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Apuntes: Revista de Estudios sobre Patrimonio Cultural - Journal of Cultural Heritage Studies

Print version ISSN 1657-9763

Apuntes vol.25 no.2 Bogotá July/Dec. 2012

 

Avaliação da influência do teor de água na trabalhabilidade de argamassas de terra*

Maria Idália Gomes**, Teresa Diaz Gonçalves***, Paulina Faria****

**idaliagomes@dec.isel.ipl.pt Universidad de Nueva Lisboa
Ingeniera Civil con Magíster en Construcción del Instituto Superior Técnico de la Universidad Técnica de Lisboa. PhD en Ingeniería Civil y especializada en Ciencias de la Construcción de la Facultad de Ciencia y Tecnología.
***teresag@lnec.pt Universidad de Nueva Lisboa
PhD en Ingeniería Civil y Máster de la Construcción en el Instituto Superior Técnico de Lisboa. Investigador del Laboratorio Nacional de Ingeniería Civil.
****paulina.faria@fct.unl.pt Universidad de Nueva Lisboa
Doctora en Ingeniería Civil, especialista en rehabilitación del patrimonio construido de la Facultad de Ciencia y Tecnología. Profesor asociado.

Articulo de reflexión. El artículo hace parte de la tesis doctoral de Maria Idália Gomes para optar al título de doctorado de la Universidad Nova de Lisboa, Facultad de Ciencia y Tecnología. El trabajo experimental, que actualmente se encuentra en su fase final, se está desarrollando con la participación de las otras autoras en el Laboratorio Nacional de Ingeniería Civil.

Recepción: 29 de mayo de 2012 Aceptación: 15 de septiembre de 2012


Evaluación de la influencia del contenido de agua en la trabajabilidad del mortero de tierra

Resumen

En la actualidad existe un nivel elevado de ignorancia con respecto a la rehabilitación y conservación de los edificios construidos con tierra. La aplicación de un mortero de tierra debe ser compatible con los soportes, es esencial entender su comportamiento. La cantidad de agua en la mezcla tiene una gran influencia en las características físicas, trabajabilidad y su aplicación. Con el objetivo de solucionar este alto grado de desconocimiento al respecto, se realizaron pruebas de caracterización de los morteros en estado fresco y endurecido Se utilizaron cuatro tierras diferentes, añadiendo diferentes cantidades de agua. El objetivo es también evaluar directamente la viabilidad de estos morteros, a través de las aplicaciones realizadas por los operadores en muestras de tapia. Después de analizar los resultados se observó que la contracción y la trabajabilidad están fuertemente influenciadas por la relación de agua/material seco, que afecta a la viabilidad. Sin embargo, el operador es un factor muy importante en la aplicación de un mortero.

Palabras clave: mortero de tierra, contenido de agua, trabajabilidad, coherencia, contracción.


Evaluation of the influence of water contents in the workability of earth mortars

ABSCTRACT

Currently there is a high level of ignorance in what respects rehabilitation and conservation of earth buildings. It is necessary to use a mortar compatible with these kinds of supports. Therefore, it is essential to understand the behavior of earth mortars. It is known that the amount of water used in mixing has great influence on physical characteristics, workability and consequently, application -particularly with the presence of clays.

With the objective of filling up the knowledge void, characterization tests were performed on fresh and hardened earth mortars, with four different earths, in which six different water levels were added. Another objective is to directly assess the workability through applications that were made by masons in rammed earth samples. After analyzing the results it was observed that the shrinkage and workability are strongly influenced by the water/dry material, affecting the viability of a mortar. However, the mason is a highly important factor in its application of a mortar.

Key-words: earth mortar, water content, workability, consistency, retraction.


Avaliação da influência do teor de água na trabalhabilidade de argamassas de terra

RESUMO

Existe atualmente um elevado desconhecimento ao nível da reabilitação e conservação de edificações construídas em terra. Deve usar-se uma argamassa com base em terra, compatível com estes suportes, sendo fundamental conhecer o seu comportamento. A quantidade de água utilizada na amassadura de uma argamassa tem grande influência nas características físicas, na trabalhabilidade e, consequentemente, na sua aplicação.

Com este objetivo foram realizados ensaios de caracterização no estado fresco e endurecido, em argamassas de terra realizadas com quatro terras distintas, sendo adicionado a cada uma seis diferentes teores em água. Pretende-se ainda avaliar diretamente a trabalhabilidade, mediante aplicações efetuadas por operadores em provetes de taipa. Após analisados os resultados foi possível observar que a retração e a trabalhabilidade de uma argamassa são fortemente influenciadas pela relação água/material seco, condicionando assim a viabilidade de uma argamassa. Contudo, o operador é um fator de elevada importância na aplicação de uma argamassa.

Palavras-chave: argamassa de terra, teor em água, trabalhabilidade, consistência, retração.

SICI: 1657-9763(201212)25:2<258:EICATM>2.0.TX;2-H

* Los descriptores y key words plus están normalizados por la Biblioteca General de la Pontificia Universidad Javeriana.


Ao longo das últimas décadas tem se vindo a assistir a uma mudança de mentalidades a nível mundial, havendo uma maior preocupação no uso de materiais sustentáveis, quer em novas construções, quer em reabilitação e conservação.

As argamassas de terra, em que o ligante é a argila, foram comummente utilizadas no passado. Hoje em dia, materiais com base em cimento são normalmente utilizados, inclusive para reparação de paramentos de taipa sem estabilização, levando a resultados menos duráveis e ao aparecimento de anomalias expressivas nas edificações

Uma argamassa de reparação deve, acima de tudo, ser compatível com o paramento a reparar. Estudos sobre argamassas com base em cimento ou cal, no seu estado fresco ou endurecido, são comuns. Todavia, existem muitas lacunas no conhecimento sobre argamassas de terra, ou seja, existem poucos estudos e estes são muito dispersos, quer em termos de métodos de ensaios, quer de materiais analisados.

Não existem estudos relativos à influência do teor de água correlacionando-o com a trabalhabilidade; sendo um aspeto fundamental, deveria ser talvez o primeiro a abordar no âmbito da formulação de argamassas deste tipo.

Segundo a RILEM (1982) "o único meio evidente que um pedreiro tem à sua disposição para corrigir a trabalhabilidade de uma argamassa é alterando o seu teor em água" (RILEM, 1982, p.479). O teor de água tem, de facto, grande influência nas características físicas e na trabalhabilidade deste tipo de argamassas. Esta elevada influência é devida à presença de argilas, que alteram as suas propriedades físicas em presença da água, nomeadamente ao nível da plasticidade, compactação e retração.

Foram recolhidos materiais de zonas não expostas das paredes de três construções de taipa localizadas na região do Alentejo, Portugal (Avis e Odemira), com o qual se construíram provetes de taipa. Nos provetes foi executada uma anomalia superficial padronizada, tendo em vista à sua reparação com as diferentes argamassas de terra a desenvolver. Efetuaram-se quatro tipos de argamassa de reparação: três tipos utilizando as terras recolhidas das três edificações antigas de taipa, com as quais tinham previamente sido realizados os provetes de taipa (esta alternativa representa a reparação de cada uma das taipas com a correspondente terra local); foi também realizado um quarto tipo de argamassa baseado numa terra argilosa comercial (esta alternativa representa a reparação das diferentes taipas com uma terra standard).

O objetivo geral do trabalho apresentado neste artigo é avaliar duas das propriedades das argamassas que são mais afetadas pela influência do teor de água: a trabalhabilidade, característica que traduz a facilidade com que uma argamassa é aplicada no suporte, e a retração, que mesmo para uma argamassa de reparação e não de revestimento, pode inviabilizar a sua aplicabilidade.

Dada a indisponibilidade de uma metodologia para aferir diretamente a trabalhabilidade das argamassas, foi necessário avaliar também em que medida os ensaios existentes para determinação da consistência e do escoamento da argamassa fresca podem, no caso das argamassas de terra em estudo, traduzir a sua trabalhabilidade.

Neste contexto, os objetivos específicos do trabalho são os seguintes:

  1. estudar, com base em ensaios, a influência do teor de água na consistência (por espalhamento e por penetrómetro), no escoamento (através do cone de Marsh) e na retração dos quatro tipos de argamassa;
  2. avaliar a eventual correlação existente entre os resultados dos ensaios de caracterização da argamassa fresca (consistência por espalhamento, consistência por penetrómetro e escoamento) e a trabalhabilidade (avaliada diretamente por operadores mediante aplicações por eles efetuadas nos provetes de taipa), encontrando gamas de valores de referência para os respetivos ensaios;
  3. verificar a fiabilidade das classificações atribuídas pelos operadores, com base num modelo matemático de análise conjunta;
  4. procurar um teor de água que corresponda a uma boa trabalhabilidade e baixa retração; caso este exista, verificar (através da aplicação nos provetes de taipa) se a argamassa em causa é viável, em termos de trabalhabilidade, como argamassa de reparação.

Dado que não existem ensaios padrão para caracterizar especificamente argamassas de terra, sendo estas ou não argamassas de reparação, os ensaios realizados neste trabalho foram baseados na literatura sobre argamassas com outros constituintes.

Neste artigo descreve-se o trabalho realizado e as conclusões a que este conduziu. O artigo está estruturado da seguinte forma: (i) abordagem sobre a metodologia experimental, desde a recolha do material até à fase experimental; (ii) descrição e preparação do material, assim como a execução dos provetes de taipa e das argamassas de reparação; (iii) descrição dos procedimentos de ensaios realizados; (iv) análise e discussão dos resultados.

TRABALHABILIDADE

A trabalhabilidade traduz a facilidade com que uma argamassa é aplicada no suporte pelo operador, devendo esta permanecer aderente e poder eventualmente ser regularizada. É um conceito um pouco ambíguo e de difícil tradução quantitativa, pois depende da sensibilidade e habilidade do operador, podendo ainda variar com o tipo de suporte. Não obstante, segundo a RILEM (1982, p.481) e a ASTM C270-08 (2008, p.6), a trabalhabilidade é a propriedade mais importante de uma argamassa no seu estado fresco. À falta de trabalhabilidade corresponde uma argamassa de difícil manuseamento, podendo apresentar-se áspera, muito seca ou demasiado fluida, com segregação e exsudação excessiva ou falta de aderência. Este comportamento no estado fresco irá influenciar também as suas propriedades após endurecimento.

A trabalhabilidade resulta da combinação de várias propriedades. Segundo a R1LEM (1982, p.481), a consistência e a plasticidade são os fatores principais na trabalhabilidade de uma argamassa. Já a ASTM C270-08 (2008, p.6) refere, além destas, a coesão e a aderência. Estas propriedades nem sempre têm, contudo, correspondência clara e inequívoca em termos de métodos de ensaio de argamassas:

(i) A consistência, tal como definido nas normas europeias de ensaio, é uma medida da fluidez ou do teor de humidade da argamassa, permitindo avaliar a deformabilidade da argamassa fresca quando sujeita a determinado tipo de tensão. Esta característica é, de facto, muito condicionada pelo teor em água (Pkla et al, 2003, p. 110), (Hendrickx, 2009, p. 8). O Comité Europeu de Standardização (CEN) indica dois métodos de ensaio para medir a consistência das argamassas frescas: o ensaio de espalhamento, CEN EN 1015-3:1999, e o ensaio do penetrómetro, CEN EN 1015-4:1998. Segundo Cascudo e Carasek (2007, p.2) as recomendações da R1LEM MR 1-21 "Testing methods of mortars and rendering" referem estes dois ensaios para determinar a consistência de uma argamassa: o ensaio onde é imposta à argamassa uma deformação através de uma vibração que lhe é induzida é referido ao ensaio da mesa de espalhamento e o ensaio que emprega uma penetração de um corpo no interior desta é designado por ensaio do penetrómetro. Em termos do âmbito do ensaio, estas normas apresentam uma diferença que, no entanto, não é totalmente clara: enquanto o campo de aplicação do ensaio de espalhamento abrange argamassas contendo agregados normais e leves, o ensaio de penetrómetro inclui argamassas contendo agregados densos e leves.

Para Rago e Cincotto (1999, p.9) existe uma relação direta entre a consistência e a viscosidade. Para Vieira (1998, p. 160) o ensaio de escoamento (pelo cone de Marsh) permite determinar o tempo que uma argamassa leva a escoar através da abertura inferior de um cone, sendo considerado um bom indicador da viscosidade. Também Roy e Roussel (2005, p. 25) referem que o tempo de escoamento está diretamente relacionado com o comportamento do material, nomeadamente a viscosidade; quanto maior é o tempo de fluxo, menor a fluidez, ou seja, maior a viscosidade.

(ii) A plasticidade é a propriedade devido à qual a argamassa tende a manter a sua deformação após a redução da tensão de deformação para o valor da tensão de cedência (RILEM, 1982, p.481). Os métodos de ensaio que conferem às argamassas uma deformação através de vibração medem, simultaneamente, a consistência e a plasticidade (Cascudo a Carasek, 2007, p.2). Para determinar a plasticidade de argamassas frescas é, de facto, comummente (Hendrickx, 2009, p.8), (Cascudo e Carasek, 2007, p.2) utilizado o ensaio de consistência por espalhamento, CEN EN 1015-3:1999.

(iii) A coesão é a "força que atrai, que une entre si as partículas (...) de um corpo" (Dic. da Academia das Ciências, 2001, p.857). As propriedades coesivas de uma argamassa no estado fresco são bastante importantes, uma vez que é esta propriedade que mantem aglomerada os constituintes (agregados e ligantes), evitando a ocorrência de segregação, sendo este efeito refletido no estado endurecido. Segundo Bombled, citado por Rago e Cincotto (1999, p.9) a coesão pode ser alterada variando a superfície específica dos sólidos e a sua quantidade presente na mistura. Considerando a coesão no estado endurecido, esta característica designa-se por tensão e poderá ser medida pelo ensaio de tração (R1LEM, 1982, p.519), (Rago a Cincotto 1999, p.9).

(iv) Quanto à aderência ao substrato, numa argamassa trabalhável permite uma fácil aplicação pelo operador, devendo portanto permanecer aderente ao paramento sem ocorrência de descolamento ou escorregamento. A R1LEM (1982, p. 485) propõe um método qualitativo para avaliar se a aderência inicial é ou não adequada entre a argamassa no estado fresco e uma alvenaria de tijolo, blocos ou ladrilhos, não especificando para paredes de taipa. Contudo, é no estado endurecido que esta propriedade é mais avaliada, através do ensaio de tração, CEN EN 1015-12:2000.

METODOLOGIA EXPERIMENTAL

O trabalho teve como primeira fase a seleção, recolha e preparação de amostras de material constituinte das paredes de três edificações antigas de taipa, situadas na região do Alentejo, Portugal. O material recolhido nas três edificações serviu (Tabela 1) para a realização de:

  1. provetes de taipa, com dimensão de 30'20'28 (cm) (largura'espessura'altura);
  2. argamassas de terra.

Para a realização das argamassas, além das terras recolhidas nas três edificações foi ainda utilizada uma terra argilosa comercial, denominada por terra-padrão (TP) e tendo como objetivo o desenvolvimento e a caracterização de uma argamassa utilizando um material externo ao das edificações.

As terras utilizadas nos provetes de taipa (MAv_P, MPD_P e MVC_P) e nas argamassas de terra (MAv_A, MPD_A, MVC_A e MTP_A) foram previamente preparadas tal como descrito no capítulo 4.

Em cada um dos provetes de taipa executados foi reproduzida, nas duas faces maiores, uma anomalia superficial - anomalia esta destinada a tentar simular, de forma padronizada, as correntemente encontradas nas paredes exteriores de edificações em taipa (Keable, 1996, p.78), (Walker e Standards Australia, 2001, p.58, 87), (Walker et al., 2005, p.85), (Toumbakari etal., 2010, p.1209).

A fim de avaliar a influência do teor em água nas diferentes argamassas (AAv, APD, AVC e ATP) realizaram-se seis amassaduras de cada uma, utilizando teores de água crescentes, do que resultou um total de 24 amassaduras.

A análise experimental das argamassas compreendeu:

  1. ensaios de caracterização das argamassas no estado fresco:
  2. - propriedades reológicas: consistência por espalhamento; consistência por penetrómetro; escoamento através do cone de Marsh;
  3. - massa volúmica aparente;
  4. ensaios de caracterização das argamassas no estado endurecido: retração (linear e volumétrica);
  5. avaliação direta da trabalhabilidade das argamassas, através de aplicações efetuadas por dois operadores para reparação da anomalia superficial recriada nos provetes de taipa.

Refere-se que o ensaio de escoamento foi efetuado com base no procedimento descrito na norma NP EN 445:2008, utilizando o chamado cone de Marsh. O diâmetro interno do tubo de saída do cone de Marsh indicado na norma é de 10 mm. Porém verificou-se que este valor é demasiado reduzido para argamassas de terra (a norma refere-se a caldas de injeção, que são bastante mais fluidas). Assim utilizou-se um funil de vidro com diâmetro interno do tubo de saída de 25 mm, com capacidade de aproximadamente 6 l e diâmetro do bocal de 292 mm. O ensaio pelo cone de Marsh é inexecutável para todas as argamassas AAv e para metade das restantes argamassas efetuadas, não se apresentando como um ensaio viável para este tipo de argamassas. Verificou-se ainda que o ensaio de escoamento não é um bom parâmetro para avaliar a trabalhabilidade neste tipo de argamassas. Deste modo este ensaio, o procedimento deste ensaio e os respetivos resultados não serão apresentados.

1. MATERIAIS E PROVETES

As terras MAv, MPD e MVC foram recolhidas de paredes de edifícios antigos no Alentejo (zona do país onde a construção de taipa é mais frequente) que se apresentavam íntegras. Os edifícios foram escolhidos de modo a obter terras com características distintas, nomeadamente com diferentes distribuições granulométricas e tipo de argila.

As designações dadas aos materiais colhidos nas três edificações referem-se ao nome da localidade ou herdade de onde foram retirados: Av - construção rural na localidade de Avis; PD - construção rural na herdade de Pá Danado, Odemira; VC - construção rural na herdade de Val Chaim, Odemira (Tabela 1). As características destas edificações, o procedimento de colheita de amostras e a subsequente caracterização experimental do material (granulometria, limite de plasticidade, retração linear, compressibilidade, massa volúmica, teor da matéria orgânica, teor de sais e composição mineralógica) estão descritos noutra publicação (Gomes et al., 2012a, p.5-16).

A terra-padrão foi selecionada de entre as comercialmente disponíveis, colocada à disposição pela empresa Sorgila - Sociedade de argilas. O processo de escolha está descrito em Gomes et al. (2012b, p.2).

A composição mineralógica das quatro terras resume-se na Tabela 2, apresentando-se os respetivos difratogramas na Figura 1.

Para a obtenção dos difractogramas, as amostras foram secas a 40°C em estufa ventilada até massa constante (quando a diferença entre pesagens realizadas com um intervalo de 24 horas é inferior a 0,1% da massa seca) e posteriormente peneiradas através do peneiro com abertura de 106 µm. A amostra analisada foi de aproximadamente 2 g, tendo sido aleatoriamente colhida do material que passou pelo peneiro. Na análise por DRX foi utilizada uma radiação Kα do cobalto produzida por uma unidade de difração de raios X, nas seguintes condições de ensaio: varrimento entre 3 e 74° 2θ;velocidade de varrimento de 0.05° 2θ/s; tensão e corrente de filamento, respetivamente, de 35 kV e 45 mA.

1.1 Preparação das terras e análise granulométrica

Terras rara realização dos provetes

A preparação das terras incluiu a desagregação de torrões com a ajuda de um martelo de borracha (de maneira a não partir os agregados), peneiração por via seca pelo peneiro de 12.5 mm (# 1/2" ASTM) rejeitando o material retido, e homogeneização do material passado utilizando um repartidor de acordo com o procedimento de ensaio descrito pela norma CEN EN 1015-2:1998/A1:2006 e respetivo aditamento.

Terras para a realização oas argamassas

A preparação das terras colhidas nas três edificações (MAv_A, MPD_A e MVC_A) incluiu a peneiração por via húmida (procedimento mais correto para este tipo de materiais) através do peneiro de 2 mm (N.° 10 ASTM), decantação do material passado, secagem do material sólido em estufa ventilada a 40°C, moagem num moinho de maxilas, e homogeneização da amostra com auxílio de um repartidor, com base na NP EN 10973:2002. A necessidade de efetuar a desagregação do material decorre do facto de a terra se agregar em consequência da humidificação e secagem, optado pela utilização de um moinho de maxilas.

A preparação da terra-padrão para as argamassas (MTP_A) incluiu uma fase da moagem com moinho de maxilas de forma a desagregar os torrões inicialmente presentes e, posteriormente, pelo uso de um repartidor para homogeneizar a mistura, com base na NP EN 1097-3:2002.

De maneira a controlar eventuais alterações da granulometria aquando da passagem dos materiais pelo moinho de maxilas, foram efetuadas análises granulométricas de controlo, antes e depois da moagem. Contudo, não se observaram diferenças significativas.

As curvas granulométricas das terras colhidas das edificações (MAv_A, MPD_A e MVC_A) e da terra-padrão (MTP_A), tal como foram utilizadas para a realização das argamassas, estão apresentadas na Figura 2.

1.2 Execução dos provetes de taipa

Para que os provetes de taipa pudessem ter características tão semelhantes quanto possível às das respetivas paredes originais de taipa, determinou-se a massa volúmica aparente (seca) do material existente in situ pela técnica experimental descrita na Especificação do LNEC, LNEC E205:1967 (ver resultados na Tabela 3). Com base neste valor e no volume final de cada provete (16800 cm3), calculou-se o valor da massa total de terra a utilizar em cada provete de taipa.

Os provetes foram executados utilizando moldes de contraplacado marítimo construídos para o efeito, Figura 3. A terra foi primeiro homogeneizada com água, pulverizando esta sobre a amostra de terra a utilizar em cada provete. O preenchimento total do molde foi efetuado em três camadas de terra, as duas primeiras com 10 cm e a última com 8 cm. Cada uma das camadas foi vigorosamente compactada com um maço, Figura 3, com massa de aproximadamente 2,6 kg. Na execução dos provetes, procurou-se utilizar a quantidade de água correspondente ao teor de água ótimo (TAO), que havia anteriormente sido determinado pelo ensaio Proctor normal (Gomes et al., 2012a, p.9). Os provetes de taipa foram descofrados/desmoldados imediatamente após terminado o enchimento dos moldes. Seguidamente foi realizada a anomalia superficial, com uma área de 25'22 (cm) e cerca de 2,0 cm de profundidade, Figura 4. Esta tarefa foi realizada através de raspagem com espátula, utilizando também um x-ato para definir o contorno. Os provetes foram colocados a secar numa sala com ambiente controlado a 20°C de temperatura e 50% de humidade relativa (HR).

1.3 Execução das argamassas de reparação

Na amassadura das argamassas utilizadas para reparação da anomalia foi seguido, sempre que possível, o procedimento prescrito na NP EN 1961:2006, não obstante esta norma não abranger especificamente argamassas de reparação ou argamassas de terra.

A metodologia utilizada para as argamassas de terra de Avis (AAv), Pá Danado (APD) e Val Chaim (AVC) foi a seguinte: (i) homogeneização manual da terra; (ii) introdução da água na cuba, seguida pela introdução da terra; (iii) execução da mistura com a misturadora em funcionamento em velocidade lenta, durante 90 segundos; (iv) paragem da misturadora durante 90 segundos; nos primeiros 15 segundos, com uma espátula de borracha, foi removida a argamassa aderente às paredes da cuba, juntando-a à restante; (v) continuação da amassadura, a velocidade lenta, durante mais 60 segundos.

Para as argamassas de terra-padrão (ATP) foi necessário aumentar mais o tempo da mistura pois, devido à grande percentagem de argila, constatou-se não ser possível uma eficaz homogeneização do material no período de tempo definido. Assim, após introdução da terra na cuba, fez-se uma primeira mistura manual, durante 2 minutos. Esta fase foi necessária para o humedecimento uniforme da terra; caso contrário, mesmo em velocidade lenta, a mistura, como ainda se encontrava bastante heterogénea em termos de humedecimento, salpicava e perdia-se massa. A etapa referida em (iii) foi também prolongada para 150 segundos, de maneira a tornar a mistura homogénea, sem grumos de material seco.

As várias amassaduras de cada uma das argamassas foram efetuadas com teor de água crescente, como descrito no ponto 3. As relações água/material seco para as diferentes argamassas podem ser observadas na Figura 5. Constata-se que a relação água/material seco é inferior na argamassa AAv e apresenta os valores mais elevados na argamassa ATP. Isto explica-se pelo aumento da percentagem de materiais finos (argila e silte - partículas inferiores a 0,06 mm), como se pode observar na Figura 6.

2. ENSAIOS DE CARACTERIZAÇÃO DAS ARGAMASSAS DE TERRA

2.1 Consistência por espalhamento

O ensaio da consistência por espalhamento é um dos ensaios mais utilizados para avaliar as propriedades das argamassas no seu estado fresco e foi realizado através do procedimento descrito na norma CEN EN 1015-3:1999 e respetivos aditamentos. São efetuados dois ensaios de espalhamento por amassadura e o resultado final é dado pela média dos dois ensaios.

2.2. Consistência por penetrómetro

O ensaio de consistência por penetrómetro foi efetuado com base no procedimento descrito na norma CEN EN 1015-4:1998. São efetuados dois ensaios por penetrómetro por amassadura e o resultado final é dado pela média dos dois ensaios.

2.3 Massa volúmica aparente

A massa volúmica aparente (p) de um material é dada pelo quociente entre a sua massa e o volume que ela ocupa. Esta propriedade das argamassas foi determinada pelo procedimento descrito na norma CEN EN 1015-6:1998. Foram realizadas duas determinações da massa volúmica aparente por amassadura. O resultado final é dado pela média dos dois ensaios.

2.4 Retração

A retração linear dos materiais de terra é comummente avaliada através do ensaio de Alcock (também designado por ensaio da caixa de retração). Este ensaio é referido em vários documentos (Houben Et Guillaud, 1994, p.57), (New Zealand Standards (NZS) 4298, 1998, p.60), (Walker e Standards Australia, 2001, p.133), (Lehmbau, 2009, p.23). Contudo verifica-se que a metodologia de ensaio utilizada pelos diferentes autores é bastante díspar. Estes aspetos e o procedimento de ensaio encontram-se detalhadamente discutidos em Gomes et al. (2012a, p.10).

0 resultado final do comprimento do solo (Comprimento solo seco ) é dado pela média do comprimento dos três provetes avaliados e o volume médio do solo seco (Volume médio solo seco) é a respetiva média do volume. A retração linear (LL) e a retração volumétrica (LV) são obtidas, em percentagem, pelas equações (1) e (2), respetivamente.

(1)
(2)

2.5 Avaliação direta da trabalhabilidade das argamassas

Com a finalidade de verificar como a trabalhabilidade das argamassas em estudo é influenciada pelo seu teor em água, foram efetuadas aplicações nos provetes de taipa por dois operadores.

As argamassas AAv foram aplicadas e avaliadas por um operador sobre uma placa de aglomerado de fibras de madeira de densidade média (MDF - medium density fibreboard). Após aplicação verificou-se que esta aplicação não traduzia os resultados correspondentes aos observados no provete de taipa, sendo estes valores desprezados, dado que não se verificaram consistentes nem comparáveis. Optou-se assim por realizar as restantes aplicações apenas nos provetes de taipa realizados para o efeito.

As condições de aplicação foram as seguintes (Tabela 4):

  1. argamassas de terra AAv, APD e AVC - aplicadas apenas em provetes de taipa efetuados com terra idêntica às respetivas argamassas, nomeadamente em provetes correspondentes PAv, PPD e PVC;
  2. argamassa de terra-padrão ATP - aplicada em três provetes de taipa (PAv, PPD e PVC);
  3. cada operador aplicou a argamassa de reparação em lados opostos do provete (à vez), exceto no caso do provete de Av (PAv) onde apenas um dos operadores aplicou a argamassa no provete.

Não foram aplicadas todas as argamassas em todos os provetes de taipa, uma vez que as três argamassas AAv, APD e AVC correspondem a terras locais, sendo por isso expectável que sejam mais adequadas para reparação da taipa correspondente, enquanto a argamassa de terra-padrão, comercial (ATP), é um material que se pretende para uso geral e que se pretende que, estabilizada ou não, possa vir a servir para reparar qualquer taipa.

As seis amassaduras, correspondentes a cada uma das argamassas, foram efetuadas de forma sequencial e aplicadas no mesmo provete de taipa. A sequência de aplicação teve em conta a crescente percentagem de água. Estabeleceu-se que, sempre que os resultados da trabalhabilidade de uma argamassa demonstrassem a impossibilidade de aplicação dessa argamassa - desde que claramente atribuível ao aumento da percentagem de água da mistura -, a amassadura seguinte não seria aplicada. Assim não foi avaliada a trabalhabilidade das argamassas AVC6 e ATP6, uma vez que estas argamassas apresentavam-se muito fluídas.

Considerou-se necessário aspergir as superfícies dos provetes de taipa antes de se proceder à aplicação das argamassas (Tabela 5). Nas primeiras amassaduras, os operadores consideraram necessário aplicar uma quantidade de água no provete superior às últimas, em todas as argamassas. Utilizou-se para esta tarefa um borrifador.

O tipo de método para a aplicação manual das argamassas foi deixado ao critério dos operadores. Identificaram-se dois métodos alternativos para aplicar a argamassa contra o provete:

  1. aplicação da argamassa com a costa da colher de pedreiro, imprimindo uma certa pressão, sempre de baixo para cima (método normalmente escolhido para argamassas mais fluidas ou extremamente secas);
  2. lançamento vigoroso da argamassa contra o suporte com a colher de pedreiro, de baixo para cima.

Os operadores definiram qual o melhor método de aplicação, tendo-se verificado no final que o método utilizado foi sempre o mesmo, para a mesma amassadura, para os dois operadores. A aplicação contra o suporte foi seguida do aperto e da regularização da superfície de argamassa.

Pode verificar-se (Tabela 5) que existe uma predominância na aplicação pelo método 2 quando as argamassas se encontram mais secas (relação água/material seco inferior) e pelo método 1 quando as argamassas estão mais fluidas e/ou extremamente secas e com poucos finos (sendo o caso da AAv). Ainda assim, como se pode constatar, não é regra, uma vez que em todas as aplicações da argamassa AVC apenas foi utilizado o método 1, facto este que possivelmente poderá ser influenciado pelo próprio material.

A avaliação das propriedades na trabalhabilidade de uma argamassa é bastante incipiente, fazendo uso de procedimentos empíricos que permitem uma avaliação baseada em aspetos de natureza visual e tátil, tendo estes muitas vezes em conta o conhecimento e experiência dos profissionais envolvidos e nas suas avaliações. É comummente aferida a trabalhabilidade com base na avaliação do trabalhador e não com base no comportamento físico do material. Esta situação leva muitas vezes a uma diferente classificação, uma vez que diferentes profissionais podem divergir na classificação das propriedades para a mesma argamassa, com base na sua intuição/sensibilidade. Segundo a RILEM (1982, p. 479) foi efetuado um trabalho experimental, com 5 pedreiros de diferentes países, que consistia em avaliar a consistência de uma argamassa, sendolhes entregue o material no seu estado seco. Verificou-se que a avaliação em termos de consistência das argamassas divergia, contudo, a agilidade para trabalhar a argamassa era praticamente a mesma.

Análise da opinião do operador na trabalhabiuoaoe da argamassa através do modelo de análise conjunta

Para avaliar a opinião do operador na trabalhabilidade da argamassa (Trab.Argamassa), foi definida uma função através do modelo de análise conjunta (conjoint analysis).

O método da análise conjunta é a abordagem mais popular quando se pretende saber as preferências do consumidor numa pesquisa de marketing. É uma das técnicas onde a decisão do interveniente tem de lidar com opções que simultaneamente podem variar com dois ou mais atributos (Green et al., 2001, p.4). A metodologia utilizada tem por base a separação dos vários elementos, em que os intervenientes apenas atribuem um valor para diferentes alternativas ou perfis, a partir das suas preferências (Hurtado & Manuel, 2010, p.30). Assim sendo, o modelo de análise conjunta é baseado nas escolhas, sendo na realidade um problema de regressão múltipla que permite determinar a importância das ponderações. Este método indica como diferentes atributos são utilizados pela mesma pessoa em diferentes situações.

A metodologia neste trabalho foi baseada nas respostas obtidas pelos dois operadores sobre a avaliação efetuada pelos mesmos aos seguintes parâmetros respeitantes à argamassa: manuseamento da própria argamassa, a facilidade de aderência ao suporte, de aperto e de regularização da argamassa. Os operadores classificaram ainda a trabalhabilidade geral da argamassa no seu conjunto. A avaliação para estes cinco parâmetros foi da consistência, quer por espalhamento, quer por penetrómetro, também aumentam.

A Figura 9 mostra também que existe uma correlação clara entre os valores obtidos pelos dois métodos. Sendo o material utilizado nas argamassas de MAv_A o mais arenoso e o material MTP_A o mais argiloso, pode ainda ver-se que, para um mesmo valor de espalhamento, o resultado no ensaio do penetrómetro tende a aumentar à medida que aumenta a componente argilosa do material utilizado na argamassa, enquanto para um mesmo valor do ensaio do penetrómetro o valor do espalhamento tende a aumentar à medida que diminui a componente argilosa do material utilizado na argamassa.

3.2 Massa volúmica

Os resultados referentes à massa volúmica das argamassas AAv, APD, AVC e ATP no estado fresco são apresentados na Figuras 10 em função da relação água/material seco.

A variação de massa volúmica com a relação água/material seco parece ser distinta para a argamassa AAv (Figura 10, à esquerda) comparativamente com as restantes argamassas. Enquanto para as restantes argamassas há uma diminuição sistemática da massa volúmica com o aumento da quantidade de água da mistura, neste caso a diminuição inicial é seguida de um aumento.

Este diferente comportamento poderá ser devido a uma maior percentagem de areia da argamassa AAv (Figura 2). Os valores de massa volúmica mais elevados são obtidos nas argamassas AAv, terra com menor percentagem de material fino - silte e argila; os valores mais baixos são verificados nas argamassas de ATP, terra com maior percentagem de material fino. Nas argamassas com a terra-padrão a variação da massa volúmica com a relação água/material seco é menos expressiva que nas restantes argamassas, provavelmente devido à elevada percentagem de material argiloso.

3.3 Retração

Apresentam-se na Figura 11 os resultados obtidos para a retração linear e volumétrica das argamassas realizadas com as três terras APD, AVC e ATP. A retração da argamassa AAv foi considerada nula, uma vez que não se registaram variações lineares ou volumétricas significativas.

Pode constatar-se que (Figuras 11 e Figura12):

  • os resultados obtidos da retração linear e da volumétrica são bastante dispares. Pelos resultados é visível que, para este tipo de material, a retração linear não é suficiente para indicar a retração real do provete, considerando-se ser uma lacuna neste ensaio apenas determinar este valor. Assim sendo, é aconselhável analisar-se também a retração volumétrica (análise da retração nas três direções);
  • a retração linear é praticamente constante para as diferentes amassaduras nas três argamassas, independentemente da variação da relação água/material seco;
  • pelo contrário, a retração volumétrica aumenta à medida que a relação água/material seco também aumenta;
  • a retração linear e volumétrica é tanto maior quanto mais elevado o teor em materiais argilosos das argamassas, para a mesma relação água/material seco.

O Regulamento da Nova Zelândia (NZS 4298, 1998, p.24) apresenta 3% como limite de retração linear para argamassas de terra sem adição de cimento, tendo em conta a realização do mesmo tipo de ensaio. Assim sendo, todas as argamassas, à exceção das argamassas AAv, devem ser rejeitadas e/ou eventualmente alteradas (estabilizadas), adicionando outros materiais ou modificando a sua distribuição granulométrica.

3.4 Avaliação direta da trabalhabilidade das argamassas

Como referido anteriormente, o resultado da avaliação direta da trabalhabilidade das argamassas de terra nos três provetes pelos dois operadores foi analisado face aos parâmetros: (i) manuseamento da argamassa; facilidade de (ii) aderência, de (iii) aperto, de (iv) regularização; (v) opinião geral sobre a trabalhabilidade. Estas avaliações foram quantificadas em: má; suficiente, boa, excelente.

É possível observar que a classificação da trabalhabilidade de uma argamassa depende muito da relação água/material seco. Verifica-se que, em geral, existe uma relação ótima água/ material seco para cada uma das terras e, a partir desse valor, a trabalhabilidade diminui, quer se aumente, quer se diminua a relação água/material seco. Constatou-se que:

  1. de entre os materiais utilizados, as argamassas com o material MAv_A (AAv) são as que apresentam os melhores resultados globais, no entanto, é de ressalvar que esta argamassa só foi avaliada por um operador;
  2. a argamassa APD3 obtém a classificação de excelente em todos os parâmetros, avaliada pelos dois operadores;
  3. as argamassas com o material MV-C_A (AVC) apresentam as piores e mais inconstantes classificações;
  4. nenhuma mistura da argamassas ATP apresenta a classificação mais baixa (má), em nenhum dos parâmetros, tendo como limite mínimo a classificação de suficiente.

As argamassas ATP foram aplicadas em todos os provetes (PAv, PVC, PPD). Após a sua aplicação verificou-se que a classificação dada por cada operador foi a mesma para todos os provetes. Com este resultado é possível referir que a aplicação das diferentes argamassas ATP não foi significativamente influenciada pelo tipo de taipa do provete, registando-se apenas a influência da quantidade de água pulverizada em cada provete (Tabela 5).

Análise da opinião do operador na trabalhabilidade da argamassa através do modelo de análise conjunta (coinjoint analysis)

A avaliação da trabalhabilidade da argamassa (Trab.argamassa) foi definida por uma função (3) através do modelo análise conjunta, tendo em conta a classificação de cada um dos parâmetros: manuseamento da argamassa, aderência, aperto e regularização, avaliados pelos operadores.

A trabalhabilidade da argamassa é considerada uma variável dependente. Os quatro parâmetros - o manuseamento da argamassa, a facilidade de aderência ao suporte, de aperto e de regularização da argamassa - são considerados parâmetros variáveis independentes, sendo usados como variáveis categóricas (designadas por preditores, na análise conjunta).

A regressão linear múltipla foi utilizada para calcular os valores dos parâmetros na função. O ajuste dos dados experimentais ao modelo obtido pode ser avaliado através de Figura 13, relativamente ao operador 1 e 2. Assim, a Figura 13 correlaciona os resultados da trabalhabilidade da argamassa calculada através da equação (3), com a opinião geral sobre a trabalhabilidade atribuída por cada operador, para as 22 argamassas avaliadas pelo operador 1 e para as 16 argamassas avaliadas pelo operador 2.

Os resultados obtidos mostram que há um ajuste muito bom dos dados experimentais com a função linear da trabalhabilidade da argamassa (3) para o operador 2, e um bom ajuste no que se refere ao operador 1.

Esta boa correlação é consistente com a hipótese de que o operador é um fator de elevada importância na aplicação de uma argamassa, conseguindo classificar os diferentes parâmetros (manuseamento da argamassa, aderência, aperto, regularização) avaliando-os e analisando-os, aferindo qual a influência que estes irão apresentar numa argamassa. Tenda em conta a função linear da trabalhabilidade da argamassa (3) pode-se classificar esta tendo em conta os valores atribuídos nos restantes parâmetros.

A Figura 14 apresenta os resultados obtidos pelos dois operadores na avaliação atribuída ao parâmetro "opinião geral sobre a trabalhabilidade", em função da característica relativa à consistência das argamassas. Pretende-se com esta análise perceber se existe alguma correlação entre os ensaios de espalhamento e de penetrómetro com a trabalhabilidade, mencionando uma gama de valores de referência para os respetivos ensaios.

Pode observar-se na Figura 14 que:

  • O espalhamento apresenta uma maior coerência nos resultados, sendo possível, através deste parâmetro, identificar a gama de valores mais adequados para uma argamassa; pode observar-se que argamassas que apresentam valores entre 152 - 177 mm apresentam uma boa classificação do ponto de vista da apreciação da trabalhabilidade pelos operadores e algumas argamassas com valores entre os 160 - 176 mm são mesmo consideradas excelentes;
  • No que se refere aos valores obtidos pelo ensaio do penetrómetro não se divisa uma relação entre a classificação final da aplicabilidade das argamassas efetuada pelos operadores e os valores deste ensaio.

Avaliando todas as argamassas e as suas características, conclui-se que as características mais relevantes para determinar a percentagem em água são o espalhamento e a retração, associado à classificação da trabalhabilidade das argamassas. Assim, as únicas argamassas viáveis são AAv1, AAv2, AAv3 e AAv4, com valores de retração (linear e volumétrica) nulos e de espalhamento entre 160 a 200 mm, respetivamente. As argamassas AAv1 e AAv2 são mesmo consideradas excelentes com:

  1. valores de espalhamento: 160,3 e 174,2 mm;
  2. relação água/material seco: 0,12 e 0,13;
  3. constituídas por terra com uma percentagem de argila de 9,8% (< 0,002 mm), 14,8% de silte (0,002-0,06 mm) e 75,4% de areia (0,06-2 mm);
  4. classificação de excelente em todos os parâmetros (opinião sobre o manuseamento da argamassa, aderência, aperto, regularização e opinião geral sobre a trabalhabilidade), à exceção da argamassa AAv1 ,que apresenta a classificação de boa no parâmetro da opinião sobre o manuseamento da argamassa.

Nas restantes argamassas (APD, AVC e ATP) será necessário reduzir o teor em argila, otimizando a distribuição granulométrica (de maneira a impulsionar a estabilidade interna), podendo ainda combinar esta alteração com a adição de outros constituintes, particularmente com vista a diminuir o valor da retração.

CONCLUSÕES

Com base nos materiais estudados e nos ensaios de caracterização da argamassa no estado fresco e endurecido, com a finalidade de avaliar a influência do teor em água na trabalhabilidade de argamassas de terra, pode concluir-se que:

  1. A retração e a trabalhabilidade de uma argamassa são fortemente influenciadas pela relação água/material seco; para cada uma das argamassas existe uma relação ótima água/material seco e, a partir desse valor, a trabalhabilidade diminui, quer se aumente ou diminua a relação água/material seco; a aplicação de uma argamassa de reparação é fortemente influenciada pela composição da mistura (relação água/material seco), sendo este o parâmetro que mais peso apresenta aquando a sua aplicação.
  2. A retração é a característica que mais influencia e condiciona a viabilidade de uma argamassa. Nas argamassas analisadas quanto maior a relação água/material seco maior será a retração volumétrica, verificando-se valores na retração linear praticamente constantes em todas as argamassas. No que se refere aos limites para a retração linear em argamassas de terra é considerado um valor máximo de 3% (sem cimento), de acordo com a norma NZS 4298 (1998, p.24), realizando o ensaio de Alcock. Tendo em conta este limite, são excluídas todas as amassaduras das argamassas APD, AVC e ATP, sendo apenas viáveis as argamassas AAv. No entanto, é possível que o valor definido na norma possa ser ultrapassado para o tipo de argamassas em análise, destinadas a constituir uma camada de reparação, reconstituindo a espessura e a regularidade, e não de revestimento final. Tal não foi avaliado neste trabalho, pois as argamassas foram removidas do suporte antes de terem retraído.
  3. Os resultados obtidos no estado endurecido pelo ensaio da retração não são passíveis de se correlacionar com a trabalhabilidade analisada pelos operadores; porém, o ensaio da retração avalia e viabiliza (ou não) a possibilidade da mistura se apresentar como uma argamassa favorável no que diz respeito à retração.
  4. Para caracterização no estado fresco, apenas o ensaio na mesa de espalhamento apresenta uma boa correlação com a trabalhabilidade avaliada pelos operadores, sendo este o que melhor traduz uma correta avaliação; o ensaio do penetrómetro não apresenta qualquer correlação que possa ser correlacionado com a trabalhabilidade.
  5. No que se refere ao ensaio de espalhamento, a gama de valores de referência encontram-se entre os 152 - 177 mm, para uma boa classificação atribuída pelos operadores, sendo que a gama de valores entre 160 - 176 mm é mesmo considerada excelente.
  6. As únicas argamassas viáveis são AAv2, AAv3, AAv4 e AAv5, tendo em conta: a avaliação do operador (classificação mínima considerada - suficiente); os valores de retração (linear e volumétrica) são praticamente nulos e os valores de espalhamento, registam-se entre 160 a 200 cm, respetivamente. Estas amassaduras apresentam-se viáveis para aplicação sem qualquer adição. De entre estas argamassas poderá escolher-se a AAv3, como sendo exemplar: é considerada excelente em todos os parâmetros avaliados pelo operador; apresenta um valor de 174 mm no ensaio de espalhamento e retração linear e volumétrica praticamente nula.
  7. A função analítica obtida através do modelo de análise conjunta (3) mostra a boa correlação existente com os dados experimentais da trabalhabilidade da argamassa. Considerou-se esta boa correlação consistente com a hipótese de que o operador é um fator de elevada importância na aplicação de uma argamassa, controlando os parâmetros: manuseamento da argamassa, aderência, aperto, regularização.
  8. A fim de viabilizar as argamassas que são excluídas neste trabalho é necessário desenvolver mais estudos no sentido de adicionar outros constituintes para melhorar as suas características. Estas argamassas devem ser escolhidas com base na melhor avaliação obtida pelos operadores e no ensaio de espalhamento, rejeitando o ensaio de retração, uma vez que, em todas essas argamassas, o resultado deste ensaio apresenta-se muito superior ao valor considerado como limite. Assim sendo, as argamassas mais promissoras para poderem ser corrigidas são APD3, AVC2 e APT3. As argamassas ATP só poderão ser viáveis após conveniente estabilização.
  9. Será ainda importante avaliar a aderência e a retração das argamassas (mesmo daquelas que foram consideradas viáveis na sua aplicação) após endurecimento depois de aplicadas num suporte de taipa e verificar o seu comportamento após ensaios de envelhecimento.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho foi realizado no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), em Lisboa. A primeira autora foi apoiada pela bolsa de doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Somos gratos às pessoas que colaboraram no trabalho experimental, em particular, José Costa e João Júnior. Estamos também gratos aos proprietários de todos os edifícios. Em particular gostaríamos de agradecer ao Engenheiro Guilherme Andrade da empresa Sorgila - Sociedade de Argilas, pela disponibilização dos materiais.


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* Cómo citar este artículo: Gomes, M.I, Diaz Gonçalves, T., Farina, P. (2012). Evaluación de la Influencia del contenido de agua en la trabajabilidad del mortero de tierra. En: Apuntes 25 (2): 258 - 277.

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