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Literatura: Teoría, Historia, Crítica

versão impressa ISSN 0123-5931

Lit. teor. hist. crit. vol.22 no.2 Bogotá jul./dez. 2020

https://doi.org/10.15446/lthc.v22n2.86085 

Artículos

Os monstros do ano 2001: trabalho e dinheiro em alguns poetas dos anos noventa argentinos

Los monstruos del año 2001: trabajo y dinero en algunos poetas de los años noventa argentinos

The Monsters of Year 2001: Work and Money in Some Poets of the Argentinean Nineties

Joaquin Correa1 

1 Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil joaquin_medio@hotmail.com


Resumo

Imaginando - parafraseando a Aby Warburg - o patrimônio económico gestual argentino na história interna das imagens da poesia dos anos noventa e suas projeções, o presente artigo propõe uma leitura de uma série de poemas que abordam a questão do dinheiro ou do trabalho num período que foi crítico para os argentinos. Essa indagação permitirá observar as distâncias ou proximidades da poesia com o mundo do trabalho que, naqueles anos, sofria transformações que apenas hoje começamos a entender. Para isso, alguns dos poetas proporão uma leitura económica do passado recente e outros se fixarão no presente. Em todos os casos, a poesia não ficará incólume e terá seus pressupostos estéticos modificados.

Palavras-chave: crise; economia; poesia contemporânea argentina; trabalho

Resumen

Imaginando -parafraseando a Aby Warburg- el patrimonio económico gestual argentino en la historia interna de las imágenes de la poesía de los años noventa y sus proyecciones, el presente artículo propone la lectura de una serie de poemas que abordan el tema del dinero o del trabajo, en un periodo que fue crítico para los argentinos. Esto permitirá observar las distancias o proximidades de la poesía con el mundo del trabajo que, en aquellos años, sufría transformaciones que hasta hoy comenzamos a entender. Para esto, algunos de los poetas propondrán una lectura económica del pasado reciente y otros se fijarán en el presente. En todos los casos, la poesía no quedará incólume y verá, en consecuencia, sus presupuestos estéticos modificados.

Palabras clave: crisis; economía; poesía contemporánea argentina; trabajo

Abstract

Imagining, - like Aby Warburg did - the Argentinean gestural economic heritage in the internal history of the images of the 1990s poetry and its projections, this paper proposes a reading of a series of poems that approach the subject of money or job in a critical period for Argentinians. This investigation will allow us to observe the distances or proximities of poetry with the world of work that, in those years, suffered transformations that only until today we are beginning to understand. Therefore, some of the poets will propose an economic reading of the recent past and others will look at the present. In all cases, poetry will not remain unscathed and will see its aesthetic presuppositions modified.

Keywords: crisis; economy; contemporary argentinean poetry; work

Nunca pensé que escribir poesía

fuera diferente a venderla

o, directamente, a fabricar ladrillos

o diferente a trabajar de mozo en Banchero

(donde hay un horno).

No hay poesía tan alta como la chimenea de esa pizzería.

Washington Cucurto, "Escribir poesía"

Os livros do senhor Camaratta

LENDO A POESÍA REUNIDA DE Fabián Casas se poderia esboçar, esquematicamente, uma série de poemas do poeta diante do espelho: "Recién salido de la ducha" de Tuca, "Me pregunto", "No estoy en bata comiendo naranjas al sol" e "Mientras me lavo la cara" de El salmón, por exemplo. O enfrentamento, face a face, com e sem óculos, com esse outro eu que devolve o espelho conduz a pensamentos metafísicos, existenciais, em que se mede o corpo próprio enquanto um objeto no mundo, ou se indagam as ressonâncias do recentemente abandonado espaço onírico, ou se ponderam os ecos do já-acontecido:

Enquanto lavo meu rosto

Darío, em pé, grita e gesticula.

Sob um cobertor marrom,

Daniel ri e fala das suas namoradas.

Eles estão bêbados e os que gritam na cozinha,

como deputados, também.

Mamãe ressuscitada,

bate nas janelas, pedindo para entrar.

Ao amanhecer, sob uma clareza impiedosa;

cigarros, livros espalhados,

pratos com comida.

Caminho devagar até o banheiro;

sei que a desgraça paira sobre nós,

não agora, também não no ano que vem,

ainda somos jovens, mas isso

perde-se imediatamente.

Não temos nada, eu acho,

enquanto lavo meu rosto,

nem um ofício, nem uma herança,

nem uma casa de pedra sólida.1 (60)

Colocado no penúltimo lugar de El salmón, coletânea de poemas escritos entre 1990 e 1996 e publicada nesse último ano, o poema começa descrevendo um dos encontros entre amigos-poetas que Casas registrava no seu diário (Diarios de la edad del pavo, 2017) e que outros colegas da época (Washington Cucurto, dentre eles), posteriormente, lembrarão como míticos ou, pelo menos, dificilmente esquecíveis. Presumivelmente, então, Darío seja Darío Rojo e Daniel, Daniel Durand, editores junto com o próprio Casas da revista 18 whiskys. Na mínima saída, em direção ao banheiro, desse espaço íntimo, disparatado, anárquico e noturno, denso e também político, como colocado pela comparação com os deputados e uma lembrança platónica, entre doses etílicas variáveis, cigarros e leitura de livros, numa cena de farra, e inclusive com a presença vinda do além da mãe do poeta, na beira do dia, ele, o poeta, um pouco aturdido, parece atingir uma iluminação repentina que se resolve, de modo dialético, uma vez frente ao espelho. Nessa situação, o poeta adota a primeira pessoa do plural, fala em nome do grupo de amigos, fala em nome da sua geração, e enuncia a carência absoluta além da juventude, da poesia e da amizade que, no fim das contas, não serão capazes, também não, de solucionar esse déficit porque, talvez, sejam elas a própria desgraça. A poesia, no caso, não é considerada um ofício nem, metaforicamente, uma herança ou casa de sólida pedra.

Essa poesia, pouco depois, num poema de Horla City, que recria o monólogo interior de um tal senhor Camaratta antes de morrer, estará em oferta na mesa dos saldos:

Me formei, sou disciplinado,

cometi o pior dos pecados,

sentei para ler ao sol

livros que comprei em promoção,

porque colocaram à venda

à poesia dos anos noventa.2 (174)

Na sua noite agónica, o senhor Camaratta declara ter lido, prazerosamente ao sol, e como se de um pecado se tratasse, a poesia dos anos noventa. A rima bufa com que acaba a estrofe (oferta / venta / noventa) nos adverte da paródia: é "El remordimiento", poema de La moneda de hierro, que ecoa ali. Mas o pecado aqui não é não ter sido feliz senão ter lido aqueles livros em oferta, dentre os quais, e talvez, algum livro do próprio Casas. "Minha mente / se aplicou às simétricas porfias / da arte, que entretece naderías" (Borges 143), liamos no poema borgeano. Naderías são também as que confessa o senhor Camaratta. E a poesia dos anos noventa, uns quinze anos depois, reaparece sob a luz não só da desgraça, senão também do des-prezo.

Nos poemas mais recentes de Casas, escritos depois de sua separação e sintomaticamente intitulados Últimos poemas en Prozac, embora o trocadilho careça de graça, dado que são todos dispostos em verso, o dinheiro e o trabalho estão quase completamente ausentes, obliterados por esse estado narcótico dos antidepressivos.3 O que aparece é o registro da vida depois da ruptura, a paternidade, o retorno à solidão, o não saber o que fazer. Ainda assim, em "Biografía de un escritorio", se lembrando da escrivaninha que ficou na sua antiga casa de casado a partir da cor do cabelo do cachorro vira-lata que uma menina acaricia no local onde está comprando plantas, elenca uma série de escrivaninhas, dentre elas aquela que o pai criou, ao modificar a função da mesa de jantar:

E outra tarde de inverno nos anos setenta

seu pai usou a mesa de jantar pela primeira vez como escrivaninha

à noite, com uma pequena lâmpada,

para fazer, como ele disse, as contas: as matemáticas

necessárias para sustentar uma família

como se fosse uma pequena empresa.4 (58)

A associação desencadeada pela cor do cabelo do cachorro vira-lata, então, o deposita num lugar da sua juventude: uma cena da intimidade da sua família, a primeira vez que o pai, sozinho, depois da janta, quase que em segredo, fez as contas necessárias para sustentar à família e transformou a mesa de jantar numa escrivaninha, isto é: colocou a economia no lugar das refeições, da alimentação. É uma cena crítica. Utilizando um vocabulário atual (PYME: micro e pequenas empresas), aproxima a língua da empresa ou, talvez, do empreendedorismo, para se referir à organização económica familiar. Se a estrofe anterior recuperava o momento em que, passeando com uma menina pelo lago Silvaplana, Nietzsche teve a ideia do eterno retorno do mesmo, há, nessas associações só em aparência livres um vínculo de ordem dialético, acostumados como estamos, por outro lado, aos remates sentenciosos dos poemas de Casas. Desse modo, na figura do pai de família recentemente divorciado, e a partir do elenco de uma série de escrivaninhas, mais ou menos distantes, se recuperam diversas situações de outras vidas como se, seguindo um raciocínio de tipo platónico, naquela escrivaninha estivessem todas as escrivaninhas com todas as situações possíveis que elas abrem. Assim, Casas, dentre muitos outros devires em aberto, é seu pai naquela crítica primeira noite: um homem sentado sozinho, na escuridão da noite, fazendo as contas que nunca fecham.

Ócio / Negócio

Mexendo na mesa dos saldos, procurando nexos dentre os retornos das formulações de pathos dos gestos (Warburg, "O ingresso" 93), imaginando - parafraseando a Aby Warburg - o património económico gestual argentino na história interna das imagens (Warburg, "A influência" 175) da poesia dos anos 1990 e projeções, releremos a continuação os livros desvalorizados do senhor Camaratta. Dentre esses, talvez nenhum se dedicou tanto aos vínculos do poema com o emprego e o dinheiro como o fez Curriculum vitae de Pablo Aguirre, livrinho publicado pelas Ediciones Deldiego5 no final da década de noventa argentina, isto é: no ano de 2001, que contém um extenso poema sobre o começo da vida laboral da voz poética, focado especialmente nos trabalhos da temporada de verão. Se a praia é, para quase todo mundo, e por antonomásia, um local de ócio e descanso, tal e como lemos em outros dos títulos do catálogo de Deldiego, La playa, de Darío Rojo, publicado também naquele ano de 2001 e focado mais na descrição dos turistas e da percepção do poeta, na areia mesmo, em Curriculum Vitae apenas existirá como espaço laboral, reduzido à temporada de verão. Ócio e negócio: quando lemos La playa adivinhamos Curriculum Vitae, e vice-versa. Os versos com os que começa o poema são: "acho que meu primeiro emprego remunerado / foi pintar as linhas de estacionamento / no prédio onde eu morava" ["creo que mi primer trabajo pago / fue pintar las líneas del estacionamiento / en el edificio donde vivía"] (Aguirre s. p.). Uma lembrança vaga inaugura o poema que, contrário ao que poderia se deduzir dessa dificuldade mnemónica e do próprio título, não será uma enumeração retrospectiva e pormenorizada dos empregos de uma vida, senão o picaresco relato daqueles verões trabalhados na praia de uma cidade balneária depois de ter concluído o ensino médio. Se, como deixa entrever o primeiro verso, um currículo é a enumeração dos trabalhos remunerados já tidos na própria vida, troca-se aqui a simples coleta de dados laborais do passado por um relato em verso de uma dessas experiências.

De passar a vassoura pelo local até gerenciar o caixa, o transcorrer dos anos traz, junto com a perda da inocência, alguma espécie de promoção laboral, numa hierarquia explícita fundamentada na destreza e força corporal que situa o trabalho da lanchonete abaixo daquele outro dos salva-vidas e dos "carperos" (o pessoal contratado pela gerência da própria praia para cuidar das tendas e guarda-sóis). Com ironia descreve a cada um dos seus colegas, sua procedência provinciana e seus truques no limite da legalidade, imita os diferentes sotaques e destaca a qualidade que criara o apelido. Cada um deles tinha a sua própria estratégia para tirar um maior proveito económico do emprego: "Todos nós cobiçávamos alguma coisa / todos nós roubávamos alguma coisa" ["Todos codiciábamos algo / todos robábamos algo"] (s. p.). Sob o entretecido de relações geradas pelos empregos legais que cada uma dessas pessoas desenvolvia na praia, se constituía uma rede de trocas mais ou menos invisível que acabava definindo as relações e amizades. O emprego visível, no final das contas, era apenas uma justificativa para conseguir o fetiche, busca diária que suprisse, quanto menos simbólica ou emocionalmente, a escassez do salário e o trato com os proprietários:

Todos nós odiávamos os chefes:

o gordo Verdaguer

Verduguer

cuspíamos

no seu dompedro

que pedia de sobremesa

Todos nós reclamávamos

do pouco que ganhávamos:

eu também reclamava

apesar de que toda grana

me parecia muita.6 (s. p.)

O prazer do emprego aparece só nas últimas duas estrofes: uma conversa amável com algum cliente a partir do elogio do café que ele fazia ou a entrada no mar como purgação da sujeira do dia. O poema, de algum modo, vem depois, para restaurar, entre o emprego e a busca do fetiche, o princípio do prazer. "Meu nome é Ana Gallardo. Eu tenho 51 anos. Sou artista. Este é o meu curriculum vitae" (00:00:0-6), escutávamos dizer a Ana Gallardo em, precisamente, cv laboral, obra em formato áudio de 2009, pertencente agora à coleção do malba e exposta ali na ocasião de Verboamérica. Naquela oportunidade, na ficha catalográfica do museu, liamos: "Não lucro com a venda de minhas obras, e por isso tenho que fazer outros tipos de trabalho para ganhar o meu sustento e o da minha família. Gravei um áudio onde relato meu currículo de trabalho. Nele está tudo o que eu faço e tudo o que eu fiz ao longo da minha vida desde que comecei a trabalhar".7 Ana Gallardo, na equiparação entre "minhas obras" e "outros tipos de trabalhos", estava recuperando, seguindo Didi-Huberman, o sentido modesto de obra, "essa palavra do trabalho", com que se designa, conforme o Dicionário Histórico da Lingua Francesa que ele cita, "em primeiro lugar um objeto criado pela atividade, o trabalho de alguém, assim como a ação, as operações que resultam nesse objeto" ("A obra" 7). Do mesmo modo que no poema de Aguirre, seremos testemunhas do começo da vida laboral, embora aqui com uma projeção maior, menos focada e detalhada. Nos dois casos não há poesia nem arte nos empregos. Será o trabalho posterior com essa falta que fará dela parte de uma obra e fundamente a poética de cada um dos dois. "Não lucro com a venda de minhas obras; por isso, eu tenho que fazer outros tipos de trabalho para ganhar o meu sustento e o da minha família",8 também poderia ter afirmado com certeza Pablo Aguirre. Para Alan Pauls, cv laboral foi uma das obras mais instigantes de Un lugar para vivir cuando seamos viejos, a retrospectiva que o Museo de Arte Moderno de Buenos Aires dedicara à artista rosarina em 2015 e 2016:

É um relato laboral, ou melhor, é um relato sobre a alimentação, de mera sobrevivência, no qual a arte, se aparece, aparece só como um mundo ideal ou como um horizonte inacessível, e cujos marcos compõem o cenário de insegurança típico do mundo do trabalho contemporâneo.9 (s. p.)

Começava Pauls descrevendo a obra. E continuava:

As escassas faíscas de adrenalina que animam esse mapa da fragilidade do emprego são alguns meses como contrabandista de matérias-primas para bijuteria entre a Argentina e a Cidade do México (onde a artista viveu por alguns anos) e outras, também no D. F., como "representante de artistas de cabaré". Gallardo recita seu registro de trabalho sem ênfase, fiel à impressão subsintática e administrativa do gênero cv, e delega na repetição e na acumulação (quantos call-centers pode atender um artista contemporâneo?) o humor e a crueza paradoxal de uma autobiografia onde a arte foi despejada por necessidade. Diferente é o tom da ficha que comenta a obra, duradoura, estóica, pouco sentimental, sem um pingo de ironia ou distância: "Não lucro com a venda de minhas obras", escreve Gallardo, "por isso, eu tenho que fazer outros tipos de trabalho para ganhar o meu sustento e o da minha família.10 (s. p.)

Nesse mundo precarizado, a arte está localizada além ou aquém das necessidades e da sobrevivência. Mas é numa relação de complementarie-dade, não opositiva, que aparece o vínculo trabalho precarizado - arte: porque existiram esse sem-número de trabalhos é que existe o conjunto das obras de Ana Gallardo. Desse modo, as suas obras, a partir de cv laboral, não podem ser separadas nem isoladas das condições precarizadas do trabalho. Encontramos aqui, como antes nos diários de Casas, a figura do artista "pathético":

Não é estranho que um artista não lucre com sua arte (talvez essa seja a única fusão entre arte e vida que a milagrosa arte contemporânea ainda não está em posição de garantir). O que é estranho é a lógica de uma vida dupla tão extrema, quase uma super-heroína, na qual Gallardo se coloca (vendedora de planos médicos durante o dia, protagonista de bienais à noite), e a maneira como ela transforma essa desinteligência social-sem dúvida comum a muitos artistas, embora nunca esteja tão visível quanto no caso dela-no objeto de um anseio auto-representacional pelo qual se filtra uma figura que acreditávamos extinta: a figura do artista que sofre. Se a imagem de Gallardo algemada na recepção de uma empresa ou na venda de planos de celular nas ruas parece injusta, não é tanto porque testemunha as misérias da insegurança no trabalho, da hiper-flexibilidade e da desregulamentação (tendência da qual o artista contemporâneo é menos vítima do que pioneiro), senão porque postula que não ser o dono de seu tempo ou ser fiel ao seu desejo é o drama máximo que um artista (contemporâneo) pode sofrer.11 (Pauls, s. p.)

Apesar disso, o que lê Pauls em cv laboral não é tanto esse conjunto de condições senão a alienação do tempo que sofrem os artistas contemporâneos. Problemática essa que é central no raciocínio artístico de César Aira, formulada sob a forma da ocupação do tempo, e que eu acho indissociável da maneira em que foi colocado o vínculo arte-vida, excepcionalmente, nessas obras. Pauls não questiona o fato de que os artistas não vivam da arte que fazem porque, talvez, não a considera um trabalho. E por isso, nessa vida dupla que marca cindida, há sofrimento. Porque a arte precisa, para ser realizada, sacrificar tempo em trabalhos mal remunerados e alheios ao interesse pessoal, dado que nem é considerada um trabalho e, precisamente por isso, fechando um círculo vicioso, não é justamente recompensada. Na entrevista com Gabriela Cabezón Cámara incluída no catálogo da retrospectiva do mamba, Un lugar para vivir cuando seamos viejos, Ana Gallardo confessa as dificuldades daquela vida precária: endividamento constante e crescente, falta de serviços básicos para viver (água, luz, gás), as vezes sob a condição de migrante e com uma filha a seu completo cargo. Será dali, da falta, da desgraça e do des-prezo, que tirará as forças para construir as obras futuras (as reuniões de dança ou karaokê, a construção de uma escola para a velhice): "Trabalhamos a vida toda fazendo qualquer coisa, agora vamos fazer o que queremos fazer"12 (citada em Cabezón Cámara 40). A preocupação de Ana Gallardo com a velhice, nesse sentido, não pode ser pensada longe dessa questão: a instabilidade da vida, causada pelas condições laborais precárias, levou ela a conceber a ideia de um lar de idosos próprio.

Os prêmios

A descrição da precariedade da sua vida nos anos noventa feita por Ana Gallardo aparecia também num dos livros que o senhor Camaratta, talvez, comprou em oferta: Música mala, de Alejandro Rubio, ganhador do primeiro Prêmio do Concurso Hispano-americano de Poesia vox, em 1997. No segundo poema do livro, "La información", liamos:

Terça-feira quatro, a nova lei

ainda se debate, 99 %

de umidade. O apé cheira a couve-flor,

em cento e vinte e quatro pranchas a gordura

crepita, as famílias se movem para a mesa

e brincam com a faca, o garfo, o copo, a colher. Eu estou liquidado. Meu filho também, por outro lado; mas ele

não deve saber isso, deveria achar que ainda há espaço

entre aqueles que são, vão, vêm,

se movem, constroem. Para salvá-lo

do tédio do bairro euzinho construí

um bunker na sala; sentado

atrás da metra soviética assistimos o dia todo

televisão à cabo.

Quinta-feira oito, a lei não saiu, metade da cidade

respira com alívio, a outra metade

pica o olho enquanto tenta pegar

outro pedaço de carne. Sábado seis

ou sábado sete, o bebê já está engatinhando, resistimos

com a última faixa de munição; tenho medo

de que cortem a luz, abaixem o martelo

e o anúncio chegue na forma de um uivo

de leitão sangrando até onde eu estou

com a mochila nos pés, o bebê nas costas,

mordendo comida fria.13 (11)

Costurado como se fosse um diário, o poema entretece as notícias que chegam de fora - a sanção de uma lei, o clima - com o que acontece dentro da casa - o iminente despejo da família. A esfera pública da grande política nacional atravessa o espaço íntimo do lar, já ameaçado desde outras frentes. O pai sabe que não há alternativa, nem para ele, nem para o seu filho. A televisão, e o cenário que resguarda ela, parecem ser as defesas contra esse mundo que não cessa de anunciar o fim. A condena já foi decretada, embora as sanções não cheguem. Na iminência da catástrofe íntima, o pai não chega a compreender que esse seu estado precário - e não nenhuma outra ameaça que chegue do mundo exterior batendo a porta - constitui a condena mesma.

No poema seguinte, "Vendedores", aparece a dúvida sobre o tempo por vir que constitui a essência cronotópica da precariedade:

Sendo difícil saber se está chegando

para nós um futuro calculado

ou um passado que não vai retroceder, quem

dos dois se moverá primeiro?14 (Rubio, Música 12)

Melhor dizendo, essa configuração temporal é imediatamente anterior à configuração própria do tempo precário porque pelo menos aqui existe uma dúvida sobre o plano do futuro. O tempo da precariedade é o tempo que o Punk nos anos de 1970 anunciou, mas numa acepção perversa: no future. E nesse estado de coisas, o jovem artista conforme aparece em "Médici" deve someter não tanto seu "currrrr / rículum vitae" senão seu corpo à Fundação e seus velhos dirigentes se quiser sobreviver. A reflexão sobre a literatura, por outro lado, é realizada pelo jornalista de Crónica, médio de comunicação (na época, jornal e canal de tv) de tipo sensacionalista, que na sua folga escreve:

porque o realismo social nos ferrou,

nos tratou como idiotas, e por realismo

mágico, bom, enfim, melhor

o da Tropicana: é melhor, mais real,

visceral.15 (Rubio, Música 17)

A partir daí, entre o poema "12" de Espantapájaros e a Refalosa, lembranças peronistas e a cor vermelha do sensacionalismo, o poema avança até acabar escolhendo a lógica cor de rosa do romance sentimental. A eleição do jornalista não será nem opathos, nem o tropos: apenas o amor fugaz enquanto na cidade transitam as viaturas. Daniel García Helder lia nos personagens de Música mala, como lerá mais tarde em "Homero", música e videoclipe de Viejas Locas ("Aspectos" 131-148), uma galeria de "infrahumanidad": "esmagados sob uma camada anacrónica de determinismo naturalista, tornam-se interioridades alienadas, singularidades indesejadas, entidades regressivas que se reproduzem assexuadamente, por simples bipartição"16 ("Ensayo" 28). "Infrahumanidad" poderia ser o qualificativo kafkiano e argentino para precariedade.

O espaço de "La información" é similar daquele com que abre Punctum, de Martín Gambarotta, outra coletânea de poemas de personagens dos anos de 1990, vencedor aliás de outro Concurso Hispano-americano de Poesia, no caso, daquele organizado pelo Diario de Poesia em 1995, publicado um ano depois, em 1996:

Um quarto

no qual o espaço do teto é igual

ao do piso, que por sua vez é igual

ao de cada uma das quatro paredes

que delimitam um lugar da rua.17 (9)

Nos poemas titulados apenas com números, com dificuldade se adivinham as cenas fragmentadas do Guasuncho, Cadáver, Hielo, Gamboa ou Confuncio, dentre outros,18 inseridas no devir aleatório dos seus dias, "nas horas sem trabalho / arrastadas pelo espanto"19 (24). Os trabalhos, nessas sequências, aparecem como lembranças inverossímeis e longínquas de outro país: "vender bíblias para o Ministério / das Ondas de Amor e Paz" (12), "O trabalho de Fulano e Mengano numa oficina montando chaveiros / colando bonequinhos de Jesus nas cruzes / i.n.r.i. de plástico" (18),"st [foi] criar gansos para Venado Tuerto"20 (24). País esse que, no caso de muitos deles, "relíquia viva / do museu da subversão"21 (69), veio depois da militância política da esquerda armada, e que convive de modo cínico ou, quanto menos, bizarro com o neo-liberalismo predominante da época.22 "Todos os personagens", escreve Ana Porrúa numa nota de rodapé, "ingressam ao texto no momento em que deixam o mundo político; esta é o único relato de origem que aparece deles"23("Punctum" 110):

Hielo conversa com La Drogona de Palermo

que foi na casa dele para pedir um pouco de grana.

"Bora", diz Hielo, "coloque sua camisa

do Macaco andando em Mula,

vamos queimar esses livros

e vamos ver a luta de classes

nos bares da noite, àqueles que se acham

pedreiros por levantar quatro sacos, pedir grana

para teu namorado que tem um chaveiro da CNN,

esse que paga 10 dólares por um sanduíche

e depois tem problemas com a barriga

ou para o outro cara que você conhece

aquele que traz jogadores da

Federação Boliviana de Futebol.24 (Gambarotta "Punctum" 48)

De Hielo, em outro poema, se dirá: "Botar água nalgumas plantas desagradáveis / foi seu único ato na primeira pessoa naquele dia"25 (57). O poema registra um perambular pela cidade sem rumo nem sentido. Nesse panorama de des-subjetivação o que falta, além do sentido, parece ser, é o emprego. As horas são horas desocupadas:

Janeiro, janeiro,

os guri zerado e sem trabalho:

tudo é simples se a gente

tem medo no jogo sujo.26 (Gambarotta 50)

O que é que é esse jogo sujo? Esse poema, o número vinte, descreve todas as pequenas ocupações que fazem aqueles que não tem, precisamente, emprego no verão. O poema ocupa o espaço da página dessas vidas desocupadas, des-obradas, num leque de possíveis prefixos da negação.

Do mesmo modo que, mais tarde, em Música mala, o trabalho da arte é, dentro desse mundo em decadência, criticado duramente e até ridicularizado:

Então, ao invés de virar artista

procure uma profissão nobre que gaste suas mãos:

carpinteiro toca na madeira. Muda a madeira

trabalhada com suas mãos e ferramentas

por grana. Grana por madeira

não ideias por madeira. Grana

por uma cadeira trabalhada

com tuas mãos.27 (Rubio 61-62)

Esse poema que, antes, brincara com a legenda "disco es cultura" que levavam impressos os cds naquela época, questionando, precisamente, o conceito de cultura, como coisa filtrada, própria tanto dos fascistas quanto dos democratas, e que, antes ainda, afirmara: "Todo ato é literário / e isso é nojento. Tudo / implorando sinceridade",28 acaba distanciando a arte do trabalho, no sentido de ofício, comparando-a aliás com o ofício bíblico por excelência. Sentindo "[l]a presión / atmosférica del pasado" (79) no final do século, as cenas de Punctum, "el Martin Fierro de nuestra generación", conforme Washington Cucurto (citado em Soto 283), quiseram fazer emergir, como dizia a anónima contracapa da reedição de 2011, "como un cuerpo fondeado en el Río de la Plata, el fundamento del orden liberal: la masacre de los disidentes". O punctum do poema, então, dá a ver um retorno traumático, segundo Mario Cámara, "o retorno de uma história que se recusa a ser "enterrada", que como uma pulsão insiste e inscreve os anos setenta nos anos noventa através de estilemas e fragmentos"29 (113). Os anos noventa tentaram fechar a pacificação social que o neoliberalismo precisava para terminar de apropriar-se do cenário político. As sobrevivências do fundo do rio proporcionaram outra leitura da história, evidenciando o preço em vidas dessa nova ordem nacional.

Aura cartonera e berreta

Ainda não se chamando de Washington Cucurto, Santiago Vega ganhou a edição seguinte do Concurso Hispano-americano "Diario de Poesía", em 1997. A edição número quarenta e um da revista, do outono daquele ano, traz uma coletânea do livro vencedor, Zelarayán, aquele que de fato significaria pouco tempo depois sua estreia na poesia, publicado em 1998 pelas edições Deldiego. Já a primeira parte do primeiro poema da coletânea, "Una mañana terrible", resulta significativa demais para nosso percurso:

Às dez da manhã

recitando seus melhores

poemas

assustando os caixas e mulheres idosas

com seu uivo

Ricardo Zelarayán

foi arrastado pelo cabelo

por seguranças

por jogar o espinafre

no chão,

por tirar as tampas dos iogurtes

de litro.

Ricardo Zelarayán

foi arrastado pelo cabelo

por andar feito um diabo

entre as gôndolas

imprimindo medo

nos meninos e meninas

crianças que têm

o sexo e o roubo

nos olhos

meninas que gozam

do gozo

do libidinoso

monstro

que pensa

no doce retorno

fulgor e deleite

do ânus virginal.

O monstro

foi despejado

do supermercado

por ter maus hábitos

e ser improdutivo

para a sociedade

para a Grande Empresa Nacional

dos Mendes.30 ("Zelarayán" 6)

A estranha cena protagonizada por um então esquecido, ou quanto menos: pouco lido, poeta, Ricardo Zelarayán, se passa no contexto onde proverbialmente trabalhava Cucurto, conforme seu mito autoral. Um Zelarayán beat e fora de si, profundamente erotizado e animalizado, entra no supermercado recitando seus versos como grito de guerra e é detido imediatamente pela segurança do local. Nesse contexto, a oscilante voz do poema, politicamente incorreta, que sabe tanto quais são os melhores poemas de Zelarayán quanto o que esconde o desejo das crianças que o observam, acaba incorporando o discurso repressivo do capital: o poeta é um ser monstruoso e improdutivo para a Sociedade e a Grande Empresa Nacional. Já na terceira parte do poema, Zelarayán estará preso numa gaiola dentro do supermercado, se lembrando nessa reclusão dos estupros a menores que fazia pelas noites. No poema seguinte, narrado com a alegria das interjeições dos quadrinhos, "De cómo son hechos los arco iris y por qué se van", pelo qual Cucurto será acusado, apenas poucos anos depois, de xenofobia e pornografia, um jovem vindo de Salta é demitido por um coreano dono de "uma oficininha / para cortar pano, na rua Paso / centro do Once"31 (7), por reclamar o pagamento do dia logo depois de ter acabado a primeira jornada laboral. À negativa do chefe, o saltenho responde com violência, matando o coreano com a prancha quente e estuprando a filha dele. Numa resenha de El grano del invierno, de Pablo Chacón, Santiago Vega afirmara, alguns anos antes de aparecidos esses poemas, que Chacón "tenta capturar o retrato invisível de uma época atroz"32 ("Retrato" 37). Em seu caso, na abjeta e jovial visibilidade, poderíamos pensar, estaria o seu modo de plasmar a mesma atrocidade da época.

Lembrando o contexto de escrita de Zelarayán, recentemente, para o livro de entrevistas com Facundo Soto, Santiago Vega já definitivamente Washington Cucurto dizia:

Eu trabalhava num supermercado. Eu o escrevi aos poucos entre as gôndolas, enquanto trabalhava. Eu era responsável por um setor, que era o setor do sacolão, e nesse setor eu tinha que fazer uma enorme gôndola, com cerca de 50 metros de comprimento por 2 metros de altura, e tinha que carregá-la com legumes: acelga, espinafre, aipo, repolho branco, repolho roxo, alface. Eu montava essa gôndola, que é uma gôndola difícil na área porque são materiais delicados. Eles me deram um bloco de folhas de papel, onde eu tinha que estocar a mercadoria, o que estava e o que estava faltando na gôndola e na sala fria. Que houvera cebolas, sacos de batatas, batatas doces. Na sala, está tudo o que você precisa frio: kiwis, maçãs, peras. Eu ia anotando o que estava faltando. Atrás daquele bloco de notas, escrevia os poemas. Enquanto trabalhava, eu escrevia. Foi um trabalho muito emocionante, muito físico.33 (Citado em Soto 10-11)

Escrito, então, durante o tempo de trabalho no supermercado, no anverso das notas para o stock diário de um dos setores, segundo ele, mais delicados, Zelarayán aparece associado a esse emprego carregado de paixão, corporal em todo sentido. É um "produto", dirá na mesma entrevista, desse mundo. Cucurto, no entanto se defina como "uma pessoa trabalhadora" ["una persona trabajadora"] (citado em Soto 15) e até deva seu pseudónimo ao fato de ser um empregado de supermercado,34 rubro no qual trabalhou de 1989 até 2003, quando saiu Cosa de negros e alcançou certa consagração, seja um dos editores fundadores da Eloísa Cartonera (cujo primeiro local foi, aliás, uma verdulería) e acredite que "ser artista não é algo diferente de ser outras coisas"35 (citado em Soto 90), não define à escrita como um trabalho:

Sim, para a maioria dos escritores é um trabalho bonito, talvez o trabalho que eles merecem e sempre desejaram. Nunca foi um trabalho para mim. Quando me sento para escrever, nunca me sento para trabalhar. É que tenho uma forte consciência operária e sei que o trabalho em muitos aspectos é outra coisa e em muitos outros aspectos também tem coisas semelhantes ao fazer artístico, por assim dizer. Há também uma questão de figuração: existem pessoas que tiram um cartão de escritor, publicam livros, fazem entrevistas, vão a feiras internacionais, mas não escrevem ou escrevem apenas para cumprir. Não aceito escritores que não escrevem, para mim são impostores. Mas nunca pode ser um trabalho, nem mesmo no caso de César Aira, que escreve todos os dias sem parar. Escrever é uma coisa e trabalhar é outra.36 (Citado em Soto 92)

E, embora sua renda fixa provenha das crónicas sobre esportes que escreve para o site da ESPN, continua sendo taxativo: "escrever é uma coisa e trabalhar é outra". De um lado do bloco de notas está o registro diário do stock de frutas e verduras e do outro, como uma coisa feita às escondidas, a poesia. De um lado o deve, do outro o haver. Para Cucurto, a poesia é "mais uma atividade"37 (citado em Soto 134) - como reza aliás a nossa epígrafe, tirado de um dos seus poemas, "Escrever poesia" - ligada mais as emoções e experiências do que a qualquer tipo de profissão, ligada mais ao espaço íntimo-privado do que ao exterior: se num momento afirma que "o ato de escrever é um ato de intimidade, quase privado até"38 (citado em Soto 190), logo dirá, depois de saber e entender que escrever é o que ele quer para o resto dos seus dias, que "não vou trabalhar mais, é uma decisão política"39 (citado em Soto 191). Porém, é interessante situar a emergência de sua figura no contexto dos anos 1990-2000 para compreender melhor o estado de forças:

Na Argentina, a precariedade do emprego, manual e intelectual, que aconteceu durante a ascensão do neoliberalismo na década de 1990, transformou a profissionalização do escritor (uma característica fundamental da arte autónoma no início do capitalismo industrial) numa multiprofissionalização: o escritor, diante da impossibilidade de viver num mercado cada vez mais marginal, dominado por empresas multinacionais interessadas em garantir a produção nas vendas, deve trabalhar em outras coisas. Ele vira não só um produtor, mas um trabalhador (vítima precária, geralmente MEI, de contratos "lixo" elaborados por editoras e pelo novo mercado de gestão cultural do estado). Então, o escritor trabalha na literatura ou na cultura - desde que tenha o privilégio de estar entre as seletas fileiras dos funcionários do trabalho intelectual. O caso de Cucurto é emblemático: um ex repositor de supermercados que, através de talento, esforço, criatividade e atrevimento fundamental no mundo editorial subterrâneo (editor de várias revistas, como La novia de Tyson, dedicada à divulgação da literatura latino-americana contemporânea) acedeu a gestão cultural como produtor de eventos da Casa da Poesia da Cidade de Buenos Aires e daí montou seu próprio empreendimento, La Cartonera, aliás, que começou nas longas horas das vigias noturnas na casa de Evaristo Carriego (sede da Casa da Poesia), onde amigos e colegas passavam a noite usando as instalações.40 (Palmeiro 211)

O percurso de Cucurto evidencia as transformações do mercado laboral argentino e o devir da sua figura está entrelaçado ao da cultura daqueles anos. E ainda assim, se continua obliterando esse devir de trabalhador do mercado a artista multitasking, como já Alan Pauls tinha denominado a Rosario Bléfari. Não considerando a escrita como um trabalho, sua extensa obra seria um elogio económico-político à preguiça. Nesse sentido, quando questionado pela relação entre arte e dinheiro, responderá:

Nenhuma. Eu acho que o artista tem que fazer a sua parte, estar imbuído de seu trabalho e pronto. Não pode ter esperanças mercantis, não estou dizendo que não existam, mas, bom, a arte não pode ter um espirito mercantil. Pelo contrário, deve ser um espaço de diálogo, experiência e reflexão. Um lugar também de inspiração e de aproximação com o outro.41 (Citado em Soto 289)

Se a escrita não é um trabalho, e o que ele faz é, basicamente, poesia e narrativa, ele não se assume como um trabalhador e, por isso mesmo, não pretende ganhar dinheiro nessas atividades. Esse chamado trabalho do artista não entra dentro dos padrões do trabalho enquanto emprego e se aproximaria ao sentido de dedicação a uma determinada tarefa e não a transformação material do mundo. Aliás, na editora em que ele participa, Eloísa Cartonera, os autores cedem os direitos autorais e não percebem ganho algum, destinado em grande parte aos recolhedores de papelão da cooperativa.42 Mesmo assim, continua chamando muito a atenção que, ainda nele, cuja produção sai do mundo do trabalho, e isso é nela tematizado constantemente, prevaleçam ideias de cunho romântico no fazer artístico. Há um descompasso entre as concepções da escrita e do trabalho: se no limiar da virada de século ou, mais precisamente, no crítico 2001 argentino, para mencionar um acontecimento, o trabalho como emprego mudou abruptamente, e a Eloísa Cartonera é um claro exemplo disso,43 a poesia ainda parece estar atrelada a um estado de forças diferente e até arcaico. Serão os poemas, como acontece por exemplo no caso de Paulo Leminski, uma forma adorniana de resistência ao capital e à mercantilização? Será considerado o trabalho que o poema requer como aquele que a Eloísa Cartonera propunha, isto é, como meio e não como fim, como motor da vida e não como simples ferramenta para ganhar dinheiro? Ou é, antes bem, a obra de Cucurto uma ode ao ócio e não ao trabalho que pertence, conforme Leonel Cherri, a uma nova imagem, na que "o trabalho literário não seria mais um tipo de trabalho, senão um ofício absurdo, ruim, improdutivo, queer ou até trash" (139) definido "não mais pela disciplina e pela acumulação temporária, pela originalidade e a qualidade criativas; mas pelo lazer e a improdutividade; pela des-criação e a ineficácia"44 (139)?45 A figura do poeta, por fim, se define por aquilo que faz (como o resto dos trabalhadores) ou por aquilo que ele é? Apagar a primeira definição e optar pela segunda implicaria atribuir, a partir de uma "vida de artista", uma aura ao poeta, adquirindo com isso sua subjetividade o estatuto de instância criadora de valor.

Nessa direção cucurtiana pode ser lido Poemas para no ir a trabajar, de Fernando Aíta, publicado em 2019, cuja epigrafe reza o seguinte: "O principal objetivo deste panfleto é que as pessoas trabalhadoras se inspirem e não forem trabalhar"46 (5). A coletânea de poemas se apresenta como um conjunto de motivos, desculpas e justificativas para se ausentar do emprego e desfrutar um dia ou vários em casa, fazendo nada, qualquer coisa que não seja trabalhar, produzir, se someter a uma hierarquia. O poema, nesse estado de forças, vira espaço de resistência, da utopia, do humor, do ócio e da improdutividade, da inoperância: há poesia porque não se trabalhou, porque o sujeito ficou com a sua primeira e, talvez, única propriedade: o tempo.

Outro sentido, nessa direção, encontramos na aproximação às artes visuais que o próprio Cucurto começou a desenvolver nos últimos anos. No meio da montagem da sua mostra Poemas graficados, realizada na Galería Jungla Hábitat de Buenos Aires, durante 2014, dirá na conversa com Facundo Soto:

E se alguém quiser comprar uma obra, Cucu, qual o preço?

O que custa um livro numa livraria.

Mas, Cucu... Mínimo uns 800 pesos, se você quiser fazer algo popular, para que qualquer pessoa que goste do que você faz possa comprar algo, mas pelo preço de um livro?

Não, não Porque a 800 pesos apenas os ricos poderiam comprar, eu não quero desenhar para os ricos, quero que qualquer um tenha um desenho em casa, certo? Essa é a ideia. Caso contrário, quantos serão capazes de comprar? Fora essa ideia da arte mercantil... Fazer uma obra e vendê-la por milhões de dólares, me parece uma total obscenidade... Não gosto disso. A brincadeira deixa de ser engraçada...47 (Soto 320)

A arte tem que estar ao alcance de todos e não só dos ricos, aliás, melhor longe deles. O preço de venda de uma de essas pinturas deveria ser igual àquele de um livro, produto massivo ou, no caso da Cartonera, produto quase único (as capas são coloridas a mão, uma por uma, cada uma distinta da outra, porém as folhas do interior são simples xerox) no entanto barato. Quando foram expostas na mostra "Deseo & ternura", na pequeníssima casa-galeria de Martin Llambí, um apartamento de um ambiente frente ao Obelisco portenho, em março de 2018, visitada por uma ou duas pessoas por vez, prévio agendamento por e-mail, as pinturas eram oferecidas a "preços populares": 500 pesos argentinos (Damore s.p.), isto é, na época, uns 24 dólares norte-americanos. Nesse sentido Cucurto se aproxima à imaginação do artista presente num dos, conforme Martín Pérez Calarco (23), cem poetas e escritores que menciona nas entrevistas, o colombiano Jaime Jaramillo Escobar. Em "Ciro de Medellín", por exemplo, retrata a vida de Ciro Mendía, poeta da fome, pobríssimo, no meio da pujante cidade de Medellín:

Mas, apesar de ele ser de Antioquia, ele não tinha depósitos nem poupança, nem

propriedades, não estava associado com ninguém nem estava autorizado a ter cartão de crédito,

isto é, não era ninguém,

porque nesta terra onde cada poeta se considera o melhor do mundo, ele só ousava ser o melhor da sua rua.48 (18)

"Sem um prato para comer, / também não tinha o que comer nem comia"49 (18), o poeta morador da rua com sua vida diária se enfrentava ao modo de ser dominante da cidade. Ou por exemplo, o poeta que, em "Perorata", enuncia sua poética, descrevendo o ofício de poeta de rua como se fosse o daqueles que fazem truques de prestidigitação, antes de ter que ir embora pela proximidade da polícia.

A pobreza é um dos tópicos da poesia de Jaime Jaramillo Escobar, a pobreza entendida enquanto fruto de uma ordem de domínio de uns sobre os outros e assumida não como falta e sim como defesa e arma de combate. Em "Visita de la reina Isabel a Colombia", tem lugar um diálogo entre os séquitos da rainha e os habitantes do país que, embora ofereçam todo quanto dispõem, não parece ser suficiente para os membros reais. A última das coisas que eles possuem, essa sim, não é oferecida: "Mas não tente tirar vantagem da nossa / pobreza. A pobreza é a nossa última arma"50 (58). Em outro diálogo, desta vez entre Evangelina e Deus, a emergência estará mais na pobreza do que na arte. E, por fim, perto da eleição do valor das pinturas de Cucurto, leremos em "El canto del siglo":

Eu vou cantar com os pobres, longe, na margem do rio, onde não nos escutem os ricos,

Porque se eles nos ouvirem, vão querer comprar nosso canto e depois o vender

a nós mesmos e fazer a venda do século.51 (67)

O canto não se vende, dirá o próximo verso. A riqueza, ela se canta a si própria. Entre Jaime Jaramillo Escobar e Washington Cucurto, podemos ler o conceito de "berreta" com que Marcelo Díaz, membro do grupo de Poetas Mateístas de Bahía Blanca nos anos de 1990, fundamentou seu primeiro livro, editado em 1998 pela editora Libros de Tierra Firme. Em conversa com Ana Porrúa, dizia: "O berreta é o mesmo que os novos ricos reverenciam como objetos kitsch, mas comprado num Tudo x 1,99 $"52 ("Contratapa" s. p.). A categoria do "berreta" daria a ver a valoração dos objetos segundo apropriados por uma determinada classe. Conforme Ana Porrúa, "o berreta também tem a ver com a pobreza, com as margens do mercado, com aquilo que perdeu sua aura"53 ("Contratapa" s. p.). E, se o primeiro livro de Díaz é Berreta, descobrimos ali uma poética que começa discutindo sua própria aura para, a partir disso, ler o panorama político imediato, aquela "normalidade inabitável" ("Poemas" 2). Relidos pela lente berreta, Marcelo Díaz reescrevia célebres poemas de Rubén Darío, Wallace Stevens e Charles Baudelaire, fazendo de um dos animais tradicionais da poesia, o cisne, apenas um elemento degradado à decoração esquecida na mata do jardim,

[ú]nico sobrevivente

de um país difícil

num momento difícil;

indiferente ou digno,

quem se importa?54(Berreta 11)

O outrora galhardo símbolo da poesia, degradado a mero cimento berreta cagado pelos pombos, sai da alta poesia para ser parte de um cenário em ruínas.

A Arturiada

Muitos dos poetas até aqui lidos apareceram agrupados na assim chamada "Arturiada", Monstruos. Antologia de la joven poesia argentina, a cargo de Arturo Carrera, publicada originalmente no site do Instituto de Cooperación Iberoamericana (ICI), em 1998, e editada em papel em 2001 pelo Fondo de Cultura Económica. No prefácio, Carrera se justificava: "definimos hoje a presente antologia ou florilégio como uma seleção do monstruoso, isto é, do que é exibido além da norma (monstrum) como a palavra que se dispersa e se espalha apenas confiada no seu sucesso estético (micropolítico) teleonômico"55 (11). Seguindo a hipótese de Leónidas Lamborghini de que grande parte da poesia e da arte contemporânea "caracteriza-se por sua percepção particular do monstruoso como um fato cotidiano, como mundo alienado, como costume"56 (citado em Carrera 11), Carrera recortava dos seus jovens contemporâneos um corpus de poesia a partir da sua ideia de "acontecimiento fulgurante", medido "a plena pérdida" (12). Lembrando Murilo Mendes, na sua resenha da antologia, Raul Antelo dizia: "É possível ler ali uma das peculiaridades do monstro: seu prazer na solidão. A ideia conota uma ameaça: o monstro coloca em perigo o sistema de reproduções e linhagens; e com ele periga o andaime alfabetizado, a cena da escrita"57 (s. p.). As duas definições do monstro se encontram numa terceira, dada por César Aira:

O monstro é único, não tem com quem se casar nem com quem procriar descendência. O monstro é sempre como que um símbolo da extinção, porque o monstro constitui uma espécie, mas uma espécie constituída por um só indivíduo... Por isso costuma-se dar-lhe o dom da imortalidade, costuma-se fazê-lo sobreviver de alguma maneira distinta daquela que nós encontramos, que é a de nos reproduzirmos, e por isso os monstros têm, enfim, essa melancolia do ser que se sabe condenado a uma extinção definitiva, mas que não é de todo definitiva: a posteridade do monstro é sua legenda. Nisso o monstro é um ente quase artístico, porque o único que pode deixar é a história que foi.58 ("Monstruo" 337)

Além dos poemas e poetas já trabalhados aqui, do conjunto de Monstruos surgem outros indícios ou sobrevivências ameaçantes nos quais gostaria agora de me deter.

Depois de uma breve síntese bio-bibliográfica, cada poeta comentava alguma coisa - se queria - sobre sua ars poética. Ariel Schettini afirmava na sua que "a poesia cria a ilusão de ser - embora não seja verdade - o último lugar onde existe um modo de produção artesanal de objetos estéticos"59 (178) e que, por isso, no contemporâneo, "se transformou no prisma privilegiado para detectar a área mais lábil da mudança social"60 (178). Por sua vez, Santiago Llach fechava a sua dizendo: "Nasci um pouco antes da crise do petróleo. Logo depois, o devir histórico deu origem ao aparecimento, no aqui e agora, do terror. Para me recuperar, leio, amo e copio os clássicos: meus contemporâneos"61 ("Ars poética" 80). Essa situação se fazia evidente no seu extenso poema "Arnaut en Cachaca", ali apresentado. Com epígrafe de Augusto de Campos, explicando como se devia pronunciar o nome provençal, Llach imaginava uma sobrevida quase zumbi do poeta nos anos dois mil portenhos, repartidos entre a política da aliança democrática e a cena da poesia jovem. De algum modo, era uma expansão de Punctum, na trilha proposta pela contracapa anónima da reedição de vox / Mansalva de 2011, relendo os erros do "relato do progresso" e as sobrevivências do menemato no governo posterior, a presidência de Fernando de la Rúa, sobrevivências que não eram mais que a continuidade disfarçada "do processo denominada de reconstrução nacional"62 (83), denunciando um pacto económico com "os executores da violência legal / monopolizada pelo estado e com os donos das estações da tevé"63 (81) e o rol inocente dos artistas:

Os artistas reclamam em espaços livres

cedidos pelo administrador cultural estrela da Administração de la Rúa,

herói vang do inverno democrático

cedido gentilmente ao seu governo

pelo reitor achanchado da universidade secular.64 (83)

Ana Porrúa lia na figura do monstro o leitmotiv da poesia recente, porque ali "se expõem deliberadamente as fissuras do sistema social e político" ("Notas" 125). A paródia do artista, esse monstro, que "para ganhar o seu sustento, escreve relatórios sobre arte " (126), era similar ainda àquela presente no Gambarotta de Punctum ou no Rubio de Música mala.

Num dos poemas apresentados de Martín Prieto, "En la biblioteca, trabajando", temos a rara oportunidade de ler uma afirmação do trabalho de escrita:

O bibliotecário - bonito, magro, gentil

até a exasperação - escreve com letra desleixada

um número de código, uma data, "vai trabalhar?"

TRABALHO // 3 Coisa produzida pelo entendimento.

// 5 Esforço humano aplicado à produção de riqueza.

É usado em contraste com capital.

Sim, vou produzir uma coisa pelo entendimento.

Vou ler, vou comparar, vou escrever, vou trabalhar.65 (143)

A seleção dos sentidos do verbo trabalhar permite definir ao trabalho feito na biblioteca, de índole intelectual, também como um trabalho e, ao mesmo tempo, contrapor isso à produção de capital. Mas o que aparece a continuação no poema não é a evidência da concentração no trabalho senão a dispersão na leitura das inscrições religiosas, afetivas e políticas presentes no edifício da biblioteca. A interrupção do trabalho previsto de antemão permite a escrita do poema, feito durante o tempo idealizado para o trabalho de pesquisa na biblioteca. Porém, e voltando as definições, esse trabalho fruto da dispersão e do acaso é também um trabalho, dado que estão presentes os passos com que o poeta definiu sua ocupação: leitura, comparação, escrita.

A arte poética de Alejandro Rubio é, talvez, a mais lembrada de todas: "La lírica está muerta" ("Ars poética" 160), começava afirmando, de modo polémico. Ampliava:

Pode-se dizer que estamos em um momento de barbárie e que é o dever dos poetas manter a chama acesa por um futuro melhor. Seria necessário responder que a lírica não foi um espírito, mas uma manifestação social, e que valeria mais a pena apostar em uma nova posição diante da linguagem na qual os traços da contemporaneidade são questionados.66 ("Ars poética" 160)

Conforme Martín Prieto, o que Rubio fez foi "dar para a lírica um caráter histórico (a lírica não foi um espírito, ele diz, mas uma manifestação social) e incorpore-a na tradição"67 ("Neobarrocos" 40). O novo olhar dessa tradição devia colocar o presente num primeiro plano sob o fundo do passado. Essa sua intervenção dava a ver um dos gestos da poesia dos anos noventa, assinalando outro lugar possível para a poesia, já não mais simples ornamento estético e sim contestação, provocação, em definitiva, a construção da voz que diz as coisas que a racionalidade emudece.

No seu inacabado Tentativa de uma história da poesia lírica, Herder colocava a hipótese da origem da poesia lírica no "estado mais natural ao homem" (49), a necessidade e a carência dos povos, atendidas pela religião. A poesia, nesse sentido, era efetiva e estava definida pela paixão e pela ação e, por sua vez, o poeta - muitas vezes sacerdote e governante, douto e herói - era um mediador entre a natureza e os homens, de índole sobre-humana e até divina, porque o conteúdo ou modo de apresentação de seus versos ultrapassava a capacidade de invenção dos homens. Nesse estado de coisas, a poesia lírica participava da história e esse era seu valor. Se, agora, seguimos a Rubio e entendemos a poesia lírica apenas como uma manifestação social própria da história da poesia, com a morte da lírica, ele buscava explicitar a ameaça do monstro, ateia e anaurática. No entanto, no 2001 argentino, as mães da poesia voltaram a ser a necessidade e a carência, embora (des)atendidas por outra religião, a religião do dinheiro. A poesia monstruosa trazia consigo alguma sobrevivência do seu passado lírico: a poesia era, mais uma vez, pathos e ação.

A poesia, ou melhor, a ideia de poesia que ainda parece vigorar, está presa de uma distinção dos tempos que já Aristóteles fazia entre um tempo de liberdade, alheio a qualquer tipo de determinação e necessidade, esforços ou preocupações e outro tempo dedicado a produzir o útil e preciso, o tempo de trabalho. A divisão do tempo descansava na existência ou na falta do ócio. O momento da filosofia e, por isso mesmo, da poesia estava além do trabalho, da necessidade e da utilidade. Os homens livres não trabalhavam, os indignos sim, comerciantes, escravos e párias. Se a Reforma protestante modificou a noção de trabalho, depositando nela uma dimensão teleológica de redenção e glória, também mudou a ideia de ócio, agora tempo livre do trabalho (é verdade, já não é o ócio a perspectiva a partir da qual se define o tempo e sim sua contraparte, o trabalho) usado para recuperar a capacidade laboral e voltar, com mais forças, às tarefas. Agora não há mais um verdadeiro descanso do trabalho, apenas pausas. Não há mais um tempo além do trabalho, todo tempo é tempo de trabalho, embora profanado, sem glória nem redenção.

Em "Los poetas del 31 de diciembre de 2001", crónica publicada em El País, de Espanha, César Aira propunha pensar novos valores - porque os valores são históricos e os acontecimentos do dezembro de 2001 argentino tinham mudado nossa história - para esses monstros que exigiam uma redefinição da arte e da literatura desses tempos. A anedota que apresentava para fundamentar seu raciocínio eram os livrinhos de poesia, "gratuitos e fantasmais, acidentes da História que ilustram de modo exemplar"68 (s. p.), que tinham sido impressos graças a promessa de um subsídio do Ministério da Cultura que, crise mediante, foi - no melhor dos casos - pago muito a posteriori e com as editoras quebradas. Esse foi o caso, por exemplo, de Ediciones del Diego ou de Belleza y Felicidad - "o nome já é um programa de resistência"69 (s. p.), dirá dela Aira. Se "[a] arte acaba sempre por ser negociável, portanto aceitável; basta para isso confiná-la nos lugares que garantem sua guarda, ou seja, sua imunidade" (Didi-Huberman, "Comemorar" 55), a garantia que o subsídio público dava a essas obras assegurava sua auratizacão. Porém, a irrupção da crise, a desvalorização da moeda e a quebra das editoriais cortaram o caminho triunfal dos monstros. De todos modos, assegurava Aira, com os valores do passado, esses poemas eram uma fraude. Com os valores do presente, "esses poemas adquirem uma cor de necessidade"70 (s. p.). E se, como afirma Byung-Chul Han, "o dinheiro é um objeto particular, dado que é o valor"71 (24), a proposta de Aira era similar a contemporânea dos Venus.72 Novas definições, novos valores: da fraude à necessidade esteve a monstruosa poesia da virada do século, obras sem rabo nem cabeça,73 que, como as diferentes moedas nacionais e estatais que começavam a circular naquela época, procurava ser outra forma de troca, moeda de escasso ou nulo valor, inestimável em todo caso, interrupção dos fluxos do tempo, busca do tempo usurpado e reconfiguração do futuro, acontecimento fulgurante apenas medido a plena perda, gratuito e fantasmal.

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1Esta e todas as traduções do espanhol são minhas salvo menção em contrário. No original disse: "Darío, parado, grita y gesticula. / Bajo una frazada marrón, / Daniel se ríe y habla de sus novias. / Están borrachos y los que gritan en la cocina, / como diputados, también. / Mi vieja, resucitada, / golpea las ventanas, pidiendo entrar. / Al amanecer, bajo una claridad despiadada; / cigarrillos, libros desperdigados, / platos con comida. / Camino, despacio, hasta el baño; / sé que la desgracia está sobre nosotros, / no ahora, tampoco el año próximo, / todavía somos jóvenes, pero eso / se pierde enseguida. / No tenemos nada, pienso, / mientras me lavo la cara, / ni un oficio, ni una herencia, / ni una casa de sólida piedra" ("Mientras me lavo la cara").

2No original disse: "Estoy formado, disciplinado, / he cometido el peor de los pecados, / me senté a leer al sol /libros que compré de oferta, / porque acaban de poner en venta / a la poesía del noventa".

3"Ni el dinero ni los superpoderes pueden acabar con la angustia", dirá aliás no poema "La Fortaleza de la soledad" (Casas, Últimos poemas 125).

4No original disse: "Y otra tarde de un invierno del setenta / su padre usó por primera vez la mesa familiar como escritorio / durante la noche, con una lámpara pequeña, / para hacer, como él decía, las cuentas: la matemática / necesaria para sostener una familia / como si fuera una pyme" (58).

5"Del Diego foi o bastião dos poetas originalmente reunidos na revista 18 Whiskys. Os livros eram feitos na casa de Daniel Durand, e o trabalho manual desse núcleo resultou na edição de alguns livros importantes para entender aquele tempo: Zelarrayán, de Washington Cucurto, 8 poemas, de José Villa, La pasión del novelista de Damián Ríos, todos eles editados em 1998. Por Del Diego, foi editado, em 2001, um dos livros considerados atualmente como aquele que inaugurou uma nova relação entre linguagem coloquial e género poético: La zanjita, de Juan Desiderio. Em Del Diego, Cecilia Pavón e Fernanda Laguna também foram editadas, criadoras de uma galeria de arte que virou uma meca kitsch que monopolizou grande parte da cena do momento: Belleza y felicidad. Todo o catálogo de Del Diego é uma ampla amostra das diferentes correntes estéticas que surgiram com a marca da poesia dos anos 90". No original disse: "Del Diego fue un bastión para los poetas reunidos originalmente en la revista 18 Whiskys. Los libros se hacían en la casa de Daniel Durand, y el trabajo manual de ese núcleo dio como resultado la edición de algunos libros clave para entender la época: Zelarrayán de Washington Cucurto, 8 poemas de José Villa, La pasión del novelista de Damián Ríos, todos editados en 1998. Por Del Diego se reeditó, en 2001, lo que a esta altura es considerado ampliamente como el libro que inauguró una nueva relación entre el lenguaje coloquial y el género poético: La zanjita, de Juan Desiderio. Por Del Diego también fueron editadas Cecilia Pavón y Fernanda Laguna, artífices de una galería de arte que se convirtió en una meca kitsch que acaparó buena parte de la escena del momento: Belleza y felicidad. Todo el catálogo de Del Diego es una amplia muestra de las diferentes corrientes estéticas que emergieron tras la marca de la poesía de los 90" (Jaramillo, "Cómo editar" 12).

6No original disse: "Todos odiábamos a los jefes: / al gordo Verdaguer / Verduguer / le escupíamos / el dompedro / que pedía de postre // Todos nos quejábamos / de lo poco que se ganaba: / yo también me quejaba / pese a que cualquier plata / me parecía mucha".

7No original disse: "No vivo de la venta de mis obras, por lo tanto tengo que hacer otro tipo de trabajos para ganar mi sustento y el de mi familia. Grabé un audio donde narro mi currículo laboral. Todo lo que hago y he hecho a lo largo de mi vida desde que comencé a trabajar".

8No original disse: "No vivo de la venta de mis obras, por lo tanto tengo que hacer otro tipo de trabajos para ganar mi sustento y el de mi familia".

9No original disse: "Se trata de un recorrido laboral, o más bien alimentario, de mera supervivencia, en el que el arte, si aparece, aparece apenas como un mundo ideal o un horizonte inaccesible, y cuyos hitos componen el paisaje de inseguridad típico del mundo del trabajo contemporáneo".

10No original disse: "Los pocos chispazos de adrenalina que animan este mapa de la fragilidad laboral son unos meses de contrabandista de materias primas para bijouterie entre Argentina y el D. F. mexicano (donde la artista vivió unos años) y otros, también en el D. F, de "representante de artistas de cabaret". Gallardo recita su prontuario laboral sin énfasis alguno, fiel a la impronta subsintáctica y administrativa del género cv, y delega en la repetición y acumulación (¿cuántas centralitas telefónicas puede jactarse de haber atendido un artista contemporáneo?) el humor y la crudeza paradójica de una autobiografía donde el arte ha sido desalojado por la necesidad. Distinto es el tono de la didascalia que comenta la obra, sufrido, estoico, apenas sentimental, sin una pizca de ironía o de distancia: "No vivo de la venta de mis obras", escribe Gallardo, "por lo tanto, tengo que hacer otro tipo de trabajos para ganar mi sustento y el de mi familia".

11No original disse: "No es raro que un artista no viva de su arte (quizás ésa sea la única fusión arte-vida que el milagroso arte contemporáneo no está todavía en condiciones de garantizar). Lo raro es la lógica de doble vida tajante, casi de superheroína, en la que Gallardo se coloca (promotora de prepaga médica de día, protagonista de bienales de noche), y el modo en que transforma esa desinteligencia social —sin duda común a muchos artistas, aunque nunca tan a la vista como en su caso— en el objeto de un afán autorrepresentativo por el que se filtra una figura que creíamos extinguida: la figura del artista que sufre. Si la imagen de Gallardo engrillada en la recepción de una empresa o vendiendo planes de telefonía celular en la calle suena injusta, no es tanto porque atestigüe las miserias de la precarización, la hiperflexibilidad y la desregularización laborales (una tendencia de la que el artista contemporáneo, por otro lado, es menos víctima que pionero) como porque postula que no ser dueño de su tiempo ni poder ser fiel a su deseo es el drama máximo que un artista (contemporáneo) puede padecer".

12 No original disse: "Ya trabajamos toda la vida de cualquier cosa, hagamos lo que queremos hacer".

13"Martes cuatro, la ley nueva / todavía se discute, 99 por ciento / de humedad. El depto. huele a coliflor, / en cientoveinticuatro planchas la grasa / crepita, las familias se desplazan hasta la mesa / y juegan con el cuchillo, el tenedor, el vaso, la cuchara. / Estoy liquidado. Mi hijo también, / por otra parte; pero él / no debe saberlo, debe pensar que aún hay lugar / entre ésos que son, van, vienen, / se mueven, edifican. Para salvarlo / del tedio vecinal yo mismo edifiqué / un búnker en el living; sentados atrás / de la metra soviética miramos todo el día / televisión por cable. / Jueves ocho, la ley no salió, media ciudad / respira aliviada, la otra mitad / se pincha el ojo al tratar de ensartar / otro bocado de carne. Sábado seis / o sábado siete, el nene ya gatea, resistimos / con la última tira de munición; tengo miedo / a que corten la luz, bajen el martillo / y el anuncio llegue en forma de aullido / de lechón desangrado hasta donde estoy / con la mochila a los pies, el bebé a la espalda, / mordiendo comida fría".

14No original disse: "Siendo difícil saber si viene / hacia nosotros un futuro calculado / o un pasado que no va a retroceder, ¿quién / de los dos se mueve primero?".

15No original disse: "porque el realismo social nos cagó, / nos trató como a tarados, y para realismo / mágico, bueno, en fin, mejor / el de Tropicana: es mejor, más real, / visceral".

16No original disse: "aplastados bajo una capa anacrónica de determinismo naturalista, devienen interioridades alienadas, singularidades no deseadas, entes regresivos que se reproducen asexualmente, por simple bipartición".

17No original disse: "Una pieza / donde el espacio del techo es igual / al del piso que a su vez es igual / al de cada una de las cuatro paredes / que delimitan un lugar sobre la calle."

18"Cacos discursivos ou 'narrativos, pequenos episódios ou imagens pequenas que fogem da linearidade e parecem fazer parte de um todo explodido, in absentia". No original disse: "Esquirlas discursivas o 'narrativas', pequeños episodios o pequeñas imágenes que escapan a la linealidad y parecen ser partes de un entero estallado, in absentia", segundo Ana Porrúa ("Punctum" 103).

19No original disse: "en las horas sin trabajo / arrastradas por el espanto".

20Os originais dizem: "vender biblias para el Ministerio / de Ondas de Amor y Paz", "El trabajo de tal y tal en un taller armando llaveros / pegando muñequitos de Jesús a una cruces / i.n.r.i. de plástico", "ST [se fue] a criar gansos a Venado Tuerto".

21No original disse: "reliquia en vida / del museo de la subversión".

22Mario Cámara faz ênfase nessa convivência de tempos opostos: "Nesta deriva, intermitente, aparecem dois períodos históricos específicos da história argentina: os anos de 1970, através de uma série de referências a organizações armadas; e os anos de 1990, que sem serem explicitamente mencionados, ressoam em imagens desoladas, em paisagens miseráveis, no tecido de uma indústria devastada. Mas Punctum, longe de nos oferecer imagens reconhecíveis, é uma operação sobre a linguagem apresentada como desman-teladora e uma sucessão de sobreposições que quebram o significado ou apresentam o significado e a história-a dos anos setenta, a dos anos noventa-como ruptura e como ruína" (106-107). No original disse: "En esa deriva, intermitentes, asoman dos periodos históricos concretos de la historia argentina: los años setenta, a través de una serie de referencias a las organizaciones armadas; y los años noventa, que sin ser mencionados de modo explícito, resuenan en las imágenes desoladas, en los paisajes miserables, en la trama de una industria devastada. Pero Punctum, lejos de ofrecernos imágenes reconocibles, es una operación sobre la lengua que se presenta como desmontaje, y una sucesión de encabalgamientos que quiebran el sentido o presentan el sentido y la historia —la de los setentas, la de los noventa— como quiebre y como ruina".

23No original disse: "Todos los personajes [...] ingresan al texto en el momento que salen del mundo político; este es el único relato de origen que aparece de ellos".

24No original disse: "Hielo charla con La Drogona de Palermo / que pasó a pedirle un cospel. / 'Dale, dice Hielo, 'ponete tu remera / del Mono andando en Mula, / quememos estos libros / y salgamos a ver la lucha de clases / en los copetines de la tarde, a los que se creen / albañiles por levantar cuatro bolsas, a pedirle plata / a tu novio que tiene llavero de la cnn, / el que paga 10 dólares por un sándwich / y después siente inconvenientes en la panza / o al otro punto aquel que tenés / el que trae jugadores de / la Federación Boliviana de Fútbol".

25No original disse: "Darle agua a unas plantas desagradables / fue su único acto en primera persona ese día".

26No original disse: "Enero, enero, / la pendejada reseca y sin trabajo: / todo es simple si uno / se acobarda en el juego sucio".

27No original disse: "Así, en vez de hacerte el artista / buscate un oficio noble que te gaste las manos: / carpintero toca madera. Cambia madera / formada con sus manos y herramientas / por plata. Plata por madera / no ideas por madera. Plata / por una silla trabajada / con tus manos".

28No original disse: "Todo acto es literario / y eso apesta. Todas las cosas / rogando por sinceridad".

29No original disse: "el de una historia que se resiste a ser 'enterrada, la que como pulsión insiste e inscribe los setenta en los noventa mediante estilemas y fragmentos".

30No original disse: "A las diez / de la mañana / recitando sus mejores / poemas / asustando a cajeras y viejas / con su aullido / Ricardo Zelarayán / era arrastrado de los pelos / por los guardias de seguridad / por tirar las espinacas / al piso, / por destapar los yogures / de litro. / Ricardo Zelarayán / era arrastrado de los pelos / por andar como un demonio / entre las góndolas / imprimiendo temor / en niños y niñas / niños que tienen / el sexo y el hurto / en los ojos / niñas que gozan / del gozo / del libidinoso / monstruo / que piensa / en el dulce retorno / fulgor y deleite / del virginal ano. / El monstruo /fue desalojado / del supermercado / por tener malos hábitos / y ser improductivo / para la Sociedad / para la Gran Empresa Nacional / de los Mendes".

31No original disse: "un tallercito / de cortar tela, en la calle Paso / pleno Once".

32No original disse: "intenta plasmar el retrato invisible de una época atroz".

33No original disse: "Trabajaba en un supermercado. Lo escribí un poco entre las góndolas, mientras trabajaba. Yo estaba encargado de un sector, que era el sector de la verdulería, y dentro de este sector tenía que hacer una góndola enorme, como de unos 50 metros de largo por 2 de alto, y tenía que cargarla de vegetales: acelgas, espinacas, apios, repollos blancos, repollos colorados, lechuga. Yo armaba esa góndola, que es una góndola difícil dentro del rubro porque son materiales delicados. A mí me daban un bloc de hojas de papel, donde tenía que hacer el stock de la mercadería, de lo que había y de lo que faltaba en la góndola y en la cámara de frío. Que estuvieran las cebollas, las bolsas de papa, de batatas. En la cámara va todo lo que necesita frío: los kiwis, las manzanas, las peras. Yo iba anotando lo que faltaba. Detrás de ese block escribía los poemas. Mientras trabajaba, escribía. Era un trabajo muy apasionante, muy físico".

34"Ainda trabalhando no supermercado, eu me relacionei com eles, eu era o mais novo e eles me viam como um ser estranho, entende? Eles eram gente fina, bem, pessoas da universidade, que já estavam no meio. Eu era um neguinho do supermercado, quase sem cultura. Eles suavam de mim, achavam isso legal. Um dia, Gelman chega e vamos comer numa churrascaria. Era uma mesa comprida, estava Desiderio, tinha varios, não sei se Manuel Alemian estava lá, olha. No dia seguinte, tinha que acordar às 6 da manhã para trabalhar no supermercado. Quando eles saíram da churrascaria, disseram 'vamos para outro bar' e eu disse 'não, não, não curto'. Então eles olharam para mim e todos começaram a rir e apontando para mim 'você é Cucurto'. No dia seguinte já era Cucurto. E Fabián [Casas] me batizou Washington". No original disse: "Todavía trabajando en el supermercado me relacionaba con ellos, yo era el más chico y me veían como un ser extraño, ¿viste? Ellos eran gente fina, universitaria, que ya estaba en el palo. Yo era un negrito de supermercado, sin cultura casi. Me gastaban y les parecía simpático. Un día viene Gelman y vamos a comer a una parrilla. Era una mesa larga, estaba Desiderio, había varios, no sé si estaba Manuel Alemian, mirá. Al otro día yo me tenía que levantar a las 6 de la mañana para trabajar en el supermercado. Al salir de la parrilla dijeron 'vamos a otro bar de copas' y yo dije 'no, no, yo no cu curto'. Entonces me miraron y todos empezaron a reírse y a señalarme 'vos sos Cucurto'. Al otro día ya era Cucurto. Y Fabián [Casas] me puso Washington" (citado em Soto 23).

35No original disse: "ser artista no es algo distinto de ser otras cosas".

36No original disse: "Sí, para la mayoría de los escritores es un lindo trabajo, tal vez el trabajo que merecen y que ansiaron siempre. Para mí nunca fue un trabajo. Cuando me siento a escribir jamás me siento a trabajar. Es que tengo una fuerte conciencia obrera y sé que el trabajo en muchos aspectos es otra cosa y en muchos otros aspectos también tiene cosas parecidas al quehacer artístico, por así decirlo. También hay un tema de figuración: hay gente que saca carnet de escritor, publica libros, hace entrevistas, va a ferias internacionales, pero no escribe o escribe sólo para cumplir. Yo no acepto a los escritores que no escriben, para mí son unos impostores. Pero jamás puede ser un trabajo, ni siquiera en el caso de César Aira, que escribe todos los días sin parar. Escribir es una cosa y trabajar es outra".

37No original disse: "como otra actividad más".

38No original disse: "el acto de escribir es un acto de intimidad, algo casi privado".

39No original disse: "no voy a ir a trabajar por nada del mundo, es una decisión política".

40No original disse: "En la Argentina, la precarización del trabajo, tanto manual como intelectual, ocurrida durante el auge del neoliberalismo de los 90 hizo de la profesio-nalización del escritor (característica fundamental del arte autónomo en los albores del capitalismo industrial) una multiprofesionalización: el escritor, frente a la imposibilidad de vivir de un mercado cada vez más marginal dominado por empresas multinacionales interesadas en la producción asegurada en las ventas, debe trabajar de otras cosas. Se convierte no sólo en un productor, sino en un trabajador (precarizado, por lo general monotributista víctima de contratos 'chatarra' pergeñados tanto por editoriales como por el nuevo mercado de la gestión cultural estatal). Entonces el escritor es un trabajador de la literatura, o de la cultura —esto siempre y cuando tenga el privilegio de contarse entre las selectas filas de los empleados del trabajo intelectual. El caso de Cucurto es emblemático: un ex repositor de supermercado que a través del talento, del esfuerzo, la creatividad y fundamentalmente de la desfachatez en el mundo editorial underground (editor de varias revistas, como La novia de Tyson, dedicada a la difusión de la literatura latinoamericana contemporánea) accedió a la gestión cultural como productor de eventos de la Casa de la Poesía de la Ciudad de Buenos Aires, y de ahí a su propio emprendimiento, la Cartonera, que de hecho se inició en las largas horas de guardias nocturnas en la casa de Evaristo Carriego (sede de la Casa de la Poesía), donde amigos y colegas pasaban las veladas haciendo uso de las instalaciones".

41No original disse: "Ninguna. Creo que el artista tiene que hacer la suya, estar imbuido en su trabajo y nada más. No puede tener esperanzas mercantiles, no digo que no las haya, pero, bueno, el arte no puede ser una pretensión mercantil. Todo lo contrario, tiene que ser un espacio de diálogo, experiencia y reflexión. Un lugar también de inspiración y de acercamiento al otro".

42Perguntado sobre a Eloísa Cartonera, dirá: "Não sei se meus livros propõem um mundo melhor, acho que não. Mas aqui em Eloísa, claro, acreditamos no cooperativismo e no trabalho como gerador. É o trabalho que eu mais amo. E a literatura é algo que vem com isso, mesmo para o nosso projeto de fabricação de livros, não é a coisa mais importante, o fundamental é como trabalhamos, como nos organizamos, quem somos, por que estamos aqui; a literatura é apenas o pretexto" (citado em Arroyo 110). Por outro lado, resultaria injusto invisibilizar o trabalho dos "cartoneros", trabalho que Ksenija Bilbija contextualiza e explica minuciosamente: "Esse novo tipo de "ocupação" foi fomentado pelo fato de que na Argentina a reciclagem do lixo não é obrigatória, e também pelo fato de o preço dos produtos de papel ter aumentado com o colapso económico [de 2001]. Como o peso valia quatro vezes menos do que nos anos de Menem (durante os quais o plano de conversibilidade, patrocinado pelo crédito estrangeiro e pelo dinheiro que vinha da privatização de empresas públicas), não trouxe a estabilidade económica buscada numa Argentina corroída pela corrupção, a coleta diária de papelão se tornou um meio de sobrevivência para milhares de cidadãos. Estatísticas oficiais do Instituto de Estatística e Censos (INDEC) indicam que, em 1998, o 6,2 % da população de Buenos Aires estava embaixo da linha da pobreza e o 1,6 % estava embaixo da linha da pobreza, em 2002, o 22,2 % dos cidadãos eram pobres e em maio de 2003 o 25,2 % eram indigentes. Muitas pequenas empresas faliram, seus funcionários perderam seus empregos e milhares deles foram expulsos do sistema de produção. Dessa forma, a combinação de quase um quinto dos habitantes de Buenos Aires se situar embaixo da linha da pobreza e o aumento dramático do preço do papel deram origem a uma nova ocupação: o cartonero. Famílias inteiras com crianças pequenas das cidades periféricas vieram aos bairros do centro de Buenos Aires para vasculhar o lixo em busca de jornais, revistas e papelão. Esse trabalho só podia ser realizado à noite, quando, pontualmente entre as 20h e as 21h, o que restava da classe média colocava o lixo do dia às ruas. As políticas de reciclagem nunca foram bem-sucedidas em Buenos Aires, apesar do 96 % da cidade ter capacidade de reciclagem" (138-139).

43"Eloísa já existia como editora independente desde 2002, mas o nome Cartonera foi adicionado quando mudaram o modo de produção dos seus livros. Os volumes começaram a ser feitos de modo artesanal por cartoneros, aos quais também era comprado o papelão. O trabalho foi realizado na primeira loja da Eloísa, chamada 'No hay cuchillo sin rosas', que no início era também um sacolão no qual, conforme as práticas comunitárias popularizadas em 2002, frutas e legumes eram vendidos a preço de custo. Com o tempo, o espaço foi equipado e tornou-se uma oficina artesanal de impressão e fabricação total de livros e um local de venda. [...] A organização posterior sob a forma de uma cooperativa vem também desse aprendizado do ano 2002. As capas da Eloísa são ilustradas pelos próprios cartoneros que, com essa atividade, ganham cinco vezes mais do que obtinham vendendo por quilo o papelão recolhido. No que diz respeito à circulação de dinheiro do projeto, deve-se dizer que foi proposto como um empreendimento coletivo sem fins lucrativos. Em outras palavras, uma empresa não capitalista. O plano de Eloísa foi resumido na integração de sujeitos marginalizados e estrategicamente criminalizados (no topo de uma antiga curva de empobrecimento da população) em um circuito de trabalho criativo em que o papelão recebeu outro status cultural e monetário" (Palmeiro 199-200 e 201-202).

44No original disse: "no ya [por] la disciplina y la acumulación temporal, la originalidad creativa y la calidad; sino [por] el ocio y la improductividad; la descreación y la inoperancia".

45A colocação de Cherri está fundamentada, por sua vez, naquilo que foi um dos pontos de partida da pesquisa de Cecília Palmeiro: "Lendo a produção marcada pela crise que explodiu em 2001 na Argentina, pude observar que os projetos de alguns jovens (como os que presentes na editora e na galeria Belleza y Felicidad ou a loja da Eloísa Cartonera) surgiram do que era estritamente e tradicionalmente literário e se vincularam com outras práticas sociais como formas de intervenção política. Ficou claro que um ato radical não poderia ser limitado à esfera literária e que a crise da representação política afetou outras práticas discursivas, questionando a própria existência do campo literário, além de redefinir os conflitos políticos nos quais procurava intervir. Essa fuga partiu não apenas do ato de escrever como decisão individual, mas também da necessidade objetiva dos materiais baseados nas transformações tecnológicas da escrita e das práticas da leitura" (Palmeiro 11).

46No original disse: "Es el principal propósito de este panfleto que las personas trabajadoras se inspiren y no vayan a trabajar".

47No original disse: "¿Y si alguien quiere comprar alguna obra, Cucu, a qué precio la vendemos? —Lo que vale un libro en una librería—. Pero, Cucu... Mínimo 800 pesos, si querés hacer algo popular, para que a cualquiera que le guste lo que hacés pueda tenerla, ¿pero al precio de un libro? —No, no. Porque a 800 mangos solamente los ricos la podrían comprar, yo no quiero dibujar para los ricos, quiero que cualquiera pueda tener un dibujo en la casa, ¿no? Esa es un poco la idea. Si no ¿cuántos la van a poder comprar? Aparte esa idea del arte mercantil... Hacer un cuadro y venderlo a millones de dólares, me parece una obscenidad total... No me gusta. Es una cosa que le saca la gracia... —".

48No original disse: "Pero a pesar de ser antioqueno no tenía depósito de ahorros, ni / propiedad raíz, ni era socio de nada, ni estaba autorizado a portar / tarjeta de crédito, / es decir, no era nadie, / pues en esta tierra donde cada poeta se considera el mejor del mundo, / él apenas se atrevía a ser el mejor de su calle".

49No original disse: "Sin un plato en qué comer, / pero tampoco tenía qué comer ni comía".

50No original disse: "Pero no tratéis de aprovecharos de nuestra / pobreza. La pobreza es nuestra última arma".

51No original disse: "Voy a cantar con los pobres, allá lejos, a la orilla del río, donde no nos / oigan los ricos, / Porque si nos oyen querrán comprar nuestro canto para después ven- / dérnoslo a nosotros mismos y hacer el negocio del siglo".

52No original disse: "Lo berreta es lo mismo que los nuevos ricos veneran como objetos kitsch, pero comprado en un todo x 2$".

53No original disse: "lo berreta tiene que ver con la pobreza también, con los márgenes del mercado, con lo que ya no tiene aura".

54No original disse: "[ú]nico sobreviviente / de un país difícil / en un tiempo difícil; / indiferente o digno, / a quién puede importarle".

55No original disse: "a esta antología o florilegio, hoy la definimos como una selección de lo monstruoso, es decir, de lo que se exhibe más allá de la norma (monstrum) como la palabra que se dispersa y se propaga sólo confiada a su éxito estético (micropolítico) teleonómico".

56No original disse: "se caracteriza por su particular percepción de lo monstruoso como hecho cotidiano, como mundo enajenado, como costumbre".

57No original disse: "Se lee allí una de las peculiaridades del monstruo: su goce en soledad. La idea connota una amenaza: el monstruo hace peligrar el sistema de reproducciones y linajes; y con él trastabilla el andamiaje letrado, la escena de la escritura".

58No original disse: "El monstruo es único, no tiene con quién casarse ni con quién procrear descendencia. El monstruo es siempre como un símbolo de la extinción, porque el monstruo constituye una especie, pero una especie constituida por un solo individuo, entonces no tiene posibilidad de ir más allá. Por eso se les suele dar el don de la inmortalidad, se los suele hacer sobrevivir de algún modo distinto del que encontramos nosotros, que es el de reproducirnos, y por eso los monstruos tienen, en fin, esa melancolía del ser que se sabe condenado a una extinción definitiva, pero que no es del todo definitiva: la posteridad del monstruo es su leyenda. En eso el monstruo es un ente casi artístico, porque lo único que puede dejar es la historia que fue"

59No original disse: "la poesía crea la ilusión de ser — aunque no sea verdad — el último lugar donde hay un modo de producción artesanal de los objetos estéticos".

60No original disse: "se transformó en el prisma privilegiado para detectar las zonas más lábiles del cambio social".

61No original disse: "Nací poco antes de la crisis del petróleo. Poco después, el devenir histórico dio lugar a la aparición, en el aquí y el ahora, del terror. Para reponerme, leo, amo y copio a los clásicos: mis contemporáneos".

62No original disse: "del proceso llamado de reconstrucción nacional".

63No original disse: "los ejecutores de la violencia legal / monopolizada por el estado y con los dueños de las televisoras".

64No original disse: "Los artistas se quejan en espacios gratuitos / cedidos por el administrador cultural estrella de la Administración de la Rúa, / héroe vang del invierno democrático / cedido gentilmente para su gobierno / por el rector achanchado de la universidad laica.

65No original disse: "El bibliotecario —moreno, enjuto, amable / hasta la exasperación— anota con letra desprolija / un número de código, una fecha, '¿va a trabajar?' / TRABAJO 113 Cosa producida por el entendimiento. / lis Esfuerzo humano aplicado a la producción de riqueza. I Se usa en contraposición de capital. I Sí, voy a producir una cosa por el entendimiento. I Voy a leer, voy a comparar, voy a escribir, voy a trabajar".

66No original disse: "Se podría decir que estamos en tiempos de barbarie y que es deber de los poetas mantener encendida la llama para un futuro mejor. Habría que responder que la lírica no fue un espíritu, sino una manifestación social, y que valdría más la pena apostar a una nueva posición ante el lenguaje en la que entren en cuestión los rasgos de la contemporaneidad".

67No original disse: "darle a la lírica carácter histórico (la lírica no fue un espíritu, dice, sino una manifestación social) e incorporarla a la tradición".

68No original disse: "gratuitos y fantasmales, accidentes de la Historia que ilustran ejemplarmente".

69No original disse: "el nombre es todo un programa de resistência".

70No original disse: "estos poemas toman un color de necesidad".

71No original disse: "[e]l dinero es un objeto particular, puesto que es el valor".

72Cf. Stegmayer.

73Tomo emprestado de Didi-Huberman esse conceito que, a diferencia das obras primas, obras cujo valor não se alteraria jamais, num sentido metafísico, "visam menos à derrubada pura e simples de todos esses valores — o que estava em jogo nas marteladas nietzschianas — do que um deslocamento perpétuo, modesto e obstinado, do valor em geral. Sua economia é aquela, heurística, do inesgotável, mas também do inestimável: ou seja, a que deriva de uma escolha ética. Elas não têm por objetivo levar ao extremo um sistema de valores partilhado por todo mundo, o 'Mundo da arte, entenda-se. Mas recolocar alhures a questão do valor, de maneira que o para si da obra se torne um verdadeiro para outrem, ainda que esse outro esteja excluído de nosso 'mundo da arte', inomeado por ele, impensado nas majestosas ladainhas de grandes nomes de que é tecida nossa história da arte, essa triunfal narrativa do valor" ("A obra" 11). Agora, se a história da arte, e Didi-Huberman está pensando aqui nas artes visuais, especialmente, é uma narrativa triunfal do valor, isto é: ascendente e progressiva, cabe pensar para a história da poesia ou, quanto menos, da poesia contemporânea argentina, num relato triunfal ou, antes bem, num relato icariano?

Cómo citar este artículo (MLA): Correa, Joaquin. "Os monstros do ano 2001: trabalho e dinheiro em alguns poetas dos anos noventa argentinos". Literatura: teoría, historia, crítica, vol. 22, mim. 2, 2020, págs. 57-96.

Sobre el autor

Joaquín Correa nació en 1987 en Mar del Plata y reside en Brasil desde el año 2013. Es profesor y Licenciado en Letras, graduado con distinción por la Universidad Nacional de Mar del Plata y Magister en Literaturas por la Universidad Federal de Santa Catarina, donde actualmente finaliza sus cursos de doctorado con una beca CAPES -para desarrollar su proyecto de investigación que vincula dinero, trabajo y poesía. Ha publicado artículos académicos en revistas especializadas de Argentina, Chile, Brasil, Canadá y España, participó en libros colectivos de Argentina, Brasil, Estados Unidos y España, además, expuso en eventos científicos internacionales en Argentina, Brasil, Uruguay, Colombia y Chile. Fue editor de dos periódicos científico-académicos: Landa y outra travessia. Colabora regularmente con reseñas y textos de divulgación en suplementos culturales y revistas literarias de Argentina. Es poeta y traductor.

Recebido: 30 de Dezembro de 2019; Aceito: 12 de Fevereiro de 2020

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