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Estudios Gerenciales

versão impressa ISSN 0123-5923

estud.gerenc. vol.36 no.156 Cali jul./set. 2020

https://doi.org/10.18046/j.estger.2020.156.3894 

Artigo de pesquisa

Proposição de um modelo integrativo de justiça para o sistema agregado de marketing turístico

Propuesta de un modelo integrativo de justicia para el sistema agregado de marketing turístico

Proposal of an integrative justice model for the aggregate tourism marketing system

Fabiana Gama de Medeiros* 

Francisco José da Costa** 

* Autor para dirigir correspondência. Professora, Departamento de Administração, Universidade Federal da Paraíba - UFPB, João Pessoa, Brasil. fabiana@ccsa.ufpb.br .

** Professor, Departamento de Administração, Universidade Federal da Paraíba - UFPB, João Pessoa, Brasil. franze.mq@gmail.com


Resumo

Este artigo se propôs a delinear a construção de um Modelo Integrativo de Justiça (MIJ) para o Sistema Agregado de Marketing Turístico (SAMTur). Partimos da necessidade de fixar princípios de justiça que fossem adequados à promoção de um funcionamento justo e equilibrado dentro do sistema. Inicialmente, realizamos uma construção teórica discutindo as teorias de justiça e do stakeholder como bases para a promoção de um sistema de marketing justo; em seguida, analisamos elementos conceituais acerca da atividade turística e da constituição do SAMTur, e empreendemos um estudo empírico na região turística do Brejo Paraibano, Paraíba, Brasil. Como resultado, trazemos a perspectiva do sistema agregado de marketing para a atividade turística e realizamos a proposição do MIJ aplicável ao SAMTur.

Palavras-chave: macromarketing; sistema agregado de marketing turístico; modelo integrativo de justiça

Resumen

En este artículo se propuso delinear la construcción de un modelo integrativo de justicia para el sistema agregado de marketing turístico, a partir de la necesidad de establecer principios adecuados, con el fin de promover su funcionamiento justo y equilibrado. Se llevó a cabo una construcción teórica sobre las teorías de la justicia y del stakeholder como bases de un sistema de comercialización justo. Luego se analizaron elementos conceptuales sobre la actividad turística y la constitución del sistema; además, se realizó un estudio empírico en la región turística de Brejo Paraibano, Paraíba, Brasil. Con base en el resultado, se expone la perspectiva de un sistema de marketing agregado para la actividad turística y se lleva a cabo la propuesta del modelo integrativo de justicia aplicable al sistema agregado de marketing turístico.

Palabras clave: macromarketing; sistema agregado de marketing turístico; modelo integrativo de justicia

Abstract

In this paper, it was proposed to outline the construction of an integrative justice model for the aggregate tourism marketing system, from the need to establish adequate principles of justice, in order to promote its fair and balanced functioning. A theoretical construction on the theories of justice and stakeholder was carried out, as bases of a fair marketing system. Then, conceptual elements about the tourist activity and the constitution of the system were analyzed; furthermore, an empirical study in the tourist region of Brejo Paraibano, Paraíba, Brazil was carried out. Based on the result, the perspective of an aggregate marketing system for the tourist activity is presented, and the proposal of an integrative justice model applicable to the aggregate tourism marketing system is carried out.

Keywords: macromarketing; aggregate tourism marketing system; integrative justice model

1. Introdução

Pesquisas recentes têm consolidado o entendimento de que o turismo é uma atividade propulsora de crescimento econômico e de incremento no bem-estar social (Oviedo- Garcia, Castellanos-Verdugo e Martin-Ruiz, 2008; Mai, Rahtz e Shultz II, 2013; Silva, Xavier e Lins, 2013, Luo e Bao, 2019; Lee e Jan, 2019). Por outro lado, Mai, Rahtz e Shultz II (2013) argumentam que o turismo pode ampliar as desvantagens sociais e econômicas para a população receptora da atividade turística, principalmente em países em desenvolvimento.

De fato, é fácil pensar em exemplos no Brasil em que a atividade turística beneficia um grupo específico de agentes, por um lado, e, por outro, a população local é potencialmente excluída ou se encontra às margens dos seus benefícios (Ferreira, 2006; Soares, Galeno e Ros, 2014; Ribeiro e Amaral, 2015; Zanatto, Steinke e Vieira, 2019; Silva, Locks e Melo, 2020). Encontramos, assim, uma série de situações de desequilíbrio e de distribuição injusta dos benefícios da atividade turística dentre os diversos agentes envolvidos na atividade turística, assim como a geração de impactos negativos, principalmente em termos sociais e ambientais para o lugar.

Nesse sentido, é que entendemos fazer-se pertinente discutir o conceito de ética em macromarketing no contexto do turismo, a partir de uma perspectiva sistêmica, com vistas à promoção do equilíbrio de sistemas dessa natureza baseada em dois pilares centrais: a teoria do stakeholder e a teoria da justiça distributiva (Ferrell e Ferrell, 2008). Inicialmente, acreditamos que uma visão de sistemas de troca, com uma perspectiva de geração de equilíbrio desses sistemas, torna-se uma lente essencial para que a atividade turística de um destino possa ser analisada dentro de uma perspectiva mais completa. Além disso, partindo da visão de ética em macromarketing, também argumentamos que esses sistemas de trocas precisam ser justos para todos os stakeholders que os compõem.

Destarte, nesse artigo assumimos o desafio de construção de uma visão de ética em macromarketing para pensar em sistemas agregados de marketing turístico, visão esta que permita visualizar ações e projetos equilibrados desses sistemas. Argumentamos, portanto, que o sistema agregado de marketing turístico (Medeiros e Costa, 2019) (que passaremos a identificar ao longo do artigo por SAMTur) é potencialmente desequilibrado e pode alcançar melhores condições de equilíbrio a partir de uma melhor visão estrutural, que pode ser providenciada por uma ‘lente’ de macromarketing.

Vale salientar que a abordagem teórica para a temática escolhida nessa pesquisa segue a tradição da configuração de estudos sobre ética em macromarketing. Utilizamos como principal referência de construção de framework, conforme já exposto, o trabalho de Ferrell e Ferrell (2008), isto é, tomamos um sistema agregado de marketing como unidade de análise (no nosso caso, o de turismo) para entendê-lo, observar situações de desequilíbrio (à luz de teorias de justiça e stakeholders, pela visão de Ferrell e Ferrell), para em seguida propor princípios de funcionamento do sistema com vistas a torná-lo mais equilibrado.

O objetivo central desse artigo, portanto, trata da construção de um modelo integrativo de justiça para sistemas de marketing turístico. Para alcançar esse objetivo, configuramos a estrutura do artigo da seguinte forma: inicialmente, discutimos o equilíbrio em sistemas de marketing de maneira geral, tomando por base as teorias de justiça e do stakeholder, conforme recortes teóricos do tópico 2. O alcance desse objetivo nos propiciou um melhor entendimento acerca da fixação de princípios de justiça (em nível teórico) para um funcionamento equilibrado de um sistema de marketing para todos os seus agentes envolvidos.

Na sequência, buscamos entender melhor as características específicas da atividade turística no sentido de subsidiar posteriormente a construção de princípios de justiça adaptáveis a sistemas agregados de marketing dessa natureza, conforme fizemos no tópico 3. Ainda nesse tópico, caracterizamos (teoricamente) os elementos do Sistema Agregado de Marketing Turístico (SAMTur). O atendimento desse objetivo nos auxiliou durante o processo das primeiras incursões em campo (detalhadas no tópico 4) e, posteriormente, em conjunto com a parte empírica, auxiliou na delineação final do modelo integrativo de justiça para sistemas de marketing turísticos, conforme apresentamos no tópico 5. As considerações finais foram apresentadas no tópico 6.

2. Ética em macromarketing e equilíbrio de sistemas

A definição clássica de um sistema agregado de marketing vem do trabalho de Layton (2007, 2008), para quem um sistema de marketing trata-se de uma rede de indivíduos, grupos e/ou entidades, inseridos em um contexto social, interligados direta ou indiretamente a partir da participação compartilhada em uma troca econômica. Tal troca, de maneira conjunta ou coletiva, gera valor econômico com e para os consumidores, através da oferta de produtos, serviços, experiências e ideias, e surge em resposta ou antecipação à demanda dos consumidores. O que determina a essência de um sistema de marketing, para Layton (2011), são os atos de troca econômica voluntária, ou seja, a troca de um ou de múltiplos bens, serviços, experiências e/ou ideias, que se configuram como sendo o conceito central de um sistema de marketing.

Nessa perspectiva, a disciplina de macromarketing define como objeto de sua análise as trocas ocorridas dentro desses sistemas, observando os impactos e as consequências dessas trocas na sociedade e da sociedade nos sistemas de marketing. Sendo o sistema agregado de marketing o elemento central de macromarketing (Layton, 2007), podemos dizer que a promoção do equilíbrio de um sistema de marketing é objeto central das pesquisas sobre ética em macromarketing (Ferrell e Ferrell, 2008).

Diferentes sociedades e culturas muitas vezes apre-sentaram diferenças em relação ao que pode ser considera-do uma conduta justa ou injusta, e sobre quais atribuições de responsabilidade social devem ser reconhecidas como justas em vez de injustas (Bird, 2011). Para Bird (2011), dadas as profundas discordâncias sobre como a justiça e a injustiça devem ser reconhecidas, não podemos pressupor que temos a capacidade de apontar alguma concepção de justiça já estabelecida para responder questões sobre como a responsabilidade econômica (por exemplo) deve ser dividida. O problema, então, está relacionado à escolha de um princípio de justiça adequado, dentre as diferentes formas, aparentemente todas legítimas de distribuição: a todos partes iguais, conforme as necessidades de cada indivíduo, os direitos de cada um, o esforço de cada um, a contribuição na sociedade ou, ainda, conforme o mérito (Klein, 2008).

Temos conceitos de justiça associados ao conceito de equidade (fairness), de acordo com Rawls (2008), que define justiça como o princípio moral que determina a conduta justa e afirma que há a necessidade de um conjunto de princípios para escolher entre os diversos modos de organização social que definem essa divisão de vantagens e para selar um acordo acerca das parcelas distributivas apropriadas. A justiça distributiva aplicada ao marketing trata de como o sistema de marketing, em termos de sua estrutura, políticas, ou práticas, distribui de maneira justa os benefícios e malefícios dentre os diversos agentes que são afetados pelos processos de troca (Laczniak e Murphy, 2008).

Laczniak e Murphy (2008) argumentam ainda que a justiça distributiva se aplica ao estudo de macromarketing na medida em que, geralmente, os sistemas de marketing levam a resultados injustos para determinados agentes do sistema. Além disso, em um trabalho prévio, Laczniak e Murphy (2006) argumantam que a justiça distributiva é uma premissa ética fundamental a ser considerada ao avaliar a dimensão social das práticas de marketing.

Na pesquisa em turismo, inicialmente a justiça aparecia principalmente com a preocupação acerca do meio ambiente. Camargo, Lane e Jamal (2007) argumentam que, apesar de a área de turismo sustentável se preocupar com a conservação do meio ambiente e o bem-estar socioeconômico, ela não lida diretamente com questões e desafios relacionados à distribuição justa de custos e benefícios do desenvolvimento turístico dentre os diferentes stakeholders.

Nesse sentido, Camargo, Lane e Jamal (2007) demonstram que a justiça ambiental (environmental justice) é uma perspectiva capaz de delinear princípios que servem como guias em aspectos relacionados à atividade turística, que, no entanto, recebem pouca atenção dentro do discurso de turismo sustentável. No entanto, mais recentemente, vemos um movimento de pesquisas que trazem uma ampliação das perspectivas de justiça para os estudos em turismo (Higgins- Desbiolles, 2018, Dorjsuren e Palmer, 2018, Canfield, 2019).

Uma alternativa que vai no caminho de auxiliar no alcance desses desafios consiste na adoção de um critério baseado na teoria do stakeholder, enfocando os stakeholders envolvidos na ação de troca de um sistema agregado de marketing. Assim, a justiça distributiva pode encontrar na teoria do stakeholder um parâmetro que auxilie a atingir a meta de justiça de um sistema equilibrado de marketing, já que propõe uma clara delimitação dos sujeitos envolvidos no sistema. Destarte, Ferrell e Ferrell (2008) argumentam que a justiça distributiva leva em consideração a equidade dos processos e das saídas, de acordo com um princípio ou uma filosofia normativa para avaliação das políticas de macromarketing. Nesse sentido, os stakeholders são considerados a unidade de análise principal ao avaliar as consequências das decisões normativas éticas no marketing (Ferrell e Ferrell, 2008).

Getz e Timur (2012) afirmam que, no desenvolvimento de estratégias e políticas para o turismo, está claro que as autoridades e organizações responsáveis pela atividade turística de um lugar devem levar em conta os interesses de vários stakeholders, como indústria, residentes, grupos de interesses especiais que representam o meio ambiente e a comunidade, e os turistas. Cada um desses stakeholders tem uma série de interesses e expectativas específicos relacionados ao desempenho de um destino e os seus objetivos de sustentabilidade. Essas diferentes expectativas podem causar conflitos entre os stakeholders, que podem ser extremamente prejudiciais para o destino turístico. Assim, Getz e Timur (2012) argumentam que um processo de gestão desses stakeholders é necessário de forma a reduzir ou resolver os conflitos, com o objetivo final de alcançar uma perspectiva de equilíbrio entre as diferentes ‘vozes’.

Sob o direcionamento de delinear um modelo normativo de justiça para guiar eticamente as ações de um sistema agregado de marketing, encontramos uma perspectiva prescritiva de geração de equilíbrio de um sistema de marketing, proposta por Santos e Laczniak (2009), chamada Modelo Integrativo de Justiça (MIJ). O Modelo Integrativo de Justiça desenvolvido por Santos e Laczniak (2009) foca em um grupo de stakeholders vulnerável (em relação a grandes corporações que adentram em mercados de baixa renda): os consumidores de baixa renda. Além disso, busca demonstrar como manter relações de troca de maneira ética com consumidores na base da pirâmide econômica, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento. Em sua concepção original, é um modelo normativo para guiar eticamente as ações de marketing voltadas para os consumidores de baixa renda (Santos e Laczniak, 2009).

A partir do objetivo de desenvolver uma abordagem mais equitativa para as atividades de marketing, Santos e Lacziniak (2009) têm o intuito de que a concepção central dos elementos do MIJ ofereça um delineamento acerca do que constitui a justiça econômica dentro de uma situação de mercado. Nesse sentido, o MIJ busca atender ao conceito central de justiça distributiva na medida em que busca avaliar se os benefícios e os custos das transações de mercado estão sendo alocados de maneira justa.

Apesar de ser mais diretamente relacionado a questões envolvendo consumidores de baixa renda, os autores afirmam que o MIJ pode ser aplicado a outros grupos de consumidores vulneráveis ou em desvantagem, como pessoas com deficiência, idosos, desabrigados e crianças. Assim, já que o modelo busca encontrar quais dimensões constituem um mercado (marketplace) justo, a sua utilização em outras categorias de consumidores vulneráveis e em desvantagem pode também se mostrar bastante útil. Vale salientar também que o MIJ não se trata de uma junção das diferentes teorias de justiça, mas sim (em se tratando de marketing para mercados de baixa renda) tem seu foco na justiça distributiva para definir o que é justo nas transações de um mercado (Santos e Laczniak, 2009).

Dessa forma, os autores definem cinco características de situações de mercado justas que, no conjunto, formam a base do modelo (são as entradas): (1) compromisso autêntico com os consumidores com intento não exploratório; (2) cocriação de valor com os consumidores; (3) investimento em maneiras de consumo futuras que não ameacem o meio ambiente; (4) representação dos interesses de todos os stakeholders; e (5) foco na gestão do lucro de longo prazo ao invés de maximização de lucro em curto prazo.

Essas características devem servir para guiar as relações de troca entre a corporação e os mercados de baixa renda de maneira a alcançar a justiça. Os resultados para as organizações que aderem a essas características são o estabelecimento de relações de longo prazo, o empoderamento do consumidor, as iniciativas de negócios sustentáveis e a criação de um mercado mais justo. É possível perceber, assim, que o foco do MIJ consiste em auxiliar a tomada de decisão para guiar as relações entre empresa e consumidor em mercados de baixa renda. No entanto, o escopo do MIJ pode ir além dos tomadores de decisão, levando em conta as perspectivas de todos os stakeholders da organização (Santos e Laczniak, 2009).

Especificamente, ao refletirmos sobre a configuração da atividade turística, observamos a necessidade de utilizar um modelo cujo escopo vá além da atividade de uma única organização - dada a complexidade do sistema de marketing turístico. Nesse sentido, identificar as trocas que são realizadas dentro desse sistema pode auxiliar na determinação de quais stakeholders estão envolvidos e como eles podem ser afetados pela atividade.

Diante dessa breve contextualização, argumentamos pela necessidade de se definirem princípios de justiça (filosofia normativa) no sentido de buscar a geração de equilíbrio de sistemas de marketing, sob uma perspectiva de ética em macromarketing. Além disso, tal definição deve ser embasada de acordo com a realidade e o contexto do sistema de marketing estudado. O desafio está, portanto, em definir quais bens devem ser distribuídos, quem define essa distribuição, como se define e em qual quantidade; e em definir pelas necessidades de quem são responsáveis e qual deve ser o alcance dessa distribuição.

3. Sistema agregado de marketing turístico (SAMTur)

Podemos começar a pensar em um SAMTur a partir dos agentes envolvidos nas trocas que ocorrem na atividade turística (Medeiros e Costa, 2019). Inicialmente, temos um demandante, que é o turista, que se relaciona com os diversos ofertantes que envolvem o turismo, desde a sua origem até o destino, tanto em termos econômicos quanto não econômicos. As trocas econômicas efetuadas entre esses agentes envolvem as transações com operadoras e agências de turismo, sistemas de transportes, meios de hospedagem, serviços de alimentação/lazer, comerciantes, dentre outros serviços turísticos.

Concernente às trocas não econômicas (ou não diretamente econômicas), podemos considerar como agentes envolvidos os residentes do destino, os órgãos de governo (em diferentes esferas), as agências de fomento (Sistema S1, bancos públicos), os órgãos reguladores (ambientais, transporte, infraestrutura, saúde, segurança), sindicatos/ associações/ONGs, o meio ambiente (envolvendo a fauna e a flora), além do patrimônio histórico/cultural (tangível e intangível), dentre outros. Vale notar que muitos desses agentes envolvidos tanto nas trocas econômicas quanto não econômicas podem ser configurados e analisados em termos de subsistemas.

A mídia (em seus diversos formatos) se insere nas entradas na medida em que possui um papel significativo na construção do discurso, uma vez que a comunicação entre os diferentes atores do processo é decisiva para a construção das impressões (por parte dos residentes, comércio local, empresários) e a captura (ou rechaça) de demanda, através da veiculação de ações promocionais ou de notícias negativas em relação ao destino.

O funcionamento desse sistema acontece desde o momento em que o turista efetua a compra da sua viagem até a ocasião em que ele está no destino, interagindo com os diferentes agentes do sistema. Os ofertantes, por sua vez, vendem diferentes produtos e serviços para o turista, além de prepararem as atrações e os equipamentos turísticos para recebê-los. Os residentes fazem parte da oferta na medida em que são parte integrante do destino turístico e são afetados pelo fluxo de turistas em seu lugar de residência.

As agências de fomento e os governos buscam promover o lugar e criar uma infraestrutura urbana para receber o turismo. O meio ambiente e o patrimônio histórico/ cultural são fatores primordiais de atração de turistas a um lugar e, assim como os residentes, sofrem os impactos da atividade turística. Nesse processamento, o lugar de destino se prepara para receber o fluxo turístico, efetuando o planejamento e o desenvolvimento urbano, preparando os sistemas de transporte, promovendo meios de participação da comunidade local e ofertando itens de lazer e visitação.

As saídas esperadas (eficiência do sistema) do SAMTur estão relacionadas às divisas geradas para os agentes privados e públicos, à diversificação de investimentos, à preservação do meio ambiente e do patrimônio históricocultural, à qualidade de vida dos residentes e ao desenvolvimento local (econômico e social). Vale ressaltar que, fora do sistema, encontramos o contexto no qual o sistema está inserido - aqui observamos aspectos relacionados às contingências da região onde a atividade turística está inserida, além de levar em consideração a influência e a relação com outros sistemas que afetam o funcionamento dos sistemas de marketing turístico (para citar alguns, sistema de saúde, saneamento básico, segurança pública, educação etc.).

Em nível macro, o desenvolvimento local de uma região turística deve ser a principal saída desejada pelos gestores de um destino turístico. Diante desses aspectos, ficamos com a reflexão sobre como o SAMTur pode funcionar de maneira a gerar essas saídas esperadas de maneira que beneficie todos os envolvidos em suas atividades. A adaptação do modelo integrativo de justiça, proposto por Santos e Laczniak (2009), parece-nos apresentar um bom caminho para alcançar esses objetivos, já que se pauta em princípios de justiça e busca atender às necessidades dos diferentes stakeholders envolvidos em um sistema, adicionalmente à preocupação com as partes mais vulneráveis do processo.

Deparamo-nos neste momento, a partir das discussões sobre os componentes de um SAMTur, com o desafio de visualizar um modelo que defina valores e princípios que balizem o justo funcionamento do sistema para todos os agentes envolvidos. Em um exercício preliminar, considerando a construção até agora realizada, em especial o modelo integrativo de justiça proposto por Santos e Laczniak (2009), temos a proposição de um encaminhamento construído a partir de uma teoria normativa, levando em consideração elementos éticos e morais que devem estar presentes nas transações entre as empresas e consumidores.

A proposta integra a noção de justiça e equidade nas transações de marketing, identificando cinco características de situações de mercado justas, que se configuram como as suas entradas (valores). Vejamos como esses valores se adaptariam, preliminarmente, à perspectiva de um SAMTur, levando em consideração as características da atividade turística (Tabela 1).

Tabela 1 Proposição teórica dos princípios adaptados à atividade turística 

Princípios MIJ (Santos e Laczniak) Adaptação no turismo
1. Compromisso autêntico com os consumidores, especialmente com os de baixa renda, com intuito não exploratório 1. Compromisso autêntico com o turista e com a comunidade receptora (residentes, meio ambiente e patrimônio histórico-cultural), com intuito não exploratório
2. Cocriação de valor com os consumidores, especialmente aqueles de baixa renda ou em desvantagem 2. Cocriação de valor com a comunidade local, a partir de políticas de participação, empoderamento e governança social
3. Investimento no consumo futuro sem ameaçar o meio ambiente 3. Promover a atividade turística numa região sem comprometer o meio ambiente
4. Representação dos interesses de todos os stakeholders, particularmente consumidores de baixa renda 4. Representação dos interesses de todos os stakeholders envolvidos na atividade turística, especialmente os residentes do lugar
5. Foco nos ganhos de longo prazo ao invés de busca pela maximização de lucros no curto prazo 5. Desenvolvimento econômico e social para a região com foco nos ganhos de longo prazo
6. Levar em consideração as especificidades do contexto regional no qual a atividade turística está inserida (proposição nossa)

Fonte: elaboração própria.

No compromisso autêntico com os consumidores, no caso da atividade turística, temos o consumidor direto - que é o turista -, este não deve ser explorado, por exemplo, com a oferta de serviços mais caros e informações errôneas. Vemos também um outro agente diretamente afetado pela atividade turística e que geralmente está em situação de desvantagem, o residente. Paralelamente, os recursos ambientais e o patrimônio histórico-cultural (material e imaterial) também são afetados e, muitas vezes, explorados de forma indiscriminada pela atividade. Dessa maneira, poderíamos propor uma reconstrução deste primeiro princípio, da seguinte forma: compromisso autêntico com o turista e com a comunidade receptora (residentes, meio ambiente e patrimônio histórico-cultural), com intuito não exploratório.

Referente a cocriação de valor com os consumidores, especialmente aqueles de baixa renda ou em desvantagem, discussões teóricas acerca da promoção da participação da comunidade local no planejamento de políticas públicas para o turismo e políticas de governança social e democrática podem promover a possibilidade de cocriação. Aqui, a proposição seria de cocriação de valor com a comunidade local, a partir de políticas de participação, empoderamento e governança social. A ideia é dar voz à comunidade local, de maneira que ela participe de todo o processo do desenvolvimento turístico, já que geralmente ela fica à margem, não recebendo os benefícios que a atividade pode trazer, e muitas vezes sofrendo apenas os custos. Boley e McGehee (2014) argumentam acerca da importância do empoderamento do residente como sendo um aspecto central para o desenvolvimento de uma atividade turística sustentável em determinada localidade. Os autores afirmam ainda que, se o governo falha em empoderar os residentes, o sucesso do desenvolvimento turístico e sua sustentabilidade terá dificuldade de permanecer.

Em relação ao investimento no consumo futuro, sem ameaçar o meio ambiente, a crescente preocupação com a sustentabilidade e a intensificação dos estudos sobre práticas de desenvolvimento - práticas que possam garantir o equilíbrio de um determinado local em condições de igualdade de usufruto pelas gerações futuras - tiveram impacto direto no setor turístico, de acordo com Scótolo e Panosso Netto (2015). Esses autores argumentam que, para além das questões relativas à preservação ambiental do planeta, o desenvolvimento sustentável do turismo prevê o crescimento econômico do destino em harmonia com as características sociais, históricas, culturais e ambientais do local anfitrião. Aqui estão balizadas as questões de desenvolvimento ambiental sustentável da atividade turística, em que todos os agentes devem estar envolvidos no sentido de preservar os recursos ambientais do destino turístico. A proposição seria de promover a atividade turística numa região sem comprometer o meio ambiente.

No quarto princípio que aborda a representação dos interesses de todos os stakeholders, particularmente consumidores de baixa renda, alguns questionamentos nesse sentido podem ser levantados para nortear este aspecto: quem ganha (ou tende a ganhar) e quem perde (ou pode perder) com essa atividade? Quais são os grupos envolvidos na atividade (segmentos sociais, distribuição de renda, características culturais, necessidades e desejos) e quais os contrastes existentes entre esses grupos? Qual a natureza do turismo em questão (predatório, humanista, enriquecedor, ético)? (Scótolo e Panosso Netto, 2015). Aqui, adaptaríamos a proposição para focar na consideração dos interesses dos residentes de um destino turístico, que são os principais stakeholders interessados e afetados. Então, ficaríamos com a seguinte proposição: representação dos interesses de todos os stakeholders envolvidos na atividade turística, especialmente os residentes do lugar.

Finalmente, sobre o foco nos ganhos de longo prazo ao invés de busca pela maximização de lucros no curto prazo, adaptando a realidade da atividade turística, teríamos questões relacionadas com todos os itens anteriores no sentido de vislumbrar um desenvolvimento mais sustentável, no qual as empresas não pensem somente nos seus lucros imediatos, mas também em como o destino turístico pode se manter viável para todos ao longo do tempo. Podemos adaptar a proposição para o caso do turismo, no intuito de que a atividade promova desenvolvimento econômico e social para a região com foco nos ganhos de longo prazo. Especificamente, dado que estamos tratando de lugares, propomos a utilização do conceito de desenvolvimento local, já que tem como principal premissa o envolvimento da população, tendo em vista que ocorre (ou deveria ocorrer) por meio de uma construção coletiva da comunidade, a qual irá orientar os rumos a serem seguidos.

A partir do exposto, propomos um sexto valor para um MIJ do SAMTur, que trata de levar em consideração as especificidades do contexto regional no qual a atividade turística está inserida. Acerca desse aspecto, Tomazzoni (2009) argumenta que a contextualização espacial do desenvolvimento se fundamenta no conceito de região, considerando suas diversas classificações, e afirma ainda que a visão sistêmica da concentração regional das atividades produtivas é uma estratégia relevante para entender as variáveis que dificultam ou impulsionam o desenvolvimento. Além disso, Tomazzoni (2009) indica que a contextualização teórico-espacial possibilita identificar e validar elementos relevantes da estrutura do modelo de análise da realidade das cadeias produtivas que constituem a macrocadeia produtiva do turismo regional. Com base nos argumentos de Tomazzoni (2009), tomaremos as questões relacionadas à região Nordeste como exemplo de contexto regional que condiciona a estrutura e o funcionamento do SAMTur.

4. Decisões metodológicas

O objetivo central deste tópico é descrever a pesquisa de campo que, em paralelo ao estudo teórico, nos auxiliou na construção de um framework de funcionamento de sistemas de marketing turísticos. Portanto, o trabalho empírico não foi realizado para comprovar hipóteses ou proposições teóricas, mas sim foi parte complementar, em conjunto com a teoria, para a proposta do modelo integrativo de justiça para o SAMTur.

A unidade de análise foi a região do Brejo Paraibano, a qual possui cidades localizadas nos lugares de maior altitude do estado da Paraíba, Brasil. Por suas temperaturas mais amenas, são lugares de grande atratividade, principalmente no período de inverno. Adicionado à atratividade turística do lugar, um fator que contribuiu para direcionarmos um olhar específico para essa região foi o fato de esta ser única região turística com uma Instância de Governança Regional, chamada Fórum Regional de Turismo Sustentável do Brejo Paraibano (FRTSBP), e que estava em pleno funcionamento quando da realização da presente pesquisa.

A microrregião do Brejo Paraibano é uma das 23 microrregiões da Paraíba (estado localizado no Nordeste do Brasil), pertencendo à mesorregião do Agreste Paraibano. Sua população, estimada em 2014 pelo IBGE em mais de 116 mil habitantes, habita nove municípios (Alagoa Grande, Alagoa Nova, Areia, Bananeiras, Borborema, Matinhas, Pilões, Solânea e Serraria). Com cidades localizadas em lugares mais altos (com mais de 500 metros acima do nível do mar), as cidades do Brejo Paraibano encantam os turistas pelas suas temperaturas mais amenas (nos invernos mais frios, podem chegar a até 12° C), clima bucólico, belezas naturais e belas paisagens. Além da beleza natural, o Brejo Paraibano destaca-se pela sua diversidade e riqueza cultural em termos de artes, música e gastronomia, evidenciadas em diferentes roteiros e eventos culturais promovidos na região, como a Rota Cultural Caminhos do Frio, a Civilização do Açúcar, os Caminhos dos Engenhos, o Festival Sons e Sabores, dentre outros.

Na formação da Região Turística do Brejo foram identificados catorze municípios com potencial turístico que, juntos, compartilham semelhanças ambientais, sociais e culturais: Alagoa Grande, Alagoa Nova, Areia, Arara, Araruna, Bananeiras, Borborema, Campo de Santana, Guarabira, Matinhas, Pilões, Pirpirituba, Serraria e Solânea. O Fórum possui como membros representantes do poder público, do terceiro setor e da sociedade civil organizada dos municípios componentes da região Turística do Brejo Paraibano.

Para a compreensão e melhor aprofundamento do fenômeno aqui estudado, entendemos que a abordagem de pesquisa mais adequada aos nossos objetivos foi a qualitativa, que possibilitou a análise de um objeto a partir da ótica daqueles que estão nele envolvidos, de maneira a explicar o fenômeno social com o menor afastamento possível do ambiente natural (cf. Merriam, 2009; Godoi e Balsini, 2010). Concernente aos procedimentos observacionais, optamos por uma inserção inicial bastante exploratória no campo, sem um roteiro predefinido, e apenas com a meta de buscar entender a configuração da atividade turística na região, identificando atores, ações e funcionamento.

Como guia de trabalho de campo, utilizamos a perspectiva de Belk, Fischer e Kozinets (2013), que trata os métodos observacionais de pesquisa como situações em que o pesquisador busca sistematicamente capturar e registrar de alguma forma (anotações de campo, vídeo, fotos etc.) as ações de um grupo particular de pessoas para depois analisálas com propósitos científicos. Os métodos observacionais devem envolver o testemunho direto de atividades sociais enquanto práticas, incluindo o contexto social e as interações.

Conforme Belk, Fischer e Kozinets (2013) afirmam que, para ser utilizada como um método para geração de dados acerca da experiência humana, a observação se caracteriza tradicionalmente pelas seguintes premissas:

  • Atos sociais, eventos e práticas são vistos a partir da perspectiva das pessoas que estão sendo estudadas;

  • Atenção prioritária deve ser dada aos detalhes;

  • Eventos, práticas e ações são entendidos a partir da sua contextualização social e histórica;

  • Atos sociais são considerados como sendo dinâmicos e processuais ao invés de eventos pontuais;

  • Algum arcabouço teórico mais geral guia o primeiro contato e a construção do roteiro de observação;

  • No entanto, a imposição prematura de noções teóricas nas perspectivas dos participantes deve ser evitada, a partir do esforço do pesquisador de deixar para trás concepções prévias, no sentido de superar o viés inerente.

Nessa aproximação com o campo, diferentes conversas informais foram acontecendo, próximas do que Godoi e Mattos (2010) comentam sobre a entrevista conversacional livre em torno de um tema, caracterizada pelo surgimento das perguntas nos contextos e nos cursos naturais à interação, sem que haja uma previsão de perguntas nem de reações a elas.

Para os nossos propósitos, a observação foi essencial para uma vivência mais aproximada, ao mesmo tempo em que possibilitou uma visão mais global do objeto de estudo, inclusive auxiliando nas escolhas dos recortes teóricos definidos para a pesquisa. A coleta de dados nessa primeira incursão foi registrada a partir de notas de campo (escritas e em gravações de áudio das nossas percepções) e em registros fotográficos e documentais.

Através da observação realizada a partir da vivência no campo, tivemos uma interação direta com o fenômeno de interesse, em que pudemos não somente observar, como também alternar essa atividade com conversas e entrevistas informais ao longo do caminho, conforme prevê Merriam (2009). Nesse primeiro momento da pesquisa, também nos utilizamos da análise de alguns documentos já publicados (como blogs, reportagens, sites oficiais, estudos etc.) para o melhor entendimento da região do Brejo. Dessa maneira, a observação foi um processo essencial para a construção do presente trabalho, já que pressupõe um período longo de inserção no campo e contato com as pessoas envolvidas e com o contexto a ser estudado.

Buscamos observar as atividades e os atores relacionados com a atividade turística na região, participando de atividades junto ao Fórum de Turismo do Brejo, promovendo atividades de extensão, palestras e oficinas. Em paralelo, viajamos para as cidades que fazem parte da Rota Cultural Caminhos do Frio, conhecendo algumas das atrações culturais e turísticas, e as pessoas que fazem cada lugar. Todas as observações e conversas/entrevistas informais se fizeram da maneira mais livre possível, pois a ideia era entender uma realidade sem pressupostos prévios. As primeiras incursões em campo iniciaram em junho de 2015 e se estenderam até outubro de 2016.

Após essa etapa, diante dos registros e das reflexões acerca dessa imersão no campo, juntamente com os recortes teóricos definidos na pesquisa, obtivemos uma boa construção do funcionamento do sistema de marketing turístico na região. Assim, tivemos subsídios para direcionar o conteúdo de entrevistas (semiestruturadas) com pessoas envolvidas na atividade turística, em especial membros do Fórum de Turismo do Brejo, a fim de consolidar nossa compreensão do fenômeno, de maneira a delinear condições para a definição de princípios de justiça aplicáveis a esse tipo de sistema.

A Tabela 2 apresenta um resumo das observações realizadas, sintetizando os principais propósitos, etapas e resultados (em termos de contribuição para a pesquisa). Foram três as vias principais de participação, que em muitos momentos se sobrepuseram: Projeto de Extensão, Caminhos do Frio e Participação em atividades junto ao Fórum de Turismo.

Tabela 2 Resumo das observações realizadas 

Observação Propósitos Etapas Resultados
Projeto de extensão Edições 2015 e 2016 Participar de atividades relacionadas ao planejamento do desenvolvimento turístico na região e obter envolvimento com a comunidade Buscar necessidades de intervenção na região Planejar ações para auxiliar no desenvolvimento do turismo Promover oficinas e palestras Envolvimento com os agentes incluídos no planejamento da atividade turística Contato com as diferentes percepções sobre o turismo na região
Roteiro Caminhos do Frio Edições 2015 e 2016 Conhecer o funcionamento de um dos principais eventos de atração de turistas para a região Visitar as cidades participantes Participar de atividades Conversar com a comunidade e agentes envolvidos Obtenção de informações sobre os bastidores da organização do evento Entendimento de pontos positivos e negativos sobre os atrativos turísticos e potencialidades
Participação em reuniões e eventos do Fórum de Turismo (diferentes ocasiões entre 2015 e 2016) Interação com as atividades de planejamento da atividade turística na região Levantamento de datas de possibilidade de participação Presença nas reuniões e atividades diversas Maior contato com representantes de prefeituras, setor privado e agências de fomento Entendimento mais macro dos elementos constituintes da atividade turística

Fonte: elaboração própria.

Percebemos, então, durante as observações que alguns pontos necessitavam de aprofundamento para que pudéssemos consolidar a compreensão acerca do SAMTur do Brejo. Assim, levantamos alguns pontos principais oriundos dessas primeiras incursões:

  • Questões relacionadas com o nível de participação/ apropriação/empoderamento da população local na atividade turística da região;

  • Grau de aceitação da população local acerca da atividade turística;

  • Valorização da cultura local;

  • Stakeholders envolvidos no planejamento da atividade turística na região;

  • Planejamento de longo prazo e continuidade das ações;

  • Dependência de investimentos e ações do poder público para o planejamento e a promoção da atividade turística;

  • Participação da iniciativa privada na atividade turística;

  • Infraestrutura de acesso e turística;

  • Problemas básicos de abastecimento de água, transporte, saúde etc.;

  • Influência de características de relações políticas no Nordeste brasileiro (clientelismo, paternalismo) na gestão do turismo.

A partir desse primeiro conjunto de material empírico coletado, tivemos subsídios para direcionar o conteúdo de entrevistas (semiestruturadas) com pessoas envolvidas na atividade turística, em especial membros do Fórum de Turismo do Brejo. Foram realizadas 10 entrevistas, 6 com pessoas que eram do sexo masculino e as demais do sexo feminino, e apenas um não era membro do Fórum de Turismo. Todos os áudios das entrevistas foram gravados para posterior análise e transcrição, com prévia autorização dos entrevistados.

Para análise dos registros (tanto das observações como das entrevistas), utilizamos a análise de conteúdo. Dessa forma, seguimos as etapas conforme configuração de Bardin (2011). Inicialmente, na préanálise, que trata da organização do material das entrevistas e da sistematização do conhecimento necessário para a compreensão dos registros, efetuamos a transcrição das gravações e uma primeira leitura flutuante; a segunda etapa tratou da exploração do material coletado e das escolhas acerca da categorização do conteúdo; e a terceira, do efetivo tratamento e interpretação do conteúdo coletado. Todo o processo de entrevistas e análises ocorreu entre os anos de 2016 e 2017.

5. Estudo empírico e princípios

De acordo com os resultados encontrados, em conjunto com a construção teórica prévia realizada, obtivemos subsídios para o delineamento de princípios de justiça aplicáveis a sistemas de marketing turístico dessa natureza. Conforme já explicado, a finalidade desse estudo não foi de iluminar o empírico com os elementos teóricos encontrados, mas sim que seus aspectos fossem identificados para que, de forma complementar, formassem base para o delineamento de princípios de justiça aplicáveis ao modelo de funcionamento do sistema proposto. A Tabela 3 resume as categorias analisadas em conjunto com seus pontos de análise.

Tabela 3 Composição das categorias analisadas 

Categorias Pontos de análise
Participação e aceitação da atividade turística pelos residentes Participação da população no planejamento; Agentes importantes na promoção das atividades; - Aceitação e nível de satisfação com a atividade turística; Exploração do turista; Percepção de benefícios oriundos da atividade turística
Valorização da cultura local Percepção de valorização da cultura local; Ações de promoção da cultura local
Planejamento da atividade turística Condução do planejamento da atividade turística; Continuidade das ações; Agentes que participam do planejamento; Formatos de participação no planejamento; Abrangência de municípios representados
Características nordestinas e dependência do poder público Relação entre planejamento turístico e características da política regional; - Aspectos políticos que afetam a gestão turística; Nível de dependência da atividade na iniciativa pública; Agentes que promovem a atividade turística
Participação do setor privado na atividade turística Nível de participação da iniciativa privada; Dificuldades/entraves para essa participação
Infraestrutura de acesso e turística; abastecimento de água, transporte, saúde etc. Realidade da infraestrutura local; Prioridades e dificuldades governamentais em termos de investimento em infraestrutura; Aspectos de infraestrutura que afetam a atividade turística
Divulgação do Brejo Forma de divulgação do Brejo; Papel da mídia

Fonte: elaboração própria.

Assim, tomamos os resultados das pesquisas de campo e os analisamos em três condições, concernentes aos princípios anteriormente delineados teoricamente (Tabela 1): refutações, reafirmações, ou ainda aprimoramento dos mesmos. Isto é, verificamos em que medida estes princípios se configuram dentro de cada categoria de análise, para subsidiar nossa construção final de princípios de justiça aplicáveis a destinos turísticos dessa natureza. O detalhamento das análises encontrase na Tabela A1 - Anexos, contendo os pontos observados em cada categoria, as principais conclusões oriundas das análises, além da repercussão dessas análises em termos de princípios.

A partir da análise da repercussão dos resultados em relação às categorias e entendimento sobre os princípios, argumentamos pela seguinte configuração final de princípios de funcionamento do SAMTur (resultando em 4 princípios):

  1. Compromisso autêntico com o turista, com intuito não exploratório: um compromisso ético com o turista que, como agente demandante do sistema de marketing turístico, é a força motriz responsável pelo desenrolar das engrenagens desse sistema. Portanto, ao adaptarmos esse princípio, levamos em conta aspectos relacionados à oferta de um destino turístico que busque uma criação de valor a longo prazo baseado em retornos (sociais, ambientais e financeiros), busque um desenvolvimento sustentável do destino e a minimização dos impactos negativos, de qualquer natureza (ambiental, social, econômica...), e, acima de tudo, promova uma atividade turística ética, sem exploração do turista.

  2. Cocriação de valor com a comunidade receptora, desde a etapa de planejamento: a partir de políticas de participação, empoderamento e governança social, incluindo valorização e proteção do patrimônio histórico-cultural e ambiental da comunidade, além de consideração das especificidades do contexto regional no qual a atividade turística está inserida. De fato, um aspecto que perpassou as diferentes fases (tanto na construção teórica como no trabalho de campo) desta pesquisa, sem dúvida, foi a questão dos residentes e a necessidade de sua consideração como ‘stakeholder’ mais relevante dos sistemas turísticos.

  3. Valorização e proteção dos aspectos histórico-culturais e ambientais locais, com foco no longo prazo: no caso do sistema de marketing turístico, o local que recebe a atividade turística deve ser a principal preocupação tanto em termos de valorização das pessoas que ali moram como do meio ambiente e do patrimônio histórico-cultural (material e imaterial) que as cercam. O desenvolvimento sustentável do turismo deve levar a um crescimento econômico do destino em harmonia com suas características sociais, culturais, históricas e ambientais.

  4. Fomento à iniciativa de agentes não públicos no desenvolvimento da atividade turística: a dependência da atividade turística quanto ao setor público traz morosidade ao desenvolvimento turístico de um lugar. Entendemos ser preciso buscar diversificar os agentes responsáveis pelo desenvolvimento do turismo em um lugar. Dessa forma, as instâncias de governança regional, as associações turísticas municipais e órgãos como o Sebrae podem auxiliar na participação da sociedade em geral e, em especial, do setor privado, que deve estar envolvido e ser participante das iniciativas de desenvolvimento turístico de um lugar. Em paralelo, a mídia contribui ao auxiliar na atratividade turística de um lugar e deve estar envolvida nas ações.

Pelo exposto, podemos delinear uma visão do modelo, como mostra a Figura 1. Esse modelo deve servir de referência para o desenvolvimento das relações de troca entre os agentes envolvidos no SAMTur (residentes, governo, associações e fóruns, mídia, setor privado, turistas, órgãos de fomento e IES, dentre outros) de maneira a alcançar o equilíbrio do funcionamento do sistema. Os resultados esperados para os agentes envolvidos que aderem aos valores propostos são as relações e os ganhos de longo prazo, o empoderamento da comunidade receptora, a sustentabilidade do destino turístico e a criação de um mercado mais justo e equilibrado para todos os stakeholders envolvidos.

Fonte: elaboração própria.

Figura 1 Modelo Integrativo de Justiça para o SAMTur  

Finalizamos o presente trabalho com uma tentativa de apresentar uma operacionalização prática do MIJ. A construção argumentativa seguirá a ordem dos princípios de funcionamento previamente propostos.

  1. Compromisso autêntico com o turista, com intuito não exploratório

  • Efetiva ação dos órgãos de regulamentação do setor privado

Além das responsabilidades legais em termos de legis-lação federal, código de defesa do consumidor, dentre ou-tros, as empresas que atuam diretamente ou no entorno da atividade turística possuem suas atividades reguladas e monitoradas por uma série de órgãos e agências regulado-ras governamentais. Bares e restaurantes, por exemplo, devem seguir o regulamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que contempla desde o tipo de edificação e instalações que o estabelecimento deve ter até questões como trato e manuseio dos alimentos, controle de saúde dos funcionários, higienização etc. Além disso, prefeituras, corpo de bombeiros etc. possuem regulamentos para abertura e manutenção de estabelecimento comercial. Em paralelo, órgãos e entidades diretamente ligadas à atividade turística, desde a esfera federal, como Ministério do Turismo e Embratur, por exemplo, até em nível regional e municipal, como associações e fóruns de turismo, podem trabalhar em conjunto para que esse princípio seja viabiliza-do tanto em nível micro como em nível macro, no que se refere ao funcionamento do sistema de marketing turístico.

  • Ações de mídia e de divulgação do destino

Tanto as associações quanto os órgãos públicos mais eficientes (em nível municipal, secretarias de cultura e turismo, por exemplo; em nível estadual, empresas estaduais de turismo, secretarias de comunicação etc. e assim por diante) preocupam-se com a maneira como as informações sobre o destino chegam ao turista, a partir do fornecimento de informações claras e transparentes sobre o destino (evitando, por exemplo, situações em que é divulgada uma imagem e a realidade quando se chega no destino é bem diferente), construindo uma relação de confiança com os demandantes.

  • Monitoramento da satisfação e percepção do turista

Trata-se da realização de pesquisas de campo para verifi-car o olhar do turista sobre o destino, assim como a imagem do destino existente na mente de pessoas que não o conhe-cem, por exemplo. Essas pesquisas podem ser viabilizadas a partir da efetivação de parcerias entre associações, instituições de ensino e pesquisa, em conjunto com o poder público. Assim, pode-se estabelecer um monitoramento regular (semestral ou anual) de informações acerca da percepção e satisfação do turista com o lugar, as quais podem subsidiar decisões relacionadas a políticas públicas, planejamento estratégico de associações, de empresas ligadas ao turismo etc.

  1. Cocriação de valor com a comunidade receptora, desde a etapa de planejamento

  • Viabilização da participação dos residentes nos processos de planejamento e execução da atividade turística

A participação da comunidade local em todo o processo de planejamento e desenvolvimento da atividade turística é condição essencial para a sustentabilidade do turismo em um lugar. Essa participação pode ser incentivada por todos os agentes envolvidos na atividade turística e a sua constante busca parece ser uma condição importante dos sistemas que funcionam de maneira equilibrada. Propomos que essa viabilização seja feita, por exemplo, a partir da incorporação de representantes da sociedade civil nas associações, fóruns, conselhos etc. de turismo de cada localidade.

  • Ações de conscientização sobre a atividade turística

O despertar para a importância e a conscientização acerca dos impactos gerados pela atividade turística em um lugar podem ser incentivados nas comunidades locais desde a idade escolar. Além disso, também é necessário que os residentes conheçam as potencialidades do lugar que habitam, sua história, cultura etc. para que possam valorizá-las e inclusive protegê-las. O conhecimento acerca do que é a atividade turística, do como ela pode mudar a comunidade e quais os benefícios e malefícios que pode trazer é essencial para que a comunidade local possa tomar melhores decisões e se engajar no processo.

  • Ações de capacitação e preparação da mão de obra local

Ações de capacitação técnica favorecem o empoderamento das comunidades locais e aumentam a possibilidade de uma maior inserção na atividade turística e de participação participação nos benefícios advindos dela. A especialização, a formação de recursos humanos, especialmente na cadeia produtiva do turismo, é essencial para agregar a participação dos residentes no processo. Dessa forma, propomos o incentivo à formação de recursos humanos pelas instituições especializadas no ensino do turismo (universidades e escolas) e órgãos de fomento (Sebrae, Senac, etc.), além da constante qualificação e atualização dos profissionais.

  • Monitoramento da percepção e satisfação da comunidade com o turismo

O poder público deve se preocupar em monitorar a percepção e o grau de satisfação dos residentes com as atividades turísticas desenvolvidas em sua região, uma vez que um dos seus objetivos primordiais é a geração de bem-estar para a comunidade local. Entendemos que os governos municipais busquem parcerias com instituições de ensino e institutos de pesquisa no sentido de demandar e incentivar pesquisas regulares (abrangendo diferentes métodos) para compreender como a população percebe a atividade turística na sua região. Esse tipo de pesquisa pode subsidiar a escolha pelo direcionamento das políticas governamentais e estratégias de comunicação com a população local.

  1. Valorização e proteção dos aspectos histórico-culturais e ambientais locais, com foco no longo prazo

  • Atuação das secretarias de cultura e meio ambiente municipais e estaduais

Os poderes públicos, tanto em nível local quanto regional ou nacional, além do seu papel de fiscalização e efetivação da legislação relacionada à preservação cultural e ambiental, podem participar da efetivação desse princípio a partir da atuação de suas secretarias, na medida em que estas atuem como órgãos de preservação ambiental local e de resgate dos aspectos culturais e de identidade do lugar, funcionando em parceria com as secretarias e outros órgãos públicos ligados ao turismo, em conjunto com instituições de ensino. Nesse sentido, são diversas as áreas disciplinares que podem atuar em conjunto com secretarias, incluindo turismo, administração, geografia, história, arquivologia, agroecologia, arquitetura, biologia, antropologia, sociologia, museologia, dentre várias outras.

  • Atuação das associações e fóruns de representação local

A criação e a efetiva atuação de associações de artesãos, músicos e artistas, representantes de comunidades rurais, guias locais etc., têm o potencial de viabilizar e proteger a sustentabilidade de longo prazo do destino, inclusive na promoção de eventos que valorizem esses aspectos. Entendemos que, se bem representadas, com membros de diferentes âmbitos da sociedade, essas entidades podem atuar no resgate e na preservação de longo prazo dos aspectos e características locais inerentes ao lugar, além de tornarem-se veículos de valorização e preservação das características locais.

  1. Fomento à iniciativa de agentes não públicos no desenvolvimento da atividade turística

  1. Setor privado

Argumentamos que, a partir da ação de empresários inovadores, e graças à importância e ao protagonismo da atuação empreendedora, os segmentos do turismo devem ser organizados pelo setor privado. O empresário de qualquer segmento ligado ao turismo pode desenvolver competências de articulação com diversos outros segmentos, a fim de implementar sua atividade de forma coesa e integrada ao mercado.

  • Associações, fóruns, conselhos etc.

O planejamento para o desenvolvimento turístico de um lugar requer o encorajamento de reuniões regulares entre vários representantes da sociedade civil, setor privado, governo, órgãos de fomento, etc. Esse tipo de parceria tem o potencial para promover a discussão, negociação e construção de propostas de ampla aceitação sobre como o turismo deve se desenvolver. Além disso, esse tipo de colaboração leva ao compartilhamento de conhecimento, especialidades, capital e outros recursos, bem como uma melhor coordenação de políticas relevantes, um aumento da aceitação das políticas e uma implementação mais efetiva. Dessa forma, associações e grupos podem adquirir vantagem competitiva para uma região turística.

6. Considerações finais

Enfatizamos o valor da nossa proposta a partir de duas principais contribuições: a proposição do Modelo Integrativo de Justiça aplicável ao SAMTur, em que delineamos princípios para um funcionamento equilibrado; e um caminho para estruturação prática de ações para implementação dos princípios do MIJ. Dessa forma, em termos de impactos teóricos, trazemos uma perspectiva de análise de ética em macromarketing para sistemas de marketing turísticos, tendo como base de funcionamento a busca de equilíbrio a partir de conceitos de justiça e da teoria do stakeholder.

Entendemos que o modelo de construção dessa pesquisa e suas escolhas metodológicas podem ser tomados como base para estudos dessa natureza, tanto a partir da forma de análise do fenômeno, adentrando nos aspectos teóricos em paralelo às primeiras inserções em campo, como a construção de proposições práticas de aplicação dos princípios para funcionamento do sistema. Esta última, consideramos como condição essencial para pesquisas propositivas de modelos de funcionamento de sistemas.

Em termos de aplicação prática dentro das atividades do sistema, temos os princípios de funcionamento do SAMTur que têm o potencial de contribuir diretamente na ação dos diferentes stakeholders da atividade turística, na medida em que delineamos cursos de ação para sua aplicação. Gestores públicos, agentes privados, entidades ligadas ao turismo, associações e fóruns de diferentes representatividades da sociedade civil podem se beneficiar das proposições práticas que foram delineadas no presente trabalho.

O funcionamento eficiente de sistemas de marketing dessa natureza, portanto, envolve a participação de todas as partes afetadas pela atividade turística nas discussões e decisões sobre os desdobramentos em potencial. Assim, acreditamos que a implementação da nossa proposta tem potencial para promover o funcionamento mais equilibrado de sistemas de marketing turístico, principalmente a partir de uma menor intervenção do Estado e de uma maior participação das comunidades locais. Pesquisadores na área de macromarketing, especificamente no turismo, têm a possibilidade de ofertar importantes contribuições aos sistemas estudados, na medida em que busquem configurar caminhos práticos de realização de ações que busquem a sustentabilidade e a emancipação das regiões estudadas. Entendemos, portanto, que este trabalho traz essa contribuição.

As limitações pertinentes à construção do nosso trabalho perpassaram, inicialmente, por restringir a discussão de equilíbrio em sistemas de marketing para a teoria do stakeholder e teorias de justiça. Nossa construção foi embasada em Ferrell e Ferrell (2008), mas entendemos que estudos futuros podem trabalhar no sentido de incluir outras abordagens de geração de equilíbrio em sistemas de marketing. A inclusão de diferentes teorias para embasar o que se configura em equilíbrio poderia resultar, inclusive, em uma delineação diferente de princípios de justiça aplicáveis ao funcionamento do SAMTur no MIJ proposto.

Realçamos a necessidade de realização de pesquisas empíricas que analisem com maior profundidade as necessidades e as percepções dos diferentes envolvidos no SAMTur, inclusive com estudos específicos sobre cada um deles (em especial com os residentes). Em consequência disso, também são possíveis estudos relacionados ao funcionamento de subsistemas do SAMTur, ou de sistemas que se relacionam com ele, já que muitas cidades, por exemplo, possuem particularidades específicas, e, apesar de estarem inseridas em uma região com aspectos semelhantes, o estágio de desenvolvimento turístico em que cada uma se encontra pode ser diferente.

As lentes de macromarketing podem se aproximar ou se afastar do fenômeno, chegando até próximo aos níveis de micro de análise, ou propor níveis mais abrangentes de análise, focalizando bairros, cidades, estados, regiões, países, dentre outros. Por exemplo, pesquisas futuras poderiam buscar medir quantitativamente a percepção de empoderamento dos residentes em relação à atividade turística (empoderamento social, psicológico e político), ou a analisar a percepção de justiça nas relações de troca no destino por parte do turista e a atitude de gestores das empresas em relação à promoção de atividades turísticas justas, dentre outras.

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1Termo que define o conjunto de organizações das entidades corporativas no Brasil volta-das para o treinamento profissional, assistência social, consultoria, pesquisa e assistência técnica, que além de terem seu nome iniciado com a letra S, têm raízes comuns e características organizacionais similares. Fazem parte do sistema S: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai); Serviço Social do Comércio (Sesc); Serviço Social da Indústria (Sesi); e Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (Senac). Existem ainda os seguintes: Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar); Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop); e Serviço Social de Transporte (Sest).

Como citar: Medeiros, F. G. e Costa, F. J. (2020). Proposição de um modelo integrativo de justiça para o sistema agregado de marketing turístico. Estudios Gerenciales, 36(156), 251-263. https://doi.org/10.18046/j.estger.2020.156.3894

Observação O artigo é oriundo do trabalho de tese de Fabiana Gama de Medeiros, sob a orientação de Francisco José da Costa, publicado nos arquivos do Programa de Pós- Graduação em Administração e Sociedade, da Universidade Federal da Paraíba, Brasil (PPGA/UFPB). Disponível em: https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/123456789/11649

Anexos

Tabela A1. Resumo das conclusões das categorias e repercussão nos princípios 

Categoria: Participação e aceitação da atividade turística pelos residentes
Conclusões: (1) A participação da população geral pouco alcança o nível de planejamento; (2) As atividades culturais (artesanato, teatro, música) parecem ser veículos de viabilização de certa participação da sociedade nas atividades turísticas; (3) Os pesquisados, de maneira geral, têm uma percepção de que a população de seus municípios está satisfeita com a atividade turística, e que aos poucos estão aceitando-a; por outro lado, alguns argumentam que há uma parcela que não está satisfeita ou não entende os benefícios da atividade; (4) Identificamos alguma percepção de exploração do turista em período de festas e uma divisão desigual de benefícios oriundos da atividade turística.
Repercussão nos princípios: Princípio (i) - a análise da participação e aceitação dos residentes permitiu reafirmarmos a importância do compromisso com a comunidade receptora; Princípio (ii) - verificamos a importância da participação da comunidade e seu empoderamento, em todas as etapas do desenvolvimento e planejamento da atividade turística em um lugar; Princípio (iv) - percebemos que as instâncias de governança regional e associações turísticas devem ter o papel de representar os interesses de todos os agentes envolvidos na atividade turística, em especial, dos residentes do lugar.
Categoria: Valorização da cultura local
Conclusões: (1) Há um discurso forte em relação ao foco do turismo no Brejo de enfatizar os aspectos culturais da região; (2) Os pesquisados acreditam que os atrativos culturais da região são o principal diferencial da região, juntamente com o clima ameno; (3) Os agentes envolvidos com a promoção das atividades culturais são apontados como importantes para o desenvolvimento turístico e estão representados no Fórum de Turismo e nas associações municipais.
Repercussão nos princípios: Princípio (ii) - a partir da análise das atividades de valorização da cultura local, identificamos que estas são uma forma importante de envolvimento da comunidade local na atividade turística; Princípio (v) - de fato, as atividades culturais acabam se tornando atrativo turístico, trazendo um bom retorno financeiro para os envolvidos; no entanto, deve-se ter atenção na continuidade das ações, e no planejamento de longo prazo. Princípio (vi) - percebemos que esse é um aspecto inerente à valorização da cultura local.
Categoria: Planejamento da atividade turística
Conclusões: (1) O principal vetor e articulador do planejamento da atividade turística na região é o Fórum de Turismo do Brejo; (2) Se por um lado o Fórum auxilia na continuidade das ações, por outro, as mudanças de governo municipal ainda afetam os municípios; (3) O Sebrae aparece como um agente importante de apoio ao planejamento dos pequenos empreendedores turísticos e muitas vezes atua em conjunto com o Fórum; (4) Alguns questionam a quantidade de municípios representados no Fórum como sendo um aspecto negativo que pulveriza e desconcentra os esforços, por outro lado, o Fórum argumenta que quanto mais municípios vinculados, mais forte fica a região; (5) Parece haver um planejamento de cima para baixo que acaba não envolvendo pequenos empreendedores e população em geral na tomada de decisão.
Repercussão nos princípios: Princípio (ii) - verificamos a importância de se encontrar meios para viabilização da participação da comunidade local desde a etapa de planejamento da atividade turística; Princípio (iv) - percebemos a importância de haver meios de representação dos diversos interessados na atividade turística; Princípio (v) - encontramos a necessidade de buscar meios de superação da dependência do poder público.
Categoria: Características nordestinas e dependência do poder público
Conclusões: (1) Há a percepção de que parte da comunidade ainda vê o Estado como o responsável por prover tudo à população; (2) Há uma diferença grande em termos de desenvolvimento da atividade turística ao compararmos cidades que não dependem da iniciativa pública para promover a atividade turística àquelas que dependem; (3) Alguns argumentam que a dependência quanto ao poder público também pode ser decorrente da falta de conhecimento técnico ou de recursos financeiros suficientes para investir na atividade turística; (4) Outros também argumentam que há outras formas de angariar recursos como via editais, bancos, ministérios da cultura e do turismo etc. e que o papel do setor público é investir na parte de infraestrutura, cabendo o restante à iniciativa privada.
Repercussão nos princípios: Princípio (iv) - a questão das características nordestinas e da dependência do poder público aparece em termos de concentração de interesses de grupos específicos. Princípio (v) - percebemos que o turismo pode ser visto como um meio de trazer desenvolvimento socioeconômico para uma região, inclusive gerando autonomia; Princípio (vi) - percebemos a importância de levar em consideração as características regionais para o desenvolvimento da atividade turística.
Categoria: Participação do setor privado na atividade turística
Conclusões: (1) Em poucos municípios há uma participação forte da iniciativa privada, e são nesses que a atividade turística é mais desenvolvida; (2) Os pesquisados relataram que existe uma expectativa de que o poder público forneça a infraestrutura e atraia os turistas para os municípios; (3) O Sebrae parece ser um caminho para melhorar a participação da iniciativa privada no turismo; (4) Outros tipos de investimentos privados, como condomínios horizontais fechados, têm movimentado a economia e a atividade turística; (5) A participação do setor privado parece se dar melhor por meio das associações turísticas municipais e representação no Fórum, em conjunto com o apoio do Sebrae.
Repercussão nos princípios: Princípio (iv) - a representação dos interesses, principalmente dos pequenos empreendedores da atividade turística, pode se configurar através das associações municipais de turismo e do apoio do Sebrae; Princípio (v) - vimos que há uma percepção de que o setor privado pode contribuir para o desenvolvimento socioeconômico, e também é um meio de promover o planejamento a longo prazo a partir das associações; Princípio (vi) - identificamos que pode ser criada uma expectativa por parte do setor privado de que o governo deva ser o responsável por viabilizar a atividade turística em um lugar, em que muitos ficam esperando passivamente a ação governamental.
Categoria: Infraestrutura de acesso e turística
Conclusões: (1) Em termos dos problemas que afetam o turismo, foram relatados aspectos relacionados a problemas com estradas e sinalização, falta de tratamento adequado do esgotamento sanitário, além do fator de abastecimento de água; (2) Há também o argumento da dificuldade de começar a comercializar e vender um destino turístico sem que ele tenha a infraestrutura adequada para receber o visitante; (3) Alguns também argumentam que há diferença entre a distribuição dos investimentos por parte do governo estadual em relação ao litoral e ao interior.
Repercussão nos princípios: Princípio (i) - percebemos que a infraestrutura tanto turística como básica para os residentes é um fator que precisa ser levado em consideração, principalmente em termos de problemas de acesso, de saneamento básico, de esgotamento sanitário, de abastecimento de água, dentre outros; Princípio (iii) - os problemas de falta de esgotamento sanitário afetam os rios, além disso há problemas de assoreamento e acumulação de lixo em espaços de ecoturismo; Princípio (v) -a infraestrutura básica auxilia no desenvolvimento da atividade turística e nos ganhos socioeconômicos.
Categoria: Divulgação do Brejo enquanto destino turístico
Conclusões: (1) O formato do Brejo de circuito turístico ajuda a promover a região como um todo e aumentar a atratividade, já que há uma proximidade entre as cidades e um roteiro integrado, divulga-se a região como um todo, e não cidade A ou B; (2) A imprensa tem um papel importante, juntamente com os órgãos estaduais; (3) O Sebrae também tem um certo papel na divulgação do Brejo; (3) O fato de um município fazer parte da Rota o leva à divulgação na mídia, e o Fórum vem adicionando mais municípios no Caminhos do Frio nos últimos anos.
Repercussão nos princípios: (1) Delineação de um princípio que leve em consideração a equiparação, em termos de divulgação, dos diversos destinos turísticos de um estado.

Fonte: elaboração própria.

Recebido: 14 de Fevereiro de 2020; Aceito: 13 de Julho de 2020

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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