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Revista de Salud Pública

versión impresa ISSN 0124-0064

Rev. salud pública v.10 n.4 Bogotá sep./oct. 2008

 

 

Aspectos Socioculturais na Percepção da Qualidade de Vida entre
Praticantes de Esportes de Aventura

 

Socio-cultural aspects regarding the perception of quality of life amongst people engaging in extreme
(high-risk) sports

 

Giuliano Gomes de Assis Pimentel

Centro de Ciências da Saúde da Universidade Estadual de Maringá. Brasil. ggapimentel@uem.br

 

Recebido 18 Outubro 2007/Enviado para Modificação 31 Agosto 2008/ Aprovado em 4 Setembro 2008


 

RESUMO

Objetivo Considerando a busca por atividades de aventura como forma de melhoria da qualidade de vida, o presente trabalho analisou a percepção de algumas dimensões dessa categoria entre praticantes de vôo livre.

Metodologia Foi aplicado um questionário em 30 praticantes de asa-delta e parapente brasileiros para identificar aspectos como atividade física, comportamento preventivo, nutrição, controle do estresse e relações sociais.

Resultados Comparado com resultados encontrados em outros esportes de aventura, os voadores adotam comportamento competitivo e de risco, não demonstrando bons resultados em relação a relacionamentos afetivos e exercícios físicos. Por outro lado, são bem sucedidos financeiramente e estão mais habituados ao estresse. Mesmo não possuindo muito condicionamento físico, praticam o vôo graças ao conhecimento técnico e à tecnologia, usando as tensões nesse esporte como uma forma de treinar seu controle do estresse em situações de risco.

Conclusões Do ponto de vista da saúde mental, as atividades de lazer são recomendadas como válvula de escape ao estresse. No grupo estudado, se foi além: sua tolerância ao estresse gerado por situações de risco no esporte torna essas pessoas cada vez mais insensíveis à pressão da vida profissional.

Palavras-Chave: Assunção de riscos, indicadores de qualidade de vida, estresse, atividade motora (fonte: DeCS, BIREME).


 

ABSTRACT

Objective Considering the search for adventure activities as a form of improving life quality, the present paper aimed at analyzing the perception of some dimensions of that category among hang-gliding apprentices.

Methods A questionnaire was applied to 30 brasilians hang-gliding and paragliding apprentices in order to identify aspects such as, physical activity, preventive behavior, nutrition, stress control and social relationships.

Results Comparing results with the ones found in other adventure sports, it was observed that flyers adopt a competitive and risky behavior, not showing good results in relation to affectionate relationships and physical exercises. On the other hand, all of them are considered as wealthy and more used to dealing with stress. Even not possessing good physical conditioning, individuals practice flight just due to their technical knowledge and the dominium of technology Thus, apprentices use those sport tensions as a form of training the stress control in risky situations.

Conclusions Regarding mental health, activities of active leisure are highly recommended as an escape valve to stress. The group studied showed that besides increasing the tolerance to stress, generated by risky situations, individuals went beyond, once it was observed that the risks of such sport have turned the individuals into more and more insensitive to the professional life pressure.

Key Words: Risk-taking, sickness impact profile, stress, motor activity (source: MeSH, NLM).


 

RESUMEN

Aspectos socioculturales en la percepción de calidad de vida entre grupos deportistas de aventura

Objetivo Considerando las actividades de aventura como una forma de mejorar la calidad de vida, este trabajo analizó la percepción de algunas dimensiones de esa categoría entre practicantes de vuelo libre.

Métodos Se aplicó en Brasil un cuestionario a 30 practicantes de ala delta y parapente para identificar aspectos como actividad física, comportamiento preventivo, nutrición, control del estrés y relaciones sociales.

Resultados Comparado a los resultados encontrados en otros deportes de aventura, los voladores adoptan comportamiento competitivo y de riesgo, pero no tienen buenas relaciones afectivas ni ejercicio físico. Sin embargo, son exitosos financieramente y están más habituados al estrés. Incluso, sin contar con suficiente acondicionamiento físico, practican el vuelo gracias al conocimiento técnico y a la tecnología, utilizando las tensiones en ese deporte como una forma de entrenar su control de estrés en situaciones de riesgo.

Conclusiones Desde el punto de vista de la salud mental, las actividades de ocio activo son recomendadas como válvula de escape al estrés. En el grupo estudiado se fue más allá: su tolerancia al estrés generado por situaciones de riesgo en el deporte vuelve esas personas cada vez más insensibles a la presión de la vida profesional.

Palabras Clave: Asunción de riesgos, indicadores de calidad de vida, estrés, actividad motora (fuente: DeCS, BIREME).


 

Esportes de aventura são adotados como opcao de ócio ativo no tempo livre, especialmente entre a populacao púbere e adulta-jovem das grandes cidades. Para a saúde pública esse tipo de prática é um objeto contraditório, pois muitas pessoas são vítimas de acidentes fatais quando não agem com segurança, mas, por outro lado, a aventura é utilizada como uma forma lúdica de controle do estresse e de outros fatores de risco para diferentes padecimentos. Assim, praticar esportes de aventura pode ser um fator de risco e, ao mesmo tempo, uma forma de se adaptar às ameaças da vida cotidiana.

A partir dessa leitura indagou-se a respeito do estilo de vida dos praticantes de esportes de aventura na natureza e sua relação com a qualidade de vida, tomada em sua complexidade (1). Logo, o presente trabalho analisou a percepção de algumas dimensões dessa categoria entre praticantes de vôo livre, usando como comparação os resultados obtidos em outras duas modalidades esportivas de aventura (corrida e ciclismo).

As corridas de aventura são provas realizadas individualmente ou em equipe nas quais os participantes estão em uma área natural, orientam-se por um mapa e deslocam-se a pé ou, ainda, por meio de cordas, bicicletas, botes a remo, esqui e cavalos (2).

O ciclismo de montanhas (mountaim bike) remete às décadas de 40 e 50. Embora esporte olímpico, desde 1996 (Jogos Olímpicos de Atlanta), o mountaim bike ainda é tido como um esporte diferenciado por ter como principal característica o desafio e, em sua maioria, o contato permanente com a natureza. Por outro lado, devido ao aumento na quantidade de adeptos, os impactos dessa prática implicam em riscos ambientais (3).

O vôo livre, por fim, consiste em voar por meio de asa não motorizada, no caso a asa-delta ou o parapente. O aparecimento da asa delta ocorreu em função de pesquisas aeroespaciais nos anos 1970. Já o parapente (em francês) ou paraglider (em inglês) veio da adaptação de pára-quedas utilizados por montanhistas para descer após longas escaladas. É um dos poucos esportes em que homens e mulheres competem juntos (4).

Considerando que vôo-livre, enduro e ciclismo são três atividades de aventura com requisições físicas particulares e acessibilidades diferentes, haverá diferenças na qualidade de vida de seus praticantes? Trata-se de um trabalho reflexivo, o qual não possui pretensões em estabelecer relação de causa e efeito, até porque o aparato técnico-instrumental disponível não é adequado para esse tipo de extrapolação. Por outro lado, espera-se trazer elementos sobre as diferenças na qualidade de vida entre praticantes, conforme a modalidade esportiva de aventura, e explicar alguns de seus determinantes.

METODOLOGIA

O estudo, de formato qualitativo, conteve entrevistas, anotações de observação direta e participante e, como principal fonte deste texto, questionário sobre qualidade de vida. Quanto ao uso do questionário (5), embora tenha se mostrado um recurso limitado, este teve sua utilidade em trazer informações sobre a qualidade de vida dos sujeitos conforme seu estilo de vida frente a cinco categorias: nutrição, atividade física, comportamento preventivo, relacionamento social e controle do estresse. São fornecidas frases sobre o estilo de vida e o respondente deve pontuar de 01 a 03 conforme seu nível de concordância. Como são três questões por categoria, uma pontuação 09 sugeriria, em tese, o estilo de vida mais saudável.

O uso desse instrumento foi marcado pela tentativa de inserir olhares socioculturais na saúde. Esse intento partiu do pressuposto, hoje melhor aceito na ciência, de que um fenômeno precisa ser analisado sob diferentes aspectos constituintes de sua complexidade (1,6). Essa necessidade se faz muito forte quando se estuda o corpo em movimento porque há uma convergência a olhá-lo de forma reducionista, tendendo somente ou para o aspecto sociocultural ou para o biológico.

Participaram do estudo 30 praticantes de vôo livre, residentes em diferentes cidades do Brasil e presentes em um festival na província do Paraná, Sul do Brasil. Os mesmos assinaram o termo de consentimento, tendo o estudo sido aprovado pelo Comitê de Ética local. Os entrevistados foram escolhidos aleatoriamente, mas levando em consideração o fato de serem praticantes recreativos (7).

Para efeito de comparação, os resultados são discutidos concomitantemente a dados colhidos com os mesmos instrumentos de coleta e aplicados com sujeitos de corrida de aventura (enduro a pé) e de ciclismo de montanha (moutaim bike). Todas as coletas e análises foram feitas no Norte do estado do Paraná, onde o autor realizou todas as coletas entre 2004 e 2006 (8).

As coletas foram realizadas durante eventos amadores. Antes das entrevistas e questionários, o autor se inseriu como sujeito-participante, para realizar a observação direta da atividade e para melhor selecionar os sujeitos.

RESULTADOS

A comparação geral de respostas obtidas pelo questionário sobre perfil do estilo de vida individual entre os praticantes das provas está contida na Tabela 1.

DISCUSSÃO

Para análise dos dados, os esportes foram comparados entre si quanto ao uso de tecnologia, o que remete ao custo financeiro, e quanto à demanda física. Por ordem de custo, o vôo livre é mais dispendioso e a corrida, a que requereu menos investimento. Por outro lado, inicialmente se pode pensar que, na prática esportiva amadora, o enduro exija mais condicionamento, pois o moutaim bike e vôo compensam com a tecnologia, necessitando de menos esforço corporal para percorrer distâncias maiores. Apenas para ilustrar, são gastos em média 08 METs (unidade metabólica equivalente a 3,5 mLO2/Kg/min ou 1 kcal/kg/h) para se percorrer 20,9 km/h de bicicleta em comparação a 08 km/h percorridos numa caminhada com o mesmo gasto energético. Correndo a 19,2 km/h, seriam gastos 18 METs (9).

Porém, considerando a participação em provas, o ciclismo de montanha, comparado ao enduro a pé, é duplamente mais dispendioso ao requisitar predominância de alta intensidade e mais tecnologia, porém cobrindo mais espaço em menor tempo. Isso se justifica porque a permanência desses praticantes no limiar anaeróbio é mais significativa, havendo mais produção de lactato tanto em ciclistas treinados quanto em sedentários (10).

Entre os ciclistas, é curioso observar que o item relacionamentos foi o único com média inferior ao de participantes do enduro. Para estudos qualitativos isso pode sugerir desdobramentos sobre o significado do rendimento e da tecnologia como fator de menor sociabilidade no esporte. Esse pressuposto já é comum na Teoria crítica, mas, dada a multiplicidade de variáveis, são embrionárias as comprovações empíricas.

Quanto ao comportamento preventivo, 54,1 % dos participantes não fuma e não bebe mais que uma dose por dia e 45,8 % desconhece a pressão arterial e o nível de colesterol. Não foi evidenciada relação do comportamento preventivo com a classe social ou a idade, mas se evidenciou que os escores são melhores entre quem necessita do corpo para sustentar-se profissionalmente, a exemplo de policiais e atletas. Já em relação à nutrição, todos obtiveram seu pior desempenho, devido ao pouco consumo de verduras e frutas.

Diferenças socioculturais podem ser percebidas nos índices relativos a controle e prevenção do estresse. Entre pilotos, entre os quais predominam profissionais liberais ou empregados de nível educacional universitário, há o melhor resultado [6,66] se comparado com ciclistas [6,05] e corredores [5,76]. Embora esses números sugiram uma capacidade maior dos praticantes de vôo livre em controlarem o estresse, de fato, a diferença educacional e financeira aponta para uma multicausalidade importante a ser considerada antes de adiantar-se sobre os efeitos profiláticos do voar sobre o estresse. O alto escore no controle do estresse, nesse caso, só revela a necessidade constante em lidar com essa dimensão da saúde mental.

Nas comunicações, os pilotos são as pessoas que se revelam mais estressadas. Entre os pilotos moradores de metrópoles ou centros regionais, as descrições da rotina profissional e familiar (particularmente entre os divorciados) dizem respeito a ambiente estressantes. Isso significa muita concorrência, uso constante de novos conhecimentos e tecnologias, trabalho com prazos e em equipe, enfrentamento de desafios. Consequentemente há pouco tempo para se dedicar a relacionamentos (não por menos coincidir o pior escore nessa categoria) e necessidade de ser sempre rápido e criativo, pois em suas profissões os cenários, como na natureza, modificam-se constantemente sendo fundamental estar atento aos sinais de mudança.

Aliás, os voadores apresentam escore menor de comportamento preventivo em relação aos ciclistas. Embora se estime que um praticante do vôo-livre seja uma pessoa que zele pela prevenção de fatalidades, eles adotam atitudes de risco. Essa conduta é duplamente problemática do ponto de vista da saúde pública. Primeiro porque contradiz o que se espera da prática esportiva, associada a estilo de vida saudável. O esporte é considerado uma estratégia para combater a inatividade física, podendo contribuir na diminuição progressiva dos patamares de mortalidade por enfermidades crônicas não transmissíveis (11,12).

O segundo aspecto problemático é que a condição de vida e bem-estar desses sujeitos é mais suscetível ao atual estágio da modernidade: a sociedade de risco. É inevitável que o estresse seja crônico quando se vive uma realidade na qual a percepção do perigo cresce progressivamente, suprimindo o conforto de zonas protegidas. Nos países da América Latina a prática desses esportes de risco se torna ainda mais paradoxal porque convive concomitante não somente com os perigos globalizados, mas também com seculares problemas de colonialismo e exclusão (13).

A relação dos esportes de risco numa sociedade de risco, além de sua natureza coletiva, pode ser agravada conforme a personalidade do indivíduo. Em se tratando dos estudos sobre o comportamento competitivo e sua relação com o estresse, é recorrente na literatura a classificação das atitudes em três tipos: A, B e C. O tipo A, conhecido por ser perfeccionista e competitivo, é vulnerável ao estresse por estar sempre buscando coisas para fazer, mesmo antes de terminar as tarefas atuais. Não gosta de depender dos outros, mas costuma ser cooperativo quando isso implica em produtividade. O tipo de personalidade C, ao contrário, possui pouca confiança e auto-estima, perde o controle sobre si mesmo nas situações difíceis, sendo vulnerável ao estresse. A personalidade tipo B apresentaria uma orientação equilibrada para o sucesso, com pouco estresse. Nesse grupo, estaria o comportamento mais saudável. Em geral, ninguém se coloca somente em um tipo de personalidade, embora apresente predominância num desses tipos (14,15).

Comentando essa teoria com um piloto, consultor empresarial, este se avaliou: “tenho certeza, me enquadro no grupo A. Isso se não estiver em um A+. Trabalho em média 16-18 horas por dia, e não tenho tido tempo de voar. Isso me faz uma grande falta e creio que seu estudo possa confirma porque”. Um segundo piloto, também de Curitiba, e funcionário de uma multinacional, ajuntou “Muito interessante. Parece bem o perfil de um monte de gente que está no vôo”.

Dadas essas considerações, vindas dos próprios pilotos, considerou-se fortuito pôr objeção ao bom escore obtido pelos pilotos na categoria controle do estresse. O questionário (5) pontua o estilo de vida em diferentes tópicos, mas não o grau de importância dado a cada um desses tópicos na qualidade de vida. Porém, contrariando a mecanicidade positivista que leva a concluir pela melhor relação com o estresse no grupo de pilotos, é possível que sejam justamente estes os mais preocupados com esse quesito. Sua condição de vida (renda, moradia, emprego, escolaridade) expressa o modo como organizam seu estilo de vida.

Tanto sua atividade laboral quanto seu passatempo (voar) requisitam constante tomada de decisões frente a situações novas, envolvendo riscos de variadas proporções. Importa, desta forma, notar que a Tabela 1 mostra a tentativa dos praticantes de esportes de aventura em cobrir as necessidades mais prementes para sua qualidade de vida, incluindo na prática corporal no tempo livre. Por exemplo, entre os ciclistas há maiores cuidados profiláticos e de treinamento corporal porque o tipo de desafio que caracteriza sua relação com a vida e com o meio ambiente está pautado na capacidade do corpo em resistir ao esforço.

Assim, através das sutilezas percebidas durante a observação participante, foi possível inferir que os índices alcançados pelos pilotos refletem prioridade de cuidados em relação ao controle do estresse, sugerindo a importância desse elemento para o grupo garantir sua vida social e biológica de forma satisfatória. Em acréscimo, esse foi o grupo mais urbanizado e com mais dificuldades em possuir um tempo livre contínuo, dada a pressão profissional no tocante a superar limites. Embora seu esporte seja praticado individualmente, por motivos de segurança, os pilotos agregam-se para voar formando grupamentos provisórios, unidos em torno de uma efervescência grupal. Esse tipo de sociabilidade, pós-moderno, é questionado na perspectiva da saúde coletiva porque sua efemeridade agregaria pouco capital social na promoção da saúde (16).

Quanto aos cuidados com a aptidão corporal, os pilotos relatam, num primeiro momento, a importância em ser ativo, de ter uma prática física constante, de alimentar-se adequadamente para controle do peso. Porém, desconstroem esses valores como essenciais na prática do vôo livre. Consideram outros fatores, como a técnica, a personalidade, o conhecimento da natureza e o equipamento como pontos basilares para um bom vôo.

A maioria dos entrevistados entende que para praticar o vôo livre não seria necessário um preparo físico prévio, exceto em alguns casos de acesso pedestre à montanha, quando se deve carregar pessoalmente os equipamentos. Alguns deles relatam conhecerem pessoas consideradas com corpos considerados não-produtivos (obesos, paraplégicos e idosos), mas que praticam vôo livre em nível esportivo/recreativo.

Essa representação hegemônica entre pilotos, também está presente na literatura técnica da área (7,17,18). Embora não exista necessidade em preparo físico especial, “não só o vôo, como qualquer outra atividade, será muito melhor executada por quem esteja bem fisicamente” (7). Em síntese, o domínio da tecnologia e a aprendizagem da técnica compensam os limites do corpo, mas a performance corporal contribui para um menor desgaste decorrente da atividade.

Esse posicionamento vai coincidir com a média de atividade física [6,07], inferior à indicada pelos corredores [6,6] e ciclistas [8,36]. Logo, se observada a Tabela 1, parece haver uma aparente diminuição da requisição corporal conforme a atividade física de aventura na natureza exige mais acessórios. Essa tendência é comum na Europa (19) onde as atividades físicas de aventura na natureza (AFAN) são práticas corporais com maior requisição informacional e com menor esforço corporal, pois utilizariam a tecnologia para substituir a energia motriz pelas forças da natureza (especialmente correntes de ar e água).

Entre os aspectos instigantes na qualidade de vida dos pilotos há também o contra-senso de que esses sujeitos da pesquisa sofrem o estresse crônico como “doença/padecimento”, mas venham a tomar como opção recreativa uma prática corporal significativamente perigosa, geradora de estresse agudo. Eles relacionam o estresse ao seu cotidiano profissional, vendo sua aventura como uma compensação.

Se visto de forma exclusivamente racional, parece um paradoxo que pessoas com vidas (particularmente profissionais) marcadas por ações rápidas, criativas e estressantes buscarem no seu tempo livre uma sobrecarga de emoções através de um esporte potencialmente mais enervante, veloz e inventivo. De fato, estes buscam emoções intensas no vôo livre, avaliando-na como positiva para sua saúde, incluindo o alívio do estresse cotidiano. Em parte isso pode ser explicado pela liberação de endorfinas no organismo, gerando sensações de bem-estar que, associadas, ao prazer da superação dos limites, convergem para um balanço positivo na percepção de bem-estar do sujeito.

A literatura ressalva a importância do estresse para a vida, não havendo equilíbrio se não houver tensão. Esta está polarizada entre dois tipos de estresse. Numa dicotomia, um é um tido como negativo (destresse), pois é causado pelas frustrações e problemas diários; o outro, positivo (eustresse), advém da reação a excitações como, por exemplo, promoção no trabalho, gravidez, compra de uma casa. Embora esses dois tipos provoquem reações emocionais completamente diferentes, as respostas fisiológicas são idênticas (15).

Resta saber se o pico de estresse nessas manifestações esportivas de risco inibe o destresse – nível patológico de estresse – ou se ele apenas amplia o limiar de insensibilidade aos efeitos alarmantes do estresse crônico sobre o indivíduo. Pode-se até falar de uma ‘dialética da adrenalina’, ou seja, a administração do risco presente nos esportes de aventura promove eustresse e concomitantemente alivia a carga de destresse. Dito de outra forma, o estresse no tempo livre é usado para tratamento dos efeitos patológicos do estresse laboral. Essa relação dos esportes de aventura com a saúde coletiva merece atenção, considerando seus desdobramentos na globalizada sociedade de risco

 

REFERÊNCIAS

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