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Revista de Salud Pública

versión impresa ISSN 0124-0064

Rev. salud pública vol.19 no.5 Bogotá sep./oct. 2017

https://doi.org/10.15446/rsap.v19n5.39467 

Artículos/Investigación

(In)-Segurança alimentar de famílias residentes em um município do interior da Paraíba, brasil

Food (in)security of families living in a city of Paraíba, Brazil

(In)Seguridad alimentaria de familias residentes en un municipio del interior de Paraíba, Brasil

Dixis Figueroa-Pedraza1 

Thaíse Alves-Bezerra2 

Ana C. Dantas Rocha Cerqueira3 

Jacqueline Santos-Da Fonsêca4 

1 DF: Bacharel em Alimentos. M. Sc. Nutrição em Saúde Pública. Ph. D. Nutrição. Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande. Paraíba, Brasil. dixisfigueroa@gmail.com

2 TA: Enfermeira. M. Sc. Saúde Pública. Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande, Paraíba, Brasil. thaise_gba@hotmail.com

3 AD: Enfermeira. M. Sc. Saúde Pública. Ph. D. Enfermagem. Profesora del Curso de Enferme ría del Centro Universitario UNIFACISA - CG. Facultad de Enfermería Nueva Esperanza (FA CENE) - JP. Paraíba, Brasil. aninhacdr@hotmail.com

4 JS: Nutricionista. M. Sc. Saúde Coletiva. Universidade Estadual da Paraíba, Campina Grande. Paraíba, Brasil. jacquelinerjl@hotmail.com


RESUMO

Objetivo

Determinar a prevalência de insegurança alimentar entre famílias residentes no município de Queimadas e sua associação com as características socioeconómicas e demográficas.

Métodos

Estudo transversal, envolvendo 204 famílias residentes no município de Queimadas, interior da Paraíba, atendidas em serviços públicos de atenção básica à saúde e com crianças pequenas no núcleo familiar. A segurança alimentar foi avaliada pela Escala Brasileira de Insegurança Alimentar. Foi estudada a associação da insegurança alimentar com as características socioeconômicas e demográficas das famílias, usando modelo de regressão logística.

Resultados

A aplicação da escala revelou que 65,4 % das famílias sofriam com insegurança alimentar, sendo 8,4 % leve; 18,5 % moderada e 38,5 % grave. Maiores prevalências de insegurança alimentar foram encontradas nas famílias não beneficiárias de programa social e com precariedade em condições relacionadas ao saneamento ambiental (sem sanitário no domicílio, sem descarga no sanitário, consumo de água não tratada, escoamento sanitário a céu aberto).

Conclusões

Os resultados do presente estudo mostram que mais da metade das famílias atendidas em serviços públicos de atenção básica à saúde e com crianças pequenas residentes na cidade de Queimadas vive em estado de insegurança alimentar e que as características socioeconômicas são determinantes importantes desse estado.

Palavras-Chave: Estado nutricional; saúde da criança; atenção primária à saúde (fonte: DeCS, BIREME)

ABSTRACT

Objective

To determine the prevalence of food insecurity among families living in the municipality of Queimadas and its association with socioeconomic and demographic characteristics.

Methods

Cross-sectional study involving 204 families living in the municipality of Queimadas, state of Paraíba, Brazil, attended at public primary health care services and with small children in the family core. Food security was assessed by the Brazilian Scale of Food Insecurity. The association between food insecurity and socioeconomic and demographic characteristics of families was studied using a logistic regression model.

Results

The application of the scale revealed that 65.4 % of families suffered from food insecurity, being 8.4 % mild, 18.5 % moderate and 38.5 % severe. High prevalences of food insecurity were found in families not receiving social program and in precarious conditions related to sanitation (no toilet inside houses, without toilet flushing, consumption of untreated water, open sewage).

Conclusions

The present study shows that more than half of the families with young children living in the city of Queimadas, served in public primary health services, live in a state of food insecurity and that socioeconomic characteristics are determinant of this state.

Key Words: Nutritional status; child health; primary health care (source: MeSH. NLM).

RESUMEN

Objetivo

Determinar la prevalencia de inseguridad alimentaria entre familias residentes en el municipio de Queimadas y su asociación con las características socioeconómicas y demográficas.

Métodos

Estudio transversal que involucro a 204 familias residentes en el municipio de Queimadas, interior de Paraíba, atendidas en servicios públicos de atención básica de salud y con niños pequeños en el núcleo familiar. La seguridad alimentaria fue evaluada por medio de la Escala Brasileña de Inseguridad Alimentaria. Fue estudiada la asociación de la inseguridad alimentaria con las características socioeconómicas y demográficas de las familias, usando modelo de regresión logística.

Resultados

La aplicación de la escala reveló que 65,4 % de las familias estaban con inseguridad alimentaria, siendo 8,4 % leve; 18,5 % moderada y 38,5 % grave. Mayores prevalencias de inseguridad alimentaria se encontraron entre familias no beneficiadas por el programa social y con precariedad en condiciones relacionadas con el saneamiento ambiental (sin baño en el domicilio, baño sin descarga, consumo de agua no tratada, desagüe sanitario a cielo abierto).

Conclusiones

El presente estudio muestra que más de la mitad de las familias con niños pequeños, residentes en la ciudad de Queimadas, que son atendidas en servicios públicos de atención primaria de salud, viven en estado de inseguridad alimentaria y que las características socioeconómicas son determinantes de ese estado.

Palabras Clave: Estado nutricional; salud del niño; atención primaria de salud (fuente: DeCS, BIREME)

A alimentação faz parte das necessidades básicas do ser humano. Quando garantida de forma adequada, promove uma nutrição segura, contribuindo para que o indivíduo atinja seu potencial pleno de crescimento e desenvolvimento, com boa qualidade de vida, dignidade e cidadania 1. O conceito de segurança alimentar surge durante a Primeira Guerra Mundial relacionado à segurança nacional, ganhando importância na Segunda Guerra Mundial. Em 1946 a fome é discutida como questão política com a publicação do livro Geografia da Fome de Josué de Castro. Nos anos 70 passa a ser vista como questão de produção agrícola, nos anos 80 amplia sua visão ao acesso e no ano 1996 é discutida a responsabilidade do Estado para assegurar a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) como direito 2. No Brasil, o direito à alimentação como eixo norteador da SAN é respaldado na Lei Orgânica da SAN de 2006 3, a qual define SAN como A realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras da saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, cultural, econômica e ambientalmente sustentáveis.

Assim conceituada, a SAN configura um ideal de cidadania 4, na perspectiva do direito de todos (e de cada um) 5, passando a ocupar um papel central e estratégico fundamental do desenvolvimento humano 2. Por sua importância, a SAN tem sido tema recorrente no mundo todo nas áreas de saúde, nutrição e das ciências sociais, o que tornou necessária a busca de indicadores para o seu acompanhamento e avaliação, a comparabilidade tem-po-espacial e a avaliação do impacto das intervenções 6. Seguindo os argumentos da escola americana, ao indicar limitações da medição da san através de medidas indiretas que buscam quantificar o número de indivíduos em situação de carência alimentar ou fome, pesquisadores brasileiros adaptaram e validaram para o país a US Household Food Security Survey Measure. Denominada Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), a escala propõe que a experiência da fome tem aspectos sociais e psicológicos sem apresentar sempre consequências físico-biológicas, constituindo a única medida direta da insegurança alimentar e fome 7.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), utilizando a EBIA, identificou que 30,2 % da população brasileira possuem algum grau de insegurança alimentar, com prevalências maiores nas regiões Norte (40,3%) e Nordeste (46,1 %). Nesse estudo, a prevalência de insegurança alimentar das famílias da Paraíba foi de 41,0 % 8. Por sua vez, estudo de base populacional 9 realizado em 14 municípios do interior da Paraíba indicou prevalência de insegurança alimentar de 52,5 %, destacando Queimadas como um dos municípios de maior prevalência (61,8 %).

Considerando que a insegurança alimentar é determinada, principalmente, pela pobreza e pelas desigualdades sociais, com repercussões principalmente nos grupos mais vulneráveis 10, este trabalho teve por objetivo determinar a prevalência de insegurança alimentar, e sua associação com as características socioeconômicas e demográficas, entre famílias residentes no município de Queimadas, atendidas em serviços públicos de atenção básica à saúde e com crianças pequenas no núcleo familiar. O município de Queimadas, localizado na região do agreste paraibano, possui o comércio como uma de suas principais atividades econômicas. Entretanto, 21,8 % da sua população auferem rendimentos abaixo da linha da pobreza extrema, proporção que corresponde a quase o dobro da reportada, por exemplo, no município de Campina Grande (12,2%) 11.

METODOLOGIA

Local, população e amostra de estudo

O presente estudo do tipo transversal baseia-se no banco de dados da pesquisa "Situação Alimentar, Nutricional e Atenção à Saúde Materno-Infantil na cidade de Queimadas, Paraíba", desenvolvida nos meses de julho e agosto de 2011.

O estudo foi realizado no Município de Queimadas, localizado na Região Metropolitana de Campina Grande e na Mesorregião do Agreste Paraibano, com uma área de 401,77 km 12. O sistema de saúde do município é constituído por 16 Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF), sendo 11 rurais e cinco urbanas; um Centro de Atenção Psicossocial; um Núcleo de Apoio à Saúde da Família; um Centro de Saúde, no qual funcionam serviços de atendimento odontológico e exames bioquímico-labo-ratoriais; e uma Unidade Mista que oferece apoio à rede de serviços de saúde.

Foram incluídas no estudo todas as famílias com crianças nascidas durante o ano de 2009, residentes em Queimadas no momento da coleta de dados. Para quantificar o total de nascidos vivos em 2009 foram consideradas as Declarações de Nascidos Vivos (DNVS), disponíveis na Secretaria Municipal de Saúde. A informação foi complementada por busca ativa de nascimentos junto aos Agentes Comunitários de Saúde (ACSS) e enfermeiros. Considerando o endereço constante na dnv, foi realizado um mapeamento das crianças por unidade de saúde de acordo com a área de abrangência de cada unidade. A identificação das famílias inicialmente elegíveis que não residiam em Queimadas, na ocasião da coleta de dados, foi verificada através de informantes-chave (enfermeiros, acss, líderes comunitários).

Foram excluídas as famílias cujas mães não realizaram nenhuma consulta de pré-natal em alguma das ubsf do município durante a gravidez do filho nascido em 2009, famílias cujas mães tiveram uma gravidez subsequente à da criança nascida em 2009, famílias cujas mães possuíam idade inferior a 18 anos, famílias que possuíam crianças nascidas em 2009 com malformações congênitas graves e famílias cujas crianças nascida em 2009 eram gêmeas ou faleceram. As informações anteriores foram fornecidas pelos enfermeiros e/ou coletadas em documentos oficiais (livros de registro, prontuários, fichas do siab). Mães com as quais não foi possível realizar contato ou visitar o domicílio após três tentativas foram consideradas perdas.

Procedimentos para a coleta de informação

As informações foram coletadas nas ubsf e/ou no próprio domicílio materno. O instrumento de coleta utilizado na pesquisa constou de um questionário, com questões abertas e fechadas, contendo informações dirigidas às mães sobre as características socioeconômicas e demográficas de suas famílias. Adicionalmente foi aplicada a EBIA.

Foi elaborado um Manual Instrucional objetivando orientar e padronizar o preenchimento dos questionários e a coleta dos dados. Foi realizado treinamento dos entrevistadores para apreciação do instrumento de coleta e realização de ajustes no mesmo. O estudo piloto foi feito no Centro de Saúde da Palmeira do município de Campina Grande. Numa segunda etapa, os entrevistadores debateram as dificuldades surgidas, ocasião em que foram feitas novas adaptações no questionário, resultando por fim, no modelo definitivo que foi aplicado.

Variáveis de estudo e análise dos dados

Os dados foram digitados no programa Excel, com dupla digitação dos questionários, para comparação e detecção de possíveis erros. Foi utilizado o aplicativo Validate do programa Epi-Info para verificar a consistência dos dados.

Para a avaliação das características socioeconômicas e demográficas, foram utilizadas as seguintes variáveis: chefe da família, cor da pele da mãe, situação conjugal da mãe, escolaridade da mãe, benefício de programa social, zona de localização do domicílio, presença de sanitário no domicílio, presença de descarga no sanitário do domicílio, abastecimento de água no domicílio, tratamento da água para beber no domicílio, destino do lixo no domicílio, escoamento sanitário no domicílio, número de cômodos no domicílio.

Para avaliar a situação de (in)segurança alimentar das famílias, foi utilizada a ebia. Este questionário compõe-se de 15 perguntas fechadas com respostas positivas e negativas, que avaliam a percepção da entrevistada sobre a situação alimentar vivida nos últimos três meses anteriores à entrevista. Para as respostas positivas, foi atribuído o valor 1 (um) e, para as negativas, o valor 0 (zero). Quando todas as perguntas da EBIA foram respondidas negativamente, a família foi classificada em situação de Segurança Alimentar; até 5 perguntas positivas, Insegurança Alimentar Leve; de 6 a 10 respostas positivas, Insegurança Alimentar Moderada; e de 11 a 15 respostas positivas, Insegurança Alimentar Grave 13.

As diferenças na distribuição das proporções de (in) segurança alimentar, segundo diferentes categorias de variáveis independentes de estudo, foram realizadas usando o teste qui-quadrado, sendo consideradas significativas quando o valor de p<0,05. Utilizou-se modelo de regressão logística multivariada, aplicando o método de adição progressiva das variáveis, incluindo as variáveis que apresentaram p<0,20 nas análises bivariadas, considerando como critérios de inclusão e exclusão níveis de significância estatística Wald menor ou igual a 5 % e maior ou igual a 10 %, respectivamente. Foram calculados os valores de Odds Ratios e os respectivos intervalos de confiança de 95 % das variáveis que permaneceram no modelo final. As análises foram desenvolvidas com o auxílio do programa estatístico Rv2.10.0.

Aspectos éticos

Em observância às determinações da Resolução i96/96, do Conselho Nacional de Saúde do Brasil, o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba, protocolado com o número 0170.0.133.000-11. Após terem sido devidamente esclarecidas a respeito da pesquisa, todas as mães assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Segundo o registro de DNV, 407 partos de mães residentes em Queimadas foram verificados inicialmente. Por busca ativa foram identificadas 43 mães, totalizando 450 partos ocorridos durante o ano de 2009. Um total de 27 mães foram identificadas como não residentes em Queimadas na ocasião da coleta de dados. Assim, 423 famílias foram consideradas elegíveis. Desse total foram excluídas 90 famílias, sendo 43 por não realização de consultas de pré-natal em alguma das UBSF (mães com plano de saúde); 40 por gravidez após o parto ocorrido em 2009; uma por idade materna inferior a i8 anos; duas por serem crianças com malformações congênitas graves; uma por gravidez de gêmeos e três por falecimento das crianças durante o primeiro ano de vida. Houve 120 perdas e nove recusas. A aplicação da ebia revelou que das 204 famílias que participaram do estudo, 65,4 % sofriam com a insegurança alimentar em diferentes graus: 8,4 % insegurança alimentar grave, 18,5 % insegurança alimentar moderada e 38,5 % insegurança alimentar leve.

A mãe como chefe de família foi registrada em 12,2 % dos domicílios, enquanto 81 % das mães referiram viver com companheiro. A maioria delas declarou-se de cor parda (71,6 %) e 12,7 % possuíam baixa escolaridade (<5 anos de estudo). Quanto às condições de saneamento básico, verificou-se que 39 % dos domicílios não estavam ligados à rede pública de abastecimento de água, 71,2 % não tinham acesso a tratamento público de esgoto e 14,1 % não possuíam água tratada/mineral para consumo individual. Maiores prevalências de insegurança alimentar foram encontradas nas famílias beneficiárias de programa social, que não dispunham de sanitário no domicílio, que não tinham descarga no sanitário, que bebiam água não tratada e que não dispunham de sistema de esgoto domiciliar. Para os beneficiários de programa social, a percepção foi marcadamente mais evidente para a insegurança alimentar moderada, que teve prevalência 3,72 vezes mais elevada no grupo de famílias que recebiam o auxílio (22,7% versus 6,1 %) (Tabela 1).

Tabela 1 Situação de (in)segurança alimentar classificada segundo a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar, de acordo com as características socioeconômicas e demográficas das famílias.Queimadas (PB), 2011 

No modelo de regressão logística multivariada (Tabela 2), observou-se que o benefício do programa social associou-se a uma chance maior do que 3 vezes mais de insegurança alimentar. Ausência de sanitário no domicílio, ausência de descarga no sanitário do domicílio, ausência de sistema de esgoto no domicílio e o consumo de água não tratada permaneceram associadas à insegurança alimentar, com valores de razões de chance entre 2,16 e 3,03. A ausência de saneamento básico associou-se a uma chance maior do que duas vezes mais de insegurança alimentar, referido tanto para o uso de fossa quanto a céu aberto.

Tabela 2 Odds ratios (OR) e intervalos de confiança (IC 95%) entre variáveis socioeconómicas e demográficas e insegurança alimentar 

Escala Brasileira de Insegurança Alimentar. Modelo de regressão logística multivariada com segurança alimentar como variável dependente (categoria de referência=segurança alimentar). Queimadas (PB), 2011

DISCUSSÃO

A prevalência significativa de insegurança alimentar observada entre as famílias de Queimadas (65,4 %), possivelmente, é resultado das condições de vida precárias a que está submetida a população dessa área. Queimadas é um município com predomínio da área rural e com alta proporção da população com rendimentos abaixo da linha da pobreza. Em Queimadas, da população elegível para este estudo, representada por usuárias de serviços públicos de saúde, 75,1 % das famílias tinham benefício de programa social e 62,0 % residiam na zona urbana.

Altas prevalências de insegurança alimentar também foram reportadas em populações de risco: 88,2 % entre famílias com crianças menores de cinco anos do município de Gameleira (PE), município da zona da mata meridional e um dos mais pobres do Estado 14; 88,0% entre famílias usuárias de serviços públicos de saúde residentes na zona rural de Maranguape, região metropolitana de Fortaleza (CE) 15; 87,3 % entre famílias com crianças menores de cinco anos do município de São João do Tigre (PB), de baixo Índice de Desenvolvimento Humano 16; 74,6 % entre famílias beneficiárias de programas de transferência de renda 17; 72,0 % entre famílias do distrito Campos Elíseos, um dos mais pobres de Duque de Caxias (RJ) 18. Entretanto, na população norte-americana, inquérito de base domiciliar revelou que apenas 11,1 % da população encontrava-se em situação de insegurança alimentar em 2007 19. No Brasil, nas populações de Pelotas (RS) 20 e do Distrito Federal 21, 11,0 % e 24,9 % das famílias, respectivamente, assoalharam insegurança alimentar. Prevalências de insegurança alimentar, também, bem menores que as observadas neste estudo foram registradas na PNAD para o Brasil (30,2 %), para a região Nordeste (46,1 %) e para a Paraíba (41,0 %) 8. Embora ainda menores, mas similares, foram as prevalências de insegurança alimentar quando a EBIA foi aplicada nos 14 municípios do interior da Paraíba selecionados pelo Governo Federal para iniciar o Programa Fome Zero, tanto para o conjunto da população (52,5 %) quanto para a população de Queimadas (61,8 %) 9.

Os resultados desta pesquisa alinham-se aos de outros estudos, publicados entre 2008 e 2012, que mostraram a importância da determinação socioeconômica da insegurança alimentar das famílias brasileiras 9,10,16,17,19-22. Observa-se, no conjunto desses trabalhos, diversidade de variáveis socioeconômicas que têm sido relacionadas à insegurança alimentar, indicando, de fato, consistência com o que seria esperado: famílias mais vulneráveis do ponto de vista socioeconômico apresentam maiores prevalências de insegurança alimentar. Os dados desses estudos encontram-se apresentados no Quadro 1. Esses achados podem ser ainda reforçados se considerado que no município de Queimadas a insegurança alimentar associou-se a três condições socioeconômicas estudadas de maneira diferente: ausência de sanitário no domicílio, ausência de descarga no sanitário do domicílio, falta de tratamento da água para beber. Esses resultados, conjugado à importância revelada pelo sistema de esgoto no domicílio, mostram que a probabilidade de insegurança alimentar para uma família depende do acesso a serviços de saneamento básico e confirmam a importância de investimentos do Estado nesse sentido. Meritório é enfatizar, também, a importância da garantia do acesso à água de qualidade para beber.

Quadro 1 Características de alguns estudos sobre a situação de (in)segurança alimentar de famílias brasileiras, avaliada pela Escala Brasileira de Insegurança Alimentar, e associação com variáveis socioeconómicas 

A maior prevalência de insegurança alimentar entre beneficiários de programas sociais converge com a hipótese que sugere condições de maior vulnerabilidade decorrente da marginalização ou exclusão social nessas famílias 17. Tanto a PNAD de 2004 23 quanto a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde de 2006 24 mostraram que os beneficiários de programas com transferências condicionadas de renda tinham pior condição de acesso aos alimentos quando comparado aos não beneficiários. A prevalência de insegurança alimentar de 83,1% entre beneficiários do Programa Bolsa Família encontrada numa amostra probabilística de 5000 domicílios brasileiros também expressa a maior magnitude do problema neste grupo 25. Maiores prevalências de insegurança alimentar entre beneficiários de programas de transferência de renda sugerem o adequado destino dos recursos.

Além da clara associação inversa entre as prevalências de insegurança alimentar e as variáveis socioeconômicas encontradas neste estudo, outro resultado que chama atenção é que a zona de localização dos domicílios não influenciou a prevalência de insegurança alimentar. Situação diferente foi observada em estudo abrangendo 14 municípios da Paraíba que indicou prevalências maiores de insegurança alimentar na zona rural 9. Os resultados das famílias de Queimadas, possivelmente, relacionam-se às características próprias do município: alta proporção de famílias com rendimentos baixos e desproporcionalidade entre residentes segundo a zona com marcada predominância rural. Como na zona rural prevalece um quadro de pobreza bem mais generalizado/difuso, que predomina também no município, a população torna-se mais homogênea e sem diferenciações tão marcantes (maior igualdade de pobreza). Além disso, as diferenças nos mecanismos de subsistência das famílias de zonas urbanas em relação às de zonas rurais também poderia justificar a ausência de diferenças na avaliação da segurança alimentar. De qualquer forma, é de ressaltar que ainda são limitados os estudos nesse sentido, o que alerta a importância de investigações que tratem das variações do tipo urbano-rural relacionadas à SAN.

Concluindo, os resultados do presente estudo mostram que mais da metade das famílias com crianças pequenas residentes na cidade de Queimadas, interior da Paraíba, atendidas em serviços públicos de atenção básica à saúde, vivem em estado de insegurança alimentar; como esperado, as características socioeconômicas são determinantes importantes desse estado. Tendo em vista essa relação, destaca-se a necessidade de esforços para manter e melhorar as políticas econômicas e sociais que têm favorecido o aumento do poder aquisitivo dos mais pobres e de investimentos públicos que permitam completar a universalização dos serviços essenciais de educação, saúde e saneamento de qualidade. Urge, também, a necessidade de maiores esforços para o delineamento e a condução de estudos de distribuição cronológica e espacial, a exemplo de diferenciais urbano-rural, e focados na avaliação de intervenções

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Recebido: 08 de Agosto de 2013; Revisado: 16 de Julho de 2016; Aceito: 24 de Maio de 2017

Conflito de interesse:

Nenhum.

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