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Opinión Jurídica

versão impressa ISSN 1692-2530versão On-line ISSN 2248-4078

Opin. jurid. vol.19 no.spe40 Medellín dez. 2020  Epub 22-Set-2021

https://doi.org/10.22395/ojum.v19n40a25 

Artículos

Enfrentando a pandemia da covid-19: a sustentabilidade empática como medida de uniao ante a realidade transnacional

Enfrentando la pandemia de COVID-19: la sostenibilidad empática como medida de unión ante la realidad trasnacional

Facing the Covid-19 Pandemic: Empathic Sustainability as a Measure of Union Against the Transnational Reality

Denise Schmitt Siqueira-Garcia* 

Heloise Siqueira-Garcia** 

* Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, Brasil denisegarcia@univali.br https://orcid.org/0000-0002-1710-3642

** Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, Brasil heloisegarcia@univali.br https://orcid.org/0000-0001-5010-6450


RESUMO

Este artigo é desenvolvido no contexto de uma pandemia decorrente da doenga chamada “covid-19”, que é causada pelo novo coronavírus. Trata-se de uma família de virus que causa infecgóes respiratórias e é de fácil contaminado entre humanos e que apresentou rápida disseminagao a diversos países em 2020. Diante dessa realidade, a pesquisa e a manifestado académica sao necessárias na busca de medidas, instrumentos, políticas e princípios capazes, de alguma forma, de mitigar as consequéncias negativas da pandemia da covid-19. A partir de critérios filosóficos e teóricos, o artigo tem como objetivo geral apresentar a sustentabilidade empática como medida de uniao para o enfrentamento das consequéncias dessa pandemia a partir de uma perspectiva transnacional. Ao final, constata-se que a superado das consequéncias negativas dependerá da atuagao conjunta de pessoas e nagóes de todo o globo, já que a pandemia é claramente uma demanda desterritorializada, a qual deve acontecer por meio da sustentabilidade empática. Para a elaboragao do artigo, foi utilizado o método indutivo, com as técnicas do referente, da categoria, dos conceitos operacionais, da pesquisa bibliográfica e do fichamento.

Palavras-chave: covid-19; sustentabilidade; civilizagao empática; transnacionalidade

RESUMEN

El artículo se desarrolla en el contexto de una pandemia ocasionada por la enfermedad denominada “COVID-19”, que es causada por un nuevo tipo de coronavirus. Se trata de una familia de virus que causa infecciones respiratorias, de fácil contagio entre humanos y que ha presentado una rápida diseminación entre países en el 2020. Ante esta realidad, la investigación y manifestación académica es necesaria en la búsqueda de medidas, instrumentos, políticas y principios capaces, de alguna manera, de mitigar las conse cuencias negativas de esta pandemia. Desde criterios filosóficos y teóricos, el artículo tiene como objetivo general presentar a la sostenibilidad empática como una medida de unión para hacer frente a las consecuencias de la pandemia desde una perspectiva trasnacional. Los hallazgos de este trabajo permiten identificar que la superación de las consecuencias negativas dependerá del actuar conjunto de personas y naciones de todo el globo por medio de la sostenibilidad empática, toda vez que la pandemia es claramente una demanda desterritorializada. La elaboración de este artículo involucró el uso del método inductivo y técnicas como el referente, la categoría, los conceptos operacionales, la búsqueda bibliográfica y el registro.

Palabras clave: COVID-19; sostenibilidad; civilización empática; transnacionalidad.

ABSTRACT

During 2020 the world experienced a pandemic due to the disease known as COVID-19, which is caused by the coronavirus, a family of viruses responsible for respiratory infections that are easily transmitted among humans and spread rapidly across countries. In view of this reality, research and academic manifestations are necessary in the search for measures, instruments, policies and principles capable of mitigating the negative consequences of this pandemic, the context where this work was developed. Based on philosophical and theoretical criteria, this paper has the general objective of presenting empathic sustainability as a measure of unity in order to face the consequences of the COVID-19 pandemic from a transnational perspective. It was verified that overcoming the negative consequences of this reality will depend on the joint actions of people and countries all around the world, since the pandemic is clearly a deterritorialized demand that must be faced through empathic sustainability. The elaboration of this paper involved the application of the inductive method along with techniques such as the referent, the category, operational concepts, bibliographic research, and the registry.

Keywords: COVID-19; Sustainability; Empathic civilization; transnationality.

INTRODUJO

Destaca-se que o presente artigo científico é decorrente de pesquisas realizadas pelas autoras no ámbito da sustentabilidade e da transnacionalidade, considerando a linha de pesquisa da qual fazem parte no Programa de Pós-Graduagao Stricto Sensu em Ciencia Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí (Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade), bem como das pesquisas realizadas pelas autoras no grupo de pesquisa Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade, vinculado ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq, Brasil).

Conta-se, ainda, que a parcela do artigo que trata sobre a transnacionalidade é fruto de pesquisas para a elaboragao da tese de doutorado “Mecanismos transnacionais de combate a pobreza: uma possibilidade de análise a partir da solidariedade sustentável, da economia e da governanga", desenvolvida pela autora Heloise.

A sociedade mundial vive em 2020 uma pandemia decorrente da doenga chamada “covid-19", que é causada pelo novo coronavírus, uma família de vírus que causa infecgoes respiratórias e é de fácil contaminado entre humanos.

Em razáo do alto contágio da doenga, da rápida disseminagao a diversos países e de ser uma emergencia de saúde pública de importáncia internacional, a Organizado Mundial da Saúde (OMS) decretou a existencia da pandemia em 11 de margo de 2020.

As consequencias ora observadas da pandemia estáo impactando de forma considerável a populado mundial em diversos aspectos - económicos, sociais, ambientais e, principalmente, de saúde pública -, contudo sabe-se que a grande maioria das consequencias ainda será vivenciada e confirmada em período posterior ao seu fim.

Diante da realidade assustadora que se vivencia e ainda se preve, a pesquisa e a manifestado académica sobre o tema sao necessárias no sentido de se buscar, principalmente pelos aspectos da precaugao e da prevengao, medidas, instrumentos, políticas e princípios capazes, de alguma forma, de mitigar as consequencias negativas dessa pandemia. Nesse contexto, o presente artigo é desenvolvido.

A partir de critérios filosóficos e teóricos, o artigo tem como objetivo geral apresentar a sustentabilidade empática como medida de uniao para o enfrentamento das consequencias da pandemia da covid-19 a partir de uma perspectiva transnacional.

O problema central surge da verificagao de que a pandemia apresenta característica transnacional, em que a humanidade é considerada como grupo único, cujas consequencias sao sentidas nas diversas partes do globo, em alguns casos de forma mais emblemática em outros de forma mais moderada, como é o caso do que ocorre com as consequencias danosas ambientais, a mudanga climática e o mercado económico. A pandemia do novo coronavírus, cujo início remonta-se a uma pequena cidade da China é sentida hoje em todas as regioes do globo com sintomas e consequencias similares. A partir disso, apresenta-se o seguinte questionamento: pode a sustentabilidade empática como medida de uniao ser o critério teórico orientador do enfrentamiento da pandemia da covid-19?

Para tanto, o artigo foi dividido em tres partes correlacionadas entre si: a primeira apresenta os aspectos introdutórios e a contextualizagao da pandemia da covid-19; a segunda trata da realidade transnacional, apresentando a pandemia como uma das demandas desterritorializadas; a terceira e última apresenta o tema da sustentabilidade empática, demonstrando-a como instrumento de enfrentamento da pandemia da covid-19.

Nesse universo, é desenvolvida a pesquisa, a qual pretende ter relevancia social no ámbito global, bem como contribuir para a Ciencia Jurídica.

Para o desenvolvimento da pesquisa deste artigo científico, foi utilizado o método indutivo e, como método de procedimento, o estatístico - no que tange aos impactos da covid-19 em diversos segmentos, ao número de infectados, de mortos e de curados - e o método funcionalista, que se centra na interpretagao dos fatos e dos impactos trazidos pela crise. Foram, ainda, utilizadas as técnicas do referente, da categoria, dos conceitos operacionais, da pesquisa bibliográfica e do fichamento (Pasold, 2015).

1. A PANDEMIA DA COVID-19

Vive-se atualmente uma pandemia decorrente da alta propagagao da doenga chamada “covid-19”, ocasionada por um virus que pertence a familia dos coronavirus, que causam infecgoes respiratórias. Já existiam estudos sobre a existencia de coronavirus em humanos desde 1937, mas em 21 de dezembro de 2019 se descobriu um novo agente dele em casos ocorridos na China, mais precisamente na cidade de Wuhan (Brasil, 2020a).

Após vários casos da covid-19 na China, a OMS declarou, em 30 de janeiro de 2020, que o surto da doenga causada pelo novo coronavirus (covid-19) constitui emergencia de saúde pública de importancia internacional e, em 11 de margo de 2020, a covid-19 foi caracterizada pelo mesmo órgao internacional como uma pandemia (PAHO, 2020), a qual se refere a distribuigao geográfica de uma doenga, e nao a sua gravidade (PAHO, 2020).

É a sexta vez na história que uma emergencia de saúde pública de importancia internacional é declarada. As outra foram:

  1. 25 de abril de 2009 - pandemia de H1N1;

  2. 5 de maio de 2014 - disseminagao internacional de poliovirus;

  3. 8 de agosto de 2014 - surto de ebola na África Ocidental;

  4. 1 de fevereiro de 2016 - vírus zika e aumento de casos de microencefalia e outras malformagóes congenitas;

  5. 18 de maio de 2018 - surto de ebola na República Democrática do Congo (PAHO, 2020).

Desde a decretagao da pandemia atual, a doenga decorrente da covid-19 disseminou-se rapidamente em todo o território mundial, tendo alguns países que se encontram com crises mais graves, como, por exemplo, a Itália, a Espanha, os Estados Unidos e hoje o Brasil.

Dados de pesquisadores datados de 10 de abril de 2020 apontam que a Europa concentra mais da metade dos casos, com 799 mil, as Américas contabilizam 493 mil, e a África, o continente menos afetado, registrou 8,7 mil (Efe, 2020).

Vários países, para evitar a contaminagao de seus cidadaos, resolveram adotar o isolamento social. Aqui no Brasil, tem-se uma recomendagao do Ministério da Saúde nesse sentido, mas cada governador e prefeito está regulamentando a forma como deve ocorrer esse isolamento, o que foi, inclusive, corroborado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Agao Direta de Inconstitucionalidade 6.341, de 15 de abril de 2020, a qual possibilitou a autonomia das agóes de combate a pandemia por parte de prefeitos e governadores de Estado.

Dentre as medidas que foram tomadas para a contengao do vírus estao: o fechamento de escolas; a redugao ou o total cancelamento dos transportes de pessoas; o fechamento de estabelecimentos comerciais; a proibigao da realizagao de eventos de qualquer natureza; o fechamento de templos e igrejas; a proibigao de frequentar praia, pragas e outros locais públicos; enfim, a paralizagao bem ampla das atividades económicas e sociais. Somado a isso, um pedido incessante para que as pessoas permanegam em isolamento em casa.

Nao restam dúvidas que, desse isolamento, vários impactos sociais e económicos serao vivenciados e perdurarao por algum tempo. No entanto, esses impactos precisam ser ajustados posteriormente, pois o que se pretende agora é a preservagao do bem da vida.

Essa realidade nao é de um ou de outro país: essa pandemia e suas consequencias abalaram o mundo, invadindo todas as fronteiras territoriais. Nesse sentido, no próximo tópico, será abordada justamente a evidencia da caracterizagao da pandemia como uma demanda desterritorializada, ou seja, uma verdadeira realidade transnacional.

2. A REALIDADE TRANSNACIONAL: A PANDEMIA COMO DEMANDA DESTERRITORIALIZADA

A realidade que impera nos dias atuais - principalmente o vivenciado desde o início de 2020 com a pandemia ocasionada pela covid-19 - é a de que existem temas que nao mais suportam a limitagao das barreiras ficticias criadas pelos Estados nacionais, como a economia, os direitos do consumidor, o direito ambiental, a sustentabilidade, o direito penal transnacional, o direito empresarial. Tais problemas podem ser considerados como decorrentes da globalizagao e de cunho mundial, já que suas repercussoes já nao mais obedecem as fronteiras dos Estados nacionais e ameagam o pleno exercicio da soberania, demonstrando-se como deficientes os direitos nacionais.

Conforme destaca Garcia (2019), todas essas demandas, antes consideradas internacionais e geradoras de conflitos entre governos e povos, sao, na verdade, problemas humanos evidenciados em qualquer nivel sociedade: individual, comunitário, inter-regional ou internacional. Ainda, afirma que a busca de solugao deve ser diferente, já que o Estado nacional nao se mostra mais capaz de dar respostas consistentes a essas complexas demandas transnacionais que se avolumam.

Conforme destacam Piffer e Cruz (2020), os acontecimentos que recorrentemente ultrapassam as fronteiras nacionais sao efetivamente transnacionais e demandam um compromisso regular e significativo de todos os participantes.

O Estado nacional, originado das revolugoes francesas e americana, conforme aponta Habermas (2001), sofre, desde a década de 1970, os impactos da globalizagao, caracterizada pela quantidade cada vez maior e intensificada das relagoes de troca, de comunicagao e de transito para além das fronteiras nacionais (Garcia, 2019).

Ohmae (1995) afirma que vivemos num mundo sem fronteiras, em que o Estado nacional se tornou mera ficgao, e os politicos parecem ter perdido seu poder efetivo. Apesar de Giddens (2001) discordar em parte, o que as autoras também discordam, de que o Estado nacional nao é uma ficgao, mas seu formato está sendo alterado. A globalizagao, nos dizeres do autor, afasta-se do Estado nacional, enfraquece alguns de seus poderes e cria demandas e possibilidades para a regeneragao de identidades locais.

Castells (2005) aponta que o mundo vivencia um processo de transformagao estrutural de múltiplas dimensoes propiciadas pela globalizagao. Nesse contexto, Cruz P. M. (2014) e Gongalves (2010)apontam para o desencadeamento de uma crise de governabilidade decorrente do reconhecimento dos problemas que ultrapassam as fronteiras. A primeira hipótese advinda disso é a de que a humanidade é um grupo único, que vivencia problemas de maneira equanime, como sao os de ordem económica, ambiental, empresarial, de direitos humanos, consumerista e criminal (Garcia, 2019).

Pode-se dizer que esse grupo se une por critérios de cidadania global1 no ambito politico e de empatia no ambito fisico, já que a empatia é caracteristica inata do ser humano, conforme aponta Rifkin (2010), que demonstra a existencia da empatia global em um mundo interconectado, apto a salvar a Terra e evitar o fim da civilizadlo. Isso se liga aos critérios de solidariedade,2 essenciais para a visao do Direito Transnacional, visto que este demanda o reconhecimento de uma consciencia global solidária capaz de ampliar a visao humana dos problemas que assolam a humanidade e repercutem a sua volta (Garcia, 2019).

Segundo Rodríguez Olvera (1998), a sociedade mundial é um feito que nao se pode mentir, sendo ela constituída, nas palavras de Neves, pela “[...] conexao unitária de uma pluralidade de ámbitos de comunicado em relagóes de concorrencia e, simultaneamente, de complementaridade (2009, p. 26, destaques no original)”.

A caracterizagao da sociedade como um grupo único mundial parece óbvia: somos todos parte de uma mesma espécie, que reflete problemas compatíveis e respostas isonomicas. A pandemia da covid-19 é mais um dos aspectos a comprovar a naturalidade da caracterizagao da sociedade como um grupo único mundial, sendo que a mesma doenga atinge e mata pessoas pertencentes as partes mais remotas do globo terrestre.

Conforme bem destaca Dowbor (2020), o coronavírus e as respostas comuns buscadas pelos países para combate-lo só demonstram ainda mais a dimensao planetária dos desafios enfrentados.

A Europa está parando de produzir medicamentos porque depende de insumos da China e de outros países. Nos Estados Unidos, empresas param por falta as vezes de uma pega. A crise atual está nos fazendo tomar consciencia de a que pontos somos hoje um sistema interligado e interdependente. Somos uma economia mundial, os seres humanos circulam freneticamente pelo planeta como milhóes de formigas, o dinheiro imaterial circula na velocidade da luz sem controle provocando instabilidade generalizada, a informagao se tornou uma commodity global, mas nao temos governanga planetária. (Dowbor, 2020, parágrafo 15)

Garcia destaca que, com a crise do Estado nacional e com o avango da globalizagao após o fim da Guerra Fria e a queda dos regimes socialistas, “tornou-se novamente possível a visao de grupo único mundial, ao menos em alguns aspectos da vida civil e política” (2019, p. 325), o que se evidenciou ainda mais neste ano de 2020. Nesse sentido, Santos (2011) afirma que a globalizagao permite a identificagao da humanidade como um todo e a sua visao unitária em razao da interdependencia das economias, governos e lugares.

As vantagens da “globalizagao vistas pelo avango da tecnologia, pela ampliagao do acesso a informagao e pela evolugao dos meios de transporte gerados pela globalizagao intensificaram a visao da sociedade mundial a partir do reconhecimento dos problemas que transpondem barreiras” (Garcia, 2019, p. 326), o que bate a nossa porta com a pandemia declarada.

Giddens (2001) pondera que a globalizagao, compreendida pela complexa variedade de processos e uma mistura de influencias políticas e económicas, está mudando a vida das pessoas, principalmente nos países desenvolvidos, além de criar sistemas e forgas transnacionais. Além disso, as diversas tecnologias que propiciam o avango dos transportes e da comunicagao trazidas pela globalizagao se tornam a espinha dorsal do processo de interdependencia global, conforme evidencia Castells (2005).

Staffen (2019) pondera que a globalizagao promove uma grande mudanga, até radical, nos poderes dos mais diversos níveis - ideológico, institucional ou normativo -, em razao das respectivas interagoes sociais que a todo momento encontram novos arranjos.

O Estado nacional, como se sabe, é um Estado territorial, ou seja, baseia seu poder num lugar concreto, com o controle das instituigoes, a criagao de leis, a defesa de fronteira, com a protegao de sua soberania. Em contrapartida, a sociedade global advinda da globalizagao e suas nuances, ramifica-se em várias dimensoes, se mescla e ao mesmo tempo relativiza o Estado nacional, e apresenta uma multiplicidade de círculos sociais, redes de comunicagao, relagoes de mercado e modos de vida que transpassam em todas as diregoes as fronteiras territoriais do Estado nacional. É essa sociedade global que reclama por uma tratativa jurídica e política que ultrapasse as barreiras do Estado nacional e apresente solugoes aos seus problemas. (Garcia, 2019, p. 328)

De acordo com destacam Piffer e Cruz (2020), apesar de a transnacionalidade nao se confundir com a globalizagao, ela nao pode ser dissociada dela, sao fenómenos interligados. A transnacionalidade nasce do contexto da globalizagao.

A realidade transnacional é patente e demanda agao, principalmente jurídica, o que coaduna com a visao ideológica de Santos (2011, p. 19-21) “por uma outra globalizagao”, ao afirmar que a realidade atual avinda da globalizagao é perversa, tendo que se pensar numa globalizagao mais humana, cujas bases materiais sao a unicidade da técnica, a convergencia dos momentos e o conhecimento do planeta usados sob fundamentos sociais e políticos mais coerentes. Isso já se mostra possível gragas a algumas características positivas da globalizagao, como a enorme mistura de ragas, culturas, povos e gostos somados aos progressos da informagao e a mistura de filosofias em detrimento do racionalismo europeu. O que falta é a agao voltada para estes ideais. (Garcia, 2019, p. 328-329)

O avango nos estudos da transnacionalidade e de seus institutos se situa no contexto de problemas globais, como é o caso da pandemia, que demandam respostas ainda nao alcangadas a sua altura.

Para Beck, transnacionalidade é “el surgimiento de formas de vida y acción cuya lógica interna se explica a partir de la capacidad inventiva con la que los hombres crean y mantienen mundos de vida social y relaciones de intercambio ‘sin mediar distancias'” (1998, p. 57).

Garcia (2009) destaca que o fenómeno decorrente da transnacionalidade surge pela compreensao das demandas transnacionais ou ao que chamamos de “demandas desterritorializadas”, as quais se relacionam a efetivagao de direitos difusos e transfronteirigos baseados no valor da solidariedade.

Pela concepgao da palavra, Stelzer indica que transnacional é o que “atravessa o nacional, que perpassa o Estado, que está além da concepgao soberana do Estado e, por consequencia, traz consigo, inclusive, a ausencia da dicotomia público e privado” (2009, p. 24-25). E é aplicado a sujeitos diferentes dos baseados no Direito Nacional e Internacional, como individuos, empresas, Estados, organizagoes de Estados ou outros grupos, conforme aponta Jessup (1965).

Já em 1965, Jessup (1965) apontava diversos exemplos e premissas que caracterizariam o Direito Transnacional e que até entao nao existia nada que excluiria a aplicagao desse direito específico. “O desafio apresentado é a quebra de para digma do pensamento moderno” (Garcia, 2019, p. 338). Koh (2006) destaca que o estudo do Direito Transnacional é importante, pois cada vez mais influencia leis e políticas nacionais.

Sua base teórica aponta para o reconhecimento da pluralidade cultural e seu exercício decorre de uma pauta axiológica comum de caráter difuso, o que corrobora com as evidencias trazidas pela pandemia declarada da covid-19.

Nesse condao, apresenta-se o conceito de Direito Transnacional como:

conjunto de ordens, normas e princípios evoluídos das concepgoes dos direitos internos, dos direitos humanos e da economia frente a influencia do cenário global decorrente da globalizagao, pautados pela solidariedade sustentável, pela justiga ambiental e pelos próprios direitos humanos, cuja aplicagao é garantida mundialmente pela organizagao jurídica interna dos Estados nacionais a indivíduos, empresas, Estados, organizagoes de Estados, ou outros grupos sociais e institucionais. (Garcia, 2019, p. 343)

Assim, defende-se que o Direito Transnacional, de maneira a se apresentar um contributo aos estudos dessa disciplina, na qualidade de Direito, compreende os seguintes pontos:

  1. a) Sujeitos mais abrangentes que os do Direito interno e do Direito internacional, principalmente em razao do seu objeto, englobando Estados nacionais, Organizagoes Internacionais, Organizagoes de Estados, empresas e indivíduos;

  2. b) Objeto compreendido pelas chamadas “demandas transnacionais”, evidenciadas por problemas, demandas e realidades cujas consequencias ultrapassam as barreiras fictícias dos Estados Nacionais, que hoje podem ser compreendidas, por exemplo, pelo meio ambiente, direitos humanos, Economia, crimes transnacionais, direito digital, direito do consumidor, direito empresarial e paz mundial.

  3. c) Principios basilados em tres valores fundamentáis: a solidariedade sustentável, a justiga ambiental e os direitos humanos, vinculados a responsabilidade intra e intergeracional;

  4. d) Forma estabelecida pela criagao de "normas jurídicas transnacionais”, criadas a partir de regras previamente estabelecidas de aplicagao heterárquica, perfectibilizada pelo transconstitucionalismo e pelo transjudicialismo;

  5. e) Instituigoes responsáveis pela fiscalizagao da aplicagao das normas aos sujeitos, dotadas de poder de polícia administrativo e compreendidas por órgaos já existentes com cunho coercitivo, como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a Organizagao Mundial do Comércio, a Organizagao Internacional do Trabalho, Organizagao Mundial da Saúde e Programa das Nagoes Unidas para o Meio Ambiente (este que deveria se tornar um órgao dotado de poderes de fiscalizagao e coergao, transformando-se numa possível "Organizagao Mundial para o Meio Ambiente”). (Garcia, 2019, p. 384-385)

Conforme destaca Garcia (2019), as relagoes humanas sao multidimensionais, multiníveis e multiformes, estando as pessoas interligadas pelas mais variadas formas - por pensamentos políticos e económicos, crengas religiosa, vínculos de trabalho e afetivos, dependencias económica e de comércio, problemas e vantagens ambientais e de saúde -, e, ainda, em diversos níveis - locais, nacionais, internacionais ou transnacionais -, sendo que cada vez mais a globalizagao permite e admite tais relagoes. O avango da tecnologia, dos meios de comunicagao e de transporte permite o estreitamento dos lagos, a atemporalidade e a transterriorialidade. A fronteira fictícia dos Estados nao é mais relevante para os diversos aspectos da vida económica, social e política.

A pandemia declarada da covid-19 é mais uma evidencia disso tudo, considerando que o vírus "surgiu” em dezembro de 2019 na China e, ao final de margo, já ultrapassa 415 mil pessoas infectadas segundo dados disponibilizados pelo site do Ministério da Saúde (2020b). Nesse sentido, entende-se que é papel da academia contribuir de alguma forma para as discussoes e a criagao de teorias que abarquem o enfrentamento dessa pandemia e a tentativa de mitigagao de seus efeitos negativos. Nesse contexto, a presente pesquisa busca realizar sua contribuigao por meio das consideragoes do seu enfrentamento também por critérios subjetivos, como é o caso da sustentabilidade empática, o que será demonstrado no item a seguir.

3. A SUSTENTABILIDADE EMPÁTICA E O ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA DA COVID-19 3

Nao restam dúvidas que a pandemia da covid-19 está gerando um colapso global, visto que esse vírus alcangou todas as fronteiras mundiais com consequencias sociais e económicas que precisarlo ser repensadas.

A sociedade global sairá dessa experiencia com a necessidade de reerguer o mundo, os lagos de convivio social e a economia. Nesse sentido, a presenga do coronavírus precisa ser vista como uma oportunidade de reflexao sobre a necessidade de cooperagao nao só entre os cidadaos, mas também uma cooperagao mundial, porque as medidas tomadas em um Estado podem impactar, rapidamente, outros lugares.

Vive-se um grande dilema ético e que será decisivo para a humanidade, pois se terá que escolher entre viver um isolamento nacionalista ou uma solidariedade global. Será preciso cada vez mais estreitarmos as fronteiras. A cooperagao entre comunidades locais e a comunidade global ainda é a arma mais poderosa que existe contra o inimigo que nao se pode combater.

Segundo Harari, quando fala da necessidade de um pensamento global: “Para evitar uma corrida ao fundo do pogo o genero humano provavelmente vai precisar de algum tipo de identidade e lealdade global” (2018, p. 157). E continua: “Se o genero humano nao conseguir conceber e administrar diretrizes éticas globalmente aceitas, estará aberta a temporada para o dr. Franskenstein”. Justamente a nossa necessidade depois desse grande “susto” ocasionado pela covid-19.

Para concluir, a onda nacionalista que varre o mundo nao pode fazer o relógio recuar para 1939 ou 1914. A tecnologia mudou tudo ao criar um conjunto de ameagas existenciais globais que nenhuma nagao é capaz de resolver sozinha. Um inimigo comum é o melhor catalisador para a formagao de uma identidade comum, e o genero humano tem agora pelo menos tres desses inimigos - guerra nuclear, mudanga climática e disrupgao tecnológica. Se apesar dessas ameagas comuns os humanos privilegiarem suas lealdades nacionais particulares acima de tudo, os resultados serao muito piores que os de 1914 e 1939. (Harari, 2018, p. 161)

Ao lado desses exemplos fornecidos pelo autor sobre a guerra nuclear, mudangas climáticas e disrupgao tecnológica coloca-se a covid-19 com o poder de gerar toda essa reflexao.

É preciso pensar numa civilizagao empática global, nos dizeres de Rifkin (2010), empatia vista pelo autor como aquela que faz com que entremos no estado emo cional da outra pessoa que sofre e que sentimos sua dor como se fosse a nossa. Ela supoe uma participagao ativa, com a vontade de tomarmos parte da experiencia da outra pessoa.

Si sentimos empatía con otro ser, comprendemos de una manera inconsciente que su existencia, al igual que la nuestra, es muy frágil y finita, y que es posible gracias al flujo incesante de energía a través de su ser. Sin embargo, hace muy poco que hemos tomado conciencia de que, en parte, todos debemos nuestro bienestar al aumento de nuestra deuda entrópica personal con el medio que nos rodea. (Rifkin, 2010, p. 48)

Conforme apontado por Rifkin, em entrevista ao jornal La Repubblica, em 5 de margo de 2010:

A nossa empatia, durante milenios, foi exercida dentro de círculos restritos, da família a comunidade agrícola até o Estado-nagao, nao se adaptou a extensao global da nova comunidade humana. Reprogramar a nossa consciencia, aplicar a empatia em escala planetária é urgente se queremos evitar a destruigao da nossa espécie (e de muitas outras). (Amaral, 2011, 4 de abril, parágrafo 2)

Nesse caminho, Cruz, Dantas e Oliviero refletem que

Essa condigao empática, própria desse mundo novo, deverá nos ajudar a refletir sobre o quao irónico é o fato de que a mudanga climática nos obriga, mais do que nunca, a reconhecer nossa humanidade compartilhada e nossa condigao comum de maneira essencial e nao só superficial. Vivemos todos nesse planeta, ou seja, nao existe nenhum lugar para onde possamos escapar ou nos esconder. A fatura entrópica que a espécie humana gerou afeta todo o planeta e ameaga com a possibilidade de nossa extingao. (2016, p. 41)

Outro fator de suma importancia, ao lado desses levantados até o momento, é a necessidade de observancia do atual paradigma da humanidade que é a sustentabilidade, o fato é que a sobrevivencia na Terra somente se fará possível com o alcance da sustentabilidade em seu equilíbrio dimensional e isso só ocorrerá a partir de atitudes humanas empáticas.

Segundo Cruz et al., “encontramo-nos num momento decisivo da história, porque o caminho para uma consciencia global compartilhada está sendo trilhado de maneira muito rápida e acompanhado por intervengoes humanas na natureza cada vez mais intensas” (2016, p. 31).

Entao pergunta-se: o que é sustentabilidade?

Nos dizeres de Garcia, o termo “sustentabilidade” traz diversas conotagoes e “decorre do conceito de sustentagao, o qual, por sua vez, é aparentado a manutengao, conservagao, permanencia, continuidade e assim por diante” (2012, p. 389).

Freitas conceitua o princípio da sustentabilidade como sendo um

princípio constitucional que determina, com eficácia direta e imediata, a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretizagao direta e imediata, a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretizagao solidária do desenvolvimento material e imaterial, socialmente inclusivo, durável e equanime, ambientalmente limpo, inovador, ético e eficiente, no intuito de assegurar, preferencialmente de modo preventivo e precavido, no presente e no futuro, o direito ao bem-estar. (2012, p. 41)

Assim, seria ela o equilibrio das tres dimensoes: a social, a ambiental e a económi ca. A dimensao ambiental está relacionada a protegao do meio ambiente; a dimensao social ligada a melhoria na qualidade de vida das pessoas, com a garantia pelo menos dos direitos sociais básicos; a dimensao económica preocupada com a forma de produgao e de consumo com a busca de uma economia ambiental.4

A própria construgao da sustentabilidade a partir da visao empática está inti mamente ligada aos critérios da civilizagao empática discutida por Rifkin (2010), que acaba por demonstrar a existencia da empatia global em um mundo interconectado, capaz de salvar a Terra e evitar o fim da civilizagao.

Garcia destaca que “tudo isso constrói, entre outros ditames, a ideia de uma consciencia global solidária que permita a ampliagao da visao humana para os problemas que assolam toda a humanidade, problemas estes que da mesma forma repercutem a toda ela de volta” (2019, p. 167). Problemas que ora destacamos como os causados pela covid-19.

Por tais razoes, conforme apontam Cruz et al. (2016), é preciso fugir do Estado constitucional moderno construído a partir do paradigma da liberdade, cedendo lugar a um conjunto de identidades mais pluralistas e múltiplas. Precisamos de cidadaos do mundo.

A reconstrugao de parámetros empáticos por meio de uma concepgao una que interligue cidadaos numa concepgao mundial é essencial para a preservagao da vida na Terra. A visao de uma civilizagao empática permitirá tal reconstrugao que, inclu sive, influenciará no alcance de um Estado socioambiental de Direito. Esses sao os caminhos a serem tomados para que ao final se possa chegar ao objetivo real, que é o equilíbrio multidimensional da sustentabilidade.

A conjugagao dos fatores empáticos e sustentáveis é o único caminho possível.

Nesse viés, a sustentabilidade deve ser vista como um novo paradigma do Direito,5 e a sua compreensao, conforme asseveram Cruz et al., resulta de um aporte cognitivo fornecido pelos estudos zetéticos principalmente decorrentes da sociologia, economia e filosofia, restando a Ciencia Jurídica a “fungao de se adequar a essa pauta axiológica comum humanitária, captar as realidades sociais, os seus desvios e riscos e promover estratégias objetivando mitigá-los e controlá-los para a realizagao plena do bem comum” (2016, p. 39)

É preciso um mundo solidário e humanizado, que somente poderá ser construido pela civilizado empática. É preciso a consolidado de uma concepgao de sustentabilidade global integradora com a solidariedade e a empatia, tornando-se um “paradigma de aproximado entre os povos e culturas” (Cruz et al., 2016, p. 45).

Além disso, a participado do cidadao de forma consciente e reflexiva na gestao política, económica e social é essencial, pois somente ele permitirá o alcance de todos esses pontos teóricos discutidos e construídos.

Conforme aponta Peces Barba (1991), o valor da solidariedade é elemento necessário e uma meta para o alcance da liberdade igualitária, sem que isso suponha aceitar uma perspectiva otimista enquanto a ideia de progresso (Garcia, 2019).

A realidade que se impoe é a de que é impossível desvincular-se meio ambiente, vida humana - digna -, empatia e atuagao humana com esses focos. A sustentabilidade tem como escopo a garantia dos dois primeiros. A empatia é meio indispensável para atingi-los. E o atuar humano deve se dar embasado nos ditames empáticos, caso contrário nao será possível nenhum dos anteriores.

A partir disso há que se considerar a complexidade dos temas propostos. A pandemia decorrente da covid-19 tornou ainda mais evidente a realidade transnacional vivida nas mais variadas questoes como meio ambiente, economia e saúde pública, as quais sao extremamente vinculadas as consequencias da pandemia.

Outrossim, o reconhecimento da transnacionalidade a partir da verificagao das demandas desterriorializadas, como é a pandemia decorrente do coronavírus, pactua com o reconhecimento da humanidade como grupo único vinculado por critérios de empatia e solidariedade para se chegar a reais critérios de sustentabilidade a partir das suas mais variadas dimensoes.

Ademais, os pontos advindos do Direito Transnacional defendidos nesta pesquisa apresentam como princípios basilares tres valores fundamentais: a solidariedade sustentável, a justiga ambiental e os direitos humanos, vinculados a responsabilidade intra e intergeracional.

Sabe-se que as consequencias da pandemia ora vivida ainda serao sentidas e confirmadas, contudo há que se perder o “vício” de encontrar solugoes a problemas e crises depois de evidentes, é imperativo o reconhecimento do que a história já ensinou, sao necessárias medidas de precaugao e prevengao. Baseadas nessas convicgoes, as autoras defendem que as medidas de enfrentamento das consequencias negativas da pandemia devem ser pensadas, pontuadas e até implementadas desde antes da vivencia dos problemas.

Nesse condao, com o intuito de apresentar algum contributo academico para as medidas de enfrentamento da pandemia, sustenta-se pelos argumentos anteriormente expostos que um dos vieses deverá ter foco na uniao entre o grupo humano mundial, o vencimento das consequencias negativas dependerá da atuagao conjunta das pessoas e dos países pertencentes ao globo, já que a pandemia é claramente uma demanda desterritorializada e que deve acontecer, conforme argumentos expostos, por meio da sustentabilidade empática.

CONCLUSOES

A pandemia decorrente das contaminares em larga escala territorial do novo coronavírus decretada pela OMS em 11 de margo de 2020 é única na história. Apesar da existencia de pandemias vivenciadas anteriormente, nunca foi observada uma propagagao tao rápida e que atingisse, ao mesmo tempo, tantos países do globo.

Essa realidade nao é de um ou de outro país. A pandemia e suas consequencias abalaram o mundo, invadindo todas as fronteiras territoriais, nao restando dúvidas de que dela teremos vários impactos sociais, ambientais e económicos que perdurarlo por algum tempo.

A pandemia acabou por evidenciar que existem temas que nao mais suportam a limitagao das barreiras fictícias criadas pelos Estados nacionais. A vivencia atual apenas demonstra de forma clara que existem problemas que sao de cunho mundial, com repercussoes além das fronteiras ficticias criadas para os Estados na modernidade, apresentando-se como ineficientes os Direitos Nacionais.

Além disso, há que se considerar que as correlagoes humanas sao multidimensionais, multiníveis e multiformes. Todos estamos interligados pelas mais variadas formas, em diversas dimensoes, e em diversos níveis, sendo que cada vez mais a globalizagao permite e admite tais relagoes. O avango da tecnologia, dos meios de comunicagao e de transporte permitem o estreitamento dos lagos, a atemporalidade e a transterriorialidade.

Hoje todos nós nos relacionamos nos mais variados lugares e nos mais variados tempos, havendo poucos impedimentos para as relagoes constantes ou momentáneas entre pessoas, empresas, Estados, organizagoes e instituigoes.

As fronteiras fictícias dos Estados nao sao mais relevantes para os diversos aspectos da vida económica, social e política, e a covid-19 é mais uma evidencia disso. De modo que se constrói a ideia da consciencia global solidária capaz de ampliar a visao humana para os problemas transnacionais, sendo a conjugagao dos fatores empáticos e sustentáveis o único caminho possível.

A partir disso, há que se considerar que a pandemia decorrente das contaminagoes da covid-19 tornou ainda mais evidente a realidade transnacional vivida nas mais va riadas questoes como meio ambiente, economia e saúde pública, e o reconhecimento da transnacionalidade a partir da verificagao das demandas desterriorializadas pactua com o reconhecimento da humanidade como grupo único vinculado por critérios de empatia e solidariedade para se chegar a reais critérios de sustentabilidade a partir das suas mais variadas dimensoes.

A superagao das consequencias negativas dependerá da atuagao conjunta das pessoas e dos países pertencentes ao globo, já que a pandemia é claramente uma demanda desterritorializada e que deve acontecer, conforme argumentos expostos, por meio da sustentabilidade empática.

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1 Santos (2011) é contra a utilizagao da categoria “cidadania global”, afirmando que a concepgao de cidadao depende necessariamente de um pais, de um Estado. A ideia de “cidadao do mundo” nao merece prosperar, porque o “mundo” nao pode regular os lugares.

2Sobre o tema, ver: Garcia e Garcia (2018b).

3Essa parte da pesquisa apresenta trechos do capítulo do livro escrito pelas autoras (Garcia e Garcia, 2018a).

4Sugere-se como leitura: Garcia (2016); Garcia (2014b); Garcia (2014a).

5Sobre o tema, ver: Cruz e Bodnar (2011).

Recebido: 13 de Maio de 2020; Aceito: 04 de Agosto de 2020

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