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Revista de Salud Pública

Print version ISSN 0124-0064

Rev. salud pública vol.16 no.5 Bogotá Sept./Oct. 2014

https://doi.org/10.15446/rsap.v16n5.40138 

doi: http://dx.doi.org/10.15446/rsap.v16n5.40138

Artículo/Investigación

Tentativas de suicídio atendidas em unidades públicas de saúde de Fortaleza-Ceará, Brasil

Suicide attempts treated at public health units of Fortaleza-Ceará, Brazil

Intentos de suicidio atendidas en instituciones de salud pública en Fortaleza-Ceará, Brasil

Maria I. Veríssimo de Oliveira, José Gomes Bezerra Filho e Regina F. Gonçalves-Feitosa

Faculdade de Medicina. Departamento de Saúde Comunitária. Universidade Federal do Ceará da (UFC). Fortaleza, Brasil. oliveira_ivoneide@yahoo.com.br; verissimoo@hotmail.com; gomes@ufc.br; rgfeitosa5@hotmail.com

Recebido 2 Fevereiro 2014. Enviado para Modificação 08 Maio 2014. Aprovado 10 Julho 2014


RESUMO

Objetivos Descrever as principais características de vítimas de tentativas de suicídio atendidas em instituições públicas de saúde de Fortaleza-Ceará, Brasil.

Método Estudo quantitativo, utilizaram-se um questionário com perguntas estruturadas e Inventário de Depressão de Beck. Trabalhou-se com amostra por conveniência com 360 vítimas nos Centros de Atenção Psicossocial Geral, Atenção ao usuário de álcool/ drogas, Assistência à criança/adolescente, Hospital Doutor José Frota e Projeto de Apoio à Vida.

Resultados Na análise estatística, usouse como variável dependente mais de uma tentativa de suicídio, associada às variáveis independentes. Na análise multivariada com mais de uma tentativa, e com significância (p<0,05), mantiveram associação: sexo masculino, OR=2,1 (IC95 %:1,2-3,6), p=0,005; sentimento de rejeição, RC=2,4 (IC95 %:1,4-3,9), p=0,001; internamento em hospital psiquiátrico, RC=3,4 (IC95 % :2,0-5,7), p=0,000; acreditar decepcionar alguém, RC=2,4 (IC95 %:1,3-4,4), p=0,005; depressão, RC=1,0 (IC95 %:1,0-1,0), p=0,001.

Conclusão Os dados apontam a necessidade de maior atenção a essa população, no sentido de promover diferenciados serviços de apoio, quer psicológico, quer psiquiátrico para melhoria de vida das pessoas.

Palavras-chave: Tentativa de suicídio, saúde pública, Brasil (fonte: DeCS, BIREME).


ABSTRACT

Objective This study aimed to describe the main characteristics of victims of suicide attempts treated at public health units of Fortaleza-Ceara, Brazil.

Methods With a quantitative approach, we used a questionnaire with structured questions and the Beck Scale for depression. We worked with a convenience sample of 360 victims in Psychosocial Care Centers (General/Alcohol-Drug/Infant to Teen),  Doutor José Frota Hospital, and the Apoio à Vida Project .

Results In the statistical analysis, the dependent variable of more than one suicide attempt was used, associated to the independent variables. Multivariate analysis, with more than one attempt and significance (p<0.05), maintained association: male OR=2,1 (IC95 %: 1,2-3,6), p=0,005; feeling rejected, RC=2,4, (IC95 %:1,4-3,9), p=0,001; admission to psychiatric hospital, RC=3,4 (IC95 %:2,0-5,7), p=0,000; believing to have disappointed someone, RC=2,4 (IC95 %:1,3-4,4), p=0,005; depression, RC=1,0 (IC95 %: 1,0-1,0), p=0,001.

Conclusion The data shows the need for greater attention to this population, in the sense of promoting differentiated service support, either psychological or psychiatric, to improve people's lives.

Key Words: Suicide, attempted, public health, Brazil (source: MeSH, NLM).


RESUMEN

Objetivos Este estudio tuvo como objetivo describir las principales características de las víctimas de intentos de suicidio atendidas en instituciones de salud pública en Fortaleza-Ceará, Brasil.

Métodos Estudio cuantitativo, se utilizó un cuestionario con preguntas estructuradas y el Inventario de Depresión de Beck. Se trabajó con una muestra de conveniencia con 360 víctimas en los Centros de Atención Psicosocial General, Atención al usuario de alcohol/drogas, la asistencia a los niños/adolescentes, Hospital Instituto José Frota y el Proyecto de Apoyo a la Vida.

Resultados En el análisis estadístico, se utilizó como variable dependiente más de un intento de suicidio, asociado con las variables independientes. En el análisis multivariante, con más de un intento, y la significación (p<0,05), se mantuvo asociada: hombre, OR=2,1 (IC95 %:1,2-3,6), p=0,005; sentimiento de rechazo, OR=2,4 (IC95 % :1,4-3,9), p=0,001; ingreso en el hospital psiquiátrico, OR=3,4 (IC95 % :2,0-5,7), p = 0,000; creer decepcionar a alguien, OR=2,4 (IC95 %:1,3-4,4), p=0,005; depresión, OR=1,0 (IC95 % :1,0-1,0), p=0,001.

Conclusión Los datos apuntan la necesidad de una mayor atención a esta población, en el sentido de promover diferenciados servicios de apoyo, sea psicológica, sea psiquiátrica para mejorar la vida de las personas.

Palabras-clave: Intento de suicidio, salud pública, Brasil (fuente: DeCS, BIREME).


Suicídio é uma ação voluntária de matar a si mesmo, envolvendo uma tríade: vontade de morrer, ser morto e de se matar. É um ato consciente de autodestruição, cujo resultado a vítima tem conhecimento (1).

Anualmente, um milhão de pessoas comete suicídio no mundo, com taxa global de 16/100 mil habitantes. O Brasil apresenta uma taxa média de 4 a 6 óbitos por 100 mil habitantes. As maiores taxas de suicídio encontram-se na China, Suíça, Franca, Bélgica, Áustria, Estados Unidos e no leste europeu (2).

O suicídio está no topo das dez principais causas de mortalidade mundial. É uma das maiores causas de mortalidade mundial, especialmente entre sujeitos jovens. A crescente prevalência tem sido considerada uma questão de saúde pública (3).

Quanto às tentativas de suicídio, não existem dados exatos no mundo, a maioria dos países não tem sistemas de monitoramento. Em estudo na área rural do Vietnam, segundo os autores referem, as pesquisas sobre tentativas de suicídios são mais frequentes em hospitais e áreas de captação epidemiológica (4). De acordo com a OMS, a cada três segundos, uma pessoa atenta contra a própria vida e, para cada ato concretizado, existem pelo menos dez tentativas e para cada tentativa registrada, ocorrem  quatro desconhecidas (5).

As tentativas trazem inúmeras sequelas tanto para a pessoa que o cometeu como para familiares, gerando turbulência entre estes (6). Em estudo realizado em São Paulo, autores confirmam, no Brasil, 24 pessoas morrem diariamente por suicídio, mas essa informação não é divulgada plenamente (7).

Embora não seja tarefa fácil, é possível prevenir tentativas de suicídios. O desafio da prevenção consiste em identificar pessoas vulneráveis, entender as circunstâncias que influenciam seu comportamento suicida e estruturar intervenções capazes de minimizar esses atos (8).

Diante da escassez de dados sobre o tema em Fortaleza, Ceará/Brasil, decidiu-se desenvolver a pesquisa com objetivo de descrever as principais características de vítimas de tentativas de suicídio atendidas em cinco instituições públicas de saúde desta cidade. Trabalhou-se com as seguintes hipóteses: 1. A tentativa de suicídio é mais comum entre o sexo feminino; 2. É maior em pessoas com conflito afetivo familiar; 3. É mais frequente entre pessoas com internamento psiquiátrico.

MATERIAL E MÉTODOS

Estudo descritivo quantitativo, transversal com 360 vítimas de tentativa de suicídio atendidas na emergência do hospital Doutor José Frota (IJF), Centros de Atenção Psicossocial CAPS (Geral), CAPSad (Atenção ao usuário de álcool/drogas), CAPSi (Assistência à criança/adolescente) e Projeto de Apoio à Vida (PRAVIDA).

Adotou-se amostra por conveniência, composta de todos os atendimentos consecutivos com diagnóstico de tentativa de suicídio, entre junho de 2011 e maio de 2012. Nos CAPS, a coleta de dados ocorreu durante doze meses consecutivos, em plantões de doze horas, três vezes por semana, conforme disponibilidade de atendimento psiquiátrico. No IJF foi realizada visita diariamente e no Projeto PRAVIDA, toda quinta-feira, dia específico para atendimento a pacientes com tentativa de suicídio.

Com vistas a uma maior representatividade possível da população estudada, porquanto se trata de uma amostra de conveniência (não se conhece o universo da população que tenta o suicídio em Fortaleza/Ceará/Brasil, ou mesmo na área em estudo), procurou-se garantir que uma parcela dos entrevistados fosse representativa da demanda do atendimento em cada instituição.

Mediante visita às instituições, inicialmente analisaram-se todos os prontuários de pacientes atendidos após tentativa de suicídio. Feita a identificação, o paciente era convidado a participar do estudo.

Cada entrevista durava trinta minutos, seguindo formulário padronizado e Inventário de Depressão de Beck (BDI). Mencionada escala (9) tem por finalidade medir o grau de depressão: leve, moderada e acentuada, é amplamente usada em pesquisa, em clínica, e discrimina indivíduos normais de deprimidos e ansiosos.

Incluiu-se na pesquisa toda vítima atendida com tentativa de suicídio pelo menos uma vez. Não houve exclusão. Como a princípio se analisava o prontuário, aqueles com dúvida de diagnóstico de tentativa de suicídio e incapazes de responderem aos instrumentos não eram incluídos no estudo.

Para a análise estatística trabalhou-se com SPSS versão 20 e EPINFO, versão 6.04ª. Como desfecho utilizou-se mais de uma tentativa de suicídio associando-as com variáveis independentes. Após a obtenção da análise bivariada por meio do teste quiquadrado e exato de Fisher, realizou-se estudo de prevalência das variáveis estudadas. Adotou-se o método de regressão logística, com critério de significância estatística nível de 5 %. O processo de seleção de variáveis aplicado foi o stepwise, analisando as razões de chance brutas e intervalos de confiança 95 %.

Na análise de regressão logística multivariada, foram incluídas as variáveis que obtiveram p≤0,20 e posteriormente incorporadas no modelo final ajustado. Na avaliação do ajuste entre variáveis e fatores de confusão que poderiam estar incluídos no modelo de regressão múltipla, efetuou-se um teste usando o método de Hosmer Lemeshor, que  forneceu percentual do modelo ideal para o teste (74,8 %).

Para avaliar as características do número de tentativas de suicídio, analisaram-se sensibilidade, especificidade e capacidade de discriminação de cada um, por meio da curva (ROC).

Houve algumas limitações metodológicas, no CAPS álcool/drogas, no período do estudo, houve redução de psiquiatras na instituição, diminuindo, portanto, as entrevistas. A amostra não é representativa dos casos de tentativas de suicídio no Município de Fortaleza, em virtude do IJF atender pessoas de todo o estado do Ceará. Não há conhecimento dos que tentaram suicídio e tiveram atendimento particular.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Maternidade Escola Assis Chateaubriand/Universidade Federal do Ceará, protocolo 46/11, conforme Resolução No 196/96, sobre pesquisas que envolvem seres humanos, do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde.

RESULTADOS

Na Tabela 1, a análise bivariada relacionando-se variável desfecho (mais de uma tentativa de suicídio) com variáveis independentes introduzidas no modelo, encontrou-se uma relação estatisticamente significativa: entre sexo masculino, RC=1,6 (IC95 %: 1,0-2,6), p=0,023; de mais de uma tentativa quando relacionado ao feminino. Quanto à idade, houve maior proporção de risco entre 30 e 59 anos, RC=4,0 (IC95 %:1,1-15,2), p=0,013. Não estudar mais, RC=3,0 (IC95 %: 1,4-6,7), p=0,001, comparados aos que ainda estudavam. Não possuir convívio com amigos foi significativo, RC=1,7 (IC95 %: 1,0-2,9), p=0,024, em relação aos que possuíam.

No concernente ao sentimento de rejeição entre família e pessoas próximas, houve significância, RC=1,8 (IC95 %: 1,2-2,9), p=0,003. Houve diferença estatística entre pessoas que não utilizavam internet, RC=2,2 (IC95 %: 1,0-4,4), p=0,018. Outro risco foi não seguir recomendações religiosas, RC=1,6 (IC95 %: 1,0-2,5), p=0,025, quando comparadas àquelas que seguem.

Presença de problema de saúde mental revelou significância, RC=2,0 (IC95 %: 1,3-3,3), p=0,002; e entre aqueles que fazem tratamento, RC=1,8 (IC95 %: 1,1-2,9), p=0,007. Pessoas com história de internamentos psiquiátricos tinham, RC=3,8 (IC95 %: 2,4-6,2), p=0,001. Outra variável significante foi utilizar alguma medicação, RC=2,5 (IC95 %: 1,6-4,1), p=0,001.

História de suicídio na família demonstrou significância, RC=2,8 (IC95 %: 1,5-5,1), p=0,001. Significante também foi história de tentativas de suicídio na família, RC=2,2 (IC95 %: 1,3-3,9), p=0,002.

Acreditar causar decepção a alguém apresentou significância, RC=2,1 (IC95 %: 1,2-3,6), p=0,003. Quanto ao motivo da tentativa de suicídio, maior número explicou-se pela presença de doença, RC=1,9 (IC95 %:1,2-3,0), p=0,008.

Na Tabela 2, permaneceram significantes no modelo final: sexo masculino, OR=2,1 (IC95 %: 1,2-3,6), p=0,005; rejeição por pessoas próximas, RC=2,4 (IC95 %: 1,4-3,9), p=0,001; internamento em hospital psiquiátrico, RC=3,4 (IC95 %: 2,0-5,7), p=0,001; acreditar ter decepcionado alguém, RC=2,4 (IC95 %: 1,3-4,4, p=0,005. Quanto à presença de depressão, seja leve, moderada ou acentuada, o risco para mais de uma tentativa de suicídio, RC=1,0 (IC95 % :1,0-1,0), p=0,001.

A regressão logística multivariada baseada com base nas 360 vítimas resultou em um poder preditivo, 70,6 %, e obteve um pseudo R2 de 0,3 %.

Na Figura 1, expõem-se os resultados de análise da curva ROC para escore total do número de tentativas, classificada como apenas uma tentativa de suicídio e mais de uma. Como observado, o resultado da área total da curva é 0,778 (erro-padrão=0,024), p<0,001 (IC95%: 0,7-0,8), com boa capacidade em discriminar o número de tentativas.

Na análise bivariada entre desfecho e variáveis independentes, a maioria de tentativas em número absoluto foi entre sexo feminino, no entanto, analisando como desfecho quem tentou suicídio mais de uma vez, o percentual foi maior entre o masculino (60,0 %). Embora alguns autores apontem que o sexo feminino tenta mais suicídio (6,10), o achado corrobora com pesquisa realizada nos Estados Unidos,  o sexo masculino tinha quatro vezes mais chance de tentar o suicídio comparado ao feminino (11). Em outro estudo na Índia, os autores também demonstram maioria entre o sexo masculino (12).

DISCUSSÃO

A faixa etária de risco no estudo, foi de 30 a 59 anos de idade (60,0 %). Contudo, os resultados não estão em conformidade com alguns pesquisadores. Por exemplo, Minas Gerais, os autores identificaram faixas etárias mais expressivas de 15 a 24 anos e de 25 a 39 (13). Não estudar mais predominou como risco, razão de chances de três vezes para mais de uma tentativa de suicídio quando comparados com quem ainda estuda. Para alguns autores, escola é local privilegiado para a identificação precoce de situações problemáticas, grupo de amigos e escola são essenciais para a qualidade de vida (14).

A associação entre mais de uma tentativa de suicídio e falta de amigos é refletida no presente estudo (60,0 %). De acordo com alguns autores, pessoas sozinhas com poucos amigos apresentaram prevalências mais altas de planejamento suicida (12). Conforme literatura, problemas de relacionamento, separação de amigos e isolamento social são fatores de risco para suicídio (7,8).

Um aspecto significante 60,0 % de eles referirem sentimento de rejeição por alguém próximo, com risco de quase duas vezes mais para mais de uma tentativa de suicídio. Para o ser humano, ser rejeitado é um sentimento terrível, que pode provocar sensação de abandono e depreciação. Pesquisa evidencia registros de afastamento da família, sentimentos de rejeição, tristeza, desesperança e falta de perspectivas futuras na amostra como fator de risco para o suicídio (15).

Outra variável significante foi utilização de internet. Dentre os 315 que não utilizavam, havia risco superior a duas vezes para mais de uma tentativa de suicídio. Na atualidade, usar internet é comum entre as pessoas aproximando-as para um melhor convívio social. Segundo estudo sobre Rede de apoio social e tentativa de suicídio, as relações sociais bem-sucedidas, além de disponibilidade e frequência de contato com amigos, são importantes quanto à prevenção de tentativa de suicídio (16).

Não seguir recomendações religiosas foi significativo como risco. Para alguns estudiosos, religião pode propiciar uma força positiva que neutraliza ideação suicida, sobretudo porque o compromisso religioso promove laços sociais, reduz alienação e parece ser poderoso fator contra comportamento suicida (17). Em estudo sobre ideação suicida na adolescência, indivíduos com maior envolvimento religioso apresentam menores taxas de suicídios (18).

Ressalta-se, ainda: houve relação significante entre o número de tentativas de suicídio e ter problema de saúde mental. De acordo com os dados, 60,0 % tentaram o suicídio mais de uma vez. Autores relatam que o comportamento suicida tem sido largamente descrito associado à depressão e presença de transtorno mental (7). Consoante outros autores, estes transtornos podem variar desde a intensidade de desesperança, frequente ideação suicida, depressão, esquizofrenia, transtornos de personalidade e uso alcoólico (8).

Outro aspecto relevante encontrado na pesquisa foi a associação ao desfecho e realização de tratamento para o problema de saúde. Este fato poderá está ocorrendo em virtude de associação de história de tentativas de suicídio, doença mental, como também presença de outras comorbidades (19). Entre os que faziam tratamento para o problema de saúde, havia um risco de quase duas vezes para mais de uma tentativa de suicídio quando comparados aos que não realizavam. Ademais, determinadas doenças físicas apresentam também significativa associação com os comportamentos suicidas, entre as quais, doenças neurológicas, infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e algumas neoplasias (20).

Na afirmação de certos autores, indivíduos com problemas de saúde estão fortemente associados com tentativas de suicídio. Ainda como afirmam, na presença de doenças os profissionais estão em contato regular com pacientes em risco de suicídio, e estes são um recurso importante para a detecção precoce e prevenção do comportamento suicida (4). Em relatório sobre cuidados de prevenção ao suicídio na Universidade de Michigan, o autor informa que a prevenção do suicídio pode começar na emergência ou unidade de internação, podendo se prolongar por meses e até anos já que alguns pacientes às vezes permanecem em risco crônico (21). Dos 138 que referiram internamentos, 70,0 % tentaram o suicídio mais de uma vez. Entretanto, em estudo realizado em São Paulo, não foi encontrada associação estatística entre tentativas de suicídio e internações psiquiátricas (22). Já em estudo realizado na Dinamarca, na análise multivariada, a hospitalização psiquiátrica recente era o fator mais fortemente associado a suicídio (23).

Ainda no presente estudo, houve associação quanto à utilização de medicamento. Dos 244 que utilizavam, 60,0 % tentaram o suicídio mais de uma vez. Em estudo sobre prevenção e risco de tentativa de suicídio, o tipo específico de tratamento a ser estabelecido para cada paciente não depende apenas da estimativa do risco de suicídio, mas, especialmente do envolvimento da família no tratamento. Outra questão é a habilidade em lidar com o suicídio, milhares de vidas poderão ser salvas se forem adequadamente abordadas e tratadas (24).

Outras associações de riscos ao desfecho foram tentativas de suicídio e de suicídio na família  corroborando grande parte da literatura (7,18).

Quanto causar decepção em alguém pela tentativa de suicídio e desfecho, houve associação. Isso provavelmente ocorre pelo medo de gerar expectativas entre pessoas próximas quanto ao preconceito pelo ato suicida, constrangimento, vergonha e estigma social, rejeição ou mesmo a possibilidade de abandono dos amigos e familiares.

No tocante ao motivo da tentativa de suicídio, 60,0 % tentaram o suicídio mais de uma vez pela presença de doença. Os dados confirmam estudo sobre risco de suicídio em jovens com transtornos de ansiedade (25).

Na análise de regressão multivariada, o maior número de casos de tentativas de suicídio foi entre o sexo feminino. No entanto, quando pesquisado em relação ao desfecho (mais de uma tentativa de suicídio) foi significativo para o masculino. Como o sexo feminino tenta mais vezes, a expectativa do estudo era que este poderia também superar o masculino quanto ao número de vezes de tentativas de suicídio. Tal fato, porém, não ocorreu na presente pesquisa. A associação com o desfecho manteve-se significante entre o sexo masculino. Quanto à rejeição, os dados se mantiveram significantes confirmando pesquisa sobre fatores de risco ou proteção para a presença de ideação suicida na adolescência, os autores salientam a rejeição como conflito social, conflitos interpessoais como fatores que aumentam o risco de tentativa de suicídio (26).

Seguir recomendações religiosas, não manteve significância, embora estudo afirme ser importante fator de proteção (18). Verificou-se ainda associação significativa em relação a história de internamento psiquiátrico, corroborando pesquisas por outros autores como, por exemplo, a realizada na Califórnia (EUA), na qual as internações psiquiátricas foram fatores de risco significantes (27).

E, ainda: o desfecho manteve-se significativamente associado à vítima acreditar causar decepção em outras pessoas pelo ato praticado. O medo decorre do estigma social e como vai conseguir atravessar a crise que levou a tentar suicídio. Ademais, a depressão também manteve significância no modelo proposto. Conforme a literatura há associação da depressão e suicídio (7,28).

Embora em estudos diferentes, pesquisadores da Colômbia em pesquisa sobre ideação suicida na cidade de Bogotá, encontraram na análise multivariada riscos para ideação suicida o conflito familiar e a não resolução de conflitos (29).

Como evidenciado, os resultados não confirmam a primeira hipótese, conforme detalhada na introdução ia, o número de tentativas de suicídio foi maior entre o sexo masculino (60,0 %). A rejeição poderá gerar conflito familiar, confirmando, assim, em parte, a segunda hipótese: as tentativas de suicídio são mais frequentes entre indivíduos em conflito afetivo familiar, entre outros. Entre aqueles com mais de uma tentativa de suicídio há uma razão de chance de quase duas vezes para mais de uma tentativa. No entanto, não se pode afirmar com segurança que as tentativas são mais frequentes entre os que já o fizeram antes.

Os resultados encontrados confirmam a terceira hipótese: as tentativas de suicídio foram mais frequentes entre as vítimas com história de internamento psiquiátrico.

Com base nos dados encontrados, estratégias de prevenção são extremamente importantes e a intervenção terapêutica de profissionais da área da saúde mental é de extrema relevância, pois milhares de vidas poderão ser salvas se forem adequadamente abordadas e tratadas. Sugere-se que estratégias de gestão e tratamento para casos de tentativas de suicídio devem fazer parte do comportamento clínico e institucional, por meio de diretrizes e padrões reconhecidos *


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