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Revista de Estudios Sociales

Print version ISSN 0123-885X

rev.estud.soc.  no.45 Bogotá Jan./Apr. 2013

 

Mulheres Brasileiras na divisão internacional do trabalho reprodutivo: construindo subjetividade(s)*

Manoela Carpenedo y Henrique Caetano Nardi

Maestría en Psicología Social e Institucional de la Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil y Magíster en Estudios de Género de Central European University (Hungría) y la Universidad de Oviedo, España. Correo electrónico: manoela_carpenedo@yahoo.com.br

Doctor en Sicología de la Universidade Federal do Rio Grande do Sul, brasil, con estudios posdoctorales en la École des Hautes Études en Sciences Sociales, Francia. Docente del programa de posgrado en Psicologia Social e Institucional de la Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. Correo electrónico: hcnardi@gmail.com

DOI: http://dx.doi.org/10.7440/res45.2013.08


RESUMO

Este estudo visa a compreender o modo pelo qual mulheres brasileiras participantes da cadeia internacional do trabalho reprodutivo são subjetivadas pela migração, pelas normas de gênero e pelo trabalho reprodutivo. Partindo dos estudos Fou-caultianos sobre a formação subjetividade(s), esta pesquisa analisa os efeitos do "acontecimento migração" na vida de oito trabalhadoras domésticas brasileiras no setor reprodutivo parisiense. Os resultados apontam para uma complexa e multifa-cetada gama de experiências proporcionadas pela migração. As elaborações vivenciadas por estas mulheres não respondem somente aos regimes opressivos, discriminatórios e exploratórios que modulam o trabalho reprodutivo transnacional, já que elas puderam, em certa medida, criar alguns espaços de resistência, reinventando suas vidas de modo a incrementar suas práticas de liberdade em relação às formas de assujeitamento. Por um lado, por certo, estas trabalhadoras domésticas ex-perenciam subordinação e exploração no contexto europeu devido aos jogos de dominação verificados em um contexto de ilegalidade, falta de direitos, contratos informais de trabalho e pelas hierarquias desiguais estabelecidas entre trabalhadoras/ empregadoras. Por outro lado, estas trabalhadoras imigrantes são capazes de, ao mesmo tempo, se auto-reinventar através de um conjunto de estratégias de resistência, revertendo em certa medida as condições originais nas quais se subjetivaram.

PALAVRAS CHAVE

Mulheres trabalhadoras imigrantes, cadeia global dos cuidados, processos de subjetivação, resistência, trabalho reprodutivo.


Mujeres Brasileñas en la división internacional del trabajo reproductivo: construyendo subjetividade(s)

RESUMEN

Esta investigación se ha centrado en los procesos de subjetivación de mujeres brasileñas inseridas en la cadena internacional de los cuidados. El objetivo central de ese estudio es comprender cómo el trabajo reproductivo, la migración y las normas de género impactan la vida de esas mujeres trabajadoras migrantes. Utilizando las elaboraciones Foucaultianas sobre la formación de subjetividad(es), esta investigación analiza los efectos del acontecimiento migración en la vida de domesticas brasileñas viviendo en Paris. Los resultados sugieren una interpretación compleja sobre las experiencias de vida y de trabajo de estas mujeres. Así que, estas experiencias no se conforman solamente a los regímenes opresivos, discriminatorios e exploratorios que organizan el trabajo reproductivo transnacional, ya que estas mujeres pudieran crear algunos espacios de resistencia, (re) inventando sus vidas para ampliar sus prácticas de libertad. Por un lado, las domésticas enfrentan subordinación e explotación en el contexto europeo, esto debido a los juegos de dominación verificados a través de la ilegalidad, carencia de derechos, contratos informales de trabajo y por las jerarquías desiguales entre trabajadoras/empleadoras. Por otro lado, estas trabajadoras inmigrantes pueden, a la vez, (re)inventase a través de un conjunto de estrategias de resistencia, revertiendo, así, las condiciones originales por las cuales estas construyeron su subjetividad.

PALABRAS CLAVE

Mujeres inmigrantes, cadena global de los cuidados, procesos de subjetivación, resistencia, trabajo reproductivo.


Brazilian Women in the International Division of Reproductive Work: Constructing Subjectivities

ABSTRACT

This study aims to comprehend how Brazilian transnational domestic workers are subjectivated through migration, gender and reproductive work. Through Foucault's argumentation on the production of subjectivities, this research analyzes the effects of the migration in the life of eight Brazilian women working in the Parisian reproductive sector. As the findings suggest, the migration can be characterized by a multifaceted set of experiences and elaborations that respond not only to oppressive and an exploitative regimes but also provide domestic workers, to some extent, with spaces of resistance which enable them to recreate their lives through migration in a freer way to deal with the respective processes of subjectification. On the one hand, Brazilian migrant domestic workers experience subordination and exploitation in their employment in Paris. Their status as illegal immigrants, lack of rights, informal labor contracts, restricted job opportunities, and unequal relationships between employer and employee contribute to their exploitation and subordination. On the other hand, despite their precarious situations, migrant domestic workers are able to reinvent themselves through a set of resistance strategies.

KEY WORDS

Migrating women, global care chain, subjectification, resistance, reproductive work.


Este estudo tem como objetivo principal analisar as experiências de mulheres migrantes brasileiras trabalhadoras informais no setor reprodutivo da cidade de Paris. A pesquisa explora como o movimento migratório impacta os modos pelos quais trabalhadoras domésticas brasileiras são (re)subjetivadas. Demonstraremos, através da análise das narrativas, de que forma estas mulheres imigrantes foram capazes de negociar suas identidades no interior das normas disciplinares e regulatórias existentes no contexto migratório. Assim, o estudo em questão, centra-se na produção de subjetividade de mulheres imigrantes, trabalhadoras domésticas e de cuidado, analisando as interconexões e interseccionalidades entre as normas de gênero, o efeito/acontecimento migração e as regulações do trabalho reprodutivo. Tendo em vista tal objetivo, primeiramente é necessário contextualizar a emergência dos fluxos migratórios pautados pelos marcadores de gênero, etnia, classe social e nacionalidade no contexto das novas exigências da economia global.

A divisão sexual do trabalho combinada às hierarquias nacionais e raciais/étnicas modula no contexto dos países desenvolvidos o trabalho reprodutivo, este aqui entendido como o conjunto das atividades relacionadas à reprodução da força de trabalho e da população (Brenner e Laslett 1991). Tal fato é impulsionado pela incorporação massiva das mulheres de países desenvolvidos no setor produtivo, fato que não foi acompanhado por uma divisão das tarefas domésticas entre homens e mulheres no interior da esfera privada. Assim, temos um tensionamento claro entre cuidado, reprodução da população, manutenção da força de trabalho e as exigências crescentes do mercado de trabalho no contexto da reestruturação produtiva nos países desenvolvidos.

Esta tensão entre trabalho reprodutivo e as novas demandas econômicas geraram a denominada crise global dos cuidados no contexto dos países ocidentais. De acordo com Bridget Anderson (2000), esta situação se expande particularmente no contexto europeu, onde ao longo dos anos vemos o declínio e deterioração do Estado de bem estar social, situação a qual se adiciona o envelhecimento da população, a feminilização da força de trabalho e as novas demandas produtivas que estabelecem exigências tais como flexibilização e dedicação plena ao trabalho. Este conjunto de elementos contribui para o colapso das redes de cuidado e de manutenção da esfera privada no contexto europeu, o qual irá criar novos mecanismos para lidar com a crise na esfera do trabalho reprodutivo. Particularmente na França, de acordo com Helena Hirata (2001-2002), há uma crise do emprego estável e protegido, tal fato amplia a oferta de empregos precários e instáveis. Esta tendência é acompanhada pelo crescimento de oferta no setor de serviços francês, principalmente o chamado "serviço pessoal", caracterizado pelas regras da divisão sexual do trabalho.

Como Encarnación Gutiérrez (2007) sugere, a organização nas economias pós-industriais vem modificando radicalmente os antigos modos de produção, os produtos (informação, comunicação e afeto) e as próprias condições e trabalho nos países ocidentais (flexibilidade e precariedade). Estas transformações são acompanhadas por uma necessidade crescente de mão de obra imigrante de "baixa qualificação", cuja demanda tem como objetivo preencher as ocupações emergentes de serviço criadas no interior das redes informais e flexíveis de trabalho. Conjuntamente, Rhacel Parreñas (2001) indica que as consequências da globalização dos mercados vêm modificando radicalmente as políticas e os regimes do trabalho reprodutivo internacional. Como resultado destes processos de mundialização emerge o que Parreñas denomina a "divisão internacional do trabalho reprodutivo".

Contribuindo para esse cenário, Saskia Sassen (2003) afirma que existem dois processos centrais e interconec-tados que promoveram a ascensão destas novas dinâmicas migratórias. Por um lado, temos a emergência das denominadas cidades globais. Por outro lado, temos o crescimento de novos circuitos de sobrevivência gerados nos países em desenvolvimento, isto em resposta à miséria e ao desemprego experenciados nestes países ao longo das últimas décadas. Portanto, como Saskia Sassen (2008) sugere, temos que entender esses processos migratórios como uma importante faceta de uma cadeia internacional de necessidades mútuas geradas a partir das novas exigências econômicas, pelos processos desiguais de desenvolvimento e pela a divisão desigual do trabalho doméstico entre homens e mulheres no interior da esfera privada (Ehrenreich e Hochschild 2004).

De acordo com Nadya Araujo Guimarães et al (2011), o trabalho reprodutivo no contexto francês segue as premissas de flexibilização, informalidade e precariedade. Segundo as autoras, as/os migrantes e suas/seus descendentes se destacam no setor de serviços pessoais - muitos/as na condição ilegal de sans papiers-1 principalmente na região metropolitana de Paris e nas grandes aglomerações urbanas. O número reduzido de horas de trabalho, o salário baixo, a pouca valorização social/simbólica, combinados às modulações de gênero e raça/etnia caracterizam o trabalho doméstico e de cuidados na França.

A literatura feminista que aborda a temática da migração de trabalhadoras reprodutivas sugere que as ocupações de doméstica e de babá no contexto europeu se associam a processos de subjetivação caracterizados pela norma de gênero e pelas hierarquias raciais e nacionais. De um modo geral, autoras feministas indicam que estes processos migratórios conduzem a formação de subjetividades marcadas pelo paradigma da servidão, opressão, normalização e dominação (Anderson 2000; Lutz 2008; Parreñas 2001). Por outro lado, podemos conjuntamente pensar que é através do trabalho doméstico transnacional que estas mulheres migrantes podem ao mesmo tempo reverter, em certa medida, o seu status subalterno nos seus contextos nacionais de origem, modificando em algumas instâncias as dinâmicas de poder de um modo bastante significativo.

Neste ponto, é importante ressaltar a perspectiva um tanto fixa e determinista apresentada pela literatura corrente sobre trabalhadoras domésticas transna-cionais, visto que a grande parte dos estudos sobre o tópico toma como pressuposto uma visão homogênea das mulheres trabalhadoras imigrantes de terceiro mundo. Dessa forma, a perspectiva dos estudos pós--coloniais se torna imprescindível para analisarmos os discursos determinantes a respeito da então chamada "mulher de terceiro mundo". Chandra Mohanty (1984) critica esta categorização de sujeito produzido pelo discurso feminista ocidental dominante. Tal categoria encerraria todas as "mulheres do terceiro mundo" em posições fixas, deterministas e homogêneas, visto que estas seriam sofredoras de uma escassez de poder crônica, violentadas cotidianamente pelos regimes culturais e pelos sistemas socioeconômicos.

Assim, visando a descrever e entender a multiplicidade de experiências de mulheres brasileiras migrantes que analisaremos suas narrativas buscando ressaltar as diferentes posições nas relações de poder que a experiência de migração produziu. A perspectiva foucaultia-na acerca da produção de subjetividade(s) sugere que a constituição do sujeito é produto/efeito das relações de poder organizadas em estruturas de saber/poder (formas de dominação) e do exercício de criação e resistência. É este diagrama de forças que exploraremos ao analisar como o engajamento no trabalho reprodutivo transnacional pode re/construir e re/criar para as mulheres brasileiras imigrantes modos específicos destas se relacionarem consigo mesmas2; os quais são capazes de re/articular as dimensões complexas e inter-relacionadas de dominação/resistência, opressão/liberdade. Nesta direção, é importante mencionar que estudos específicos que focam a migração brasileira para países europeus utilizando a perspectiva de gênero ainda são escassos (Martine 2005). Grande parte da literatura que se dedica à emigração de brasileiras/os se concentra nos fluxos migratórios para os Estados Unidos da América (EUA)3. Entretanto, podemos destacar pesquisas importantes centradas na emigração brasileira na Europa, como a etnografia de Angela Torresan (1994) acerca da comunidade brasileira vivendo em Londres; a investigação de Erika Ripoll (2008) sobre imigrantes brasileira/ os na Espanha; Maria Bassanezi e Lúcia Bógus na Itália (1999); Beatriz Padilla (2010) e Igor Machado (2007) em Portugal. Em relação às dinâmicas de gênero, temos o importante trabalho desenvolvido por Adriana Piscitelli (2011 e 2007) acerca da posição social das mulheres e das transexuais brasileiras no mercado europeu do sexo. Olga Gonzales (2007) afirma que a comunidade brasileira é a população latino-americana mais numerosa vivendo na França, apesar desse fato, a autora sugere que o processo da imigração latino-americana na França motivada por razões econômicas tem sido pouco documentado. Assim, visando a contribuir para suprir este déficit na literatura, apresentamos este estudo.

Metodologia

O corpus de análise desta pesquisa constitui-se de oito entrevistas semiestruturadas conduzidas em Paris no período de maio a junho de 2011. Todas as entrevistas foram realizadas em locais públicos tais como parques e cafeteiras na cidade. Escolhemos este modo de abordagem visto que entendemos a entrevista como uma relação social marcada por jogos de poder, sendo assim, ao se optar por um local público, buscamos um espaço de uso comum à entrevistadora e à entrevistada. A pesquisa de campo utilizou diferentes estratégias para explorar a rede social de brasileiras vivendo em Paris, entre elas destacamos a aproximação inicial estabelecida a partir das igrejas evangélicas brasileiras existentes na cidade.

Os relatos de todas as mulheres neste estudo estão protegidos por nomes fictícios. Todas as entrevistadas são mulheres brasileiras residindo e trabalhando ilegalmente em Paris como trabalhadoras reprodutivas: domésticas, faxineiras e babás. Jussara tem 52 anos e é divorciada. Mora em Paris há mais de 20 anos. É mãe de dois filhos e duas filhas, entre eles dois vivem no Brasil (fazem faculdade com a ajuda de Jussara) e outras duas na França. Antes de começar a trabalhar no setor de cuidados em Paris, Jussara trabalhava como recepcionista de um hotel no litoral paulista, de onde é proveniente. Jussara tem o segundo grau completo e é branca . Lisa tem 33 anos e é mãe de um filho. É solteira e possui magistério completo. Decidiu migrar pela falta de oportunidades que o contexto brasileiro apresentava. Mora em Paris há três anos. Lisa é solteira, mas tem um namorado. Ela é proveniente do interior de Minas Gerais. Lisa é branca. Antônia é proveniente de Goiânia. Tem 56 anos e desde os seus 13 anos trabalha em casas de família como babá e empregada. Antônia tem o segundo grau incompleto e dois filhos no Brasil. Os dois filhos fazem faculdade com o dinheiro proveniente das remessas mensais de Antônia. Ela vive em Paris há seis anos. Antes de decidir migrar, Antônia exercia funções como empregada doméstica e complementava sua renda vendendo lanches em coletivos. An-tônia é negra e solteira. Maria tem 40 anos de idade e é negra. Mora em Paris há três anos junto com o marido e a irmã. Maria é mãe de 2 filhos que estão fazendo faculdades particulares no Brasil com o dinheiro proveniente do seu trabalho e do trabalho do marido na capital francesa. Ela não completou o ensino médio e trabalhava como diarista e manicure no Brasil. Maria é proveniente do interior de Goiás. Cíntia tem 30 anos, é solteira e mãe de um filho. Cíntia mora há dois anos em Paris e desde os 11 anos de idade trabalha como doméstica. Ela é proveniente do interior do Maranhão. Cíntia é negra. Adriana tem 53 anos e possui o segundo grau completo. Trabalhou como recepcionista e como babá antes de migrar para Paris. Vive na cidade há dez anos. Sempre teve o desejo de sair do Brasil para construir um futuro melhor. Cíntia é branca e não tem filhos, ela é proveniente de Porto Alegre. Vitória tem 29 anos e tem o segundo grau completo. É solteira e não tem filhos. Vive em Paris há dois anos e trabalhava como vendedora no Brasil. Vitória é branca e é proveniente do interior de São Paulo. Suzana tem 28 anos possui o segundo grau completo. É proveniente do interior de Tocantins e trabalhou como manicure e como auxiliar de escritório antes de decidir migrar para Paris. Suzana é solteira e tem dois filhos que vivem no Brasil aos cuidados de sua mãe e irmã. Todo o dinheiro que Su-zana economiza com o seu trabalho ela envia para a melhoria das condições de vida da sua família. Suzana vive há 4 anos em Paris e é branca.

O roteiro de entrevista teve como foco principal reconstituir a trajetória laboral destas mulheres e os efeitos da experiência migratória em suas vidas. Conjuntamente introduzimos alguns dos nuances propostos pelas metodologias que se valem da perspectiva biográfica. O objetivo central destas entrevistas não foi obter um entendimento integral e/ou completo das trajetórias de vida das entrevistadas, visto que as entrevistas se concentraram na vida laboral destas mulheres. Apesar da centralidade da questão do trabalho, pudemos conjuntamente perceber, através de suas narrativas biográficas, os eventos e as experiências mais marcantes de suas histórias de vida. Neste ponto, introduzimos os cuidados metodológicos sugeridos por Pierre Bourdieu (2003) em suas elaborações acerca da análise compreensiva. Nessa abordagem, a análise se centra basicamente na confrontação contínua das experiências e das reflexões das participantes e da investigadora e do investigador envolvidos no estudo.

Dominação, opressão e exploração nas experiências das trabalhadoras domésticas brasileiras migrantes.

Primeiramente é importante destacar, no contexto do trabalho doméstico transnacional, que a precariedade e vulnerabilidade são elementos unificadores das experiências destas mulheres no exterior. Um dos fatores centrais de produção da precariedade e vulnerabilidade se associa ao status ilegal destas mulheres no país receptor. O problema do status irregular no país de acolhida é extremamente presente na vida cotidiana das entrevistadas, fato este que configura suas experiências em Paris. Especificamente em relação ao trabalho, a condição de ilegal emerge como um passaporte para arranjos precários e instáveis de emprego devido à condição de não cidadania.

Estas características promovem restrições importantes de oportunidades laborais. Fato este que faz com que estas mulheres se engajem em ocupações caracterizadas por baixa remuneração, precariedade e relações de poder muito desiguais entre trabalhadora e empregadora no mercado parisiense informal dos cuidados. Muitas vezes, a ocupação de doméstica, faxineira ou babá surge como única oportunidade de emprego (para além da prostituição) para mulheres imigrantes em situação ilegal. Ilustrando esse ponto de vista um tanto determinista, temos o depoimento de Maria que corrobora estas elaborações: "Aqui em Paris eu não posso sonhar com o trabalho ideal, aqui tenho só duas opções ser faxineira ou manicure. Eu faço os dois ilegalmente (...). Eu sei muito bem qual é o meu lugar aqui em Paris" (Maria).4

A posição vulnerável que estas mulheres ocupam por possuírem um status irregular não influencia somente suas oportunidades laborais, mas também impactam suas vidas em Paris. Como Ângela Torresan (1994) sugere, em seu estudo acerca da comunidade brasileira vivendo em Londres, a experiência de migrar inaugura novas experiências subjetivas para os/as emigrantes. Em nosso estudo, estas mulheres experenciam um cotidiano marcado por restrições e regras que contribuem para a formação de uma subjetividade marcada pelo medo, invisibilidade e submissão (embora esta seja apenas uma das facetas da experiência, como demonstraremos mais adiante). Ilustrando estes impasses diários, Maria conta:

    Aqui eu sei que tenho que ser neutra, sabe? Eu tenho que ser transparente, me colocar no meu lugar de ilegal. Eu não fui convidada a trabalhar aqui [...] Essa situação é muito difícil para mim. Eu sempre tenho que respeitar muito eles aqui, as regras [...] Eu moro num prédio aqui, lá eu tenho que ser sempre calma e me comportar, respeitar as regras! Eu sempre sou muito silenciosa e respeitosa. Na verdade eu sempre tive respeito no Brasil, mas aqui é diferente [...] Eu não saio à noite, eu nunca pulo a roleta do metrô [... ] No início, eu estava sempre com medo, quando a polícia passava pela rua com a sirene eu já começava a tremer de medo, não podia nem ouvir esse som [... ] Mas agora depois de três anos eu já estou acostumada, mas ainda tenho muito medo de ser pega, de ser deportada (Maria).

Podemos claramente perceber no relato de Maria a importância da insegurança na vida de trabalhadoras domésticas ilegais, já que o constante medo da deportação tem um papel importante em seus cotidianos de trabalho e de existência. Neste ponto, entendemos de que maneira o trabalho reprodutivo exercido no interior da esfera privada emerge como uma alternativa plausível na vida destas brasileiras imigrantes, já que estas podem aliar uma atividade lucrativa junto à invisibilidade que seu status irregular impõe. Com isso, percebemos de que forma a dupla invisibilidade emerge na vida destas trabalhadoras, por um lado, o próprio trabalho reprodutivo se constitui socialmente como um trabalho invisível; simultaneamente nesta operação, temos o status clandestino que confina estas mulheres à esfera privada e isolada dos labores de cuidado e de limpeza.

Embora o trabalho doméstico se coloque para as trabalhadoras imigrantes como uma boa opção de alcançar seus sonhos econômicos, este não deixa de ser uma ocupação arriscada para as mesmas. Outros obstáculos circundam a vida das trabalhadoras reprodutivas transnacionais. Por exemplo, a viagem em si se constituí em uma arriscada estratégia para estas mulheres, pois exige investimentos econômicos e psicológicos prévios. O relato de Suzana é bastante ilustrativo. Desempregada e sem perspectivas laborais em sua cidade natal antes de se lançar a experiência migratória, Suzana investiu todo o patrimônio (sua moto e mobília) na viagem. Chegando a Paris, ela enfrentou diversos obstáculos antes de estabilizar-se.

    Eu cheguei aqui com dois mil euros no bolso e mais nada. Tinha um conhecido da minha cidade que estava morando ilegal em Paris também. Eu parei na casa dele nos primeiros meses. Eu tive muito azar. Esse rapaz organizava uma parada de tráfico de pessoas aqui [... ] E eu não sabia [...] Quando eu cheguei tive que pagar 200 euros para a comida, 200 euros de aluguel, 200 euros para ele conseguir contatos de trabalho para mim e mais 200 euros para a minha identidade falsa como portuguesa. Era tudo clandestino, tudo no mercado negro [... ] E essa casa onde eu parei era horrível. O Carandiru5. Aqui os brasileiros sabem [...] Nessa casa pequena viviam mais de 30 brasileiros de tudo que é parte, quando cheguei fiquei chocada. Eu fiquei um mês e cinco dias naquele inferno, tinha muitas pessoas se drogando e garotas fazendo prostituição lá. Graças á Deus eu encontrei gente que me tirou daquele inferno (Suzana).6

Podemos claramente perceber de que forma estas mulheres brasileiras imigrantes experenciam a vulnerabilidade e as condições precárias em seus processos de chegada e adaptação ao contexto francês. Por serem ilegais, elas muitas vezes estão totalmente desprotegidas de instituições de apoio. Neste ponto, notamos a dificuldade destas mulheres em exercer seus direitos, visto que suas situações irregulares sublinham o status menos humano conferido às trabalhadoras imigrantes ilegais.

Contribuindo para a discussão, uma das entrevistadas, Lisa, define sua condição em Paris de inferioridade e subalternidade usando o termo "sub". Ela acredita estar vivenciado uma condição de sub-humana em Paris. Não são somente as entrevistadas desta pesquisa que percebem sua realidade no país de acolhida como precária e menos humana. François Brum (2006) define que as/ os imigrantes ilegais vivem em uma zona definida por uma condição de não-direito, não possuindo uma identidade jurídica no país receptor se situam em um grau zero de cidadania. Nesta condição os direitos humanos e o próprio status de humano podem ser renegados às/aos imigrantes ilegais na Europa. O jogo da clandestinidade promove importantes restrições para nossas entrevistadas. Em razão dos contratos informais, estas mulheres não estão somente desprotegidas institucionalmente, mas também recebem remuneração inferior pelos trabalhos executados no setor reprodutivo ilegal francês. Estes fatores contribuem para a precariedade nas relações de trabalho, as quais são marcadas por relações de poder que infligem formas de dominação que tem como elemento central os marcadores de opressão e subalternidade.

De acordo com as entrevistadas, as relações informais de trabalho impactam de maneira importante as relações de trabalho, visto que se sentem inaptas para invocar seus direitos e discutir de maneira mais independente seus contratos com suas/seus empregadoras/es. Ilustrando tal problemática temos o relato de Maria, ela fala:

    Eu sinto explorada em alguns momentos sim [...] Isto é mais relacionado à quantidade de tarefas, sabe? Não tanto em relação ao dinheiro [...] Por exemplo, antes de começar eu digo que consigo fazer a faxina em 3 horas [... ] Como eu cobro por hora, tenho alguns clientes que pedem para limpar tudo em um tempo que é impossível acabar [...]. Daí eu tenho que trabalhar mais [... ] Às vezes posso passar mais uma hora do que o combinado, mas eu ganho o dinheiro combinado do início só três horas, não as quatro que eu tinha trabalhado [... ] É muito difícil dizer não, porque o dinheiro e aquele cliente é importante pra mim (Maria).

Através do relato de Maria percebemos de que forma estes arranjos informais de trabalho podem potencializar as relações de poder desiguais entre empregador/a e empregada, obstruindo, dessa forma, contratos de trabalho transparentes e decentes para estas trabalhadoras. A informalidade leva à emergência de arranjos flexíveis que caracterizam a vida das entrevistadas. Sendo assim, estas trabalhadoras domésticas imigrantes organizam o seu cotidiano laboral tendo diversas/os empregadoras/ es, estabelecendo jornadas de trabalho em tempo parcial e por hora, deslocando-se entre três, quatro, às vezes cinco residências diferentes em um único dia de trabalho. Para estas mulheres, este modo de organizar o seu trabalho entre muitas/es empregadoras/es representa um bom modo de diminuir os riscos que um trabalho em tempo integral em uma casa somente representaria. Segundo as entrevistadas, é mais fácil negociar melhores condições de trabalho e salários tendo várias casas para cuidar. Esta estratégia nos permite vislumbrar formas de resistência que estas mulheres desenvolvem a fim de proteger-se e de assegurar arranjos de trabalho mais proveitosos e seguros. Entretanto, é importante destacar que apesar da proteção e da não dependência em relação a um/a empregador/a único/a que o trabalho flexível e por hora oferece a estas mulheres, este pode, ao mesmo tempo, ser bastante intenso e exaustivo para as trabalhadoras.

Contribuindo para o conjunto de mecanismos que capturam estas mulheres dentro dos jogos de dominação e as-sujeitamento temos os impasses produzidos pelas relações nada igualitárias estabelecidos entre estas trabalhadoras reprodutivas e suas/es empregadoras/es. De acordo com Judith Rollins (1985) a relação - social e cultural - construída entre trabalhadora e empregador/a consiste em uma complexa e multidimencional interação que possui como pilar um paradigma exploratório per se. Para a autora, as trabalhadoras domésticas não são somente exploradas no sentido econômico, mas também são exploradas no sentido psicológico e simbólico, em níveis que não são presentes e outros tipos de ocupação laboral. Como pudemos perceber através de nosso trabalho de campo, existem níveis implícitos de dominação social e psicológica que são estabelecidos no contexto do trabalho reprodutivo. Como Jurema Brites (2007) indica em seu estudo sobre empregadas domésticas em famílias de classe média no Brasil, as relações laborais entre patroas/ões e empregadas domésticas reproduzem um sistema de estratificação social principalmente baseado nos marcadores de gênero, classe e cor.

Em relação a essas interseccionalidades, no caso destas trabalhadoras brasileiras migrantes, as dimensões de raça-gênero-classe devem ser entendidas na sua relação com a situação de imigrante ilegal inserida no contexto do trabalho reprodutivo em países desenvolvidos. Sendo assim, as relações de gênero e raça/etnia emergem tanto na atribuição de tarefas de cuidado limpeza/babá/ma-nicure, como na questão das diferenças que marcam as posições das mulheres da Europa Ocidental e as migrantes ilegais. Portanto, vemos a emergência de uma relação classe-trabalho-gênero-origem nacional racializada pautada pelo paradigma de subalternidade (Spivak 1988).

Como Bridget Anderson (2001) sugere, o/a empregador/a não extrai somente a força de trabalho destas trabalhadoras domésticas, mas também exige uma performance, na qual a personalidade e o exercício de deferência e submissão cumprem um importante papel. Segundo a autora, ter uma trabalhadora doméstica validaria o status de superioridade da/o empregador/a, sublinhando o estilo de vida e a classe social "superior" desta/e última/o. Sendo assim, percebemos nas entrevistas a emergência de sentimentos constantes conectados à inferioridade e frustração impressos na relação com a/o empregador/a, a/o qual frequentemente confere um status social inferior às trabalhadoras domésticas. Expressando estes sentimentos temos o relato de Adriana e de Suzana;

    O trabalho que eu faço, na minha idade, é extremamente frustrante para mim, é um tipo de trabalho totalmente desvalorizado, ninguém vê o que eu faço [...] Eu faço tanto babá quanto faxina. Eu vejo no meu trabalho que os outros me olham com superioridade, eles pensam que o meu trabalho é degradante (Adriana).7

    Eu acho que o meu trabalho é desvalorizado [... ] E isso me dá esse sentimento de inferior [...] essa coisa de estar aí para servir, de limpar a casa dos outros. Eu sinto a diferença, os franceses estão em outra posição [...] Eles são franceses, estudaram [...] Eles veem nós os imigrantes que limpam as coisas para eles com um olhar diferente, como se fosse inferior [...] Eu sinto isso todo dia, é um tipo de rejeição que eles fazem comigo (Suzana).

Para todas as entrevistadas o lugar de "servir" é frequen-temente narrado como sendo difícil de ocupar, uma vez que o regime que organiza as pautas do trabalho reprodutivo conecta tal ocupação com performances deferentes e submissas. Rhacel Parreñas (2001) afirma que os acordos laborais no setor reprodutivo podem ser caracterizados por uma forte desigualdade na distribuição de poder, assim, a/o empregador/a concentraria o poder de decisões. Lisa ilustra claramente as dificuldades experencia-das por estas trabalhadoras em negociar seus contratos de trabalho, a entrevistada conta:

    Meu acordo inicial com a dona da casa era de só cuidar das crianças de tarde. Um dia enquanto as crianças estavam dormindo, ela me pediu se eu poderia passar algumas das roupas da família para ela neste tempo. No começo eu fiz isso e não achava nenhum problema, afinal ela estava me pagando por hora e as crianças estavam dormindo. O problema é que eu logo virei a passadeira oficial da casa e isso não melhorou o meu salário, continuei ganhando a mesma coisa, daí eu também comecei a lavar os pratos depois do almoço [...] Mas com o tempo vi que isso era uma exploração por que eu era pra ser só babá das crianças [...] Isso me deixa louca! Eu me deixei escravizar, sabe? Isso só porque eu sou estrangeira. Tentei falar com ela sobre isso, mas gerou muito desconforto, daí eu achei melhor ficar quieta para não perder o meu emprego [...] mas essa coisa de ser babá, empregada, passa por isso de aceitar essas coisas [...] (Lisa).8

Neste relato, vemos claramente de que forma as relações desiguais afetam a negociação destas mulheres por acordos de trabalho decentes e claros. Nesta direção, Linda Bosniak (2009) afirma que a divisão internacional do trabalho reprodutivo reflete um sistema de desigualdade em si, o qual as mulheres "ocidentais" possuem mais vantagens, tirando proveito das posições mais frágeis ocupadas por mulheres de outros países em condição menos afortunadas. Para a autora, a cidadania de um grupo de mulheres - mulheres ocidentais, brancas educadas e incorporadas no setor produtivo de seus países - só pôde ser adquirida ao custo da perda da cidadania de mulheres provenientes de contextos vulneráveis que fazem o trabalho reprodutivo. A posição de trabalhadora reprodutiva transnacional produz modos de sujeição específicos que aliam o trabalho doméstico a performances deferentes e submissas moldadas por uma relação classe--trabalho-gênero-origem nacional racializada.

Contrastando com os aspectos assujeitadores encontrados nas relações laborais destas mulheres, é importante frisar que, no caso das trabalhadoras que migraram há mais tempo, as mesmas encontraram estratégias para construir contratos de trabalho mais seguros em função da clientela conquistada ao longo dos anos. Jussara é um bom exemplo. Morando em Paris há mais de vinte anos, ela pôde usufruir mais estabilidade e rendimentos. Tal fato motiva Jussara a não deixar o país em função da tranquilidade econômica. Assim, apesar da experiência de precariedade e vulnerabilidade ser de certo modo unificadora no contexto da vida destas mulheres, existe conjuntamente a emergência de certas possibilidades de estabilidade, a qual depende tanto do tempo de permanência e experiência na cidade, quanto na construção de uma clientela e de uma rede de apoio. Vale lembrar que o estudo proposto centrou-se exclusivamente nas narrativas de mulheres brasileiras migrantes que conseguiram não somente instalar-se na cidade, mas também construir uma rede de apoio eficiente. Portanto, esse estudo não inclui as narrativas de mulheres brasileiras expulsas e/ou deportadas do país.

Como pudemos perceber, dominação e sujeição representam importantes elementos que organizam os regimes laborais de trabalhadoras domésticas transnacionais. No entanto, é necessário apontar que as trabalhadoras não devem ser vistas como uma vítimas passivas nestas interações. Como Michel Foucault (1997) argumenta em seus estudos sobre poder, o poder é relacional, o qual possui intrinsecamente um caráter produtivo e que sempre estará aberto a estratégias de resistência. Essa operativida-de do poder é inerente a todas as relações sociais. Assim, na próxima sessão, nos dedicaremos a analisar o conjunto de estratégias de resistência desenvolvidas por estas mulheres trabalhadoras reprodutivas transnacionais ao buscar se reinventar a partir da experiência migratória.

Reinvenções, rearticulações e estratégias de resistência na trajetória de vida de trabalhadoras domésticas brasileiras migrantes.

Os relatos das mulheres entrevistadas, apesar de marcados pela subalternidade da experiência de migratória pode mostrar também, em certa medida, o reposicionamento das mesmas em relação ao contexto de origem, uma vez que o acontecimento migratório é capaz de interromper a reprodução do ciclo de pobreza em suas trajetórias de vida e de suas famílias. Conjuntamente, percebemos que a migração pode modificar o posicionamento subjetivo destas mulheres em relação ao conjunto de regras sociais que as produziram como sujeitos.

Afirmamos anteriormente que os objetivos econômicos justificaram de maneira contundente a migração das mulheres brasileiras trabalhadoras reprodutivas transnacio-nais deste estudo. A esperança desta ascensão econômica produz um efeito no modo pelos quais estas trabalhadoras são subjetivadas, dado que esta oportunidade é vista como um modo de superar a desesperança, a pobreza e a subordinação vivenciadas previamente no Brasil.

É importante sublinhar a posição subjetiva dual expe-renciada por estas mulheres brasileiras migrantes. Por um lado, o sonho da ascensão social e econômica se concretiza somente em seu contexto de origem, já que, como ilustramos, a condição de precariedade é realmente difícil de ser superada em Paris. Por outro lado, é através da experiência de migração que estas mulheres adquirem renda e consequentemente status social em seus contextos nativos. Portanto, essa condição subjetiva se sustenta em um paradoxo: cumprir a performance subalterna que sua condição irregular e seu trabalho impõem e, ao mesmo tempo, dispor de dinheiro e prestígio social no Brasil. Estes fatores são capazes de modificar e reverter, em certa medida, tanto o diagrama da subordinação, como o ciclo de reprodução da pobreza em suas vidas, visto que esta condição de subalternidade que o ambiente estrangeiro oferece é frequentemente seguido pelo sonho e a esperança de obter segurança econômica em seus contextos nacionais.

Enfatizamos conjuntamente a relevância dos aportes teóricos que tratam particularmente dos pontos de bifurcação e ruptura de trajetórias de vida. Como Marc Bessin, Claire Bidart e Michel Grossetti (2010) argumentam, o acontecimento/bifurcação biográfico é capaz de reestruturar importantes dimensões subjetivas e emocionais na vida dos sujeitos, visto que o acontecimento redefine os modos pelos quais o sujeito conduz a sua vida/existência, representando assim um ponto de virada de trajetórias biográficas. Conectando tais elaborações no campo proposto deste estudo, pudemos perceber que o feito migratório emerge nas narrativas de vida dessas mulheres como de fato uma bifurcação biográfica, visto que após a migração, suas vidas e suas posições como sujeitos são consistentemente alteradas.

Barbara Ehrenreich e Arlie Hochschild (2004) afirmam que os processos migratórios geralmente tomam lugar em contextos marcados pela pobreza, violência e falta de oportunidades. Como pudemos notar em nosso campo, o trabalho doméstico transacional surge como estratégia de sobrevivência capaz de garantir a subsistência para estas mulheres em condições de vulnerabilidade e (em longo prazo) uma forma de lograr benefícios econômicos. De fato, como as entrevistadas afirmaram, o sonho de ter uma vida melhor no Brasil pós-migração motiva fortemente a tomada da decisão migratória. Ilustrando os contextos marcados pela precariedade do qual se originaram, temos o relato de Jussara :

    Eu tive que vir para cá eu não tive escolha [...] Eu não tinha mais nada no Brasil. Eu já estava com essa coisa de viajar por muito tempo na minha cabeça. Eu relembro que naquela época algumas conhecidas tinham migrado, mas para fazer prostituição, mas eu não teria migrado nestas condições. Eu sou mãe solteira, eu tenho quatro filhos, mas eu não sou prostituta [...] Eu perdi o meu emprego, eu era recepcionista em um hotel em Santos. Veio a crise eles demitiram quase todo mundo, eu fiquei desempregada. Foram tempos muito difíceis, não tinha dinheiro nem para dar comida para os meus filhos e tudo ficava cada vez mais caro. E eu tinha quatro filhos para sustentar sozinha [...] Essa saída sempre me vinha na cabeça porque tinha gente que voltava, comprava apartamentos, carros depois disso. Essa coisa de ter uma vida melhor depois desse sacrifício (Jussara).9

Neste relato podemos ver claramente a conjuntura que circunda a decisão de migrar e buscar outros circuitos para sobreviver no contexto de vida destas mulheres. Portanto, estas mulheres não se tornam vulneráveis e/ ou desprotegidas socialmente somente durante sua estada no país receptor, elas já enfrentaram previamente em seu país de origem conjunturas marcadas por um conjunto de dificuldades econômicas e sociais. Corroborando tais impressões temos o relato de Suzana:

    Eu comecei a trabalhar quando tinha 15 anos, quando a minha filha nasceu. Eu trabalhava de manicure, depois disso sempre trabalhei. Em 2007 eu tomei essa decisão de vir pra cá. Naquela época eu tinha um emprego em um escritório, mas me demitiram. Eu passei oito meses desempregada no Brasil, buscando, buscando e não encontrando nada [...] Eu tenho dois filhos e não tenho marido. Eu sou a única que me preocupo com eles [... ] Eu vim também porque tinha algumas das pessoas da minha cidade que fizeram a mesma coisa e deu muito certo para eles. Eu resolvi vir também (Suzana).

Neste relato percebemos claramente de que forma a estratégia migratória é ancorada em um objetivo econômico que, em curto/médio prazo, será capaz de garantir um futuro melhor para estas mulheres. As situações de precariedade e de vulnerabilidade vivenciadas anteriormente no Brasil são lembradas de forma bastante negativa em suas narrativas. Estas lembranças contrastam com a relativa felicidade que estas mulheres desfrutam no "sonho francês", já que a migração proporcionou garantias econômicas e (contra-ditoriamente) mais segurança e estabilidade para essas mulheres. Ilustrando as dificuldades prévias vivenciadas, encontramos na biografa de Cíntia uma trajetória marcada por trabalho infantil: "Eu comecei a trabalhar quando tinha onze anos. Eu trabalhei para uma família no Rio como empregada por comida e por um lugar para dormir [...] Foi bom porque eles me deixavam estudar e me compravam cadernos e coisas de escola [...]" (Cíntia).10

Antônia narra sua vida no Brasil como marcada por falta de perspectivas e realizações.

    Eu tive que passar tantas dificuldades no Brasil que eu procuro esquecer [... ] Esse sentimento de não poder dar uma vida decente para os filhos destrói o coração de uma mãe. Eu me pergunto por que o meu país fez isso comigo, porque tenho que viver longe dos meus filhos [...] O meu país não me deu a oportunidade de estar com os meus filhos. Eu fui obrigada a arrumar sozinha outras formas de dar uma vida boa para eles. Nesses seis anos aqui, eu consegui muita coisa que nem sonhando teria no Brasil (Antônia).11

Além dos benefícios econômicos diretos que estas mulheres adquirem por meio da migração, pudemos perceber conjuntamente que novos desejos e realizações passam a ser buscados por essas mulheres. No caso de Antônia, Jussara e Maria que têm filhas e filhos em idade universitária, o trabalho de babá e faxineira garante não somente o sustento de suas famílias estendidas no Brasil, mas também o pagamento das mensalidades dos cursos superiores no Brasil em universidades particulares. Para algumas das entrevistadas, as mudanças econômicas já começaram. Suzana conta suas realizações e sua nova experiência como investidora agropecuária em seu estado.

    Com o meu trabalho aqui em Paris eu sustento os meus filhos e mais minha irmã que cuida deles. Já reformei a nossa casa inteira [... ] Eu estou aqui faz tempo então consegui guardar bastante dinheiro. O ano passado comecei a investir em uns bois lá na região. Tenho bastante já, é o meu investimento que está rendendo. Agora eu tenho que começar a estudar um pouco mais sobre isso, porque tem gente que consegue muito dinheiro comprando e vendendo boi lá (Suzana).

A partir desse relato, percebemos de que forma a experiência migratória pode rearticular distintas posições subjetivas para estas mulheres. No caso de Suzana podemos ver, em certa medida, uma relativização de sua posição subalterna, já que, mesmo estando engajada em um trabalho que possui baixo reconhecimento econômico e pouco prestígio social, Suzana conseguiu ao mesmo tempo mudar o circuito de servidão e deter a reprodução do ciclo de pobreza que assolava a sua vida. Curiosamente, Suzana vai mais além, visto que ela toma uma posição de investir o seu dinheiro, estando disposta a jogar novos jogos dentro da gama de possibilidades que ela construiu. Portanto, notamos de que forma o acontecimento ruptura proporcionado pela experiência migratória pode, em certa medida, reverter dinâmicas opressoras e assujeitadoras. Essa reversão dos mandatos de subordinação indica como a experiência migratória pode produzir processos de subjetivação complexos, dando margem ao sujeito para recriar novas possibilidades de existência, usando estratégias de resistência que se utilizam do quantum de liberdade que marca as relações nas quais está imerso. Reforçando este ponto, temos a história de Jussara que demonstra como o acontecimento migração pode afetar suas perspectivas de vida.

    Eu me considero privilegiada aqui. Eu moro em Paris há mais de vinte anos. Agora na minha situação sou eu que escolho meus clientes. Eu só trabalho para gente de classe alta aqui. [... ] Aqui as meninas que trabalham em escritório que estudaram não ganham mais de mil euros. Eu por exemplo consigo tirar dois mil, dois mil e meio por mês. Eu sei que esse trabalho que eu faço não é bem visto, e que nenhum francês ia fazer [... ] mas meu trabalho é bom, eu tenho flexibilidade, não tenho hora fixa. Em algumas casas eu tenho a chave e decido quando vou limpar. Tenho uma relação fusional com os meus clientes [... ] para mim, na minha idade não vale mais a pena mudar de trabalho (Jussara).

Através deste exemplo notamos como a migração pode produzir um impacto no modo que estas mulheres se subjetivam através do trabalho. Pudemos perceber novamente esse espaço subjetivo dual ocupado pela entrevistada. Por certo ela reconhece que sua ocupação é desvalorizada socialmente, no entanto, este fato não impede Jussara de se empoderar através de seu trabalho. Pelo contrário, apesar das normalizações e os mandatos de subalternidade que regulam o trabalho reprodutivo, vemos a capacidade de Jussara em negociar acordos laborais que são lucrativos e que proporcionam uma boa qualidade de vida. No caso específico de Jussara, vemos que não é somente o aspecto financeiro que permite a entrevistada desfrutar de relativa liberdade para além dos mecanismos objetificadores, mas também mediante acordos flexíveis de trabalho, conquistados por ela mesma.

Outro aspecto importante a ser abordado dentro do contexto da produção de subjetividade marcada pelo acontecimento migratório na vida destas trabalhadoras brasileiras se refere aos distintos mecanismos de resistência desenvolvidos por estas mulheres, fortes o suficiente para sustentar seus cotidianos no contexto francês. Como Marc Bessin e Laurence Berger (2002) sugerem, as armas dos socialmente e economicamente oprimidos não são necessariamente estratégias de en-frentamento fracas e/ou débeis. De acordo com os autores, os indivíduos em contextos de opressão encontram formas coletivas e individuais para lidar com conjunturas particularmente difíceis. Assim, estas trabalhadoras desenvolvem um conjunto de estratégias individuais e coletivas que proporcionam espaços de recriação e de invenção capazes de produzir níveis toleráveis no interjogo entre liberdade/dominação.

Os tensionamentos enfrentados por estas mulheres são muitos, sendo assim, as redes solidárias entre mulheres brasileiras desempenham um importante papel no cotidiano destas trabalhadoras migrantes, já que são capazes de auxiliar não somente nos processos de busca de emprego, mas também proporcionam seguridade emocional e simbólica. Estas redes são capazes de motivar o próprio projeto migratório, auxiliando muitas vezes os primeiros passos dessas mulheres no exterior, Maria, Adriana e Suzana contam suas experiências nestas redes.

    Quando estava em Porto Alegre eu encontrei uma mulher que já estava vivendo aqui em Paris. Logo quando eu cheguei eu passei dois meses na casa dela [...] Sem ela o sonho de estar aqui não seria possível [...] Logo depois eu encontrei um grupo de brasileiras que estavam vivendo e trabalhando aqui. Elas me ajudaram muito [... ] Eu consegui empregos através delas e antes de me estabelecer eu fiquei dormindo na casa delas assim como uma cigana [... ] Essas pessoas me ajudaram muito [...] Esse contato emocional com brasileiras é muito importante para mim (Adriana).

    Quando a minha irmã chegou aqui, depois de dois anos, ela me convidou para vir morar aqui com ela. Eu cheguei e nem precisei procurar emprego. No dia seguinte depois de chegar eu já estava trabalhando [...] Aqui em Paris eu encontrei pessoas maravilhosas, brasileiras, elas se preocupam muito comigo e eu com elas (Maria).

    Chegando aqui eu logo fiz amizade com uma brasileira [...] Agora ela é uma das pessoas mais importantes aqui para mim. Ela me ajudou a conseguir o meu primeiro emprego. Nesse emprego eu trabalhei um ano e seis meses. Foi com essa oportunidade que eu comecei a pagar as minhas contas no Brasil (Suzana).

Como Donna Haraway (1991) sugere, as mudanças geradas a partir da estruturação produtiva combinada à divisão internacional do trabalho promove a emergência de novas coletividades não necessariamente baseadas nos laços familiares. Ângela Torresan (1994), por sua vez, aponta em sua etnografia da comunidade brasileira vivendo em Londres, a importância das relações de amizade entre brasileiras/os no exterior. As relações de amizade marcadas pela nacionalidade em comum, combinadas às situações e histórias de vida similares, podem construir um espaço seguro de acolhida no país de chegada. Assim, vemos de que forma relações fundamentadas na solidariedade podem reconstruir as interações sociais das trabalhadoras imigrantes; neutralizando, em certa medida, o mandato contemporâneo do individualismo. Essas estratégias de proteção coletiva entre mulheres brasileiras demostra os modos pelos quais as pessoas em situação de vulnerabilidade podem reconstruir novos modos de ser e existir no mundo, construindo novas formas de suporte social baseado na solidariedade e na amizade. Diante destas estratégias criadas por estas mulheres, percebemos o modo pelo qual puderam reinventar novas estilísticas de vida através do evento migração, caracterizadas por inventividade e ação/proteção coletiva. Os modos potentes destas estratégias de resistência são reforçados por sentimentos que estão fortemente envolvidos nestes novos modos de ser e existir no mundo.

O sexo, a nacionalidade e as experiências de vulnerabilidade similares definem essas estruturas de proteção coletiva, no caso das mulheres que entrevistamos, existem laços de proximidade que permitem que elas se protejam e se sustentem emocionalmente e logisticamente umas as outras. Os efeitos subjetivos dessa forma de organização coletiva são claros, pois o contexto de proteção não é o da família nuclear e/ou o Estado e suas provisões, mas são os pares em mesma situação e condição. Assim, a vulnerabilidade experenciada por elas é compensada pelo suporte solidário desta comunidade de mulheres brasileiras que partilham problemáticas e histórias de vida. Sobre esse sentimento Suzana e Cíntia comentam:

    No momento eu estou preocupada com uma amiga minha, ela não consegue [... ] Eu já estou vendo umas coisa para ela, essa semana mesmo eu acho que consigo

    algo [... ] Aqui a gente tem que se ajudar uma a outra, a gente tem que criar o nosso pequeno Brasil em Paris, para que todo mundo fique bem (Suzana).

    Aqui eu vou toda a semana neste culto em português. É muito bom, encontro muitas brasileiras que estão aqui que nem eu. Eu tenho muitas amigas, nós nos ajudamos com contatos de trabalhos e passamos tempo juntas também (Cíntia).

Aqui é importante marcar, na fala de Cíntia, a importância das igrejas brasileiras na adaptação e na socialização dos emigrantes brasileiros. Como Soraya Fleischer (2001) indica, as igrejas evangélicas brasileiras desempenham um papel relevante nas redes de suporte de emigrantes brasileiros no exterior. Além dos cultos e da preocupação cotidiana com as amigas, outras estratégias coletivas e individuais são desenvolvidas por estas mulheres brasileiras trabalhadoras imigrantes. Um bom exemplo dessas estratégias de confronto às capturas objetificadoras consistem na saída encontrada por estas trabalhadoras para voltar ao Brasil para ver as suas famílias e depois retornar para a França, isto mesmo sendo imigrantes ilegais. Esta operação demonstra de forma contundente os modos pelos quais trabalhadoras reprodutivas migrantes são capazes de "jogar" de diferentes modos com o código legal/moral, encontrando assim, em certa medida, espaços de liberdade e resistência. Maria conta a sua experiência:

    Aqui nós brasileiras sabemos o que fazer quando queremos voltar e ver nossas famílias por um tempo no Brasil. Essa vez eu fui, eu comprei a minha passagem. Daí quando eu fui embarcar o policial da migração brigou comigo e me botou esse carimbo de deportação no meu passaporte [...] Eu procedi como as minhas amigas me disseram. Cheguei no Brasil e fiz um passaporte novo, e quando eu voltei eles me deixaram entrar [... ] Eu só não sei quantas vezes eu posso fazer isso, mas eu vou fazendo até quando der.

Suzana também procedeu da mesma forma que Maria seguindo as mesmas regras. Através dessas estratégias podemos perceber o modo pelo qual, mesmo em situações de dominação e vulnerabilidade, o sujeito é capaz de desenvolver modos engenhosos e criativos de confrontar o seu status social, literalmente jogando com as regras presentes. Tendo em consideração os exemplos de Maria e de Suzana entendemos como estas mulheres, apesar de contextos precários, são capazes de jogar com as deficiências dos aparatos de controle, podendo usufruir dessa forma de um grau ampliado de liberdade. Neste ponto, é importe frisar que estas "armas" são amplamente disseminadas por toda a rede de proteção formada por mulheres brasileiras trabalhadoras reprodutivas em Paris, as quais ensinam passo a passo estas estratégias de confronto.

Considerações finais

Este estudo teve como objetivo principal compreender de que modo mulheres brasileiras migrantes engajadas no setor reprodutivo Parisiense são subjetivadas através da migração, do trabalho reprodutivo e das normas de gênero, sobretudo no que tange a fratura no interior do sujeito coletivo "mulheres" ao apontar como formas de dominação são reproduzidas na hierarquia que se estabelece entre mulheres europeias e migrantes. Foi com a intenção de analisar tal contexto que elaboramos uma visão/versão dos efeitos subjetivos deste acontecimento na vida de oito imigrantes brasileiras vivendo e trabalhado em Paris.

Como sugerimos em nossa discussão, o acontecimento migração é caracterizado por um conjunto de experiências multifacetadas que impactam as trajetórias de vida destas mulheres. Sendo assim, sublinhamos a multiplicidade e as especificidades que circundam os posicionamentos e reposicionamentos subjetivos destas mulheres. No que tange aos jogos de dominação que as-sujeitam essas mulheres, apresentamos os elementos que constroem a subalternidade e as formas de sujeição presentes na vida destas trabalhadoras domésticas em suas vidas no país receptor. Demonstramos de que forma alguns fatores tais como a ilegalidade, os contratos informais de trabalho, as relações de poder desiguais entre trabalhadoras e empregadoras pode contribuir para a captura assujeitadora e reificante. No que se refere às possibilidades de resistência no interior da norma, exploramos o modo que estas mulheres brasileiras, apesar do contexto vulnerável e precário puderam desenvolver estratégias de resistência capazes de impactar os modos pelos quais estas são subjetivadas. Assim, exploramos os modos pelos quais estas trabalhadoras domésticas puderam reinventar novas formas de ser e existir no mundo, introduzindo elementos tais como a solidariedade, a coletividade e criatividade em suas vidas. Essas redes de proteção solidárias reforçam a agência destas mulheres em promover novas formas de organização social para além do mandato individualista.

Neste ponto, reforçamos a necessidade de continuarmos acompanhando estes fluxos migratórios em função da dependência destes circuitos de sobrevivência à conjuntura geoeconômica atual, visto que, como podemos perceber, as crises econômicas emergem como um organizador fundamental capaz de impulsionar ou reprimir os movimentos migratórios. Portanto, poderíamos pensar que, com a crise atual européia, tais fluxos migratórios poderiam estar se revertendo ou se reinventando de diversas formas. Assim, seria importante acompanhar os possíveis reposicionamentos subjetivos gerados a partir das crises econômicas.

Tendo todos esses elementos em consideração, é importante ressaltar que este estudo é somente uma das narrativas possíveis acerca dos processos de subjetivação de mulheres brasileiras engajadas na divisão internacional do trabalho reprodutivo. Esta pesquisa, como indicamos na metodologia, não tem a pretensão de generalização, mas sim a descrição de processos e dinâmicas sociais. Outros estudos comparativos enfocando e problematiza-do os efeitos da experiência migratória para trabalhadoras domésticas transnacionais devem ser desenvolvidos para ampliar o entendimento deste acontecimento na vida de mulheres imigrantes.


Comentarios

* A investigação é resultado de uma pesquisa independente, apoiado institucionalmente pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Central European University-CEU.

1 Sem papéis, sem documentos, em francês.

2 Em português cuidado de si, consiste em uma atividade ética auto reflexiva pela qual somos capazes de recriar/criar nós mesmos como sujeitos.

3 Trabalhos desenvolvidos por Soraya Fleischer (2001), Christopher Mitchell (2003), Teresa Sales (2003), Bernadete Beserra (2003), Gustavo Lins Ribeiro (1998), Maxine Margolis (1998), Glaúcia Assis (1995) entre outras/os.

4 07/05/2011.

5 Famosa penitenciaria brasileira desativada em 2002.

6 27/06/2011.

7 06/05/2011.

8 30/06/2011.

9 09/05/2011.

10 25/07/2011

11 09/07/2011.


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Fecha de recepción: 28 de junio de 2012 Fecha de aceptación: 20 de septiembre de 2012 Fecha de modificación: 13 de noviembre de 2012