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Revista de Estudios Sociales

Print version ISSN 0123-885X

rev.estud.soc.  no.66 Bogotá Oct./Dec. 2018

https://doi.org/10.7440/res66.2018.04 

Dossier

Deslocamento forçado e saúde mental: o caso da hidrelétrica de Itá*

Desplazamiento forzado y salud mental: el caso de la hidroeléctrica de Itá

Forced Displacement and Mental Health: The Case of Itá Hydroelectric Power Plant

Gabriela da Silva Marques** 

Carmem Regina Giongo*** 

Franciéli Katiúça Teixeira da Cruz**** 

Jussara Maria Rosa Mendes***** 

** Graduada em Psicologia pela Universidade Feevale (Brasil). Integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Saúde e Trabalho (NEST) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil). Últimas publicações: “Trabalhadores bancários em sofrimento: uma análise da literatura nacional” (em coautoria). Revista Psicologia: Organizações e Trabalho 16: 220-235, 2016; “Bancários em sofrimento: uma análise da literatura nacional” (em coautoria). Em I Encontro História & Psicologia: dialogando relações de gênero, editado por Tatiana Spalding Perez, 49-56. Porto Alegre: WWlivros, 2015. marquesgabriela19@gmail.com

*** Doutora em Psicologia Social e Institucional. Docente do curso de Psicologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil). Integrante do NEST. Últimas publicações: “Refugiados do desenvolvimento: a naturalização do sofrimento das populações atingidas pelas hidrelétricas” (em coautoria). SER social 19: 124-145, 2017; “Suinocultor: vivências de prazer e sofrimento no trabalho precário” (em coautoria). Psicologia & Sociedade 29: 1-11. ca.aiesec@gmail.com

**** Graduada em Psicologia pela Universidade Feevale (Brasil). Integrante do NEST. Últimas publicações: “Memórias marcadas pela construção da Hidrelétrica de Itá-SC” (em coautoria). Trabalho apresentado no IV Encontro Internacional Ciências Sociais e Barragens. Universidade Federal da Fronteira Sul, 2016. francyktc.psicologia@gmail.com

***** Pós-doutora em Serviço Social. Docente do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil). Coordenadora do NEST. Últimas publicações: “Pós-graduação em serviço social no Brasil: há uma pedra no caminho” (em coautoria). Revista Katalysis 20 (2): 165-174, 2017; “Trabalho e previdência social: as lacunas de proteção social na seguridade social” (em coautoria). Argumentum 9 (3): 37-51, 2017. jussaramaria.mendes@gmail.com


RESUMO

Este estudo pretende analisar as vivências das populações que sofreram deslocamento forçado devido à construção da Hidrelétrica de Itá no Brasil, observando as interfaces desse processo com a saúde mental. Trata-se de um estudo qualitativo, fundamentado na pesquisa participante. Os dados foram coletados de fevereiro a dezembro de 2016, contaram com a participação de 43 pessoas e foram examinados através da análise de conteúdo. Os resultados apontam como causas de sofrimento as situações de violência e de violação dos direitos dos atingidos, os impactos nos modos de vida e na saúde mental, além das transformações ambientais. Conclui-se que é necessário discutir os impactos gerados pela construção de barragens e suas interações com a saúde mental dos atingidos.

PALAVRAS-CHAVE centrais hidrelétricas; depressão; saúde mental; violações de direitos humanos

RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo analizar las vivencias de poblaciones que sufrieron desplazamiento forzado debido a la construcción de la hidroeléctrica de Itá en Brasil, observando las relaciones del proceso con la salud mental. Es un estudio cualitativo, fundamentado en la investigación participativa. Los datos fueron recolectados de febrero a diciembre de 2016, con 43 personas, y examinados a través del análisis de contenido. Los resultados señalan como causas de sufrimiento las situaciones de violencia y de violación de los derechos, los grandes impactos en las formas de vida y en la salud, además de las transformaciones ambientales. Se concluye que es necesario discutir los impactos sobre la implementación de embalses y sus interacciones con la salud mental.

PALABRAS CLAVE centrales hidroeléctricas; depresión; salud mental; suicidio; violación de derechos humanos

ABSTRACT

This study seeks to analyze the experiences of populations which suffered forced displacement due to the construction of the Itá Hydroelectric Power Plant in southern Brazil by observing the interfaces between this process and mental health. This is a qualitative study based on participant research. The data were collected from February to December 2016, with the participation of 43 people, and subjected to content analysis. The results indicate that the distress factors included situations of violence and the violation of the rights of those who were affected, high impacts on people’s lifestyles and mental health, and environmental changes. We conclude that there is a need to discuss the impacts of the construction of dams and its interactions with the mental health of those who are affected.

KEYWORDS depression; mental health; suicide; hydroelectric power plants; violation of human rights

Introdução

Atualmente, as usinas hidrelétricas são consideradas fontes de energia limpa, renovável e de baixo custo, e sua implementação é justificada pelo desenvolvimento do país. Sob a prerrogativa do crescimento econômico, as hidrelétricas são criadas com o argumento de que gerarão novos empregos e oferecerão inúmeros benefícios para uma determinada região e para o país (Giongo, Mendes e Werlang 2016; Justino e Parente 2013). Assim, a construção de uma usina hidrelétrica é considerada um grande projeto de investimento, tendo em vista a sua abrangência, o alto valor financeiro envolvido e o grande uso de recursos naturais de uma região. Para os empreendedores, as vantagens que justificam a execução dessas obras estão relacionadas à geração de energia elétrica, ao aumento da oferta da água para a indústria, para a agricultura e para o uso familiar, além do controle das cheias dos rios e da criação de espaços para lazer e turismo (Viana 2003).

Em contrapartida, estudos apontam para um inquietante cenário de transformações tanto no ambiente quanto na vida das pessoas atingidas pelas construções. Dessa forma, essas obras vêm contribuindo para a naturalização do sofrimento das populações atingidas, através do discurso oficial do “mal necessário” para que o país possa ter benefícios e se desenvolver economicamente. Mas, para que isso aconteça, a vida de milhares de pessoas sem condições de defesa acaba sendo sacrificada, e elas experimentam as consequências negativas do crescimento econômico do país em suas próprias vidas (Barbosa, Barata e Hacon 2012; Giongo, Mendes e Santos 2015; Giongo, Mendes e Werlang 2016; Vignatti, Scheibe e Busato 2016).

Segundo Vainer (2003), esses grupos sociais, famílias ou indivíduos são chamados de “atingidos” e têm direito a algum tipo de indenização, reabilitação e reparação dos danos causados pela obra que os atingiu. Conforme definido no I Encontro Nacional de Trabalhadores Atingidos por Barragens, realizado em abril de 1989, o conceito “atingidos” envolve todas as pessoas que sofreram modificações em suas vidas em decorrência da implantação de barragens, independentemente se viviam no local ou se apenas trabalhavam no território atingido. Entretanto, esse conceito ainda é motivo de inúmeras lutas sociais, pois as empresas do setor elétrico tentam restringi-lo para minimizar as indenizações e as reparações que precisam prestar aos atingidos pelas obras. Vieira e Vainer (2010) apontam que não há uma estatística que apresente o número exato de atingidos por barragens, mas estima-se que 40 a 80 milhões de pessoas no mundo já sofreram deslocamentos forçados. Abrangendo os atingidos indiretos pelos alagamentos, esse número pode variar de 400 a 800 milhões, o que representaria 10% da população mundial (World Commission on Dams 2000).

As famílias deslocadas sofrem muitas perdas, assim como as pessoas que permanecem vivendo no entorno das inúmeras barragens construídas no Brasil e no mundo. Para os atingidos, as perdas vão além das alterações do território. Eles perdem os lares, as igrejas, a comunidade, o trabalho e as instituições de apoio social e político. Perdem-se também os laços familiares e sociais, pois são afastados de vizinhos, parentes e amigos de infância. Para aqueles que permanecem residindo nas regiões afetadas, esses impactos contribuem para o empobrecimento, além da perda das “raízes” e da memória coletiva (Soares 2009).

Há diversos estudos que apontam as consequências do deslocamento forçado e as formas como ele afeta os atingidos. Um estudo feito com os ribeirinhos atingidos pela construção da Usina Porto Primavera, no estado de São Paulo, evidenciou o alto prejuízo produzido na subjetividade dessas pessoas. Alves e Justo (2011) apontam que as consequências estão além da destruição da fauna e da flora, da retirada das pessoas de suas residências e da perda de suas terras. O peso dessas mudanças reflete mais intensamente na vida dos próprios atingidos em aspectos pouco observados pelos grandes empreendedores: questões relacionadas à saúde mental, à subjetividade, à identidade e à representação do território para as pessoas.

Diante disso, concebe-se a saúde mental a partir de um conceito ampliado e diretamente atrelado à garantia dos direitos humanos e a condições dignas de vida e trabalho (Auyero e Swistun 2009; Furtos 2007; Werlang e Mendes 2013). Sendo assim, neste estudo a saúde mental será compreendida a partir da abordagem do sofrimento social e ambiental desenvolvida por Furtos (2007) e Auyero e Swistun (2009). Para os autores, o bem-estar psíquico está atrelado à proteção social, às possibilidades de participação coletiva e política diante da transformação dos elementos geradores de injustiça e sofrimento, à segurança com relação ao futuro e à obtenção de objetos sociais. Os objetos sociais permitem o relacionamento com os demais grupos sociais, além de significarem a própria existência ou o reconhecimento dela. Como exemplos de objetos sociais podem ser citados o trabalho, a saúde, os sonhos, a moradia, o status social, a educação, a comunidade, entre outros. A perda desses objetos estaria relacionada à destruição ou à diminuição do desejo de viver (Werlang e Mendes 2013) e, consequentemente, aos processos de sofrimento e adoecimento mental.

Corrobora essa discussão um estudo realizado por Queiroz e Motta-Veiga (2012), que constatou um desequilíbrio nas populações após a construção das hidrelétricas investigadas, apontando importantes danos à saúde física e mental das populações atingidas, além de diversos prejuízos psicossociais. Dados similares foram encontrados em pesquisa realizada com agricultores e indígenas atingidos pela Usina Hidrelétrica de Tucuruí, na Amazônia (Acselrad 1991), pelas Hidrelétricas da Bacia Hidrográfica do Rio Piranga, em Minas Gerais (Delesposte e Magno 2013) e pela Hidrelétrica de Timbé do Sul, em Santa Catarina (Arcaro e Gonçalves 2012).

Nesse cenário estão as hidrelétricas construídas na bacia do Rio Uruguai, localizadas no sul do Brasil. Em 2008 existiam 20 usinas em operação ou construção no Rio Uruguai e cerca de 149 inventariadas (Movimento dos Atingidos por Barragens 2008). Itá, Machadinho, Barra Grande, Campos Novos, Foz de Chapecó, Passo Fundo e Monjolinho são alguns dos empreendimentos em operação em 2018. Todos eles pertencem a multinacionais como ALCOA Alumínio, dos Estados Unidos; Grupo Tractebel Suez, da França; e Vale, Bradesco, Votorantim e Camargo Correia, do Brasil. Estima-se que o faturamento dessas usinas gire em torno dos R$ 5.789.877.566,00 (Movimento dos Atingidos por Barragens 2016).

É nesse contexto que se encontram os trabalhadores rurais atingidos pela Hidrelétrica de Itá, localizada entre os municípios de Aratiba, no Rio Grande do Sul, e de Itá, em Santa Catarina, no curso principal do Rio Uruguai, no sul do Brasil (Tractebel Energia 2001). O enchimento do reservatório foi iniciado em dezembro de 1999, e a Hidrelétrica entrou em operação em 2000. Esse projeto custou dois bilhões de reais, possui uma potência instalada de 1.000 a 3.000 MW e um reservatório de 141 km² (Observatório Sócio-Ambiental de Barragens 2014).

Estima-se que a construção dessa Hidrelétrica tenha atingido 3.560 famílias (cerca de 13.000 pessoas). Entre elas, 827 sofreram o deslocamento compulsório. Além disso, a obra atingiu populações indígenas como as tribos Aldeia Konda, Toldo Chimbangue e Toldo Chimbangue II (Observatório Sócio-Ambiental de Barragens 2014). É relevante destacar que para o enchimento do reservatório houve um alargamento do Rio Uruguai e, devido a isso, a obra e os seus afluentes atingiram terras de 11 municípios: Aratiba, Mariano Moro, Severiano de Almeida e Marcelino Ramos, no Rio Grande do Sul; Itá, Arabutã, Concórdia, Alto Bela Vista, Ipira, Piratuba e Peritiba, em Santa Catarina (Tractebel Energia 2001). Com isso, surge a necessidade de uma aproximação e de uma maior compreensão das vivências das populações que foram atingidas por esse empreendimento e que sofreram o deslocamento forçado. Nesse contexto, este artigo tem como objetivo analisar as vivências das populações que sofreram deslocamento forçado devido à construção da Hidrelétrica de Itá no sul do Brasil, observando as interfaces desse processo com a saúde mental.

Metodologia

O presente trabalho se caracteriza como uma pesquisa exploratória-descritiva de método qualitativo que utilizou a observação participante associada à técnica de entrevistas narrativas como instrumento principal de coleta de dados. Neste estudo, buscou-se a integração entre o pesquisador e o ambiente pesquisado a fim de melhor descrever e conhecer a realidade vivida pelos participantes da pesquisa (Schwartz e Schwartz 1955). A técnica de entrevista narrativa é uma importante estratégia de resgate das histórias de vida e das histórias sociais, evitando a utilização do esquema pergunta-resposta com o propósito de privilegiar a livre narração do entrevistado.

Realizou-se uma análise documental dos materiais disponíveis sobre a obra investigada e, em seguida, foram feitos contatos telefônicos com órgãos públicos para a identificação das famílias atingidas pela barragem. Além disso, a inserção das pesquisadoras nas comunidades permitiu que os primeiros entrevistados indicassem novos participantes. Essa técnica, nomeada “bola de neve” (snowball), é utilizada frequentemente nas pesquisas sociais até que ocorra a saturação dos resultados (Baldin e Munhoz 2011).

A partir do levantamento, os primeiros contatos tiveram início, assim como as observações participantes, que ocorreram entre fevereiro e dezembro de 2016 em 32 comunidades atingidas pela hidrelétrica de Itá, situadas nos 11 municípios atingidos. O diário de campo foi a ferramenta utilizada para o registro dos dados observados.

Das entrevistas formais, gravadas e transcritas, participaram 43 pessoas com idade média de 58,3 anos, sendo 20 mulheres e 23 homens. No que se refere à atuação profissional, foram entrevistados 30 agricultores, quatro pessoas que ocupavam cargos políticos (vereadores e vice-prefeitos), três professoras, dois pescadores, dois comerciantes, uma técnica de enfermagem e uma pessoa que ocupava um cargo de gestão na hidrelétrica.

No que se refere às limitações da investigação podem ser citadas: a) a grande área territorial da pesquisa, dificultando algumas análises históricas e sociais das comunidades participantes do estudo; b) o elevado número de documentos selecionados para a análise documental, impedindo que o estudo da legislação vigente contemplasse um panorama histórico de construção e alteração de cada uma das leis selecionadas; c) o número reduzido de participantes que ocupam cargos políticos no momento da pesquisa e também no período desde a construção da barragem; d) a falta de análise de indicadores gerais que caracterizassem as regiões investigadas, como, por exemplo, índices de educação, saúde, mortalidade, emprego e acidentes de trabalho.

Para a análise dos dados coletados, utilizou-se o método de análise de conteúdo sugerido por Bardin (2009). A partir da leitura minuciosa da transcrição das entrevistas, foram estabelecidas quatro categorias: a) Deslocamento forçado, violência e violação de direitos dos atingidos; b) “Nós não temos mais a vida que o Rio Uruguai tinha”: as transformações territoriais e os impactos ambientais como fatores de sofrimento; c) “Quem não morreu foi embora”: a solidão e os efeitos no trabalho dos atingidos; e d) “Interrompeu a vida”: saúde mental, sofrimento social e morte dos atingidos. Destaca-se que esta pesquisa passou pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e respeitou todos os princípios éticos.

Análise e discussão dos resultados

Deslocamento forçado, violência e violação de direitos dos atingidos

Normalmente, uma das características mais marcantes no processo de construção de uma hidrelétrica é a decisão unilateral quanto à implantação do empreendimento. Essa decisão, tomada de maneira “estratégica” com base em inventários, análises de potencial energético, estudos econômicos e levantamentos aerofotogramétricos, acaba desconsiderando as realidades locais que serão afetadas (Vainer e Araújo 1992). Além disso, ela ocorre muito distante dos territórios que serão afetados pela obra, levando em consideração critérios econômicos, técnicos e estatísticos (Movimento dos Atingidos por Barragens 2016).

No caso da Hidrelétrica de Itá, as primeiras memórias dos entrevistados estavam atreladas à invasão do território em que viviam. Os agricultores relatam que os moradores locais não conheciam o que era uma hidrelétrica e que, quando se deram conta, suas terras já estavam sendo demarcadas. Além do mais, por causa da falta de clareza na comunicação, mesmo com a notícia da implantação da Hidrelétrica e com os marcos territoriais já implantados, muitos não acreditavam que a água atingiria as áreas demarcadas. Conforme um dos entrevistados, “atingiu bastante coisa, lá! Que nós pensava que ia atingir, pensava. Mas nunca pensava que ia atingir o que atingiu”. 1

A notícia pouco precisa de que seria construída uma hidrelétrica na região levou muitas famílias a se retirarem, a reduzirem a produção e a sofrerem psiquicamente diante da incerteza do futuro e do medo de perder tudo o que haviam construído. Entre os rumores iniciais da implantação do empreendimento e o deslocamento propriamente dito da população atingida passaram-se 20 anos, período em que a população local sentiu-se insegura e fez com que muitos deixassem a região antes mesmo do início das obras. Esses dados corroboram as discussões propostas por Vainer (2016) de que os critérios estabelecidos para a avaliação dos danos ocasionados pela construção de uma hidrelétrica são precários, na medida em que propõem um corte temporal incapaz de incluir todos os reais efeitos da obra. Ressalta-se que, conforme relato dos participantes da pesquisa, todo o processo que antecedeu a implantação do empreendimento foi conduzido sem a participação da população local e sem estratégias de comunicação com as famílias atingidas, potencializando os danos psíquicos e sociais.

Para Hernandez (2012), como o processo de participação social é considerado culpado pelos atrasos das obras hidrelétricas, ele é corresponsabilizado pelos recorrentes “apagões” dos últimos anos no país. Em contrapartida, é vasta a literatura que aponta a falta de envolvimento das comunidades atingidas no processo de licenciamento ambiental, apesar dos pressupostos participativos presentes na resolução do Conama n.º 009/87. Entre as críticas proferidas, problematiza-se o fato de que as populações que habitam os espaços a serem explorados pelos projetos de desenvolvimento não são consideradas no processo decisório que envolve o uso dos bens naturais locais, mesmo que os efeitos negativos das obras tenham incidência direta sobre essas comunidades (Vainer e Araújo 1992).

Frente ao início do empreendimento, a informação que os técnicos da hidrelétrica divulgavam em visitas às famílias atingidas era que a água viria e, se eles não aceitassem as propostas de deslocamento, ficariam submersos. Conforme um dos entrevistados, “era o terror em forma de ameaças”. 2 Com o avanço da obra, lideranças provenientes de grupos religiosos comunitários e das próprias comunidades rurais deram início às primeiras reinvindicações contrárias à construção da Hidrelétrica. No entanto, as pessoas que participavam dessas ações reivindicatórias eram penalizadas. Conforme os entrevistados, entre as estratégias utilizadas pelo governo e pela construtora estavam: processo judicial contra os líderes comunitários, perseguições, ameaças de morte, prisão, agressões físicas, impedimento quanto à realização de protestos e morte de lideranças. Conforme Carbonari (2012), Leão (2012) e Scalabrin (2016), a desmoralização e a judicialização dos movimentos sociais atrelados à indústria barrageira vêm sendo utilizadas historicamente como estratégias de contenção popular.

Além do mais, outro entrevistado3 lembra que a construtora e algumas prefeituras organizavam comitês, cotavam lideranças comunitárias e ofereciam dinheiro para convencer os vizinhos de que o projeto era algo bom para a região. Outra estratégia utilizada era “vender” a obra para as escolas, sempre potencializando os benefícios e a magnitude do empreendimento. Diante da falta de apoio das entidades públicas, da ausência de orientação jurídica, das pressões e das ameaças constantes, muitas famílias atingidas não possuíam escolha indenizatória, sendo obrigadas a aceitar a proposta oferecida pela construtora. Um dos entrevistados lembra que “eles ofereciam os assentamentos, então tinha que ir longe, aonde que eles iam. Tudo fora de mão para o pessoal e tudo desorientado”.4

Os participantes da pesquisa contam que, incialmente, a proposta da empresa responsável pela construção da hidrelétrica era remover toda a população atingida para os reassentamentos. No entanto, a maioria deles ficava no estado do Paraná, em condições climáticas, sociais, culturais e de trabalho muito diferentes. Foi apenas com muita resistência que algumas famílias atingidas conquistaram o direito de obter uma carta de crédito para adquirir, individualmente, outra propriedade ou para ter a comunidade rural reconstruída em uma região próxima à área atingida. Assim, teve início o processo de reconstrução dos núcleos rurais atingidos pela água, permitindo que muitas famílias permanecessem residindo no entorno do reservatório.

Nesse caso, a empresa deveria reconstruir, em uma região próxima à antiga, toda a estrutura comunitária alagada, o que geralmente envolvia igreja, salão de festas, campo de futebol, transferência de cemitério e escola. No entanto, finalizadas as obras, as comunidades deslocadas perceberam que as condições de vida nos novos núcleos rurais eram piores. Segundo um dos participantes, “e nós, bem dizer, nós viemos e ficamos pobres. Nós estávamos bem de vida lá, e aqui ficamos pobres. Na verdade, quase que nós tivemos um atraso, assim, de dez anos, mais ou menos”.5 Outro entrevistado afirmou que “eles tinham prometido que aqui seria um ponto turístico, né! Mas não foi, eles só iludiram. Eles vieram com projeto que ia ser, que ia acontecer e, na realidade, quem foi atingido mesmo fomos nós, o pessoal que ficou, porque eles não fizeram o que era para fazer”. 6

Ademais, ao fim do processo de reassentamento e de indenização, os entrevistados recordam-se das perdas de vizinhos, amigos e familiares, conforme indica um dos participantes: “Ah! Daí a gente veio, mas a maioria foi embora dos parentes, amigas. Ah! Mexeu com tudo, deu uma reviravolta”. 7 Depois da luta, de muitas perdas e ganhos, eles tiveram de despedir-se daqueles que deixariam as comunidades atingidas e partiriam para a cidade ou para os reassentamentos. Muitos foram morar na cidade, outros tantos foram reassentados em terras de outros estados ou mudaram-se para municípios próximos. Conforme Auyero e Swistun (2009), as perdas de referenciais e de marcos sociotemporais de discurso, de prática e de identidade podem estar diretamente relacionadas ao sofrimento psíquico. Observa-se que aqueles que ficaram vivendo nas novas comunidades reconstruídas no entorno do reservatório experienciaram o processo de permanecer em um mesmo lugar que já não é mais o mesmo lugar de antes.

“Nós não temos mais a vida que o Rio Uruguai tinha”: as transformações territoriais e os impactos ambientais como fatores de sofrimento

“E aí, a questão ambiental também foi um desastre. Milhões de árvores ali debaixo da água, afogou tudo”.8

A construção de uma usina hidrelétrica requer um alto investimento financeiro, de mão de obra e, acima de tudo, de recursos naturais. Nesse sentido, a implantação de um empreendimento desse porte no solo causa várias transformações no meio ambiente, destruindo territórios anteriormente cultivados, vividos e habitados. É importante destacar que é no território que as pessoas residem, convivem socialmente e trabalham (Cruz e Silva 2010; Vignatti, Scheibe e Busato 2016), principalmente quando se trata de trabalhadores rurais, para os quais o trabalho está diretamente associado ao meio ambiente.

Uma das primeiras e mais importantes transformações no meio ambiente é a inundação das terras com o enchimento do reservatório. Além de alagar terras férteis e cobrir vertentes de água potável, o lago artificial transforma o rio revolto em águas profundas e paradas. Como resultado do deslocamento forçado das residências para áreas distantes do reservatório, os atingidos pela Hidrelétrica de Itá relatam a dificuldade de acesso à água, tanto para o uso da comunidade quanto para os animais. Muitos entrevistados afirmam, inclusive, que inúmeras vezes precisaram comprar água e guardá-la em abastecimentos para disponibilizá-la gradativamente aos animais. Apesar de terem a água da Hidrelétrica muito próxima de suas terras, não é permitido o acesso de animais ao reservatório. Um dos agricultores entrevistados destacou a dificuldade encontrada no manejo com os animais devido à seca no campo, uma vez que, mesmo havendo abundância de água no reservatório, os animais não têm acesso ao local: “botava as vacas e, de lá um pouco, elas estavam de novo lá. Tira aquelas vacas de lá, mas não tem água lá em cima, está seco de água, tem que puxar de balde a água”.9 Diante da impossibilidade do acesso à água, os atingidos sentem as consequências. Segundo um dos agricultores,

“dá uma tristeza, as terras que foi embaixo da água... Por causa que tu vê quem trabalhou nessas terras nessas regiões ali, que sabia a terra boa que tinha, fonte de água que existia. Hoje em dia, se tu quer tomar uma água fresca tem que tomar da geladeira ou do freezer, aquela época não! Tu ia, uma fonte de água ali, tu ia, uma fonte de água que nascia ali no mato, tu pegava e tu tomava uma água fria”.10

Para Bermann (2007), é comum ocorrerem mudanças na relação existente entre as pessoas atingidas por barragens e a água, o solo e o meio ambiente, afinal, entre os principais problemas ambientais que uma usina hidrelétrica pode causar, está a dificuldade de manter o uso múltiplo das águas, uma vez que isso não é priorizado pelas hidrelétricas, que buscam apenas privilegiar a geração de energia elétrica. Esse dado é inverso aos fundamentos que justificam a construção das usinas, conforme destacado por Viana (2003) e Justino e Parente (2013). Esses pesquisadores afirmam que entre as vantagens da construção de uma hidrelétrica, salientadas pelos empreendedores e pelo Estado, está o aumento da oferta da água para a indústria, a agricultura e para o uso familiar. Entretanto, conforme os relatos dos agricultores atingidos pela construção da Hidrelétrica de Itá, 16 anos após a finalização da obra, ainda são encontradas dificuldades para a utilização da água.

Nesse sentido, os atingidos discorrem sobre as mudanças pessoais na relação com a água do reservatório. Um dos agricultores afirma que “não era acostumado com esse tipo de água aqui, a gente não conhece esse sistema da água”.11 Enquanto outro entrevistado indica que “é outro jeito, não imagina a profundidade dali, né! Meu Deus!”.12 Falas como essas foram frequentemente proferidas ao longo da pesquisa e ilustram a preocupação dos moradores com relação às mudanças que ocorreram com a implantação da barragem. Os pescadores que eram acostumados a navegar no Rio Uruguai, os balseiros, os admiradores da paisagem e os moradores falam sobre as mudanças na correnteza, o aumento da profundidade, o silenciamento, a mudança da cor, do cheiro e do gosto da água. Segundo um participante, “antes se escutava o barulho da água, agora é um silêncio”.13 Nessa mesma perspectiva, Alves e Justo (2011) também identificaram diversas transformações na relação dos atingidos com a água que foram provocadas pelas perdas nas pescas, nas caças que eram realizadas, nas matas e nas terras anteriormente cultivadas, afetando diretamente a subjetividade que existia na relação do ambiente com seus moradores.

Outro aspecto relatado pelos agricultores entrevistados diz respeito ao fato de que a água do reservatório estaria contaminada, impedindo o crescimento dos peixes. Estudos comprovam que devido à falta de movimentação da água no reservatório, há um comprometimento da sua qualidade, pois ela permanece praticamente parada, dificultando, assim, a decomposição dos rejeitos e afluentes do ambiente (Alves e Justo 2011; Bermann 2007).

Viana (2003) afirma que a alteração do ciclo da água e a contaminação são fortes impactos ambientais que ocorrem com a interrupção do fluxo normal do rio, pois geram diversas mudanças na composição química, física e térmica da água. Essa afirmação corrobora com outro fator destacado pelos participantes da pesquisa: a mudança da sensação térmica da região. Um dos entrevistados destacou a “mudança de temperatura, mudança de clima [...] as diferenças climáticas eram visíveis, então”,14 enquanto outro afirmou “que é fácil de entender. Talvez o aumento da temperatura gira no entorno no lago, os matos, que as coisas que foram inundadas, isso era tudo coisas que antes absorvia um pouco o calor, agora não tem mais”.15 Os atingidos pela Hidrelétrica de Itá apontam que a temperatura está mais elevada no verão e mais baixa no inverno. Igualmente, relatam que houve um aumento de umidade, neblina e cerração, conforme citado por este participante: “tá mais quente, neblina quase o dia todo, e escassez de chuva. Isso tem influenciado muito”.16 Esses relatos são corroborados pela pesquisa de Limberger e Pitton (2008), que demonstra que a implantação de usinas hidrelétricas contribui para a intensificação das temperaturas.

Outro dado que chama a atenção é o apontamento feito pelos participantes com relação ao aumento do volume de lixo na região, principalmente em torno do reservatório. Os atingidos salientam que com o aumento do fluxo de pessoas durante a construção da obra, aumentou a produção de lixo, e os responsáveis não levaram esse lixo ao seu devido destino, resultando no acúmulo de resíduos no próprio meio ambiente.

Além disso, os agricultores relatam que esse excesso de lixo acaba contribuindo para a inapropriação da água, conforme destaca este entrevistado: “se pegar nossa água do nosso lago aqui e fizer uma análise, ela é imprópria para o consumo humano”.17 Os participantes também relatam que durante a implantação da Hidrelétrica não foram informados sobre algumas consequências que a água sofreria, como o fato de que ela ficaria poluída. Um dos entrevistadosinclusive comenta sobre as informações que foram passadas a ele e aos seus vizinhos: “Então estamos tendo um outro livro, oferecido pela própria Hidrelétrica que diz assim: que água da barragem é para um múltiplo uso, quer dizer, ela poderia ser usada por todos para muitas coisas, mas, infelizmente, ela não é assim, nós não temos mais a vida que o Rio Uruguai tinha”.18

Outro aspecto percebido pelos agricultores entrevistados foi o surgimento e a proliferação de diversos tipos de insetos e animais na região. Para eles, em função do desmatamento e da água parada, surgiram inúmeras espécies de mosquitos, cobras, formigas, gatos-do-mato, macacos, raposas, além de animais aquáticos, como piranhas e mexilhões dourados, que não existiam antes. As invasões de insetos em regiões que possuem obras desse porte são comuns (Viana 2003). Entretanto, deve-se observar o quanto essa infestação de novos animais pode prejudicar a vida e o trabalho das pessoas que residem no entorno do reservatório. Atualmente, conforme relato dos participantes, o aumento das formigas na região dificulta a produção das plantações, e alguns animais silvestres, como os macacos, invadem as residências e atacam as plantações de milho e cana-de-açúcar em busca de alimento. Segundo um participante, “é um formiguedo, só que vem não sei de onde... é só formiga que tem! Planta um pé de eucalipto na nossa terra para ver... É só formiga”.19 Outro entrevistado também destaca que “os macacos atacaram tudo. Nossa plantação de milho, não sobrou nada”.20 Dessa forma, observa-se que todas as mudanças causadas no território em que os trabalhadores rurais atingidos pela Hidrelétrica de Itá residem, plantam, criam animais e vivem, produzem efeitos diretos nos modos de vida e trabalho da região.

“Quem não morreu foi embora”: a solidão e os efeitos no trabalho dos atingidos

“Daí faltou água, o galinheiro foi fechando, os porcos não deixaram mais criar e foi indo... Foi indo...”21

Diante de todas as transformações e dos impactos ambientais relatados, inúmeros foram os prejuízos para o trabalho rural na região e, consequentemente, para a saúde física e mental das pessoas atingidas. Quanto aos fatores associados ao trabalho, podem ser citadas a redução significativa da produção de soja, milho e cana-de-açúcar; a impossibilidade de criação de porcos, galinhas, aves, bovinos e suínos; e a falta de acesso ao lago artificial, que impossibilita a atividade pesqueira. Através da análise das entrevistas realizadas, pode-se perceber que essas mudanças inviabilizaram muitas propriedades rurais, impactando diretamente no trabalho dessas famílias.

Além dos impactos ambientais que reduziram as terras férteis para a produção, a precarização das estradas também contribuiu para dificultar o trabalho dos moradores da região. Com difícil acesso às comunidades reconstruídas no entorno do reservatório, as empresas responsáveis pela compra e distribuição dos alimentos produzidos na região deixaram de circular nas comunidades e propriedades, prejudicando a economia local. Acselrad (2010) e Buainain e Garcia (2013) corroboram essa informação afirmando que a situação das estradas é um obstáculo para o desenvolvimento de regiões rurais, transformando-se, assim, em um empecilho para o avanço da economia que sustenta o trabalho dos atingidos pela hidrelétrica de Itá.

Segundo os trabalhadores rurais entrevistados, após todas as mudanças que a obra trouxe, houve uma grande desestabilização econômica. Além disso, atualmente falta mão de obra na região, visto que muitas pessoas foram deslocadas para regiões distantes, enquanto outras abandonaram as comunidades rurais, já que faltava estudo e emprego nas regiões próximas à hidrelétrica. Assim, quem permaneceu vivendo do trabalho no campo sentiu as consequências, conforme relatado por este entrevistado: “uma vez, saía cargas de soja, cargas de milho, cargas de porcos, era toda semana um barulhão de caminhão. Soja? Morreu tudo”.22

Leturcq (2016) aponta que durante a construção de hidrelétricas há uma intensificação no fluxo de pessoas na região, mas que após a finalização do empreendimento observa-se um esvaziamento. Este participante relata com tristeza a situação que se percebe e na qual vive atualmente:

“Todo mundo abandonou, foi embora, o que que fizeram? Plantaram eucalipto. Tem um morador lá no meio dos eucaliptos, só mato em redor, tu não vê nada, só avião passar por cima, lá não tem morador mais nada, quem ficou ali, tá lá sofrendo sem morador sem nada... Dos moradores antigos não tem mais ninguém, o resto foram embora, quem não morreu foi embora”.23

Após o período de construção da obra houve um esvaziamento da região em função dos reassentamentos, o que, por consequência, acabou diminuindo drasticamente o público que frequentava as igrejas, as escolas e outros espaços sociais. Diante disso, muitos núcleos rurais reconstruídos pela Hidrelétrica para acolher as famílias atingidas tornaram-se “comunidades fantasmas”. Além disso, o Estado e a empresa responsável pela obra haviam prometido que o turismo se destacaria na região após a construção da barragem. Entretanto, com a falta de investimentos e devido às dificuldades de acesso por causa da precarização das estradas e rodovias da região, o turismo não ocorreu. Ademais, como houve um grande deslocamento de pessoas, comunidades inteiras foram esvaziadas, diminuindo o fluxo de pessoas, a interação social e a economia. Um dos entrevistados corrobora com essas afirmações indicando que “era uma comunidade organizada, uma comunidade forte, tinha campo de futebol, tinha igreja, tinha tudo ali, tinha escola, e era uma comunidade unida”.24

Diante disso, não apenas o trabalho rural foi afetado, mas também as atividades de apoio, como os professores que perderam seus locais de atuação pela falta de alunos, os vendedores de roupas que não tiveram mais clientes suficientes para manter seus negócios, os motoristas de ônibus que deixaram de circular na região e os pequenos comerciantes que interromperam as atividades pela falta de pessoas.

“Interrompeu a vida”: saúde mental, sofrimento social e morte dos atingidos

Todas as transformações provocadas pela construção da hidrelétrica de Itá, como a relação dos atingidos com o meio ambiente, as mudanças no trabalho e o esvaziamento das comunidades produziram importantes impactos para a saúde mental dos atingidos. Uma das entrevistadas indica que:

“Que nem nós aqui, ali tinha nossa escola, tinha campo de futebol, tinha bodega, tinha tudo. O pessoal se reunia ali, passava os domingos se divertindo, jogando um baralho, uma bocha. Uns jogava futebol, e hoje não tem mais nada. Hoje tu só olha para as paredes das benfeitorias velhas que têm ali, não tem mais nada”.25

Nessa perspectiva, percebe-se que essas populações tiveram diversas perdas em um curto prazo de tempo. Comunidades inteiras perderam o trabalho, a moradia, a educação, a saúde, o status social, e tiveram os seus sonhos destruídos. A extinção desses objetos sociais impactou diretamente na saúde mental desses indivíduos e desestruturou famílias e comunidades inteiras. Esse fenômeno pode ser entendido pelo enfoque do sofrimento social, cujo conceito está relacionado ao medo ou à perda de um ou de vários objetos que tenham importante papel na vida de um grupo de pessoas (Werlang e Mendes 2013).

É importante destacar que há também um sofrimento ambiental envolvido no contexto das grandes obras hidrelétricas que está relacionado às mudanças que acontecem no ambiente onde os sujeitos vivem. Para Auyero e Swistun (2009), o sofrimento ambiental é uma forma particular de sofrimento social, causado por ações poluidoras ou que geram danos ao meio ambiente por atores concretos. A partir dessa mudança as pessoas passam a reconsiderar a sua relação com o ambiente e sentem-se perdidas, sem identidade, pois não reconhecem mais o lugar (Roy-Allard 2015). Diante disso, assim como apontado por Assunção, Szerman e Costa (2016), destaca-se a responsabilidade que as construções de hidrelétricas têm sob os altos impactos causados nos modos de vida, de trabalho e na saúde mental das pessoas atingidas por esses empreendimentos.

Estudos internacionais realizados com populações que sofreram deslocamento compulsório na China têm demonstrado uma associação direta entre a experiência vivenciada e o aumento dos índices de depressão e de adoecimento (Cao, Hwang e Xi 2012). Além disso, elementos como o baixo poder decisório sobre a vida e sobre o futuro, a insegurança, a perda do status social, o aumento da vulnerabilidade e a perda do acesso e do controle sobre os modos de existência (Zhouri et al. 2016) contribuem para o estabelecimento do sofrimento social e, consequentemente, da depressão. Diante desses elementos, cabe destacar que a análise das entrevistas realizadas revelou que tanto as pessoas que sofreram deslocamento forçado como aquelas deslocadas in situ vivenciaram importantes mudanças ambientais, territoriais e sociais, além de relatarem sentimentos e danos similares frente à construção da barragem.

Diante disso, muitos entrevistados definiram sua situação como “isolado”, “sozinho”, “abandonado”, “aborrecido”. Em outras palavras, os entrevistados dizem que a construção da barragem “desnorteou” a todos, “interrompeu a vida”, “desfacelou as comunidades”. Entre essas vivências, a depressão causada pelas mudanças sofridas merece destaque. Segundo um dos entrevistados, “o que tu encontra mais, assim, é o povo com depressão... depressão... depressão por que nada mais dá certo, muita depressão”.26 Outro participante, tratando desse mesmo tema, afirma que “o pessoal não superou, não superou isso aí. Tem gente que não foi embora, ficou por aí. Teve um dos Reinaldo, que morava lá embaixo perto da gente também, muitas vezes tu ia lá, puxava em falar da barragem, coisa assim, começava a chorar”.27 Este entrevistado garante que havia “gente que chorava... o Virte também está com depressão. Não falou mais. Tu vê que a pessoa sente, porque, na verdade, assim, mais que tu fale, aquilo que tu sente, tu não fala. O que tu sente, tu não fala, tu pode falar um monte de coisa”.28 Outro participante, por sua vez, destacou “que nem eu acompanhei, no começo foi ali, né! Mas a gente nunca esperava ficar assim, ainda que hoje... Hoje, eu saí dois anos, quando eu fechei o posto que eu desanimei tudo, de gastos, me deu uma depressão dos diabos!”29

Na perspectiva dos entrevistados, como consequência do sofrimento vivenciado surgem as mortes. Observa-se que, durante todo o período pré e pós-construção da barragem, a população atingida vivenciou um dano irreparável: a perda da vida. Nas palavras deste agricultor entrevistado: “teve muita gente que se tirou a vida”.30 Essas mortes aconteceram durante todo o período histórico que envolveu a construção da hidrelétrica, desde as primeiras demarcações e dos primeiros boatos sobre a obra, até a chegada das notícias oficiais, o início do empreendimento, as negociações atreladas às indenizações, a mudança para os reassentamentos e para as novas comunidades, a inserção no novo lugar, o retorno para o antigo lugar e a vida que seguiu solitária após o enchimento do reservatório. Alguns entrevistados explicaram os diferentes momentos em que os suicídios aconteceram em suas comunidades, conforme relata este participante:

“Vou vender ou vou me suicidar. Aconteceu muitos suicídios nessa questão de a família estava com a mudança carregada, carregando hoje a mudança para sair de madrugada, o cara, foram achar o marido, o dono, foram achar aonde ele estava, ele estava enforcado embaixo do porão. A pressão, a mudança carregada, não sabia para onde ir, entendeu? Na verdade, ele sabia que iria para um reassentamento, eu não quero sair daqui. E daí a família, depois, acabou fazendo o velório, e depois a família conseguiu ir para o reassentamento, eu não sei se ficou no reassentamento, porque o choque foi muito grande”.31

Nas entrevistas realizadas, ficaram evidentes os danos do deslocamento forçado. Um dos entrevistados explicou que todo esse processo de perda do lugar onde viveram por várias gerações pode ser comparado ao rompimento do cordão umbilical: “houve um rompimento, esse cordão umbilical se rompeu”.32 Um dos entrevistados buscou exemplificar para aqueles que não vivem no campo que a terra, o meio ambiente e o território se apresentam como uma extensão do próprio corpo, como uma parte integrante da identidade. Romper esse elo significou, além de sofrer, romper e interromper a vida. Frente a isso, aconteceram os suicídios, conforme comprova este participante: “tinha gente que se enforcou. Bastante gente, que se enforcou. Vê que tem que abandonar tudo ali. A mulher, a mãe do Altair da Dioniza, se enforcou ali também na ilha, ela se matou”.33 Esse mesmo assunto também é abordado por este entrevistado que afirma que “quando começou assim, falar da barragem, quando começaram a ir atrás de indenizar as pessoas, em falar que iam indenizar, que começou os problemas. Daí começou, as pessoas a ficarem doente, e depressão nas pessoas, que morreram, não sabia aonde ia, ia fazer o quê, né?”,34 e por este outro, que relatou o seguinte: “é, mas tem gente que foi embora dali e foi na cidade, comprou e não sei se não se acostumou e se enforcou, né! Se enforcou lá na cidade”.35 Além dos relatos sobre suicídio, muitas famílias narraram mortes súbitas atreladas aos danos decorrentes da construção da barragem. Foram citados infartos, acidentes vasculares cerebrais e câncer.

Tendo em vista os dados apresentados, destaca-se o risco de suicídio ainda presente nas regiões pesquisadas, demandando, com urgência, um amplo diagnóstico seguido por um plano de intervenção no campo das políticas públicas de saúde nas comunidades rurais do entorno do reservatório. Além disso, aponta-se para a necessidade de novos estudos sobre o tema, dada a carência de investigações nacionais e internacionais, considerando-se que são raras as investigações acerca da saúde mental das populações atingidas pela construção de hidrelétricas.

Cabe destacar que estudos internacionais desenvolvidos com pessoas que sofreram deslocamento forçado em situações de conflitos armados apresentam dados muito similares. As pesquisas apontam que entre os fatores considerados de maior risco para o adoecimento mental estão as altas taxas de desemprego, a insegurança alimentar e a falta de segurança nas novas áreas de residência (Hamid e Musa 2010). Diante disso, as investigações mostram os altos índices de insatisfação das pessoas deslocadas com relação às novas condições de vida e de trabalho, além da prevalência de transtornos de estresse pós-traumático, aumento da ansiedade, elevação das disfunções sociais, aumento de doenças somáticas (Hamid e Musa 2010), sentimento de perda da liberdade, aumento da pobreza, perda das terras, redução da renda, prejuízos à saúde mental em decorrência da preocupação e da incerteza, mudanças nas normas sociais e culturais, falta de acesso aos meios de proteção social e isolamento social (Ellis, Murray e Barrett 2013; Roberts et al. 2009; Schultz et al. 2014). Essa análise comparativa contribui para o fortalecimento das proposições teóricas de Scalabrin (2016) e Vainer (1990) de que a situação dos atingidos por barragens também se apresenta em um contexto vulnerável e desencadeador de prejuízos para a saúde física e mental, bem como para aspectos psicossociais. De fato, há uma dívida humanitária com as populações atingidas pela construção de barragens. A questão é que nada está sendo feito para suprir essa dívida -nem no que concerne ao discurso nem no que diz respeito à ação.

Finalmente, cabe mencionar que o estudo dos documentos da hidrelétrica de Itá (Estudo de Impacto Ambiental, Relatório de Impacto Ambiental e Plano Diretor) apontou para o processo de banalização dos danos às populações atingidas e para a ausência de planos reparatórios. Os benefícios do empreendimento claramente são direcionados para regiões e grupos que não sofreram as consequências da obra. Nesse contexto, um elemento que merece destaque é a menção de que, tecnicamente, 32 núcleos rurais serão destruídos e a conclusão de que a construção da hidrelétrica não trará grandes mudanças para o local, visto que os efeitos negativos da obra seriam vivenciados naturalmente, ao longo dos anos, em função da degradação do solo e das transições populacionais. Em outras palavras, a obra teria apenas “adiantado” a destruição em nome do desenvolvimento.

Além disso, salienta-se que a palavra “sofrimento” não foi escrita nos documentos da hidrelétrica, a palavra “dano” ou “danos” apareceu 18 vezes, enquanto “desenvolvimento” apareceu 187 vezes. Uma leitura superficial dos documentos analisados não detecta sofrimento ou danos à saúde mental e, de fato, eles não aparecem. Uma leitura superficial apresenta oportunidade de desenvolvimento, de geração de energia para as regiões Sul e Sudeste ou, ainda, alternativa barata diante do racionamento previsto. Sem o trabalho de campo e a escuta ativa das populações atingidas, certamente o sofrimento e os danos à saúde mental não apareceriam.

Considerações finais

Do ponto de vista da saúde mental, é importante destacar que os agricultores identificam o território como uma extensão do corpo e da identidade, como espaço de vida, trabalho, relações sociais, lutas e intenso investimento subjetivo. Perder esse território e, mais ainda, vê-lo submerso, é também perder uma parte de si, é também morrer. Nesse sentido, apesar da abordagem ainda incipiente do sofrimento ambiental, o aprendizado obtido com os sujeitos da pesquisa sobre a indissociabilidade existente entre a subjetividade, o meio ambiente, o trabalho e as relações culturais e sociais aponta para a extrema relevância do termo e também para a necessidade da ampliação dos conceitos já empregados por Auyero e Swistun (2009). Diante disso, alerta-se para a invisibilidade da temática deste trabalho no campo da Psicologia. Em sua maioria, os estudos são desenvolvidos por pesquisadores de áreas como Geografia, Sociologia, Antropologia e, até mesmo, Economia e Administração.

Outro achado importante refere-se ao fato de que os danos e os efeitos da construção da barragem de Itá tiveram início muito antes de a obra começar a ser executada. A notícia pouco precisa de que seria construída uma hidrelétrica na região levou muitas famílias a se retirarem, a reduzirem a produção e a sofrerem diante da incerteza do futuro e do medo da perda de tudo o que havia sido construído. Do mesmo modo, os danos provocados pela obra intensificam-se com o passar dos anos, e hoje, após 17 anos do enchimento do reservatório, eles se mostram cada vez mais claros para a população remanescente. Esses aspectos, no entanto, não são previstos pelos estudos ambientais e pela legislação vigente, que geralmente consideram apenas o território alagado como área atingida, e o período de deslocamento das populações como objeto de políticas reparatórias. Para muitas famílias participantes da pesquisa, os impactos da construção da Hidrelétrica já perpassaram três gerações. Nesse sentido, destaca-se que a lógica de reparação de danos em vigor não considera os aspectos longitudinais dos efeitos causados pela construção de uma barragem, muito menos os danos à saúde física e mental das populações atingidas. Sendo assim, tampouco são previstos acompanhamentos e reparações a longo prazo. Um exemplo disso é que os estudos de acompanhamento da população investigada duraram apenas dois anos após o enchimento do reservatório, período em que, segundo os entrevistados, os impactos mais severos ainda não haviam se estabelecido.

Finalmente, entende-se que a promoção da saúde, da justiça e da equidade econômica e social está diretamente associada à qualidade do ambiente, aos modos de produção existentes e ao modelo de desenvolvimento vigente (Gurgel et al. 2009). Da mesma forma, as questões ecológicas já não podem mais ser compreendidas de maneira dissociada das relações de poder, de propriedade, de produção (Chesnais e Serfati 2003) e de saúde. Diante disso, especificamente no campo da construção de barragens, no qual os artifícios técnicos e administrativos consideram que o sofrimento só existe se comprovado metricamente, através de diagnósticos, de laudos e de exames, a dimensão social permite ultrapassar a abordagem biomédica, contribuindo para a compreensão do sofrimento dos atingidos a partir da análise dos aspectos socioculturais atrelados tanto aos aspectos físicos quanto aos modos como os grupos afetados reagem a eles e às estratégias pelas quais “as agências corporativas e públicas respondem institucionalmente às suas demandas, submetendo-as a uma inflexão técnica que promove a desautorização de suas narrativas” (Zhouri et al. 2016, 38). Sendo assim, percebe-se que a contribuição da abordagem do sofrimento social e ambiental no campo da saúde mental assenta-se no fato de apresentar uma análise macrossocial, sem deixar de considerar os efeitos dessa estrutura na esfera microssocial e, até mesmo, intrapsíquica. Os conceitos representam, assim, um caminho, um elo entre o global e o local, entre o micro e o macrossocial, entre o social e o individual. A partir disso, entende-se que o papel da Psicologia no campo das Ciências Humanas e Sociais é justamente o de contribuir para a retirada do sofrimento do campo individual, produzindo indignação e mobilização política e social.

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Citando: da Silva Marques, Gabriela, Carmem Regina Giongo, Franciéli Katiúça Teixeira da Cruz e Jussara Maria Rosa Mendes. 2018. “Deslocamento forçado e saúde mental: o caso da hidrelétrica de Itá”. Revista de Estudios Sociales 66: 30-41. https://doi.org/10.7440/res66.2018.04

* O artigo é fruto da tese de doutorado de Carmem Regina Giongo, intitulada “Futuro roubado”: banalização da injustiça e do sofrimento social e ambiental na construção de hidrelétricas. A pesquisa recebeu subsídio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (Brasil).

1 Informante 1, entrevistado em 3 de junho de 2016.

2Informante 4, entrevistado em 1º de abril de 2016.

3Informante 23, entrevistado em 4 de agosto de 2016.

4Informante 3, entrevistado em 1º de maio de 2016.

5Informante 16, entrevistado em 1º de março de 2016.

6Informante 5, entrevistado em 18 de abril de 2016.

7Informante 9, entrevistado em 8 de setembro de 2016.

8Informante 8, entrevistado em 8 de setembro de 2016.

9Informante 7, entrevistado em 10 de agosto de 2016.

10Informante 18, entrevistado em 9 de setembro de 2016.

11Informante 22, entrevistado em 8 de agosto de 2016.

12Informante 9, entrevistado em 1º de julho de 2016.

13Informante 28, entrevistado em 1º de julho de 2016.

14Informante 19, entrevistado em 25 de junho de 2016.

15Informante 17, entrevistado em 25 de junho de 2016.

16Informante 20, entrevistado em 17 de maio de 2016.

17Informante 1, entrevistado em 9 de maio de 2016.

18Informante 1, entrevistado em 9 de maio de 2016.

19Informante 6, entrevistado em 29 de abril de 2016.

20Informante 7, entrevistado em 29 de abril de 2016.

21Informante 13, entrevistado em 14 de março de 2016.

22Informante 13, entrevistado em 14 de março de 2016.

23Informante 13, entrevistado em 14 de março de 2016.

24Informante 8, entrevistado em 22 de junho de 2016.

25Informante 8, entrevistado em 22 de junho de 2016.

26Informante 17, entrevistado em 1º de maio de 2016.

27Informante 19, entrevistado em 22 de abril de 2016.

28Informante 14, entrevistado em 29 de setembro de 2016.

29Informante 26, entrevistado em 9 de outubro de 2016.

30Informante 15, entrevistado em 1º de outubro de 2016.

31Informante 19, entrevistado em 22 de abril de 2016.

32Informante 10, entrevistado em 18 de setembro de 2016.

33Informante 2, entrevistado em 19 de agosto de 2016.

34Informante 4, entrevistado em 20 de março de 2016.

35Informante 8, entrevistado em 22 de maio de 2016.

Recebido: 18 de Setembro de 2017; Aceito: 12 de Abril de 2018

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