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Eidos

Print version ISSN 1692-8857On-line version ISSN 2011-7477

Eidos  no.9 Barranquilla July/Dec. 2008

 

AXIOLOGIA E ÉTICA PROPOSICIONAL SEGUNDO CARNAP: PELA ANÁLISE LÓGICA

AXIOLOGY AND ANALYTICS ETHICS ACCORDING TO CARNAP: BY THE LOGICAL ANALYSIS

Ramiro Délio Borges de Meneses*

* Professor Adjunto do Instituto Politécnico de Saúde do Norte- Gandra. dr.ramiro@sapo.pt

Fecha de recepción: junio 2008
Fecha de revisión: julio2008
Fecha de aceptación: agosto 2008


RESUMO

Procura-se com este artigo a posição da ética em relação com a análise lógica, no âmbito do "Circulo de Viena", pelo pensamento de R. Carnap. Existem condições para determinar a aplicação do princípio da verificabilidade, pela filosofia da linguagem, seguindo o pensamento de R. Carnap. Aqui serão apresentadas as lógicas deônticas , em ordem à fundamentação lógica da Bioética, como forma de globalização linguística da mesma.

PALAVRAS-CHAVE
Ética Analítica, verificabilidade, R. Carnap, semântica formal, lógica deôntica, fundamentos lógicos da Bioética.


ABSTRACT

On this article, I explain the critical position to ethic in relation to logic analysis foundation from the "Viena Circle". However, there are conditions to carrie out the application from the verificability principle of language philosophy, by the thinking of R. Carnap, and the deontic logic plays a very important role to the bioethical foundations.

KEY WORDS
Proposicional Ethic, verificability, R. Carnap, logical semantic, deon-tic logic, bioethical foundations.


INTRODUÇÃO

Wittgenstein apresenta-se como racionalista em relação à problema da verificação de um enunciado terá que referir-se ás proposições de observação, que são deduzíveis da proposição.

Logo, a epistemologia, depois da eliminação dos elementos psicológicos e metafísicos, será uma parte da "sintaxe", segundo a perspectiva formal de Carnap. Pretendemos afirmar, neste texto, que a ética e a bioética não são uma reflexão sintáctica, mas antes procuram um fundamento semântico. Assim, pretendem se traduzir os problemas das éticas, no modo material de falar, comummente usados, em modos deônticos . Esta possibilidade de os traduzir mostra que possuem, segundo a lógica simbólica, uma semântica formal.

PELA FENOMENOLOGIA AXIOLÓGICA DE M. SCHELER E PELO PENSAMENTO DE R. CARNAP

Segundo Etelvina Nunes, se quisermos manter a nossa identidade, como sinónimo da nossa dignidade e da nossa pessoalidade, é necessário considerar que a pessoa humana é por essência um "ser axiológico", uma vez que se constitui numa referência a valores, a algo que o constitua, ou seja, a «quadros de referência» Assim, a identidade pessoal não se estabelece sem quadros de referência que transcendam o ser humano e que necessitem de ser articulados e hierarquizados. Parece-nos oportuno questionar: o que são valores? A conceptualização, ou melhor, a tematização dos valores é discutível, porque existem duas correntes no que diz respeito à concepção dos valores. Uma, que defende que o valor pode ser o resultado de uma dedução a partir do Bem; para esta, o Bem é a priori, os valores pré-existem ao agir. A outra, a posteriori, defende que os valores existem na ou pela acção. Ora, a este respeito Michel Renaud sublinha: «a criação dos valores na ou pela acção pode ser entendida como a não preexistência do valor relativamente ao agir; neste sentido, a criação do valor pela liberdade faz deste um a posteriori relativamente à acção, mas um a priori relativamente à sua tematização reflexiva»1.

Para resolver esta questão, entre o a priori e o a posteriori dos valores, a teoria do círculo hermenêutico pode ajudar na descoberta dos mesmos. E ao fazer-se referência à expressão «descoberta dos valores» está implícito que o valor é algo diferente das normas morais2.

«O valor é um bem real ou ideal, desejado ou desejável para uma pessoa e ou colectividade»3. De facto, o valor mostra-se ao ser humano como um Bem, no sentido em que é desejado como algo que reconheço interiormente. Neste contexto, não pode apenas vir de fora, mas deve passar pela preferência e pela escolha. Neste sentido, Etelvina Nunes refere que a teoria do círculo hermenêutico defendida por Michel Renaud pretende articular, não só as referências do sujeito em relação ao Bem mas introduzir o sujeito numa experiência que lhe permita ter aceso a um valor, que até ali não conhecia4.

Assim, a teoria do círculo hermenêutico do valor enuncia-se do seguinte modo: Crer para compreender e compreender para crer. O primeiro crer solicita o sujeito a uma adesão da vontade para aceitar fazer a experiência de determinado valor, ou seja, o sujeito, enquanto participa na experiência, está a compreender existencialmente o valor, isto é, faz a experiência do mesmo, in lato sensu, ou seja, a nível ontológico. O segundo compreender consiste no momento da reflexão sobre a experiência feita, ou seja, é o momento em que se faz um desenvolvimento interpretativo teórico e conceptual. É o momento onde se encontram as razões pelas quais o sujeito confere valor ao valor ou, no caso de um contra-valor, porque não vale. Neste sentido, podemos dizer que o segundo crer consiste no momento em que o sujeito reconhece o valor enquanto tal, e, neste sentido, decide por ele.

Continuando a nossa exposição, podemos afirmar que se um determinado valor, ao ser reconhecido por mim, vale, é também obrigatório que eu adira a ele, porque «este, a partir de agora constitui-me, requer a submissão de mim a ele, transcende-me»5. E, simultaneamente, reconheço que todos aqueles que partilharam comigo a experiência deste valor o viveram. Como tal, o valor já existia antes da minha participação nele, e, consequentemente, ao aderir a ele, eu acrescentei axiologia ao valor, isto é, dei-lhe mais valor, porque o vivi, não como uma simples repetição, mas com o meu modo singular e único, igual e, ao mesmo tempo, diferente dos outros6. Significa que o «eu», ao vivenciar um valor, está a reconstruí-lo e, consequentemente, a transformá-lo.

Podemos dizer que, através do círculo hermenêutico do valor, compreendemos que este é a priori e a posteriori, porque ao vivenciar o valor participo nele com a minha iniciativa, reconstruo-o. Perante o que foi dito, podemos afirmar que o homem é criador dos seus valores. Se o valor me constitui, cabe perguntar se há necessidade de o hierarquizar. Constitui-me segundo uma ordem de preferência, porque a nossa subjectividade e a nossa pessoalidade realizam-se pela referência axiológica, pela qual se edifica comigo e cria em mim uma identidade homogénea, embora sujeita a alterações7.

Neste sentido, é necessário que seja o sujeito a escolher e a reconhecer aqueles valores que são inerentes à sua realização, como pessoa, uma vez que permitem indicar o horizonte da nossa acção, numa relação dinâmica com a nossa subjectividade. Só assim os valores podem ser adaptados à mudança sem que, no entanto, percam o sentido axiológico.

Somos da opinião de Etelvina Nunes, que vai ao encontro de Taylor, ao dizer que «sem quadros de referência, a dignidade do ser humano não se realiza; estes são fundamentais no seu processo de dignificação, tanto pessoal como comunitário»8.

Scheler reconhece na pessoa um carácter dinâmico, pelo que não a reduz simplesmente a um conjunto de actos mas declara, de forma explícita, o «valor da identidade» do homem, conforme àquela que ele mantém sobre a autoconsciência da pessoa. Esse dinamismo do homem é o sinal inequívoco da sua não involução9. Compreende-se, assim, que a pessoa, para ser ela mesma e para alcançar maiores características de identidade, necessita de não se fechar em si mesma; pelo contrário, deve ter mais capacidade para se abrir . Mas onde nasce e como se realiza essa identidade? É a questão central do pensamento scheleriano. Scheler responde que ela surge do valor da mesma identidade do homem.

Segundo Vergés Ramírez, através da análise do que está na génese da identidade do homem, conclui-se que a base dessa identidade está na capacidade de relação (esse aã)10. O valor do núcleo da pessoa será objecto da participação activa do homem. Ou seja, através da experiência vivencial, o homem tem de construir o valor da sua identidade de pessoa. A forma como a pessoa se expressa faz «ser ela mesma», porque corresponde à essência do seu próprio valor como ser pessoal11.

De uma forma resumida, podemos dizer que Scheler acrescenta algumas novidades, que residem em duas áreas: uma, na maneira de expor o valor da identidade — esta é concentrada na autoconsciência do homem; e outra, no desenvolvimento que faz do conteúdo do dito valor, pois pertence ao ser mais profundo da pessoa. Assim, o valor da identidade do homem está na linha do ser, como «valor por si e em si mesmo»12.

Scheler aborda uma outra dimensão: o valor de pessoa tem um carácter introvertido ou é de cariz comunicativo? Scheler diz que a essência de tal valor não é unidimensional, mas sim intersubjectiva.

Segundo Scheler, o termo «intersubjectividade» mostra que a identidade da pessoa não é um «valor monolítico excluinte mas sim um valor mais universal»13. Por isso, Scheler acrescenta à noção de pessoa a de «pessoa total», traduzindo esta um valor de pleno humanismo, de maneira que o homem não seria plenamente pessoa se não apresentasse essa dimensão intersubjectiva, indispensável ao valor da sua identidade que é intercomunicativa14.

Neste «progresso axiológico da pessoa»15, Scheler fala numa dupla área, pessoal e social, como a plena realidade dos outros, uma vez que cada um vive em si mesmo de uma forma originária como pessoa social,bem como pessoa íntima16. O carácter social do homem dignifica-o de tal forma que o faz «ser ele mesmo», e, procurando a raiz da questão, desenvolve todas as excelências da sua condição humana. Por isso, Scheler descreve esta abrangência com o termo «pessoa total», designando assim, de uma forma precisa, esse valor total. Deste modo, a «pessoa total» é a auto-realização17 do homem, em todas as suas dimensões, como o centro da sua plenitude humana. A este respeito, Vergés Ramírez cita A. Vergot, que sustenta que «o outro está inscrito no fundamento do eu intersubjectivo»18.

Scheler responde à questão, «o que é o homem?», equiparando o «valor de pessoa» com o da comunidade, e o «valor da sociedade» com o de «pessoa total». Uma outra abordagem do valor de pessoa, importante no progresso axiológico será. Este deve ser considerado como a condição de base para a convivência humana e social.

Neste sentido, Scheler foi o único que «uniu o amor ao valor, pelo que o constitui na «pessoa», por um lado e na maneira de amar, por outro19. O amor que se adquire no valor pessoal do outro, por si mesmo, está isento de todo o atributo evolutivo. O valor do amor é referenciado como intrínseco. Não são duas realidades independentes que formam uma terceira, mas o amor da pessoa é um valor em si mesmo. Isto é, no sentido mais profundo do homem, como «pessoa total». Assim, Scheler sustenta que «todos os outros são o modo de uma pessoa total»20.

Carnap apresenta a Ética metafísica como uma " filosofia de valores". Contudo, a axiologia, segundo o filósofo do Circulo de Viena, manifesta-se como linguagem semântica dos valores, sendo estes objectiváveis simbolicamente. A Ética aparece como " filosofia da normatividade" , não num sentido empírico. Aqui poderá referir-se como forma axiológica formal, que se determina como vida metafísica da Ética, planeada como uma Meta-ética. Naturalmente, a Ética empírica será um modo alético e epistémico, que determina uma verdadeira axiologia simbólica. Um dos significados éticos aponta para uma "gramática da ética", a qual repousa na noção de análise lógica do agir humano. Esta é uma visão neopositivista da Ética, que se apresenta diametralmente oposta à concepção de Scheler.

ANÁLISE EPISTEMOLÓGICA: PELO SENIDO LÓGICO

O objectivo epistemológico, segundo o Círculo de Viena (Carnap, Schlick, etc), é a formulação de um método para a justificação dos conhecimentos (Erkenntnisse), na procura de encontrar um princípio fundamentador, que fora denominado princípio da verificabilidade. A epistemologia deve significar como se poderá "verificar" uma parte do conhecimento, isto é, como se poderá justificar um conhecimento autêntico.

Segundo o neopositivismo lógico, verifica-se o conteúdo de certo conhecimento, relacionando-o com os conteúdos de outros conhecimentos, que se supõem válidos. Na verdade, um conteúdo será reduzido a outro ou será epistemologicamente analisado21.

Naturalmente, a lógica ensina a derivação da validade de algumas proposições (Setzungen) e da validade pressuposta de outras proposições. De facto, a diferença é que a derivação lógica tem elementos através da reorganização dos conceitos, dado que, na proposição derivada, não pode surgir qualquer conceito novo. É característico de uma derivação epistemológica que o conhecimento a ser analisado, isto é, que a sentença deve justificar-se e contenha um conceito que não se mostra nas premissas.

Segundo Carnap, para determinar o significado dos conteúdos dos conhecimentos, a epistemologia deve investigar os objectos da ciência em suas várias subdivisões (ciências naturais e culturais). Devem ser averiguados os outros conceitos a que se pode reduzir o conhecimento do objecto dado. Logo, empreende-se uma análise dos objectos, onde se reduzem os objectos superiores aos inferiores. Assim serão chamados objectos, epistemologicamente fundamentais, aqueles que não podem ser reduzidos.

Poderemos formular o propósito da análise epistemológica sem ter que usar expressões da filosofia tradicional. Devemos retroceder até ao conceito de "implicação" segundo a lógica proposicional22.

Quando se encontra, finalmente, uma formulação conceitual para as questões intuitivamente propostas, as respostas previamente encontradas libertam-se do seu estado de suspensão e assentam num sólido fundamento científico.

A ciência esteve, durante tempos, na posse de um grande número de resultados da análise epistemológica. Ela tem respostas sem estar na posse das questões, isto é, sem ter a capacidade de indicar o sentido preciso dessas respostas. As conhecidas radicam na cognição dos processos de consciência de outra pessoa, que se baseia na percepção dos movimentos das sentenças linguísticas.

De facto, segundo Carnap, acontece que as análises deste tipo constituem parte fundamental do procedimento psicológico. Será somente através deste procedimento de formação conceitual que a psicologia determina os seus objectos. No entanto, veremos que este procedimento nada mais é do que a análise epistemológica, que determinará um estatuto para as ciências empíricas e não empíricas, como será o caso da Ética ou da Bioética.

A análise epistemológica é uma reflexão de conteúdos das experiências, mais precisamente aparece como análise teórica. O estatuto epistemológico das éticas não se preocupa somente com o conteúdo teórico da experiência. Será, pois, uma análise semântica das condutas humanas23.

Poderemos fazer uma avaliação epistémica de qualquer experiência que estiver enunciada e até que medida esta experiência se acrescentou ao conhecimento teórico. Também poderemos dispensar a avaliação epistémica desse constituinte sem, deste modo, diminuir a extensão do nosso conhecimento.

Pelo pensamento de Carnap, para se encontrar o critério para a análise epistemológica, aquilo que temos a fazer será deixar claro porque decidimos que a relação epistemológica, entre o núcleo e a parte secundária da experiência S, será obtida entre a e b , mas não entre b e a, porque esta relação não vale, de modo algum, entre os constituintes da experiência S.

O critério, para a relação epistemológica, criando um estatuto para o conhecimento empírico e para a reflexão ética (filosofia dos valores), entre a parte secundária e o núcleo de uma experiência, reside na possibilidade de justificação de um conhecimento contra o qual se formulou uma dúvida metodológica, através de outra forma de conhecimento, cuja validade se admitiu24.

Por um lado, pressupomos que esse procedimento é epistemologicamente inquestionável, por outro, a epistemologia constituirá um sistema a partir do qual se inspeccionam criticamente as condutas individuais25. Ao retroceder até ao método de uma ciência especial, para decidir acerca de uma dada questão epistemológica, não introduzimos essa ciência como pressuposto para um sistema válido do conhecimento.

Para Carnap, ainda não estamos preocupados com a questão de saber se os conhecimentos da ciência especial devem ou não ser considerados correctos, mas antes com a questão de saber se vale ou não a relação de dependência epistemológica entre os objectos do campo científico. Aceita-se, em Carnap, cada vez mais amplamente o facto de que o autopsicológico e o heteropsicológico possuem um carácter epistemológico inteiramente diferente. Actualmente, poderemos negar esse facto somente se estamos ligados a certas convicções metafísicas. A diferença epistemológica, entre o heteropsicológico e o autopsicológico, tornar-se-á evidente através da investigação da relação epistemológica entre o psicológico e o físico26.

A análise lógica das experiências, nas quais se reconhecem as ocorrências heteropsicológicas, mostrou que, em todos os casos possíveis (E E2, E3), o constituinte a (a percepção do físico) é epistemologicamente suficiente, enquanto que o constituinte b (a ideia da ocorrência heteropsicológica reconhecida) é dispensável relativamente à primeira.

Pela análise epistemológica, Carnap chegou à conclusão que, em cada caso, o constituinte a é o núcleo epistemológico, enquanto b é a parte secundária. Poderá demonstrar-se que b é dado epistemológica, assim como logicamente, depende de a.

Para estabelecer isto, formulámos previamente dois critérios diferentes: a justificação de b com base em a e a possibilidade de a suposição do erro na de b, quando a será dado. Estes critérios aplicam-se ao reconhecimento das ocorrências heteropsicológicas27.

O reconhecimento das ocorrências heteropsicológicas, segundo as perspectivas do Circulo de Viena, retrocede até ao reconhecimento de um evento físico. Expressamos, assim, que os objectos heteropsicológicos são epistemologicamente secundários em ordem aos objectos físicos.

Seria até mesmo mais fácil demonstrar isto, já que dificilmente existem prejuízos emocionais, que obscureciam este facto. Teríamos que mostrar que o reconhecimento dos eventos culturais, como de uma religião ou conduta moral, se baseiam no reconhecimento dos processos psicológicos dos portadores daquele processo cultural e no reconhecimento de suas documentações físicas28.

A Ética, segundo Carnap, vive da não-factualidade, tendo os seus enunciados outro sentido e não serão usados como critério para a significabilidade dos enunciados.

O significado de um enunciado reside no facto de que ele expressa um estado das coisas. Se um enunciado ostensivo não expressa um estado das coisas, então não tem qualquer significado, dado que só aparentemente é um enunciado.

Se o enunciado expressa um estado das coisas, então é significativo para todos os eventos e será verdadeiro se esse estado de coisas existe ou falso se ele não existe. Poderemos saber se um enunciado é significativo, mesmo antes de saber se ele é verdadeiro ou falso.

Carnap é claro ao afirmar, e com aplicabilidade nas éticas, se um enunciado se fundamenta através das experiências passadas, e não mais pode ser testado, então temos a mesma confiança nele, como temos num enunciado testável. A Ética satisfaz-nos com enunciados desse tipo, uma vez que em física e química o enunciado é testável29.

Estas reflexões conduzem, segundo Carnap, ao enunciado do "princípio da verificabilidade", que se poderá referir como o conteúdo das experiências se se liga pelo menos indirectamente com a experiência, de tal modo que se pode indicar qual é a experiência possível , que o confirmaria ou refutaria. As experiências fundamentá-lo-iam ou ele é testável ou ainda tem pelo menos conteúdo factual, mas não estão nem fundamentadas nem testáveis30.

De acordo com Carnap, o princípio da verificabilidade determina que só tem valor científico o enunciado que está de acordo com a experiência física.

Os valores éticos entram em jogo, mas não há qualquer conexão com a verdade e a falsidade. Finalmente, deverá dizer-se dizer que, para o neopositivismo , somente os enunciados, que possuem conteúdo factual, são teoricamente significativos e poderão enunciar-se pelo princípio da verificabilidade. Os enunciados ostensivos, que não podem, em princípio, estar fundamentados pela experiência, são carentes de significado.

Schlick, co-fundador do Circulo de Viena, não idealiza que a possibilidade de verificação não repousa em qualquer verdade da experiência, em alguma lei da natureza ou em qualquer outra proposição verdadeira, de ordem geral, uma vez que é determinada , segundo as nossas definições, pelas normas, que foram fixadas, para a nossa língua ou que podemos estabelecer arbitrariamente a qualquer momento. Todas essas normas apontam para definições indicativas e, através delas, a verificabilidade está vinculada à experiência31.

ÉTICA PROPOSICIONAL SEGUNDO CARNAP: SENTIDO E EVOLUÇÃO ANALÍTICA

Para Carnap, este saber é a filosofia dos valores (axiologia) como ramo mais relevante da filosofia moral. A palavra "ética" usa-se em dois sentidos diferentes. Às vezes a "ética" refere-se a certas investigações empíricas, por exemplo, as psicológicas e sociológicas, sobre acções dos seres humanos, atendendo à origem destas acções a partir dos sentimentos e das volições e seus efeitos.32 Pelo pensamento de R. Carnap, a Ética é uma investigação empírica. Pertence a uma ciência empírica mais do que à filosofia.

Mas, num segundo momento, a Ética é fundamentalmente diferente por ser filosofia dos valores ou da normatividade moral. Poderemos, segundo Carnap, denominá-la como Ética normativa. Esta não se refere a uma investigação pretendida sobre o que é o bem ou sobre o que é o mal, sobre o que é correcto fazer ou o que é incorrecto.33

Desta feita, o propósito desta Ética normativa radica no estabelecimento de regras para o agir humano ou apresenta-se como conjunto de juízos sobre valores morais34.

Assim, o termo e conceito de Ética têm, para Carnap, dois sentidos (sinn), um gramatical e lógico e outro axiológico. Em Carnap, há uma diferença de formulação se estabelecermos uma norma ou um juízo valorativo. Logo, uma norma implica uma forma imperativa (não matarás). O juízo axiológico correspondente será: matar é um mal35.

Esta diferença de formulação, na prática, chegou a ser muito importante ao longo do pensamento filosófico, desde a ética teleológica de Aristóteles até ao deontologismo kantiano, passando pela aretologia medieval, influenciada pela Teologia.

A regra "não matarás" tem gramaticalmente a forma imperativa, não podendo ser considerada como uma proposição, que poderá ser categórica (Kant) ou paranética (S. Paulo).

Mas, num enunciado valorativo, matar é um mal, mesmo que a regra seja uma expressão de determinado desejo, tem a forma gramatical de uma declaração, orientando-nos para uma Ética proposicional, onde surge uma semântica moral constituída, também, como Ética declarativa, que terá a sua crítica na Escola de Frankfurt, como uma Ética narrativa.

Na perspectiva de Carnap, esta forma conduziu muitos filósofos a pensar que um enunciado valorativo é afirmativo e deve ser verdadeiro ou falso. A isto chamar-se-ia uma ética tautológica por influência da teoria semântica do cálculo lógico das proposições da Lógica Matemática. Mas, na realidade, um juízo axiológico não é senão uma ordem com uma forma gramatical. Poderão ter efeitos sobre as acções dos homens e estes poderão estar em concordância com os nossos desejos ou não 36.

Isto mostra-se com significado, quando aplicamos, a tais enunciados, o método da análise lógica. Segundo Carnap, do enunciado "matar é um mal" não poderemos deduzir nenhum juízo para futuras experiências. Logo, este enunciado não é verificável e não tem um sentido teorético e, isto mesmo, será somente verdadeiro para todas as sentenças axiológicas.

Se uma pessoa mata alguém, então terá recentimentos. Mas, não há forma de deduzir este juízo do outro que diz "matar é um mal".

A primeira é deduzível de enunciados psicológicos, relativos ao carácter ou às reacções emotivas das pessoas. Estas sentenças são verificáveis e não existem sem o meaning37.

Segundo Carnap, a primeira deduz-se como enunciado psicológico, relativo ao carácter ou às reacções emotivas, pertencendo à Psicologia e não à Filosofia, mas antes à Ética. Apesar das sentenças da ética normativa terem formas de regras ou de enunciados axiológicos, carecem de sentido teórico e não se apresentam como enunciados científicos38.

No sentido de se evitarem equívocos, deveremos dizer que, de nenhum modo, negamos a possibilidade e a importância de uma investigação científica sobre os enunciados, bem como os actos da valorização. Ambos constituem acções de indivíduos e formam, como todas as espécies de actos, possíveis objectos da investigação empírica.

Para Carnap, estes enunciados históricos e sociológicos imprimem actos axiológicos, que se apresentam como proposições científicas, pertencentes à Ética, no primeiro sentido dado a este conceito.39

Com efeito, as proposições axiológicas per se são objecto de investigação e não constituem proposições destas teorias.

De acordo com alguns pensadores, as proposições axiológico-éticas significam-se como enunciados em relação às consequências dos actos considerados. Logo, denominar bom ou mau, a um género de conduta, significa dizer que é adequado ou inadequado para determinado propósito. Na verdade, pelo pensamento do filósofo do Circulo de Viena, referir que "matar é mau" poderá traduzir-se em que matar não é um procedimento adequado na vida de uma comunidade harmoniosa. Logo, sobre as bases de alguma interpretação desta espécie, como função instrumental de interesses humanos ou de questões analógicas, uma proposição de valor tem um conteúdo cognoscitivo.40

Mas, na linha do neopositivismo lógico, representado pelo pensamento de Carnap, supomos que um filósofo recusa dar às proposições axiológicas qualquer hermenêutica, que as torne analíticas e sujeitas à comprovação por meio da evidência empírica. Mas, um determinado acto é bom, não porque possa ter alguma consequência, mas em virtude da sua natureza intrínseca. Segundo o pensamento do filósofo e lógico do Circulo de Viena, as proposições de valor podem denominar-se absolutas diferentemente de outras mencionadas, perante aquelas que são relativas em determinados propósitos41.

Com muita frequência usa-se a palavra "significado", no domínio da Ética proposicional, in lato sensu, querendo acentuar que o género do significado, que negamos ao enunciado de valor absoluto, será exclusivamente o meaning cognoscitivo. Seguramente que estes sentidos possuem significados expressivos, emotivos e volitivos. Tal facto reveste-se de grande interesse para a eficiência moral.

A Ética, segundo Carnap, é proposicional e aqui são analisadas as sentenças empíricas, como investigações psicológicas e sociais, sobre as acções dos actos humanos, atendendo aos sentimentos lógicos.

Se a moral é o objecto da Ética, então esta converte-se em objecto da Metafísica. Logo, a meta-ética é reflexão crítica que analisa o discurso da ética nos pressupostos e nos limites. Aqui surge o fundamento metafísico da Ética, que não foi analisado por Carnap.

Segundo este pensador do neopositivismo lógico, a grande tese desta Filosofia assevera que os enunciados metafísicos têm uma função expressiva e não uma função representativa.

Os enunciados metafísicos não são nem verdadeiros nem falsos, porque nada afirmam e não contêm nem conhecimento, nem erro e permanecem à margem do conhecimento42.

A Ética ficará circunscrita a uma lógica da conduta humana, sem qualquer fundamento, dado que a carência do carácter metafísico não constituiria um defeito. Naturalmente, a filosofia moral ficará limitada à lógica, assim como a Ética.

Para Carnap, a única tarefa da Filosofia realiza-se pela análise lógica. Em todas as considerações feitas, incluindo as da moral, pratica-se uma análise lógica. Assim, a Ética percorre o caminho da semântica da conduta humana.43

Não será possível elaborar uma sintaxe ética, dado que esta reflexão prática não é axiomatizável devido à liberdade, consciência e responsabilidade e demais variáveis éticas.

Contudo, será relevante dizer que, com Carnap, a Ética revela-se como análise lógica das diversas condutas humanas. Assim, a Ética transforma-se numa forma de apresentar os enunciados morais como proposições sujeitas à semântica.

Segundo o pensamento de Ricoeur, criticamos a reflexão de Carnap ao dizer que se poderá relacionar a moral com aquilo que estimamos como bom. A Ética faz referência à orientação perante uma vida plenificada sob o signo das boas acções, resultando daqui o carácter de projecto. A moral apresenta-se como algo que se impõe como obrigatório. O domínio da moral caracteriza-se pelo aparecimento da norma. Ricoeur, na sua Ética, pretendeu justificar a necessidade de submeter a Ética à prova da norma. Assim, a Ética inclina-se para uma intenção, a moral, porém, desdobra essa intenção e dá-lhe a sua efectivação, traduzindo-a tendo em consideração as ameaças e os obstáculos, que, naturalmente, se opõem à sua realização. Segundo Ricoeur, a relação da norma com a intenção, da moral com a ética é não só de subordinação,mas também significará uma relação dialéctica, dado que a norma possui repercussões na intenção . Entretanto, Carnap irá subordinar a Ética à Análise Lógica da linguagem. A moral possui uma intenção semântica, que vem da linguagem analítica da Ética. Mas, Carnap não faz referência a esta posição, devido à crítica a Kant.

A Ética salienta um conjunto de normas ou regras que se caracterizam pela vida da liberdade e pela universalidade da obrigação.

No primeiro caso é subtraída a estima de si mesmo, no segundo surge o respeito. No primeiro, a distinção entre "ser" e "dever ser" fica mais definida; no segundo mais radicalizada44.

Se uns privilegiam o domínio do bem (bonum) como um fim, então apresentam-no como pressupostos teleológicos (Aristóteles e S. Tomás de Aquino); outros privilegiam a norma, que se impõe como "dever" (Pflicht) e teremos as respostas do deontologismo kantiano.

Porém, Carnap apresenta a ética como lógica da moral no aspecto proposicional . A ética é uma análise lógica da moral para chegar a ser uma moral lógica de proposições.

Com efeito, a lógica deôntica estuda os modos referentes à noção de Obrigação. Os conceitos submetidos à sua análise são os normativos (éticos, jurídicos, etc). Na verdade, os functores modais deônticos são os seguintes: obrigatóruio, permitido, proibido e indiferente. Tal como no caso dos functores modais alélicos, basta um só como primitivo para a definição dos demais. Escolhendo o "obrigatório" , simbolizado por L, seguir-se-á um número abstracto de uma classe de acções.

Existem outros conceitos deônticos que se aplicam a pares de actos. Serão particularmente marcantes os da compatibilidade, incompatibilidade, verificabilidade e da implicação. Na verdade, as lógicas deônticas, fundamentais para fundamentar formalmente a Bioética, determinariam a sua globalização linguística,que serão de estrutura analítica à lógica modal alética.

Seguindo as classes da Lógica Modal, que poderão seguir os esquemas de Von Wright, diremos, em ordem à fundamentação da Bioética, pela Lógica Formal Moderna, que se podem decifrar em diferentes modos: Modos Aléticos: necessário, possível, contingente e impossível. Estes são as formas clássicas modais e apresentam um interesse puramente formal. Os Modos Epistémicos (verificado, refutado, não-refutado, conformável, etc) referem-se à teoria da ciência, orientando-se para operações não-formadas, sendo empíricas, por meio das quais se estabelecem ou destróiem afirmações na ciência ou no conhecimento comum. Finalmente, temos os Modos Deônticos (obrigatório, permitido, indiferente e proibido, etc.) que são de especial interesse no estudo das linguagens normativas.

Todos estes elementos modais, particularmente, os deônticos fundamentam linguisticamente a Ética e a Bioética, dando-lhe novo sentido lógico-simbólico.

A Bioética, segundo uma análise lógica das condutas morais clínicas, necessita de uma lógica modal deôntica, como suporte simbólico-linguístico.

A posição de Carnap é diferente da apresentada por Habermas e Apel através de uma ética discursiva (comunicativa ou dialógica), que insiste na referência da norma consensualizada no diálogo racional. Assim são afectados por ela e por aqueles que de uma forma ou de outra, actualizam o contratualismo, desde o ponto de vista dos que propõem como decisivo o respeito pelo que se decidiria numa situação hipotética de contrato originário pela justiça (Rawls).

Naturalmente que a perspectiva de Carnap vai na linha da filosofia analítica e não por anteriores orientações. Assim, será impossível em Carnap uma fundamentação ontológica da Ética. Aquilo que existe é uma linguagem lógica da ética como análise formal de normas ou de juízos axiológicos.

A Ética em Carnap não é um complexo de enunciados metafísicos, como aqueles que pretendem descrever conhecimentos acerca de algo que se encontra, ora mais além de toda a experiência, ora sejam a verdadeira essência das coisas ou sobre as "coisas em si". Na verdade, a Ética assentaria sobre enunciados não verificáveis.45

Em função da negação da Metafísica, a Ética aparece como forma de "análise lógica", caracterizada por meio de um discurso semântico, onde se assinala o valor de verdade ou de falsidade das proposições morais.

A Ética servirá não pela gnoseologia da moral, mas, em Carnap, aparece como determinação tautológica da moral. Segundo Carnap, os metafísicos não podem evitar a clivagem dos enunciados não verificáveis, porque se os tornarem verificáveis, a decisão, acerca da verdade ou falsidade de suas doutrinas, dependerá da experiência e, por conseguinte, pertenceria ao campo da ciência empírica. A Ética não faz parte do âmbito das ciências empíricas, como bem salienta Carnap46.

Segundo a convicção do filósofo do Circulo de Viena, os metafísicos desejam evitar esta consequência, porque pretendem ensinar um conhecimento que se encontra num nível superior ao da ciência empírica, vendo-se, assim, compelidos a romper a conexão entre os seus enunciados e a experiência.

Carnap também entende a Ética como investigação científica ao fazer-se investigação proposicional, sobre sentimentos e volições, pelos seus efeitos sobre as gentes. Este é que será o verdadeiro sentido para Carnap, aparecendo como ciência pragmática47.

Talvez fosse interessante, no aspecto crítico, segundo a perspectiva de Ricoeur, afirmar, em última instância, o primado da "estima de si" e com ele o da teleologia, ao formar uma complexa definição de Ética como o agir da vida realizada, com e para os outros, em instituições justas.

A Ética, em Carnap, não se revela como saber da "praxis" e para a "praxis" a partir do ponto de vista do que "deve ser", isto é, apresenta-se como saber da acção correcta, não meramente teórica, estimulando para a "acção pragmática", ainda que toque a cada pessoa o saber aplicar tudo isto às situações concretas.

VERIFICABILIDADE: PELO PRINCÍPIO EPISTEMOLÓGICO EM BIOÉTICA

A função da análise lógica consiste na referência de todo o conhecimento, de toda a afirmação da ciência ou da vida quotidiana, com vista a clarificar o sentido de tal enunciado e das conexões entre eles.Para Carnap, existem duas ordens de verificação (directa ou indirecta). Se o problema se refere a uma proposição, que afirme algo relativo a uma percepção actual, então o enunciado pode provar-se directamente por meio desta percepção.

Se tomamos um enunciado universal, que se refere a todas as coisas ou acontecimentos que podem dar-se no tempo e no espaço, então uma lei natural será mais clara que o número de casos examináveis. Consequentemente, a proposição resulta como hipótese48.

No pensamento lógico-analítico de Carnap, toda a asserção, no amplo domínio da ciência, tem este carácter como bem se afirma sobre as percepções actuais sobre outras experiências e será verificável por meio delas. Esses enunciados acerca de futuras percepções inferem-se conjuntamente de outras proposições já verificadas.

Para Carnap, o que dá um significado teorético a um enunciado não são as imagens e os pensamentos, mas a possibilidade de deduzir dele proposições perceptivas, por outras palavras, a possibilidade da sua verificação.

Na verdade, carecemos de toda a imagem efectiva do campo electromagnético, bem como do campo gravítico. Com efeito, as proposições, que os físicos afirmam acerca destes campos, possuem um perfeito sentido, porque delas são deduzidos enunciados perceptivos. Todavia, a única objecção a estes enunciados seria que não encontramos maneira de os verificar49. Assim, o princípio da verificabilidade é fundamental para se poder definir ou descrever o estatuto epistemológico da reflexão ética, bem como das ciências da natureza. Um dos aspectos da Bioética, nos dias de hoje, devido à sua projecção, reside no estatuto epistemológico.

Os progressos das ciências questionam e provocam o homem e a sociedade, pois suscitam novas perguntas e novas exigências sociais e jurídicas e revelam-se, assim, motivadas por esses progressos, para novas leituras éticas, determinando novo estatuto epistemológico para este grau do saber.

Segundo a filosofia de Carnap, o princípio da verificabilidade dá-nos a oportunidade de as proposições dos saberes terem valor científico, quando justificadas pela experiência.

A Ética não deve referir-se somente ao homem, mas "deverá" estender o olhar para a biosfera, no seu conjunto, ou melhor para cada intervenção científica do homem sobre a vida em geral, necessitando de um fundamento epistemológico50.

Entendendo a Ética como estudo sistemático da conduta humana, considerada à luz de valores e de princípios, unem-se os dois sentidos dados por Carnap, que vão desde uma investigação empírica até a uma filosofia dos valores.

Sempre que há sintonia entre valores e princípios com os factos, então estamos perante uma conformabilidade ética na sequência do pensamento de Carnap.

Assim, a riqueza desta relação intencional epistemológica (factos, valores e princípios morais) encontra-se informada pela "verificabilidade" na sequência da semântica de Carnap.

A Ética poderá necessitar de determinar uma análise lógica das proposições semânticas, procurando o valor de verdade ou de falsidade das mesmas.

Todavia, a Ética é muito mais do que o estudo das tautologias, nas investigações empíricas, e será mais orientada para uma filosofia dos valores.

O objectivo da epistemologia, segundo Carnap, é a formulação de um método para a justificação das Erkenntnisse. Assim, a epistemologia deve especificar como se pode justificar uma parte do conhecimento, isto é, como se pode mostrar que essa é um conhecimento científico. Uma tal justificação não é absoluta, mas relativa51.

Também a lógica ensina a derivação da validade de algumas proposições (Setzungen) pela validade pressuposta de outras. Na proposição derivada, não pode ocorrer qualquer conceito novo. Será característico de uma derivação epistemológica que o conhecimento a ser analisado, isto é, que a sentença se deve justificar e contenha um conceito que não ocorre nas premissas.

A epistemologia deve investigar os conceitos da ciência empírica nas várias sub-divisões (das naturais às culturais). Com efeito, empreende-se uma análise dos objectos , onde se reduzem os superiores aos inferiores e chamam-se objectos epistemologicamente fundamentais52.

Poderá descrever-se, com Carnap, um método que conduziria a resultados que geralmente se reconhecem pertencerem à epistemologia. Este método de análise é o que se significa, se falarmos da análise epistemológica.

Segundo Carnap, se por verificação se entende o estabelecimento completo da verdade, então uma sentença universal, por exemplo, nunca poderia ser particular.

Com efeito, não podemos verificar a lei, mantendo as suas instâncias particulares, isto é, as sentenças que deduzimos da lei e de outras proposições previamente estabelecidas. Numa série contínua de experiências, não se encontra nenhuma instância negativa. Mas, se o número de instâncias positivas aumentar, então a nossa confiança na lei aumentará. Na verdade, ao invés da verificação, poderemos falar de confirmação gradativa da lei53.

Ao empreender as investigações metodológicas, especialmente concernentes à verificação, é importante distinguir entre questões lógicas e empíricas. Os conceitos lógicos pertencem à sintaxe e os empíricos são descritivos, isto é, não lógicos e pertencem ao campo da Biologia, da Psicologia e da Bioética, pelo pensamento de Carnap, ou seja, pela teoria do uso da linguagem como grau especial da actividade humana.

Por um lado, os termos e juízos descritivos pertencem à pragmática, onde se encontram as éticas, desde a fundamental até às aplicadas; por outro, surge a análise lógica pertencente ora à semântica (se se refere ao significado e à interpretação) ora à sintaxe (se é formalizada).

A Ética, como pragmática do agir humano, revela-se na semântica moral, porque procura o significado e a interpretação da vida humana com vista a promover o seu desenvolvimento54.

Pelo pensamento de Carnap, a Ética e suas extensões vivem da "análise lógica". Deixaram de ser uma reflexão categoricamente normativa do agir ou da conduta. Segundo o pensador de Koenigsberg, a observância da norma é um "dever" (Pflicht), mas este "dever" surge da Vernunft ( razão).

O elemento de universalidade dos princípios do nosso comportamento, enquanto expressão da natureza racional, não é heterónomo, surge como expressão da autonomia.

Enquanto seres racionais damos conta das leis do agir e será isto que fundamenta a liberdade (Freiheit) que possuimos enquanto seres racionais. Esta ideia de liberdade constitui o pathos da filosofia moral de Kant55.

Nesta medida, o fundamento epistemológico da Ética estaria na natureza racional do homem. Isto não é novo, dado que os estóicos (Zenão da Stoa) já tinham definido que os deveres éticos surgiam da participação do homem no logos.

A esta concepção reage o Circulo de Viena, numa nova análise, criticando o sentido e evolução da ética. Este saber pragmático surge como línguagem, não observável, mas testável na própria conduta pela "análise lógica".

Para Carnap, a Ética aparece como nova reflexão, onde as proposições, que se podem conhecer, estão baseadas nas experiências morais ou se apresentam sob a forma de uma proposicição modal alética , segundo a leitura formal das lógicas deônticas.

De alguma forma, a linguagem da ciência será restrita ao exigir, que não se admitam os predicados descritivos e, portanto, as sentenças sintéticas, a menos que elas tenham alguma relação com observações possíveis numa conexão, que se deve caracterizar de maneira adequada56.

A posição de Schlick, co-fundador do Circulo de Viena, sobre a Ética, é diferente de Carnap, ao dizer que o verdadeiro problema da liberdade, tal como em ética, somente foi confundido com a questão do indeterminismo. A liberdade ética, no pensamento de Schlick, pressuposta pelo conceito de responsabilidade, não contradiz a causalidade, senão que, pelo contrário, seria inexistente sem ela.

Apesar da crítica do Circulo de Viena, aqui representada pelo pensamento de Carnap, a Ética não deixa de se relacionar com o conceito de pessoa e com os princípios da moral, na busca de uma fundamentação metafísica, que é negada pelo neopositivismo. Talvez esta fundamentação nunca seja aceite universalmente, nas suas possibilidades e desafios, devido à questão epistemológica.

Na linha do neopositivismo lógico, a Ética, na cultura pós-moderna, aparece como "pragmática moral". A objectividade do mundo ético deveria ser vista como conformidade com as normas.

Tal conformabilidade, na linha de Carnap, torna-se dúbia apenas quando vista como algo mais do que foi analisado, isto é, como modo de obter acesso a algo que se baseia em práticas correntes da justificação.

Parece paradoxal a justificação ontológica da Ética ao repousar sobre a análise lógico-simbólica da linguagem não observável.57

Ao aceitar isentar a ética, obra ecuménica da excelência (virtude) da normatividade (dever), de toda a fundamentação metafísica, além de quebrar o estatuto epistemológico da mesma, não procuramos exonerar, da mesma tarefa, as diversas éticas filosóficas.

É difícil construir uma Ética apenas numa base neopositivista, à medida do Circulo de Viena, porque temos que ressalvar a seriedade da obrigação, que perpassa a moral, dado que a sua exigência participa da transcendência da consciência.

A normatividade incondicional, que vivenciamos na raiz da consciência, desemboca na conceitualização de princípios do pensar e do agir humanos e encontra-se e vive-se para além da análise lógica. Uma coisa é a linguagem ética, outra será aquela que é formal, dada em proposições não-observáveis a que chamamos de Ética Analítica, na linha do pensador de Viena, onde este saber é uma linguagem empírica.

O princípio da verificabilidade, identificando o significado e as condições empíricas, reduziu a Filosofia a um conjunto de sequências assignificativas de sinais, retirando à Metafísica o direito de ocupar um lugar no domínio do conhecimento.

Se o domínio do conhecimento é esgotado pela Lógica, pela Matemática e pelas ciências empíricas, então poderemos perguntar: qual o estatuto epistemológico do empirismo, enquanto sistema de afirmações aparentes? Qual o sentido da proposição que afirma a validade do princípio da verificabilidade?

A resposta vem do Circulo de Viena ao afirmar que a filosofia se dedica a esclarecer os conceitos propriamente científicos. O erro da Metafísica consistiu em tomar esse esclarecimento como uma expressão.

Para Schlick, se é necessário explicitar o significado de uma proposição, então será óbvio que essa explicitação não pode ser feita, exclusivamente, em termos de outras proposições.

A Filosofia não seria uma teoria, exprimindo factos, mas uma actividade para indicar o inexprimível. Em suma, o princípio da verificabilidade não remeteria para nenhum facto, mas antes seria a regra orientadora da actividade filosófica na busca do significado das proposições da ciência.

Com efeito, segundo Carnap, a Filosofia teria duas funções: uma positiva e outra negativa. Ambas referem-se à análise da linguagem, tal como se encontram no domínio da Ética.

Finalmente, dizer que a Ética possui duas linguagens. Estas duas são, de um lado, o conjunto de sistemas éticos que integram as culturas, em determinada época da humanidade, com suas intuições, carências e fundamentações, sempre perpassadas pelo imperativo ético; do outro, a necessidade de um consenso empírico, prático e efectivo, que só poderá resultar do debate livre e organizado, desembocando na determinação de normas mínimas a fim de se manter uma indispensável coerência na acção.

Toda a linguagem, tal como a Ética, poderia ser especificada em termos de um conjunto de sinais primitivos, que constituiriam, por um lado, um conjunto de "regras de formação", indicadoras de como obter expressões complexas por combinações de expressões mais simples, exclusivamente na base de suas formas visíveis e, por outro, um conjunto de regras de transformação restritas à forma das expressões, capazes de reflectir os modos válidos da inferência.

ANÁLISE LÓGICA: PELOS FUNDAMENTOS EM BIOÉTICA

Um dos aspectos fundamentais do pensamento de Carnap poderá ter utilidade para a Bioética. Como aproveitamento das suas ideias, encontramo-las no princípio da verificabilidade.

A Bioética parte da racionalidade humana secular e universalmente aceite. As proposições da Bioética implicam uma testificabilidade, porque partem da experiência empírica oriunda da biomedicina e da biotecnologia. O princípio da verificabilidade poderá permitir a ponte das éticas para a biomedicina e para a biotecnologia.

A Bioética poderá descrever-se como estudo sistemático das questões de valor, que surgem nos novos campos do comportamento. Ainda se poderá conceber como o estudo sistemático do comportamento humano no domínio das ciências da vida e dos cuidados de saúde, enquanto comportamento perspectivado à luz dos valores e princípios morais58.

A Bioética poderá seguir um método positivo, desde o plano sistemático até à casuística. Poderá dizer-se que o sentido de cada proposição da conduta clínica, segundo a axiologia, busca a sua verificação no dado experimental.

A negação da existência de um mundo externo seria uma proposição tão metafísica, quanto a sua afirmação. Por conseguinte, uma visão empírica da Bioética não nega os aspectos transcendentes da mesma, senão que destituídas de sentido, na mesma medida, tanto a negação quanto a afirmação do transcendente, como os valores que se encontram na Bioética.

A Bioética introduz uma nova maneira de falar, porque sujeita a novas regras, que vai da sistemática da conduta moral da vida clínica até à influência da biotecnologia, caracterizada por normas e valores. Tem um sistema de referência linguística, para as novas entidades, que surgem dos elementos que a Medicina lhe fornece59.

Deveremos, aproveitando elementos metodológicos do neopositivismo do Circulo de Viena, distinguir dois tipos de questões de existência: em primeiro lugar, as questões da existência de certas entidades do novo tipo no interior do sistema de entidades, representado pelo sistema linguístico de referência, que surgem da normatividade e da excelência da conduta humana. Chamamo-las de "questões internas"; em segundo lugar, surgem as questões concernentes à existência ou à realidade do sistema de entidades, como um todo, chamadas "questões externas", que advêm da biomedicina, fornecendo os dados para adequada reflexão ética60.

Poderemos encontrar as respostas, ou através de métodos puramente lógicos ou através de métodos empíricos, dependendo do sistema de referência ser lógico ou factual e sendo este último representado pela biomedicina. Assim, a Bioética parece pertencer ao mundo das coisas e ao munda das vivências. Implicará uma metodologia dual, dado que, segundo a análise lógica, é por sua natureza reflexão implicativa (à medida da apresentada pela Lógica Simbólica).

Será, de facto, este o contributo da Ética Analítica para a Bioética, por um lado, fornecer uma metodologia lógica, para abordar os problemas, e, por outro, apresentar nova forma semântica para os problemas da biomedicina.

Como se trata de uma "ética da linguagem", terá grande significado na aplicação e na implicação formal para o estudo e fundamentação linguística da Bioética. Esta será uma ética de implicações em função dos progressos clínicos e biotecnológicos61.

A Bioética terá muito que aproveitar da Ética Proposicional, sobretudo, no domínio das metodologias implicativas, permitindo uma leitura epistemológica do seu enquadramento ético, criando uma nova linguagem.

A Lógica Simbólica, proclamada por Carnap, identifica os enunciados dotados de significação ao exigir a sua ligação a outros mais simples, que, por sua vez, repousam nos dados empíricos. Aqui entrará a lógica da conduta moral na Bioética.

A Lógica constitui o procedimento metodológico comum e indispensável a todas as ciências, pois procura estabelecer o sentido de cada noção por um processo de reduções, até aquelas que se salientam pelos dados empíricos. Deste modo, assegura um tratamento unitário a todas as demais disciplinas científicas, propondo reduzir todos os conceitos que entram na formação do discurso pelos correspondentes dados sensíveis imediatos. No limite, será possível estabelecer o quadro susceptível para assegurar a concepção científica das realidades.

Assim, pelo pensamento do Circulo de Viena, a tarefa científica poderia ser realizada pela Lógica Formal Moderna, em virtude do poder que ela manifesta ao alcançar a precisão necessária nas definições de conceitos e nos enunciados, ao formalizar os procedimentos intuitivos pela inferência do pensamento ordinário, isto é, defini-los de forma rigorosa e controlados pelo mecanismo dos sinais lógicos.

Naturalmente que a Bioética, como "reflexão implicativa", participa das duas linguagens, quer externa (biomedicina) quer interna (axiológica e principiológica).

A Bioética necessitará da "análise lógica", porque esta permite, por um lado, depurar a linguagem das ambiguidades, nas suas formas correntes e, por outro, desfazer a ideia de que o pensamento metafísico seria capaz de organizar um conhecimento próprio, a partir das suas representações, como aconteceu pelo ditame kantiano da razão pura, que reduzia todos os conhecimentos, cientificamente válidos, aos juízos sintéticos a priori.

CONCLUSÃO

Tudo isto nos conduz a novas leitura éticas e, per essentiam suam, a uma ética global, a qual necessita de aprofundamentos epistemológicos, nomeadamente daqueles que surgem da Ética Proposicional. Assim, a globalização semântica da Ética Analítica, através da verificabilidade, será fundamentada através das Lógicas Deônticas e das Lógicas Modais, sendo um labor de investigação, em Ética e Bioética, que ainda não foi realizada, apresentando-se como área promissora no mundo da investigação e da axiologia destes saberes. A globalização das Éticas Proposicionais será crescida pela análise lógica, em função das lógicas modais aléticas. Uma forma de globalizar a Ética e a Bioética será pela semântica formal da linguagem.

A tarefa da análise lógica da linguagem moral, empreendida por significativos representantes do Circulo de Viena, com particular relevo para Wittgenstein, permite-nos determinar as caractrísticas próprias do discurso moral. Naturalmente, os juízos éticos podem ser encarados in genere como prescrições, isto é, como expressões destinadas a servir de guia para a própria conduta ou como padrão ou medida do valor ou desvalor da conduta. Antes de mais, os juízos morais referem-se a actos livres e, por conseguinte, responsáveis e imputáveis e, nisso, coincidem com as prescrições jurídicas, sociais ou religiosas. Entretanto, a moral revela-se como instância última da conduta humana, do mesmo modo que a religião. Em contraposição com os imperativos dogmáticos, as prescrições morais apresentam um carácter de razoabilidade, isto é, expressam-se como detentoras, de modo implícito, das razões que corroboram os seus comandos. Desta feita, as características específicas das prescrições morais seriam, a nosso ver, as seguintes: auto-obrigação (as normas morais não podem ser cumpridas apenas externamente, mas em consciência); universabilidade dos juízos morais (os graus de obrigação moral referem-se a todo o ser humano) e. finalmente, as prescrições morais apresentam-se pela incondicionalidade em função dos imperativos morais.

Noutra perspectiva do Circulo de Viena, os metafísicos não podem evitar a clivagem dos enunciados não verificáveis, porque se os tornarem verificáveis, a decisão, acerca da verdade ou falsidade de suas doutrinas, dependerá da experiência e, por conseguinte, pertencerá ao campo da ciência empírica. A Ética não faz parte do âmbito das reflexões empíricas .

A Ética não se revela como saber da "praxis" e para a "praxis", a partir do ponto de vista do que "deve ser", isto é, revela-se como saber da acção correcta, não meramente teórica, estimulando a acção pragmática, ainda que toque a cada pessoa o saber aplicar tudo isto às situações concretas. Isto significa que a ética, tal como Carnap sugere, não deverá ser um saber carente de consequências pragmáticas, o qual está condicionado pelo princípio da verificabilidade.

A função da análise lógica consiste na referência de todo o conhecimento, de toda a afirmação da ciência ou da vida quotidiana, com vista a clarificar o sentido dos enunciados e das conexões entre si.

Existem duas ordens de verificação, seja directa seja indirecta. Se o problema se refere a uma proposição, que afirme algo relativo a uma percepção actual, então o enunciado pode provar-se por meio da percepção actual.

Se tomamos um enunciado universal, que se refere a todas as coisas ou acontecimentos, que podem dar-se em quaisquer tempos e lugares, então uma lei natural será mais clara do que o número de casos examináveis. No pensamento lógico-analítico de Carnap, toda a asserção, no amplo domínio da ciência, tem este carácter e afirma-se sobre as percepções actuais ou de outras experiências e será verificável por meio delas. Esses enunciados, acerca de futuras percepções , deduzem-se conjuntamente com outras proposições já verificadas.

Para Carnap, o que dá um significado teorético a um enunciado, não são as imagens e os pensamentos, mas a possibilidade de deduzir proposições perceptivas, por outras palavras, a possibilidade da sua verificação. Com efeito, as proposições, que os físicos afirmam acerca dos campos (gravítico e electromagnético), possuem um perfeito sentido, porque delas são deduzidos enunciados perceptivos. Todavia, a única objecção a estes enunciados seria que não encontramos maneira de os verificar. Assim, o princípio da verificabilidade é fundamental para se poder definir ou descrever o estatuto epistemológico da reflexão ética, bem como descrever o fundamento da física.

Os progressos das ciências questionam e provocam o homem e a sociedade, pois suscitam novas perguntas e novas exigências axiológicas e jurídicas e revelam-se, assim, motivadas, por esses progressos, para novas questões éticas, determinando novo estatuto epistemológico.

Entendendo a ética ,como reflexão sistemática da conduta humana, considerada à luz de valores e de princípios, unem-se de facto os dois sentidos dados, por Carnap, que irão, desde uma

investigação empírica, até a uma filosofia dos valores. Para Carnap, a ética aparece como nova reflexão, onde as proposições, que se podem conhecer, estão baseadas nas experiências morais ou se apresentam sob a forma de uma proposta implicativa , como é o caso do princípio da verificabilidade.

Um dos aspectos fundamentais do neopositivismo lógico de Carnap, com relevância para a Ética, encontra-se nos critérios do significado. O problema não reside somente na testabilidade das sentenças comportamentais, mas no seu fundamento semântico.

Com efeito, a Ética possui duas linguagens. Estas duas são, de um lado, o conjunto de sistemas morais, que integram as culturas, em determinada época da humanidade, com suas intuições, carências e fundamentações, sempre perpassadas pelo imperativo ético; do outro, a necessidade de um consenso empírico, prático e efectivo, que só poderá resultar do debate livre e organizado, desembocando na determinação de normas , a fim de se manter, na humanidade, uma indispensável coerência no agir.

Na Lógica de Carnap, a grande tarefa da Filosofia encontra-se na análise lógica das proposições. Porém, os enunciados metafísicos são considerados, perante o neopositivismo, como pseudo-enunciados. A preocupação epistemológica de Carnap encontra-se em definir o carácter dos enunciados da Lógica, daqueles que constituem os resultados da análise lógica62.

Tal como Wittgenstein, Carnap desenvolveu a análise lógica e descobriu a carência de sentido dos enunciados metafísicos. O resultado da filosofia não é um número de proposições. No futuro, a Ética poderá ser a verdadeira ciência da preservação da identidade do homem e da sobrevivência da vida, se persistir em ser uma forma de aprofundamento do sentido do Bem ou do Dever na acção humana63.

Assim se poderá dizer que a Ética Proposicional é mais um contributo, tal como são as éticas narrativas, as normativas e/ou teleológicas. Trata-se, pois, de uma forma expressiva de ver a ética. A conduta humana surge como uma lógica formal do agir.

O princípio da verificabilidade é significativo na determinação epistemológica, originando a possibilidade de descrever a Ética como ciência, com estatuto próprio e não empírica e como seria pelo pensamento de Carnap, que determinaria o âmbito especializado para a aplicação dos princípios da valorização e do discernimento.

Os estudiosos da Ética Geral e das aplicadas discutem sobre a possibilidade de um paradigma adequado, que estruture epistemologicamente esta ciência. Enquanto uns preferem um paradigma antropológico, que busque as suas raízes na dignidade da pessoa humana, outros inclinam-se para a principiologia, que faz apelo à autonomia, beneficência e justiça64.

Com efeito, a Ética poderá estudar o sentido semântico das morais e dos factos empíricos ao contribuir para um estatuto epistemológico das mesmas, mas só no seu aspecto formal, como também pelas proposições atómicas ou moleculares de vários sentimentos éticos e suas aplicações.65 O estatuto epistemológico não poderá vir da Lógica Simbólica, nem da "análise lógica" das condutas morais. Surgirá antes do condicionalismo imposto pelas variadas antropologias, as quais dão fundamento Epistemológico à Ética.

O papel da análise lógica de Carnap funcionará mais como método gramatical do que como fundamento. A análise lógica servirá a ética através do princípio da verificabilidade, permitindo uma avaliação axiológico-ética sobre o sentido das condutas.

O saber analítico, que Carnap, sugere como esquema da linguagem filosófica, não é um saber prático, aparece antes como grau analítico do saber. Todavia, o saber ético deverá ser um saber prático e significa que nem é o tipo de saber próprio da racionalidade teórico-científica, baseado na demonstração dedutiva (lógica matemática) e indutiva (física), nem o tipo de saber da racionalidade instrumental baseado na técnica.

A razão argumentativa em Ética pode adquirir formas variadas, como se exemplifica em diferentes pensadores, perante o emotivismo espontâneo daquele que entende que a opção moral se justifica desde a mera eleição, estando na disposição de dar razões convincentes. Para Carnap, o elemento mais relevante da Ética enquadra-se numa semântica das condutas humanas.


1 RENAUD, M. - «Os Valores Num Mundo Em Mutação». (299-322), p. 305-306.

2 NUNES, Etelvina -«Pós-Modernidade e Valores: para uma leitura de Charles Taylor», p. 11.

3 LAZCANO, R. - «Sobre los valores». In: Revista Agustiana, vol. XXXVI, 1995, (345-359), p. 351.

4 NUNES, Etelvina - «Pós-Modernidade e Valores: para uma leitura de Charles Taylor», p. 12

5 Ibidem.

6 Ibidem.

7 Ibidem, p. 13.

8 Ibidem.

9 VERGÉS RAMÍREZ, Salvador - «La persona es un «valor por si misma», segundo Max Scheler». In: Revista Pensamento, Vol. 55, n° 212, p.250.

10 ibidem, p. 251.

11 ibidem.

12 ibidem.

13 Ibidem, p. 252.

14 Ibidem, p.253-254.

15 Ibidem, p. 254.

16 SCHELER, Max - Ética, nuevo ensayo de fundamentación de un personalismo ético. Tradução do Alemão por Hilário Rodriguez Sanz, Tomo II, Madrid: Revista Ocidente, 1942, p. 383.

17 GEVAERT, J. - El Problema del Hombre - Introducción a la Antropologia filosófica,. p. 194.

18 VERGES RAMÍREZ, Salvador - «La persona es un «valor por sí misma», segundo Max Scheler». In Revista Pensamento, vol.55, n° 212, 1999, p. 253.

19 Ibidem, p. 256.

20 Ibidem.

21 Cf. R. CARNAP - Scheinprobleme in der Philosophie, Hamburg: Felix MeinerVerlag, 1961, 6-7.

22 Cf. Ibidem, 8-9.

23 Cf. Ibidem, 9.

24 Cf. R. CARNAP - Meaning and Necessity, a study in Semantics and Modal Logic, London: The University of Chicago Press, 1956, 205.

25 Cf. Ibidem, Scheinprobleme in der Philosophie, 10-11.

26 Cf. Ibidem, 12.

27 Cf. Ibidem, 13-14.

28 Cf. R. CARNAP - La costruzione logica del mondo, tradução do alemão, Milano: Fratelli Fabri Editori, 1966, 113-117.

29 Cf. Ibidem, 114-115.

30 Cf. R. CARNAP - "Experience and Meaning", in: Philosophical Review, 43 (New York, 1934) 137-138.

31 Cf. M. SCHLICK - "A Causalidade e as causalidades em M. Schlick", in: Eikasia, 18 (Madrid, 2008), 1-25.

32 Cf. R. CARNAP - Filosofia y Sintaxis Lógica, trad. do inglês, México: Centro de Estúdios Filosóficos, 1963, 14.

33 Cf. Ibidem, 15; Idem, Logical Foundations of Probability, Chicago: The University of Chicago Press, 1951, 9-10.

34 Cf. Idem - Pseudoproblemi nella Filosofia, tradução do alemão, Milano: Fabbri Editori, 1966, 1-6.

35 Cf. R. D. BORGES DE MENESES - "O Mal em Kant e Ricoeur: pelo itinerário da negligência", in: Acção Médica, 68 (Porto, 2004) 245-255.

36 Cf. R. CARNAP - Filosofia y Sintaxis Lógica, 15.

37 Cf. Idem - Meaning and Necessity, a study in Semantics and Modal Logic, 23-25.

38 Cf. Idem - Logical Foundations of Probability, 15-16.

39 Cf. Idem - Der logische Aufbau der Welt, Hamburg: F. Meiner-Verlag, 1961, 3032.

40 Cf. Idem - Scheinprobleme in der Philosophie, 302-304.

41 Cf. Idem - Der logische Aufbau der Welt, 69-71.

42 Cf. R. CARNAP - Filosofía y Sintaxis Lógica, 19; Idem, Logical Syntax of Language, Chicago: The University of Chicago Press, 1950, 10-25.

43 Cf. Idem - Introduction to Semantics, Chicago: The University of Chicago Press, 1948, 25-36.

44 Cf. P. RICOEUR - Soi-même comme un Autre, Paris: Éditions du Seuil, 1990, 199-227; G.H. Von WRIGHT - An Essay in Modal Logic, Amsterdam, 1951, 12- 79.

45 Cf. R. CARNAP - Logical Syntax of Language, 50-75; Idem, Der logische Aufbau der Welt, 46-48, 64-67.

46 Cf. Idem - Filosofía y Sintaxis Lógica, 11-12; Idem, Der logische Aufbau der Welt, 69-72.

47 Cf. Idem - Logical Syntax of Language, 80-86.

48 Cf. Idem - Logical Foundations of Probability, 386-391.

49 Cf. Idem - Meaning and Necessity, 233.

50 Cf. E. SGRECCIA - Manual de Bioética, I, Fundamentos e Ética Biomédica, tradução do italiano, S. Paulo: Edições Loyola, 1996, 24.

51 Cf. R. CARNAP - Scheinprobleme in der Philosophie, 2-4.

52 Cf. Ibidem, 4.

53 Cf, R. CARNAP - "Verificability, truth and verification", in: Journal of Philosophy, 31 (New York, 1934) 144-148.

54 Cf. N. BLAZQUEZ - Bioética Fundamental, Madrid: B. A. C., 1998, 21-26.

55 Cf. W. PANNENBERG - Fondamenti dell'Etica, prospettive filosofico-teologiche, tradução do alemão, Brescia: Queriniana, 1998, 69.

56 Cf. R. CARNAP - 'Von der Erkenntnistheorie zur Wissenschaftslogik", in: Actes du Premier Congrès International de Philosophie Scientifique, 8 (Paris, 1935) 1-16.

57 Cf. R. CARNAP - Foundations of Logic and Mathematics, vol. 1, International Encyclopaedia of Unified Science, Chicago: The University of Chicago Press, 1939, 1015.

58 Cf. F. JAVIER ELIZARI - Questões de Bioética, tradução do espanhol, Porto: Editorial Perpétuo Socorro, 1996, 10-11.

59 Cf. L. ARCHER et alii - Novos Desafios da Bioética, Porto: Porto Editora, 2001, 23-24.

60 Cf. R. CARNAP - Meaning and Necessity, 207-209.

61 Cf. Idem - "Testability and Meaning", in: Philosophy of Science, 3 (New York, 1936) 14-15.

62 Cf. R. CARNAP - Filosofía y Sintaxis Lógica, 22.

63 Cf. L. ARCHER et alii - Novos Desafios à Bioética, Porto: Porto Editora, 2001, 20-23.

64 Cf. J. ROMAN FLECHA - La Fuente de la Vida, Manual de Bioética, Salamanca: Ediciones Sígueme, 1999, 38-39.

65 Cf. R. CARNAP - Der logische Aufbau der Welt, 145-146.

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