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Revista de Derecho Privado

versão impressa ISSN 0123-4366

Rev. Derecho Privado  no.36 Bogotá jan./jun. 2019

https://doi.org/10.18601/01234366.n36.11 

Observatorio de legislación y jurisprudencia

Os limites dos negocios jurídicos processuais nas ações de família no direito brasileiro*

Los límites de los negocios jurídicos procedimentales en las acciones de familia en el derecho brasileño

The Boundaries of Legal Proceedings in the Brazilian Family Law Actions

Alexander Perazo Nunes De Carvalho** 

Gabriela Martins Carmo*** 

** Centro Universitário Christus, Universidade de Fortaleza, Fortaleza, Brasil e Faculdade Luciano Feijão, Sobral, Brasil; professor. Professor visitante da Universidade Potiguar, em Natal/RN. Doutor e mestre em Direito Constitucional, Universidade de Fortaleza, Fortaleza, Brasil. Graduação em Direito, Universidade Federal do Ceará. Assessor Jurídico-Chefe, Procuradoria de Justiça Militar da União, Fortaleza, Brasil. Contato: perazo@globo.com. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-1524-0472.

*** Centro Universitário Christus, Fortaleza, Brasil. Mestranda em Direito, Centro Universitário Christus. Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Faculdade Evolutivo. Graduada em Direito, Universidade de Fortaleza. Contato: gabrielamartinscarmo@gmail.com. Orcid: https:// orcid.org/0000-0003-1745-5290.


RESUMO.

O código brasileiro de processo civil de 2015 trouxe diversas inovações em seu bojo, entre elas os negócios jurídicos processuais. Este instituto visa possibilitar que as partes tenham mais liberdades e autonomia processuais, tornando o processo mais condizente com suas individualidades. Na presente pesquisa, busca-se justamente explicar um pouco mais deste instituto e analisar se ele pode ou não (e se sim, até que ponto) ser utilizado em ações familiares. Para tanto, a presente pesquisa foi dividida em três tópicos, além das considerações iniciais e finais, no qual o primeiro visa estudar este novo instituto em si, no segundo, analisar a autonomia privada no direito de família e no terceiro, avaliar se os negócios jurídicos processuais cabem em ações familiares. Vale salientar que a metodologia da pesquisa é eminentemente bibliográfica. Da pesquisa, concluiu-se que sim, cabe o uso de negócios jurídicos processuais em ações de família com base na sua autonomia privada.

PALAVRAS-CHAVES: negócios jurídicos processuais; autonomia privada; direito de família; ações familiares; limites processuais

RESUMEN.

El código brasileño de procedimiento civil de 2015 ha aportado una serie de innovaciones, incluyendo los negocios jurídicos procesales. Este instituto busca permitir a las partes que tengan más libertades y autonomía procesal, haciendo que el proceso sea más coherente con sus individualidades. La presente investigación busca precisamente explicar este instituto y analizar si puede o no (y si es así, hasta qué punto) aplicarse en caso de ejercicio de acciones familiares. Para ese propósito, la investigación se dividió en tres temas, además de las consideraciones iniciales y finales. El primero estudia este nuevo instituto en sí; el segundo analiza la autonomía privada en derecho de familia; el tercero evalúa si los negocios jurídicos procesales encajan en acciones familiares. Cabe señalar que la metodología de la investigación es eminentemente bibliográfica. De la investigación se concluye que sí es posible utilizar los negocios jurídicos procesales en las acciones familiares basadas en la autonomía privada de esta.

PALABRAS CLAVE: negocios jurídicos procesales; autonomía privada; derecho de familia; acciones familiares; límites de procedimiento

ABSTRACT.

The Brazilian Code of Civil Procedure of 2015 brought several innovations in its core, among them the procedural legal business. This institute aims to enable the parties to have more procedural freedom and autonomy, making the process more consistent with their individualities. In the present research, we seek to explain a little more since the institute and to analyze whether or not it can (and if so, to what extent) be used in family actions. In order to do so, the present research was divided in three topics besides the initial and final considerations, in which the first one is to study this new institute in itself, in the second to analyze the private autonomy in the family right, and in the third to evaluate if the businesses procedural rights fit into family actions. It is worth noting that the research methodology is eminently bibliographical. From the research, it was concluded that yes, it is the use of procedural legal transactions in family actions based on the latter's private autonomy.

KEYWORDS: Procedural Legal Affairs; Private Autonomy; Family Right; Family Actions; Procedural Limits

CONTEÚDO.

Considerações iniciais. i. Os negócios jurídicos processuais. A. Os negócios jurídicos. B. Os negócios jurídicos processuais no novo código de processo civil. C. A (des) necessidade de homologação judicial. ii. Autonomia privada no direito de família. A. Características primordiais no direito das famílias. B. A autonomia privada como expressão fundamental da família. iii. Os negócios jurídicos processuais nas ações de família. A. A compatibilidade do direito de família com o instituto dos negócios jurídicos processuais. B. Os limites do uso dos negócios jurídicos processuais nas ações de família. Considerações finais. Referências.

Considerações iniciais

O novo código brasileiro de processo civil de 2015 trouxe diversas inovações em diversos âmbitos processuais: tramitação das ações de família em rito especial, com o objetivo sempre de se solucionar o conflito através do consenso; a obrigatoriedade de julgamento dos processos, pelos juízes, em ordem cronológica; a criação do incidente de resolução de demandas repetitivas; a obrigatoriedade da primeira audiência ser de conciliação ou mediação (salvo se as partes esclarecerem ambas que não querem), de modo a privilegiar os meios equivalentes de gestão de conflitos; a possibilidade de demandas individuais se transmudarem em ações coletivas, por exemplo.

Dentre essas inovações, uma de suma importância, porém ainda pouco conhecida, é a criação dos negócios jurídicos processuais, nos termos dos artigos 190, 191 e 200 do novo código brasileiro de processo civil de 2015. E, algumas dúvidas surgem de antemão quando este é o tema: O que são esses negócios jurídicos processuais? Para que servem? Eles podem ser utilizados em qualquer tipo de processo civil? Caberia sua utilização em uma ação, como por exemplo, as já citadas ações de família, em que o Estado conferiu status de procedimento especial?

No presente trabalho, busca-se responder a estes questionamentos, em especial, a possibilidade de utilização ou não dos negócios jurídicos processuais nas ações de família, tendo em vista que são ações repletas de peculiaridades e nuances, devido ao envolvimento afetivo que existe entre as partes que figuram o processo. Com isso não se tem a intenção de desprivilegiar outros tipos de ação, mas, como se faz necessário um recorte do objeto de pesquisa, posto a natureza do tamanho deste trabalho e a inegável participação das ações familiares em um grupo seleto de ações cheias de especificidades e que o legislador estimulou enormemente a autonomia das partes, as ações de família foi o recorte escolhido para esta pesquisa.

Para alcançar o objetivo pretendido, este trabalho foi dividido em três partes, além das considerações iniciais e finais. A primeira, de título "Os negócios jurídicos processuais", visa explicar no que consiste tal instituto, sua classificação, sua disposição no novo código brasileiro de processo civil e a polêmica questão de se há ou não necessidade de homologação judicial para que se confira validade a tal instituto.

A segunda parte, nomeada de "Autonomia privada no direito de família", consiste em analisar as características do direito das famílias, suas eventuais peculiaridades e fazer uma revisão destes direitos com base na autonomia privada.

Na terceira parte, denominada "Os negócios jurídicos processuais nas ações de família", propõe-se pesquisar tal instituto dentro do direito das famílias, verificando se, com base na autonomia privada, este instituto poderia ou não ser utilizado em ações familiares e, se sim, até que ponto.

Vale salientar que o presente trabalho possui um caráter exploratório e investi-gativo, e sua metodologia se deu com estudos bibliográficos sobre o tema, tendo em vista a falta de um estudo mais prático, como uma análise de decisões judiciais ou uma pesquisa de campo, em virtude da novidade que a própria temática é por si e sua pouca utilização prática. Por isso, o objetivo deste estudo é justamente divulgar o instituto dos negócios jurídicos processuais e, diante do exposto, passa-se ao tópico 2 (dois), primeira subdivisão do trabalho.

I. Os negocios jurídicos processuais

Os negócios jurídicos processuais constituem uma inovação do novo código brasileiro de processo civil de 2015, porém a existência deste instituto (ainda que não com essa forma, hoje conhecida, e com esse nome) é datada da época do Império Romano, em que as partes acordavam com o juiz o procedimento que seria utilizado em seu processo e que cumpririam o que ali fosse decidido, situação que só se modificou mais tarde, depois da codificação e unificação do direito processual como a que se tem atualmente, como explica Nogueira1:

Figuras a respeito de cujo caráter negocial se discute hoje, em doutrina e jurisprudência, não eram estranhas ao direito romano. Já na fase de legis actiones, durante a primeira etapa do procedimento (in iure), as partes contrapostas compareciam perante o magistrado (normalmente o pretor) e acordavam a solução da controvérsia ao iudex privado, formando a litis contestatio, com o compromisso de participar do juízo apud iudiciem e aceitar o respectivo julgamento a ser feito na fase seguinte. Parte considerável da doutrina, por isso, tem acentuado o caráter contratual ou negocial da litiscontestação em Roma.

Assim, esse cenário romano se modificou com a criação do processo do cognitio extra ordinem, que funcionava como a terceira fase do "processo" no Império Romano, na qual o juiz tomava conhecimento do litígio ouvindo as partes e posteriormente proferia sua decisão, acabando com a ideia de contratualidade que se tinha2. E tal cenário se manteve por séculos no mundo e, no Brasil, com o advento do código comercial de 1850, timidamente, tal instituto renasceu em poucos dispositivos, como cita Nogueira3:

Na vigência do regulamento n° 737, de 1850 -considerando o primeiro código processual nacional, que regulava o processo das causas comerciais, revogando-se no particular a legislação filipina-, previram vário atos (hoje) de possível enquadramento na categoria de negócios processuais, tais como: a conciliação prévia nos processos judiciais (art. 23), a convenção para estipulação do foro (art.62), a estipulação de escolha do procedimento sumário (art. 245) [...]. Superada a fase fragmentária dos Códigos estaduais, sobreveio a unificação do Direito processual civil com o Código de processo civil de 1939, a prever figuras negociais com a transação (art. 206) [...] Com o advento do Código de 1973, [...] introduziu-se um regime geral dos atos processuais, [...] que permite, por si só justificar a presença de negócios processuais praticados pelas partes. Com a aprovação do Código de processo civil de 2015, o tema entrou em efervescência.

Esse histórico mostra que, embora seja um instituto antigo, os negócios processuais consistem em uma novidade, pois, de fato e como dito, foi com o advento do novo código brasileiro de processo civil de 2015 que este instituto ganhou enorme força, mas, justamente por ele nunca ter tido tanto poder no país, é tão pouco conhecido e utilizado. Por isso, cabe inicialmente tecer seu conceito, sua classificação e, no tópico seguinte, sua disposição no novo código de processo civil, para só então adentrar no último tópico dessa primeira parte: como se dá a polêmica necessidade ou não de homologação judicial nesse instituto.

A. Os negócios jurídicos

Antes de adentrar propriamente no conceito de negócios jurídicos processuais, cabe explicar primeiramente no que consistem os negócios jurídicos. Os negócios jurídicos se apresentam como "uma espécie de fato jurídico, legitimando-se, assim, o seu tratamento como um conceito jurídico fundamental (lógico-jurídico)"4 e, por isso, é importante neste momento trazer a classificação e a diferenciação entre ato, fato e negócio jurídico, para que o conceito deste último fique aclarado.

No Brasil, o fato jurídico em sentido amplo consiste em um fato no qual incidiram regras do ordenamento jurídico, tornando um simples fato em um fato jurídico, pois "é o suporte fático que, jurisdicizado pela incidência de uma hipótese normativa, entra no plano de existência do mundo do direito"5. Esse fato jurídico em sentido amplo pode ser subdividido em fato jurídico em sentido estrito, ato-fato jurídico e ato jurídico em sentido amplo, que, por sua vez, pode ser subdividido em ato jurídico em sentido estrito ou em negócio jurídico.

O fato jurídico em sentido em sentido estrito "é aquele cujo suporte fático é integrado por simples fatos da natureza, não exigindo para sua existência, ato humano. São exemplos a morte, o nascimento, o implemento de idade, o parentesco, a confusão, a produção de frutos, a avulsão, dentre outros"6. Ou seja, uma situação da natureza que incida em alguma norma jurídica se transforma, por exemplo, em um fato jurídico de sentido estrito.

Por sua vez o ato-fato jurídico é um fato que integrado a um ato humano se torna uma conduta juridicamente relevante. Vale salientar que a vontade do homem nesses casos pouco importa ao direito, podendo assim o ato ser volitivo ou não, pois "se dá mais importância ao resultado fático decorrente da conduta humana do que a ela mesma. Ex.: caça, pesca, especificação, comistão, achado de tesouro, dentre outros"7.

A terceira espécie de fato jurídico é o ato jurídico em sentido amplo. Nesse, o suporte fático é corroborado por um ato humano também, porém a vontade humana é indispensável para que ele se realize, ao contrário do ato-fato jurídico. Ou seja, é necessária a exteriorização da vontade consciente para que o ato jurídico em sentido amplo ocorra, por isso ele possui elementos constitutivos obrigatórios: "i) ato humano volitivo que represente uma exteriorização de vontade; ii) vontade consciente; iii) que se dirija à obtenção de resultado protegido ou não proibido pelo direito, e que seja possível - apto a promover uma alteração na situação jurídica dos interessados"8.

Essa terceira espécie se subdivide em duas: ato jurídico em sentido estrito e negócio jurídico. O ato jurídico em sentido estrito (ou ato não negocial) ocorre que a vontade exteriorizada pelo homem compõe o suporte fático de uma categoria jurídica sendo seus efeitos inafastáveis e invariáveis pela a vontade do interessado, sendo, portanto, necessários para que essa subespécie exista9. Como exemplifica Braga ao falar dessa temática:

Tome-se, por exemplo, o caso em que alguém estabelece sua residência com ânimo definitivo (fato jurídico = constituição de domicílio), sendo que o efeito jurídico necessário (art. 70 CC/2002) é considerar-se aquele seu domicílio - não se pode afastar, modificar, ampliar ou restringir efeito da lei, tampouco escolher outro. Imagine-se, ainda, o ato pelo qual alguém reconhece filiação não decorrente de casamento, o perdão, a quitação, a interpelação, a escolha de prestações alternativas, a confissão, a interrupção de prescrição, dentre outros. Há, aqui, a vontade livre e consciente na prática do ato, mas não se exige, contudo, a vontade da produção de um resultado eleito10.

Por fim, a segunda subespécie do ato jurídico em sentido amplo, justamente o objeto de estudo do presente trabalho, é o negócio jurídico. O negócio jurídico existe quando a vontade exteriorizada compõe o suporte fático imprescindivelmente, atribuindo-se ao sujeito, dentro dos limites legais, a autonomia do poder de escolher a categoria jurídica, seu regramento e seus efeitos11. Ou seja, como explica Vendramini12

Por fim, o negócio jurídico, objeto do presente estudo, que se relaciona com a autonomia da vontade e com a escolha na estruturação do conteúdo da relação jurídica. Pode se dizer, ainda, que consiste em uma declaração de vontade com o fim de produzir efeitos jurídicos. Geralmente é definido como ato de autonomia privada e, por consequência, tem como característica a autodeterminação, autovinculação, autorregulação.

Vale salientar que os negócios jurídicos ainda podem ser subdivididos em unilaterais, "Há, aqui, a vontade livre e consciente na prática do ato, mas não se exige, contudo, a vontade da produção de um resultado eleito"; ou em bilaterais "quando fundados em duas declarações de vontade concorrentes (opostas) e concordantes sobre um mesmo objeto, como é o caso dos contratos (quase todos bilaterais)"; ou ainda plurilaterais "quando declarações de vontade distintas advêm de mais de dois lados, convergindo para um mesmo objeto, tal como o contrato de constituição de sociedade (plurilateral em essência)"13 e, desta forma, aclarado o que são os negócios jurídicos processuais, cabe agora visitar esse instituto no código brasileiro de processo civil de 2015[14].

B. Os negócios jurídicos processuais no novo código de processo civil

Os negócios jurídicos processuais são um tipo de negócio jurídico (defendido ma-joritariamente pela doutrina como bilaterais, tendo em vista que em um processo usualmente figuram duas partes) que se aplicam a um processo judicial. Nele as partes podem convencionar situações processuais, formato do procedimento, foro, dentre outras coisas. Cabe de início salientar que, os negócios jurídicos processuais se subdividem em típicos e atípicos.

O negócio jurídico processual é aquela hipótese de negócio jurídico que já está prevista no código brasileiro de processo civil, sendo dispensável, por isso, o esforço das partes em a regular, tendo em vista que sua disciplina já se encontra no texto legal, cabendo às partes apenas expressarem seu desejo em a utilizar. São exemplos de negócios jurídicos típicos no ordenamento jurídico brasileiro: acordo de eleição de foro; convenções que suspendem processos; convenções que dilatam prazos; a desistência da ação ou de recursos, entre outros.

Por outro lado, os negócios jurídicos atípicos são aqueles negócios jurídicos que a lei não prevê diretamente em seu texto, mas que deixa margem para que as partes o criem, o regulem e o utilizem dentro dos limites legais, como explica Talamini15: "O ajuste de vontade das partes poderá modular o procedimento ou posições jurídicas processuais em outras hipóteses, que não aquelas taxativamente previstas em lei". E no novo código se encontra amparado tal instituto, como expõe Talamini16:

Se alguma dúvida ainda havia quanto a existência de negócios jurídicos processuais, ela foi de todo sepultada pelo art. 190 do código de Processo Civil de 2015, que autoriza a celebração de convenções entre as partes a respeito do procedimento judicial ou das próprias posições jurídicas processuais (direitos, ônus, deveres processuais...). O art. 190 está inserido no livro do Código dedicado aos "atos processuais" - e nele se prevê que a convenção de natureza processual pode celebrar-se "antes ou durante" o processo. Assim, a clara posição tomada pelo CPC no sentido de afirmar a natureza processual dessas convenções, independentemente de serem celebradas no processo. Sempre existiram negócios jurídicos processuais em nosso ordenamento. Mas antes eles eram típicos. Constituíam numerus clausus: hipóteses taxativas, sempre a depender de uma específica previsão legal [...]. Mas o artigo 190 veicula uma cláusula geral autorizadora dos negócios jurídicos processuais. Permitem-se negócios processuais atípicos. [...] Assim, atribui-se ampla liberdade às partes para, de comum acordo, modularem o processo judicial ajustando-o as suas necessidades e expectativas concretas.

A inspiração para a criação de cláusula geral no código brasileiro de processo civil, que prevê a possibilidade da existência de negócios jurídicos processuais atípicos, foi a arbitragem, tendo em vista o raciocínio de que, já que as partes podem até mesmo retirar a demanda do judiciário e levá-la a juiz privado em um processo delineado pelas suas vontades, porque o Estado também não possa permitir que em sua jurisdição as partes delineiem seus procedimentos, conferindo uma maior autonomia à vontade delas?! Por isso que, o artigo 190 e 191 do referido diploma processual17 ofereceram tanta liberdade às partes envolvidas no litígio:

Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.

Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.

Art. 191. De comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática dos atos processuais, quando for o caso.

§ 1o O calendário vincula as partes e o juiz, e os prazos nele previstos somente serão modificados em casos excepcionais, devidamente justificados.

§ 2o Dispensa-se a intimação das partes para a prática de ato processual ou a realização de audiência cujas datas tiverem sido designadas no calendário.

Dessa maneira, pelo caput do artigo 190, percebe-se que em se tratando de direitos disponíveis à autocomposição (ou seja, cabendo a utilização de qualquer meio equivalente de gestão de conflito para aquele problema) e, sendo as partes capazes para tal ato, podem as partes negociar acerca do procedimento processual, tanto no decorrer da ação, quanto em instrumentos jurídicos pré-processuais. Tal situação demonstra um grande avanço na visão processual, na qual o processo deixa de pertencer ao juiz, passando a ser o processo das partes, como expõem Pereira Neto e Tejeiro18:

De acordo com o próprio artigo 190 do Código de Processo Civil existem também os negócios jurídicos processuais e os negócios jurídicos pré-processuais, onde nos dois casos as partes tem que ser capazes e transigirem sobre matérias que admitem autocomposição, sendo que nos negócios jurídicos processuais as partes realizam o negócio durante o decorrer a da ação e no negócio jurídico pré-processual os negócios, acordos, são realizados antes da propositura da ação, como eleição de foro, fases processuais, entre outros. Notamos que o negócio jurídico processual traz o mesmo pensamento existe no Novo Código de Processo Civil, ou seja, de que o processo, dentro do que for disponível, pertence a parte, tirando assim toda aquela antiga teoria que o processo pertence ao Estado juiz, notando então uma mudança de paradigma processual.

Essa efetivação da visão de que o processo não pertence ao Estado (representado na figura do juiz), mas às partes, fica claramente demonstrada no parágrafo único do artigo 190, que dispõe as situações que necessitam de homologação judicial para que os negócios jurídicos processuais tenham validade jurídica, assunto este que se torna importante quando se faz uma leitura conjunta desse dispositivo juntamente com o artigo 200 do referido diploma processual. Por isso, cabe agora um estudo mais aprofundado sobre tal temática.

C. A (des) necessidade de homologação judicial

O artigo 200 do código brasileiro de processo civil19 dispõe:

Art. 200. Os atos das partes consistentes em declarações unilaterais ou bilaterais de vontade produzem imediatamente a constituição, modificação ou extinção de direitos processuais.

Parágrafo único. A desistência da ação só produzirá efeitos após homologação judicial.

Assim, a questão da necessidade ou não de homologação judicial é uma dúvida que surge ao se fazer uma leitura associada do artigo 190 com o dispositivo exposto, pois por meio dele se percebe que os negócios jurídicos possuem validade imediatamente após a pactuação das partes do que, logicamente, presume-se que não seria necessária a homologação judicial para sua validade.

Por outro lado, o parágrafo 1° do artigo 190[20] dispõe: "De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade", dando a entender que todo negócio jurídico processual passaria por uma prévia analise do juiz para então ter ou não validade, causando uma dúvida de até que ponto seria necessária ou não a homologação do juiz para que estes tivessem validade.

Porém, essa dúvida é sanada pelo enunciado n° 133 do FPPC21 que explica: "Salvo nos casos expressamente previstos em lei, os negócios processuais do art. 190 não dependem de homologação judicial", ou seja, de maneira geral não é necessária a homologação judicial para que o negócio jurídico processual tenha validade, entretanto, existem exceções, como expõe Talamini22:

Em regra, a eficácia do negócio jurídico processual independe de prévia homologação ou chancela judicial. Ele produz seus efeitos desde logo (art. 200, CPC/15). Há exceções. O parágrafo único do próprio art. 200 estabelece uma: a desistência da ação. Em outros casos, o ajuste almejado pelas partes interferirá em termos práticos de modo muito direto sobre a esfera de atuação do juiz - sendo, então, imprescindível que ele intervenha na própria celebração do ato, confirmando sua viabilidade prática. Ou seja, são casos que envolvem uma programação de condutas para o próprio juiz - e que só terão como vinculá-lo se ele for previamente consultado e aferir a factibilidade daquilo que se pretende. É o que se passa na convenção sobre calendário processual (CPC/15, art. 191 - v. adiante). Nesse caso, não há exagero em se afirmar que o órgão judicial é partícipe da avença, ficando a ela vinculado. Isso não é de todo uma novidade: a alienação executiva (em hasta pública ou alienação por iniciativa privada) certamente não tem natureza jurídica de simples compra e venda. Constitui ato público, de natureza executiva. Mas é também um negócio jurídico (com efeitos materiais e processuais) - de que participa não o executado (até então titular do bem expropriado), mas o Estado-Jurisdição. De qualquer modo, a regra geral é a dispensa de intervenção ou homologação prévia pelo juiz.

Resumidamente, então, este questionamento pode ser assim respondido: após as partes pactuarem um negócio jurídico processual, o juiz irá apenas analisar se há alguma nulidade, abusividade ou situação de vulnerabilidade de uma das partes e, se não houver, não se faz necessária a homologação judicial, começando o negócio jurídico a ter validade imediatamente, preocupando-se o juiz apenas com as consequências, por exemplo, temporais, daquela avença. Por outro lado, caso o negócio jurídico verse sobre a desistência da ação ou alguma das situações excecionais acima citadas é que se fará necessária a homologação judicial.

II. Autonomia privada no direito de família

Sabe-se que a família é a célula-base de toda sociedade. É em seu seio que os seres humanos se desenvolvem e suas personalidades nos primeiros anos de vida são amoldadas. É nela que se aprende o valor social da cultura na qual o homem está envolvido e este se torna um ser social, pois como explica Laraia23 "o homem é o resultado do meio cultural em que foi socializado. Ele é herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a experiência adquirida pelas numerosas gerações que o antecederam".

Diante de tamanha importância, a família é um núcleo extremamente protegido pelo Estado, tendo em vista que uma mudança de conceito significativa nela traz mudanças que reverberam por toda a restante estrutura social vigente. Ou seja, o significado de família é um conceito que altera toda a organização coletiva existente e essa percepção do que seja família é um conceito que já se modificou diversas vezes durante a história da humanidade.

No princípio, como sabido, a sociedade possuía uma estrutura matriarcal e sem traços de monogamia: as mulheres eram o centro da comunidade e ficavam nas "aldeias", cuidando das proles, enquanto os homens saiam para caçar e, por motivos desconhecidos, esse cenário se modificou até se transformar em uma estrutura patriarcal, na qual a figura masculina era a principal na comunidade.

Instituiu-se o casamento e, com o nascimento do Cristianismo na Europa, houve uma oficialização da monogamia, tendo essa visão familiar se espalhado por todo o ocidente através das colonizações europeias. O conceito de família foi "aprimorado" nesse sentido de definir que família era a união entre um homem e uma mulher através do casamento com o intuito de ter filhos.

Esse panorama foi vivido por muitos séculos até que, com a revolução industrial e a necessidade da entrada da mulher no mercado de trabalho (por esta se configurar uma mão de obra qualificada e mais barata do que a masculina), deu-se início a um longo processo histórico de igualdade entre os sexos.

Vale salientar que esse processo de tratamento igualitário entre homens e mulheres, em que ambos têm direitos e deveres iguais, ainda não está totalmente finalizado, mas é inegável o grande avanço que já ocorreu nesse sentido. E, o fato é que empoderamento de gênero, o respeito as diferenças e a proteção à liberdade individual, em conjunto com a onda de democratização do país através da promulgação da Constituição Federal de 1988, fizeram com que no Brasil se possibilitasse uma modificação do núcleo familiar, conceito este que mais uma vez está em processo de remodelamento, remodelamento este que está intrinsecamente ligado a autonomia privada.

Pelo exposto, percebe-se a necessidade de um estudo um pouco mais aprofundado nesse tópico sobre esse remodelamento: as características atuais do direito das famílias, como essas características se interligam com o significado de autonomia privada e quais os efeitos disso; para que, no tópico de número quatro, compreenda-se melhor sua disposição nos procedimentos especiais do novo código brasileiro de processo civil e possa se enxergar sua ligação com os negócios jurídicos processuais.

A. Características primordiais do direito das famílias

O direito das famílias, por se tratar de uma matéria que rege o núcleo familiar, que, como já dito anteriormente, é repleto de peculiaridades, é uma parte muito específica do código civil, cheia de singularidades e princípios próprios. Nele, o legislador teve a preocupação de trabalhar com dispositivos que protegessem sua constituição, sua função social e os afetos ali envolvidos, com base na nova visão do que seja família nessa pós modernidade na qual o mundo está inserido, por isso, faz-se importante desvendar neste ponto do trabalho o seu conceito, sua função, bem como a do direito de família, suas características e princípios.

Por falar na nova visão, cabe a aclarar inicialmente. Atualmente, a família é concebida como a união entre pessoas ligadas pelo vínculo afetivo com o intuito de viverem juntas. É um conceito propositadamente aberto por incluir os mais diversos tipos de agrupamentos familiares, sejam eles uma família tradicional, matrimonial, monoparental, mosaico, união estável, homoafetiva, enfim.

A sua função também deve ser explicitada preliminarmente. A família existe em razão de seus componentes e com a função de promover a dignidade da pessoa humana e a felicidade para todos, como explica Farias e Rosenvald24:

Avulta afirmar, como conclusão lógica e inarredável, que a família cumpre modernamente um papel funcionalizado, devendo, efetivamente, servir como ambiente propício para a promoção da dignidade e a realização da personalidade de seus membros, integrando sentimentos, esperanças e valores, servindo como alicerce fundamental para o alcance da felicidade. [...] Por tudo isso, a família é o lugar adequado em que o ser humano nasce inserido e, merecendo uma especial proteção do Estado, desenvolve a sua personalidade em busca da felicidade e da realização pessoal.

Por esse conceito aberto é que, segundo Farias e Rosenvald 25, concebe-se o direito das famílias como "um conjunto de normas-princípios e normas-regras jurídicas que regulamentam as relações decorrentes do vínculo afetivo, mesmo sem casamento, tendentes à promoção da personalidade humana, através de efeitos pessoais, patrimoniais e assistenciais".

Sobre esses efeitos pessoais é que consiste um dos principais diferenciais desse ramo especializado do direito, pois nele se tratam dos interesses mais particulares de todas as relações que podem existir no âmbito do direito privado, pois "possuem as relações familiares um caráter acentuadamente privado, destinando-se à tutela do ser, em seus múltiplos interesses morais e materiais"26.

Para que tantas particularidades sejam garantidas, esse ramo do direito privado possui princípios específicos em um rol não taxativo, quais sejam: a pluralidade das entidades familiares; igualdade entre homem e mulher e entre os filhos; planejamento familiar e responsabilidade parental; solidariedade familiar; melhor interesse da criança; função social da família; afetividade; não intervencionismo estatal (ou da liberdade); dentre outros.

B. A autonomia privada como expressão fundamental da família

É sobre esse último princípio citado no tópico acima, (o do não intervencionismo ou da liberdade, como alguns doutrinadores preferem chamar), que recai a importância da autonomia privada familiar, mas antes de ver a sua interligação, cabe conceituar autonomia privada, que, segundo Couto27 consiste em:

Por sua vez, autonomia privada é o direito fundamental que garante ao particular o exercício de sua vontade. É o princípio de direito privado pelo qual o sujeito tem a faculdade de "praticar um ato jurídico, determinando-lhe o conteúdo, a forma e os efeitos". Para a teoria geral do direito a autonomia privada é um dos princípios fundamentais do direito privado, pois consiste na liberdade da prática do poder que as pessoas naturais e jurídicas têm de gerar normas jurídicas individualizadas, as quais vinculam os participantes de uma dada relação ou negócio.

Trazendo tal princípio para o direito das famílias, percebe-se que seu significado consiste em conferir liberdade ao indivíduo para que o grupo familiar possa se reger pelas suas próprias escolhas, garantindo a função social da família, qual seja, promover o desenvolvimento da personalidade de seus membros e conferir-lhes felicidade e afeto, sendo tal significado, portanto, a existência desse núcleo social.

Vale salientar que ele também significa que a intervenção estatal na família deve ser mínima. O Estado não pode invadir a esfera privada ao menos em situações que demandem proteção a esse núcleo, nos moldes do artigo 226 da Constituição Federal:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 1° O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2° O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3° Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4° Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5° Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6° O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 66, de 2010.)

§ 7° Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8° O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

Assim, resumidamente, como diz o próprio caput do artigo supracitado, a família é a base da sociedade e o estado tem o dever de protegê-la, proteger seus interesses, garantir a liberdade individual de seus membros e permitir a autonomia privada como uma máxima expressão do próprio significado de família.

III. Os negócios jurídicos processuais nas ações de família

Devido a tamanha importância da família tratada no tópico anterior, o legislador, no novo código brasileiro de processo civil de 2015, instituiu que as ações de direito de família possuiriam um procedimento especial no código, ou seja, possuiriam um procedimento diferenciado do procedimento ordinário tradicional das ações cíveis.

Nesse cenário cabem os questionamentos: seguindo as ações de família um procedimento especial previamente determinado pelo código, caberia o uso de negócios jurídicos processuais nelas? Seria o direito de família, e sua série de disposições de caráter pessoais, personalíssimas e intransponíveis, compatíveis com o instituto dos negócios jurídicos processuais? Feita já uma base acerca dos negócios jurídicos processuais, direito das famílias e da autonomia da vontade com a expressão máxima da família, cabe agora responder a tais questionamentos.

A. A compatibilidade do direito de família com o instituto dos negócios jurídicos processuais

Respondendo inicialmente ao segundo questionamento, o da compatibilidade das disposições de caráter pessoais, personalíssimas e intransponíveis compatíveis com o instituto dos negócios jurídicos processuais, ao que parece, a resposta consistiria na característica que tanto os negócios jurídicos processuais quanto o direito da família possuem em comum: o privilégio e respeito à autonomia privada.

Por tudo já abordado neste trabalho, aduz-se que a autonomia privada seja a "chave" que permite aos negócios jurídicos serem utilizados em situações familiares, tendo em vista que os negócios jurídicos processuais conferem justamente autonomia às partes que utilizam e, por isso, cabe sim a utilização desses, até porque ninguém melhor do que as próprias partes (ou melhor, os próprios familiares) para saberem qual o procedimento processual que eles querem seguir.

Parece difícil imaginar que os familiares queiram pactuar um procedimento com regras próprias para eles, e talvez essa dificuldade se dê em relação ao direito de família por ele se tratar de relações continuadas e afetivas, ao passo que em outras áreas do direito civil isto não ocorra. Porém, isto é algo que pode ser pactuado sim pré-processualmente. Mas, e processualmente, caberia também?

B. Os limites do uso dos negócios jurídicos processuais nas ações de família

Quanto ao primeiro questionamento, o novo diploma processual trouxe para as ações de família um procedimento processual especial. Esse procedimento diz respeito a obrigatoriedade da primeira audiência nesse tipo de ação ser uma audiência de mediação e, no fato de que a qualquer tempo do processo, serão empreendidos esforços para que ocorra uma solução consensual do conflito, conforme os artigos 694 à 696[28]:

Art. 694. Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação.

Parágrafo único. A requerimento das partes, o juiz pode determinar a suspensão do processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar.

Art. 695. Recebida a petição inicial e, se for o caso, tomadas as providências referentes à tutela provisória, o juiz ordenará a citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação, observado o disposto no art. 694.

§ 1o O mandado de citação conterá apenas os dados necessários à audiência e deverá estar desacompanhado de cópia da petição inicial, assegurado ao réu o direito de examinar seu conteúdo a qualquer tempo.

§ 2o A citação ocorrerá com antecedência mínima de 15 (quinze) dias da data designada para a audiência.

§ 3o A citação será feita na pessoa do réu.

§ 4o Na audiência, as partes deverão estar acompanhadas de seus advogados ou de defensores públicos.

Art. 696. A audiência de mediação e conciliação poderá dividir-se em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual, sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o perecimento do direito.

Entretanto, não solucionado o litígio através dos meios equivalente, proceder-se-á com o trâmite do procedimento comum, conforme aduz o artigo 697 do mesmo diploma29: "Não realizado o acordo, passarão a incidir, a partir de então, as normas do procedimento comum, observado o art. 335", por isso, pela lógica, a pergunta se caberia o uso de negócios jurídicos processuais nas ações de família, na parte de procedimento comum do processo, a resposta seria sim, pois não haveria nenhum óbice dessa utilização.

Quanto à parte inicial disciplinada pelo procedimento especial, também compreende-se que caberia o uso de negócios jurídicos processuais, tendo em vista o mesmo raciocínio da compatibilidade dos negócios jurídicos com o direito de família e pela a possibilidade de se fazer uso dos negócios jurídicos sempre que ao litígio puder ser aplicado um meio equivalente, como é no caso em que se aplicaria a mediação.

Considerações finais

Em resumo, neste trabalho se mostrou que, embora os negócios jurídicos processuais tenham suas origens na época do Império Romano, eles constituem uma novidade no novo código brasileiro de processo civil no atual modelo trabalhado, sendo possibilitado pelo diploma de forma típica e atípica e fortalecendo a capacidade de escolha da autonomia das partes processuais para pactuarem, como querem, determinadas regras do seu procedimento.

Da mesma maneira, também inspirado na autonomia privada, tem-se o discipli-namento do direito de família atual, que busca conferir aos indivíduos a liberdade para que sejam e vivam conforme sua felicidade. É nesse cenário que se verifica e se defende a utilização dos negócios jurídicos processuais e sua aplicação ao direito de família e as ações de família.

Ademais, vale salientar que, por sua natureza, cabe a utilização dos negócios jurídicos processuais nas mesmas situações que cabe a utilização dos meios equivalentes, como é o caso da mediação no direito das famílias. Assim, conclui-se que não apenas cabe a utilização dos negócios jurídicos processuais em ações do direito de família, como esse instituto é capaz de ser um instrumento de promoção da autonomia privada nas famílias.

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* Todas las referencias a la ley se refieren al sistema legal brasileño.

1 NOGUEIRA, P. H., Os negócios jurídicos processuais, Salvador, Jus Podivm, 2017, 138.

2Ibid.

3Ibid., 139.

4Ibid., 123.

5BRAGA, P. S., "Primeiras reflexões sobre uma teoria do fato jurídico processual: plano de existência", Revista de Processo, 2007, 296.

6Ibid., 299.

7Ibid.

8Ibid., 302.

9Ibid., 303.

10Ibid.

11Ibid.

12VENDRAMINI, B., O Negócio jurídico processual no novo código de processo civil, [en línea], disponível em: https://brunovendra.jusbrasil.com.br/artigos/315807487/o-negocio-juridico-processual-no--novo-codigo-de-processo-civil, 1 [consultado o 4 de dezembro de 2017].

13BRAGA, "Primeiras reflexões sobre uma teoria do fato jurídico processual", cit., 306.

14"Lei n.° 13105, de 16 de março de 2015", [em linha], Código de Processo Civil, Brasília, disponível em: http://novo.more.ufsc.br/legislacao/inserir_legislacao [Consultado o 11 de dezembro de 2017].

15TALAMINI, E., Um processo pra chamar de seu: nota sobre os negócios jurídicos processuais, [em linha], disponível em: http://www.migalhas.com.br/depeso/16,mi228734,61044-um+processo+pra+chamar+de+seu+nota+sobre+os+negocios+juridicos, 2 [consultado o 11 de dezembro de 2017].

16TALAMINI, Um processo pra chamar de seu, cit., 2.

17"Lei n.° 13105, de 16 de março de 2015", cit.

18PEREIRA NETO, J. A. DE Q. E TEIJEIRO, D. R. DA C., Negócio jurídico processual como meio de solução de conflito, [em linha], disponível em: https://www.conpedi.org.br/publicacoes/roj0xn13/tz0g06z1/axgjkmpve6p2l45d.pdf, 259 [consultado o 11 de dezembro de 2017].

19"Lei n° 13105, de 16 de março de 2015", cit.

20Ibid.

21São Paulo, Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis, [em linha], disponível em: http://portalprocessual.com/wp-content/uploads/2016/05/Carta-de-S%C3%A3o-Paulo.pdf [Consultado o 9 de dezembro de 2017].

22TALAMINI, Um processo pra chamar de seu, cit., 8.

23LARAIA, R. DE B., Cultura: um conceito antropológico, Rio de Janeiro, Zahar, 1986, 45.

24FARIAS, C. C. DE e ROSENVALD, N., Direito das famílias, 5.a ed., Bahia, JusPodivm, 2013, 48.

25Ibid., 50.

26Ibid., 52.

27COUTO, L. O., "O direito fundamental da autonomia privada no direito de família", [em linha], âmbito jurídico, vol. XII, n.° 64, 2009, disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6119, 1 [consultado o 10 de dezembro de 2017].

28"Lei n.° 13105, de 16 de março de 2015", cit.

29Ibid.

Para citar el artículo: CARVALHO, A. R N. DE y CARMO, G. M, "Os limites dos negócios jurídicos processuais nas ações de família no direito brasileiro", Revista de Derecho Privado, Universidad Externado de Colombia, n.° 36, enero-junio 2019, pp. 301-318, DOE https://doi.org/10.18601/01234366.n36.11.

Recebido: 23 de Fevereiro de 2018; Aceito: 12 de Novembro de 2018

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