 1.777, de 9 de setembro de 2003, aprova o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário (PNSSP), que ressalta o direito dos detentos a uma assistência à saúde de forma integral, de acordo com algumas diretrizes estratégicas, como: prestar assistência integral resolutiva, contínua e de boa qualidade às necessidades de saúde; reduzir os agravos mais frequentes; definir e programar ações e serviços consonantes com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS); implementar a intersetorialidade; democratizar o conhecimento do processo saúde/doença, dentre outras 2.

Nesse contexto, a enfermagem possui um papel bastante relevante, pois colabora para a recuperação de vida dos indivíduos reclusos, através de uma sistematização de enfermagem individual, integral e equânime, livre de qualquer tipo de preconceito e discriminação, obedecendo aos preceitos éticos inerentes de sua atividade profissional 5.

Considerando que a população carcerária está vulnerável a diversas situações que afetam a saúde, o presente artigo tem como objetivo analisar as principais patologias que acometem os detentos de um Complexo Prisional de Recife (estado de Pernambuco, nordeste do Brasil), refletindo, à luz da literatura, sobre as concepções de enfermagem que permeiam tais agravos.

Materiais e método

Trata-se de um estudo documental, de natureza exploratória e descritiva, com abordagem qualitativa, realizado em um Complexo Prisional Estadual localizado em Recife, Pernambuco (PE), Brasil.

Os documentos são importantes fontes de dados, pois armazenam informações que são relevantes para a caracterização de uma determinada situação. Considerar a pesquisa documental pelo cunho qualitativo é propor novos enfoques para uma problemática. Três aspectos principais delinearam o estudo para se refletir nas concepções de enfermagem: a escolha dos documentos, o acesso a eles e a sua análise 6.

A população estudada foi de pessoas privadas de liberdade, atendidas no ambulatório do Complexo Prisional, durante o ano de 2015. Esse ano foi considerado turbulento, pois 15 tentativas de fuga foram registradas juntamente com diversas rebeliões que incluíram armas de fogo e morte de detentos e vizinhos da localidade. Tal fato justifica o interesse em investigar as condições de saúde dessa população, que se encontrava em alta vulnerabilidade.

A amostra foi composta por 113 prontuários. Os critérios de inclusão foram os diários dos detentos que receberam qualquer tipo de assistência à saúde no ambulatório durante o ano de 2015 e que estavam em regime fechado. Foram excluídos da pesquisa os prontuários dos detentos em liberdade condicional e os prontuários atendidos com anos maiores ou menores que 2015.

Foi elaborado um questionário semiestruturado padronizado para nortear o levantamento das informações dos prontuários. Ele foi composto por 32 questões objetivas, as quais corresponderam a: idade, tabagismo, realização de algum tratamento de emergência ou ambulatorial, doenças notificáveis pelo Ministério da Saúde, doenças prévias e medicações que fazem uso.

A coleta dos dados foi realizada nos meses de setembro a outubro de 2016, após a assinatura da carta de anuência e a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Salgado de Oliveira (Universo), sob o n.° de Caee: 59636916.1.0000.5289. Depois da coleta de dados, estes foram formatados e analisados utilizando o EpiInfo 2007; foi realizada análise descritiva para a caracterização das variáveis para, posteriormente, ser feita uma análise à luz da literatura científica.

Resultados e discussão

No presente estudo, foram investigados 113 prontuários de detentos atendidos no ambulatório em um Complexo Prisional Estadual da cidade do Recife-PE durante o ano de 2015. Na Tabela 1, observa-se o perfil social e da saúde levantado dos prontuários.

Tabela 1 Perfil social e de saúde da população privada de liberdade atendida no ambulatório em um Complexo Prisional de Recife-PE (2015) 

Fonte: dados da pesquisa, 2015.

Com relação à faixa etária, verifica-se que 66,37 % têm 18 a 31 anos, o que corrobora com um estudo realizado na cidade de Belo Horizonte no ano de 2010, no qual 80 % das pessoas que foram privadas de liberdade novamente possuíam até 30 anos de idade 7.

Dados oficiais do Departamento Penitenciário Nacional 1 do Ministério da Justiça e Segurança Pública evidenciam que, em 2016, a população privada de liberdade do Brasil estava em torno de 726.712, distribuída em diferentes estabelecimentos penais que compõem o sistema penitenciário brasileiro. Ressalta-se ainda que 55 % dos detentos são formados por adultos jovens (idade até 29 anos). Realidade que pode ser evidenciada, inclusive, em estudo realizado nas penitenciárias femininas do estado da Paraíba 8.

Grande parte dos jovens ingressou na criminalidade ainda durante a adolescência, sendo eles os mais envolvidos em crimes violentos. Esses jovens são, em sua maioria, advindos de estratos sociais de populações pobres, comunidades marginalizadas e com baixo nível educacional 2,7.

Com relação à variável tabagismo, pode-se notar que 70,80 % da população não faz uso de tabaco. Sobre o atendimento de emergência, verificou-se que 92,92 % receberam algum tipo de tratamento emergencial e 7,08 % não receberam. Dentre os detentos, 98,23 % deles não possuem doenças interrogadas.

A alta taxa de atendimentos emergenciais justifica-se pelas torturas e agressões físicas que os detentos sofrem nas prisões. Tais práticas podem ocorrer tanto por parte dos agentes penitenciários que introduzem a "correção", após uma tentativa de fuga ou rebelião, quanto por parte de outros detentos, principalmente atos violentos, como tentativas de homicídios, abusos sexuais, espancamentos e extorsões 9.

A violência se relaciona diretamente com a estrutura social, econômica e política, e agrava-se com as exclusões e desproteções sociais, ameaçando a integridade física e mental do sujeito. Os profissionais de enfermagem se sentem ameaçados em atuar em ambientes violentos e refletem a ansiedade, o medo e a insegurança sobre como agir diante de determinadas situações. No entanto, estudos evidenciam que os profissionais perpassam tais limitações e promovem o cuidado em saúde de acordo com as necessidades apresentadas, da forma mais efetiva e eficaz 10.

Outro aspecto que prejudica a atuação dos profissionais é a quantidade de enfermeiros inferior do que a real necessidade. As condições de trabalho devem ser analisadas, pois alguns incentivos podem ser ofertados para motivar tais profissionais, como o acesso informatizado à rede de prestadores, segurança, contrarreferência e incentivos financeiros de trabalho 11.

De acordo com Oliveira 5, destacam-se alguns fatores que favorecem a contaminação e disseminação de doenças infectocontagiosas no sistema prisional, tanto para a população privada quanto para os funcionários do estabelecimento e a comunidade extramuros: demora na identificação dos portadores da doença; isolamento daqueles portadores da doença; alta rotatividade de detentos; celas pequenas e pouco ventiladas, e tempo de encarceramento.

Na Tabela 2, pode-se detectar as doenças prévias dos detentos atendidos no ambulatório do complexo prisional. Com relação à incidência de transtornos mentais, os detentos estão vulneráveis a fatores que contribuem para a ocorrência, principalmente, de ansiedade e depressão, como a privação da liberdade e a mudança do seu ambiente social. As situações adversas vivencia-das podem desencadear nos indivíduos respostas e reações distintas, adaptativas ou aquelas que submetem os detentos a riscos ainda maiores. Em um estudo 12 realizado com presidiários de Santa Catarina, foi relatado que os sintomas de depressão não têm relação direta com os transtornos mentais específicos, mas sim com condições insalubres, superlotação, celas mal iluminadas e ventiladas com odor fétido, má alimentação, sedentarismo e violência 13.

Tabela 2 Caracterização das doenças prévia dos detentos atendidos no ambulatório de um Complexo Prisional de Recife-PE (2015) 

Fonte: dados da pesquisa, 2015.

Como a população estudada não pratica nenhum tipo de atividade física, os detentos possuem maiores chances de desenvolverem cardiopatias, aumentando de 20 a 30 % o risco de mortalidade 12. Em consonância, para reduzir a dermatite atópica, são necessárias duas práticas: melhorar a higiene e exposição ao sol, pois esta promove a síntese de vitamina D, que é responsável pela modulação de micronutrientes e diferenciação celular 14,28.

Destaca-se também o fato de que quase metade da população privada de liberdade (49,56 %) não possuía doenças prévias quando atendida no ambulatório do Complexo. Esse fato se relaciona com as subnotificações, problemática que dificulta a análise da situação de saúde dessa população e, consequentemente, prejudica o planejamento de estratégias e ações para o controle de doenças. Para Barbosa 20, mesmo havendo legislação específica que orienta os sistemas prisionais a prestar assistência à população privada de liberdade, e apesar de grande parte dos estados brasileiros já estar recebendo o financiamento previsto pelo PNSSP, muitos estabelecimentos prisionais não estão aptos a desenvolver serviços referentes à saúde 15,20.

Dessa forma, Alcantra et al. 16 e Mourão et al. 17 relatam que é relevante que haja melhoria no investimento de recursos humanos e financeiros, com o objetivo de ofertar aos milhares de indivíduos privados de liberdade o acesso à saúde, de modo que não seja visto como um privilégio ou compaixão, mas como um direito garantido pela Constituição. Assim, é necessário que o presídio ofereça uma assistência multiprofissional aos portadores de transtornos mentais, principalmente para a ansiedade e a depressão, com o objetivo de reduzir e prevenir sinais e sintomas 13.

A incidência de IST/Aids em detentos chega a ser o dobro da população que vive livre, pois o fato de estarem confinados favorece as relações homoafetivas sem o uso de preservativo, a violência sexual praticada por parte dos outros detentos, o compartilhamento de objetos perfu-rocortantes (agulhas usadas em tatuagens, piercings, lâminas de barbear), a restrição do espaço e da mobilidade, o que favorece a contaminação e disseminação de outras IST 18,19.

O PNSSP reconhece as seguintes áreas como prioritárias: diabetes, hanseníase, tuberculose, hipertensão e IST/Aids. O controle das endemias é de responsabilidade do enfermeiro, o qual desenvolve ações de promoção e prevenção da saúde. É preciso realizar a busca ativa, o diagnóstico precoce, a notificação compulsória, o tratamento supervisionado e a investigação dos comunicantes para a tuberculose e a hanseníase; atentar para a hipertensão e o diabetes, bem como realizar o tratamento adequado de tais casos. Para tanto, o acompanhamento clínico é fundamental. Em consonância, a presente revisão evidencia o alto índice de transtornos mentais registrados entre os detentos, agravo não considerado pela PNSSP 20.

A Tabela 3 evidencia as doenças notificadas nos detentos. Os dados estão em consonância com os evidenciados pelo Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias, no qual em primeiro se tem o HIV/Aids, em seguida sífilis, hepatites e tuberculose 21.

Tabela 3 Doenças notificáveis na população privada de liberdade atendida no ambulatório de um Complexo Prisional de Recife-PE (2015) 

Fonte: dados da pesquisa, 2015.

Um dos aspectos que justifica o alto índice de tais doenças e agravos são as condições precárias do encarceramento que a população privada de liberdade está sujeita: celas superlotadas, pouco ventiladas e iluminadas, associadas à má higieni-zação, ao sedentarismo e ao uso de drogas 3,22.

Outro aspecto é a dificuldade de adesão aos tratamentos, que favorece a sobrecarga nos serviços de urgência e emergência, assim como a assistência farmacêutica, colaborando para que o muní-cipio se torne bastante vulnerável. Vale salientar que os detentos não recebem nenhum tipo de informação a respeito das doenças infectoconta-giosas, o que leva a conceitos equivocados sobre transmissão, sintomas, tratamento e cura, principalmente da tuberculose. Atrelado a isso, é notório que medidas de educação e controle devam ser instituídas a essa população para reduzir a prevalência e o abandono ao tratamento, com a finalidade de reduzir as altas taxas de transmissibilidade 23-25.

Observa-se que 77,88 % da população privada de liberdade não teve nenhuma patologia notificada, fato questionável, uma vez que as más condições de permanência nas celas favorecem a transmissão de doenças. Pode-se ratificar ainda a problemática da subnotificação e a falta de registro nos prontuários. Manter a qualidade no registro das informações é viabilizar o monitoramento local dos casos e auxiliar a vigilância e controle dos agravos 15.

Com relação aos tratamentos medicamentosos, observou-se que 51,33 % dos detentos não informaram o uso de medicamentos, 31,86 % informaram não utilizar e 16,81 % que utilizavam. Dentre os medicamentos prescritos utilizados por essa população, estão: 0,88 % albendazol, carbamazepina e clonazepan; 7,08 % antivirais e 4,42 % fluconazol. Carbamazepina e clonazepan são benzodiazepíni-cos utilizados para tratar pacientes depressivos.

A Organização Mundial da Saúde aponta que a depressão será a segunda maior causa de incapacidades em 2020 27. Sua incidência entre a população privada de liberdade tem estreita relação com o ambiente recluso e isolado do sistema prisional que desencadeia sintomas como: ansiedade, depressão, agitação, insônia dentre outros transtornos psiquiátricos 28.

Devido ao ambiente insalubre, às baixas condições dos detentos e ao quantitativo de profissionais insuficiente para atender aos sistemas previ-denciários, as infecções virais e o abandono ao tratamento tendem a aumentar. Evidencia-se que, quando os detentos são cuidados por profissionais, frequentemente, eles se sentem bem, tendo a percepção de que o tratamento é para a sua saúde e para a saúde dos outros que convivem com ele 24.

Estudo realizado por Damas (2012), no estado de Santa Catarina, evidencia que, como o quantitativo de profissionais é reduzido, a dispensação ou administração de medicamentos se torna um entrave para a assistência à saúde, sendo essa atuação transferida para os agentes penitenciários ou até mesmo o medicamento é entregue ao próprio detento; uma ação perigosa que pode levar ao uso inadequado da medicação 28.

Conhecer as patologias da realidade que o enfermeiro está atuando orienta-o para a aplicação de um processo de enfermagem eficaz, planejando oportunidades direcionadas às necessidades reais da população privada de liberdade 30.

Estudo de revisão evidencia que as ações realizadas pelos enfermeiros no sistema prisional podem ser classificadas em três categorias: assistência voltada para os cuidados primários de atenção à saúde, que se referem à vigilância, promoção e prevenção da saúde dos detentos, por meio de um acompanhamento assistencial; cuidado aos pacientes crônicos, com maior ênfase para os hipertensos e diabéticos, e, por fim, gestão administrativa, categoria que preenche grande parte da disponibilidade do profissional. Observa-se que a educação em saúde não é incluída, o que demonstra uma fragilidade no sistema prisional 31.

O enfermeiro é considerado um exímio educador, que tem a capacidade de promover a autonomia e empoderar os participantes. Evidenciase que a utilização de metodologias ativas, como roda de conversas, proporciona maior reflexão e compreensão de assuntos que necessitam ser abordados pelos participantes.

O enfermeiro tem a capacidade de ampliar a sua perspectiva e reconhecer os fatores condicionantes e determinantes envolvidos no processo saúde-doença de cada realidade, o que fornece uma visão holística sobre o sujeito privado de liberdade, aspecto essencial para assisti-lo 31.

Conclusão

O cenário do sistema prisional é de condições subumanas, que fere com os direitos humanos básicos de cidadania. Nessa situação, a vulnerabilidade aumenta, e a emergência para a atuação de políticas, estratégias e ações que intervenham nesses locais é evidente. Para transformar essa realidade, são necessárias intervenções educativas com os detentos e um maior número de profissionais de saúde, principalmente enfermeiros, capacitados e sensibilizados para atuar nessa realidade, o que garantiria ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde.

Com relação às dificuldades encontradas durante a revisão documental, destaca-se a escassez de trabalhos relacionados à temática na literatura científica, principalmente na área da enfermagem. Mais estudos nessa área poderiam contribuir substancialmente para a melhoria da assistência aos detentos e, assim, alcançar as metas propostas pelo PNSSP, bem como o desenvolvimento de uma assistência integral.

Portanto, é preciso potencializar as produções científicas relacionadas ao âmbito penitenciário e repensar a saúde do sistema prisional, buscando a garantia constitucional da saúde e as boas condições no ambiente dessa população, direitos assegurados pelo SUS.

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Recebido: 05 de Novembro de 2017; Aceito: 03 de Julho de 2018

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