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CES Psicología

On-line version ISSN 2011-3080

CES Psicol vol.7 no.2 Medellín July/Dec. 2014

 

Revisão da Dimensão Conscienciosidade do Inventário Dimensional Clínico da Personalidade

Revision of the Conscientiousness Dimension of the Dimensional Clinical Personality Inventory

Revisión de la dimensión Escrupulosidad del Inventario Dimensional Clínico de la Personalidad

Lucas de Francisco Carvalho1, Bruna Daniela Balbino de Souza2, Ricardo Primi3
1Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2,3Universidade São Francisco, Brasil.

1 Professor do Programa de Pós Graduação strict sensu em Psicologia da Universidade São. Brasil. lucas@labape.com.br
2 Graduanda em Psicologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
3 Professor do Programa de Pós Graduação strict sensu em Psicologia da Universidade São. Brasil.

Forma de citar: Carvalho, L. F., Balbino, B., & Primi, R (2014). Revisão da Dimensão Conscienciosidade do Invenário Dimensional Clínico da Personalidade. Revista CES Psicología, 7(2), 1-14


Resumo

O objetivo deste estudo foi revisar a dimensão Conscienciosidade do Inventário Dimensional Clínico da Personalidade (IDCP). O estudo foi dividido em seis etapas, desde a revisão da literatura e seleção dos construtos relevantes, até a operacionalização dos construtos e seleção final de novos itens para aplicação. Para a revisão da dimensão, foram consideradas a proposta para a quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-5) e o Personality Inventory for DSM-5 (PID-5), o modelo SWAP e o modelo de Anna Clark. Com base nisso, como resultado, um conjunto de 34 novos itens foi estabelecido na etapa final. Estudos futuros devem buscar investigar as propriedades psicométricas da dimensão revisada, tendo como expectativa índices de fidedignidade por consistência interna mais altos e itens mais patológicos em comparação à dimensão original.

Palavras-chave: Dimensional Clínico da Personalidade, Conscienciosidade, Transtornos Psiquiátricos, DSM-IV-TR, Psicopatologia.


Abstract

The aim of this study was to review the Conscientiousness dimension of the Dimensional Clinical Inventory (DCPI). The study was divided into six stages, from literature review and selection of relevant constructs, to the operationalization of the constructs and final selection of new items for application. For the dimension review, we considered the proposal (section 3) for the fifth edition of the Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-5) and the Personality Inventory for DSM-5 (PID-5), the SWAP model and model of Anna Clark. Based on this, as a result, a new set of 34 items was established as a final step. Future studies should seek to investigate the psychometric properties of the revised dimension, expecting higher reliability indices for internal consistency and more pathological items compared to the original dimension.

Keywords: Dimensional Clinical Inventory, Conscientiousness, Psychiatric Disorders, Mental Disorders, DSM-IV-TR, Psychopathology.


Resumen

El objetivo de este estudio fue revisar la dimensión Escrupolosidad del Inventario Dimensional Clínico de la Personalidad (IDCP). El estudio se divide en seis etapas, desde la revisión de la literatura y la selección de los constructos pertinentes, a la operacionalización de los constructos y selección final de los nuevos items para su aplicación. Para la revisión de la dimensión, se consideró la propuesta (sección 3) de la quinta edición del Manual Diagnóstico y Estadístico de los Trastornos Mentales (DSM-5) y el Personality Inventory for DSM-5 (PID-5), el modelo SWAP y el modelo de Anna Clark. Basado en esto, como resultado, se estableció un conjunto de 34 nuevos items como paso final. Los estudios futuros deben tratar de investigar las propiedades psicométricas de la dimensión revisada, esperando más altos índices de confiabilidad de consistencia interna y items más patológicas en comparación con la dimensión original.

Palabras clave: Inventario Dimensional Clínico de la Personalidad, Escrupolosidad, Trastornos Psiquiátricos, DSM-IV-TR, Psicopatología.


Introdução

Atualmente a personalidade é compreendida como um conjunto de características psicológicas que auxiliam o indivíduo a lidar com as demandas do cotidiano (Millon, Millon, Meagher, Grossman & Ramanath, 2004). As características da personalidade podem se manifestar de maneira mais saudável ou mais patológica, estabelecendo um continuum entre esses polos (Widiger & Trull, 2007). Por um lado, o polo saudável refere-se a modos de funcionamento bem sucedidos ao lidar com obstáculos do cotidiano; por outro, funcionamentos patológicos dizem respeito a indivíduos que não conseguem lidar com as demandas do dia a dia, geralmente acarretando prejuízos importantes em suas vidas.

Em alguns casos, o funcionamento patológico da personalidade pode configurar-se como um transtorno da personalidade (Millon & Grossman, 2007a; 2007b). Como ressaltam Skodol et al. (2011), uma pessoa será diagnosticada com um transtorno da personalidade quando exibir prejuízos relevantes em relação ao self (dimensões identidade e auto direcionamento) e no funcionamento interpessoal (dimensões empatia e intimidade). Considerando as peculiaridades do funcionamento patológico da personalidade, estão disponíveis na literatura científica diversos modelos teóricos para compreensão das características típicas desse funcionamento. Exemplo disso é a teoria dos estilos de personalidade de Theodore Millon.

Com base em sua teoria, nos pressupostos evolutivos e nas categorias propostas no eixo II do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais [DSM-IV-TR] (American Psychological Association [APA], 2003), Millon propôs quinze estilos patológicos da personalidade, que representam padrões de funcionamento da personalidade, também chamados de estilos ou protótipos (Millon et al., 2004; Millon & Davis, 1996; Millon & Grossman, 2007a; 2007b; Millon, Grossman & Tringone, 2010; Millon, 2011). Protótipos são modelos baseados em características que são comuns nos integrantes de um grupo, isto é, são usuais mas não pré-requisitos necessários (Ortigo, Bradley & Westen, 2010). Na proposta de Millon, os estilos/protótipos derivados são, esquizoide, evitativo, depressivo, dependente, histriônico, narcisista, antissocial, sádico, compulsivo, negativista, masoquista, paranoide, esquizotípico, borderline e hipomaníaco.

Ao lado disso, partindo da teoria de Millon e com base no eixo II do DSM-IV-TR (APA, 2003), bem como respaldo empírico no delineamento dimensional (Schroder; Wormworth & Livesley, 1992), Carvalho (2011; Carvalho & Primi, no prelo) desenvolveu o Inventário Dimensional Clínico da Personalidade (IDCP). Trata-se de um instrumento de autorrelato para avaliação de aspectos patológicos da personalidade, composto por 163 itens distribuídos em 12 dimensões, que são apresentadas na Tabela 1.

O uso do instrumento possibilita a obtenção de perfis da personalidade da pessoa que está sendo avaliada, de modo que altas pontuações sugerem características tendenciosas a um funcionamento patológico da personalidade (Abela, 2013; Carvalho, 2011). No que se refere às propriedades psicométricas das dimensões do IDCP, os dados apresentados por Carvalho (2011) demonstram a adequação em relação aos índices de fidedignidade e evidências de validade (com base na estrutura interna e na relação com variáveis externas). O IDCP foi aplicado a 1281 pessoas (1154 sem diagnóstico psiquiátrico conhecido e 127 pacientes diagnosticados com transtornos psiquiátricos) com idade variando entre 18 e 90 anos (M=26,64; DP=8,94), sendo 61,8% do sexo feminino. Basicamente, procedeu-se a análises fatoriais exploratórias e confirmatórias e verificação dos coeficientes de fidedignidade por meio do alfa de Cronbach. Esse índice mostrou-se satisfatório para onze das dimensões completa do instrumento, considerando como ponto de corte 0,70. Além disso, também foram verificadas evidências de validade com base na relação com outras variáveis, especificamente, com as dimensões e facetas do Inventário de Personalidade NEO-PI Revisado (NEO-PI-R) e com diagnósticos psiquiátricos. No geral, foram confirmadas as relações previamente esperadas entre as dimensões do IDCP e dimensões e facetas do NEO-PI-R e também com os diferentes diagnósticos psiquiátricos do eixo II do DSM-IV-TR (APA, 2003).

Por um lado, pode-se considerar os dados encontrados como favoráveis ao uso do IDCP para avaliação de características patológicas da personalidade, por outro, algumas recomendações para reformulações no instrumento foram apontadas (Carvalho, 2011). Entre essas recomendações, a dimensão Conscienciosidade, relacionada aos critérios diagnósticos típicos do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo (Abela, 2013; Carvalho & Primi, no prelo), foi aquela que apresentou mais atributos a serem revisados. Vale ressaltar que a dimensão Conscienciosidade, relacionada a uma tendência à organização, ordem, foco no trabalho, pontualidade, perfeccionismo, entre outros aspectos, é frequentemente apontada na literatura (Lynam, 2012; Miller, 2012; Samuel & Gore, 2012; Widiger & Costa, 2012) como relacionada ao transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo, que se configura como um padrão de preocupação com ordem, perfeccionismo e controle (APA, 2013).

No que se refere aos apontamentos para revisão da dimensão Conscienciosidade do IDCP, o primeiro deles concerne ao índice de fidedignidade encontrado (α=0,69), sendo o único inferior a 0,70 entre as dimensões do IDCP. Ainda que o índice não tenha sido tão baixo, deve-se considerar que o instrumento destina-se prioritariamente ao uso clínico e, por isso, os níveis aceitos de erro na mensuração devem ser observados com mais rigor (AERA, APA & NCME, 1999). Além disso, um segundo importante ponto a ser considerado quanto à dimensão Conscienciosidade refere-se à representatividade do construto avaliado. Apesar de não ter sido realizada uma análise qualitativa focando as especificidades do conteúdo dessa dimensão em relação aos diversos atributos apontados na literatura para conscienciosidade, o trabalho de Carvalho (2011) apresenta indícios do funcionamento da dimensão.

Exemplo disso é a magnitude de correlação encontrada entre essa dimensão e o fator de mesmo nome do NEO-PI-R, qual seja, r=0,52 (p<0,01), e mais especificamente com as facetas Senso de dever (0,45; p<0,01) e Ponderação (0,44; p<0,01), ainda que com as demais facetas da dimensão do NEO-PI-R as magnitudes tenham variado entre 0,31 e 0,34 o que também são magnitudes expressivas.

Pode-se inferir a partir desses dados que a dimensão Conscienciosidade do IDCP avalia principalmente características relacionadas com o cumprimento das obrigações sociais, morais ou éticas, e com o cuidado de pensar antes de agir, que são características típicas das facetas Senso de Dever e Ponderação, respectivamente (Costa & McCrae, 2009).

Mas também, de maneira menos expressiva, com a capacidade de se perceber efetivo e prudente, exibição de atitudes de organização e planejamento, aspiração a objetivos grandiosos na vida, e capacidade para começar e terminar tarefas (características das demais facetas da Conscienciosidade do NEO-PI-R).

Ao lado disso, a literatura científica é consistente ao apontar que a maior parte dos instrumentos avaliando características típicas de conscienciosidade (por exemplo, o NEO-PI-R) geralmente acessa prioritariamente o funcionamento saudável da personalidade (Lynam, 2012; Miller, 2012; Samuel & Gore, 2012; Widiger & Costa, 2012). Em decorrência disso, apesar da relação teórica ser mais expressiva, as magnitudes empíricas das relações encontradas entre a dimensão conscienciosidade e o transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo tendem a variar entre baixa e moderada.

Os dados apresentados por Carvalho (2011) sugerem que a dimensão Conscienciosidade do IDCP está no mesmo sentido do que outros instrumentos utilizados na avaliação de características patológicas da personalidade (além do NEO-PI-R, pode-se ressaltar também o MCMI-III, instrumento desenvolvido com base na teoria de Millon).

Não obstante do que já foi apresentado neste trabalho, vale ressaltar que a média obtida pela amostra de Carvalho (2011) para a dimensão Conscienciosidade foi de 2,5, a maior média entre as 12 dimensões do instrumento, e a média de theta (nível de traço latente com base no modelo de Rasch da família de modelos matemáticos com base na Teoria de Resposta ao Item) apresentada pela amostra nessa dimensão foi a única positiva. Tanto a média quanto o theta sugerem que essa dimensão está mais relacionada a um funcionamento saudável mais que as demais dimensões. Considerando os dados apresentados e a importância de garantir que todas as dimensões do IDCP avaliem prioritariamente características patológicas da personalidade, o presente estudo teve como objetivo revisar a dimensão Conscienciosidade do Inventário Dimensional Clínico da Personalidade. Para tanto, buscou-se na literatura características atreladas à conscienciosidade e também aquelas tipicamente relatadas como componentes do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo

Método

Delineamento e Procedimentos

Considerando o objetivo apresentado, este estudo foi dividido em seis etapas distintas. Na primeira delas acessou-se a literatura para verificação dos atributos tipicamente relacionados às dimensões para avaliação das características patológicas do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo. A literatura com base na teoria de Millon (por exemplo, a última obra publicada pelo autor, Millon, 2011) e especificamente no DSM-IV-TR não foi revisada já que o IDCP foi concebido com base nessas fontes. De modo similar, também não considerou-se a literatura com base no modelo dos cinco grandes fatores (CGF), já que o estudo de Carvalho (2011) demonstrou relações expressivas entre a dimensão Consicenciosidade do IDCP e a respectiva dimensão do modelo CGF. Em contrapartida, considerou-se publicações recentes, contemplando características e critérios diagnósticos não considerados na versão original da dimensão, sendo, proposta (seção 3) para a quinta edição do DSM, o DSM-5 (APA, 2013), bem como as dimensões componentes do Personality Inventory for DSM-5 [PID-5] (Krueger; Derringer, Markon, Watson & Skodol, 2011); as dimensões avaliadas pelo Shedler-Westen Assessment Procedure [SWAP] (Shedler & Westen, 2004); e as dimensões propostas por Anna Clark (1990), que dão base para o Schedule for Nonadaptive Personality [SNAP].

Na etapa dois, foi realizada uma revisão dos modelos considerados na etapa anterior e, a partir disso, selecionadas aquelas dimensões compostas por características relacionadas ao transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo. Essas dimensões e suas características respectivas foram transcritas para uma planilha eletrônica. Então, os autores deste estudo traduziram de maneira independente cada uma das dimensões e características, produzindo um banco de dados composto pelas dimensões e características originais, no idioma inglês, e pelas versões traduzidas. No caso de divergências quanto à tradução, os pesquisadores procuraram atingir um consenso.

A etapa três caracterizou-se pela operacionalização dos construtos elencados, isto é, pelo desenvolvimento de itens para todas as características presentes no banco de dados. Na etapa seguinte, os pesquisadores selecionaram independentemente os itens que consideraram como mais adequados, para que na sequência chegassem em um consenso acerca de quais itens seriam ou não selecionados.

Na quinta etapa foi verificada a representatividade dos 11 itens componentes da versão original da dimensão Conscienciosidade do IDCP em relação aos itens desenvolvidos na etapa anterior. Para tanto, os 11 itens foram agrupados de acordo com seus conteúdos e o mesmo foi feito para os novos itens desenvolvidos. Então, os itens originais e os desenvolvidos neste estudo foram comparados quanto aos conteúdos específicos avaliados em relação à conscienciosidade. Por último, na etapa 6, considerando a comparação na etapa anterior, foram selecionados os novos itens para composição da versão revisada da dimensão Conscienciosidade.

Resultados

No que concerne à primeira etapa, como descrito anteriormente, foram consideradas as propostas para o DSM 5, PID-5, SWAP e de Clark (1990), considerando a relevância desses modelos na literatura. O DSM 5 apresenta características específicas no chamado critério A (isto é, prejuízos no self ou autofuncionamento e no funcionamento interpessoal) e no critério B (isto é, 25 facetas agrupadas em 5 dimensões da personalidade) para o transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo. Uma vez que o PID-5 é um instrumento para avaliação das características patológicas da personalidade com base na proposta para o DSM-5, os itens desse instrumento foram desenvolvidos para avaliar as dimensões e facetas do critério B já apresentado.

De acordo com Shedler e Westen (2004), entre os 12 fatores encontrados no estudo, o fator 8, Obsessividade, é aquele que representa características típicas do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo. E, no modelo de Clark (1990), as características relacionadas ao transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo se distribuíram em diferentes dimensões, de modo que considerou-se especificamente essas características e não as dimensões como um todo. Exceção a isso foi a dimensão Rigidez, a qual é composta por quatro critérios dos quais três são típicos do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo e 1 do transtorno da personalidade paranoide. Também este último critério foi considerado.

Nas Tabelas 2, 3, 4 e 5, representando a etapa dois, estão apresentadas as dimensões e características patológicas típicas do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo encontradas na literatura de acordo com os modelos acessados. Na primeira coluna é apresentado o modelo de base para as dimensões ou características (nomeadas aqui de construto), na segunda coluna está o construto selecionado e na terceira coluna há a definição do termo.

Pode-se observar a partir da Tabela 2 que o entendimento atual do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo no DSM-5 refere-se a indivíduos que se focam prioritariamente no trabalho e produtividade e apresentam limitações importantes na área afetiva da vida. Além disso, são pessoas com altos níveis de perfeccionismo e dificuldade em se relacionar com os outros por carência de empatia, rigidez interpessoal e foco no trabalho. Na Tabela 3 são apresentados os construtos relacionados com o transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo de acordo com o PID-5.

O PID-5 foi desenvolvido para avaliar as características do critério B para o DSM-5, isto é, as 25 facetas agrupadas em suas respectivas dimensões (afetividade negativa, desapego, antagonismo, desinibição e psicoticismo). Em relação ao transtorno da personalidade obsessivo compulsivo, foram propostas duas facetas, Perseverança e Perfeccionismo Rígido. No geral, essas facetas se referem a indivíduos extremamente persistentes e perfeccionistas, uma vez que não conseguem deixar de executar uma tarefa mesmo após diversos fracassos, e por cobrarem desempenhos e tarefas impecáveis de si e dos outros. Além disso, preocupam-se com os mínimos detalhes e são inflexíveis tanto na maneira de realizar as coisas como em ideias e pontos de vista. Na Tabela 4 é apresentado o construto relacionado ao transtorno obsessivo-compulsivo de acordo com o SWAP.

De acordo com a Tabela 4, verifica-se que a dimensão obsessividade está relacionada ao transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo já que agrega características típicas de conscienciosidade. Além disso, inclui aspectos cognitivos e defensivos relevantes para o transtorno referido, como a intelectualização e a mesquinhez, pouco presentes em outros modelos. As características encontradas com base em Clark (1990) estão apresentadas na Tabela 5.

No modelo de Clark (1990) as características relacionadas ao transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo distribuíram-se em cinco dimensões distintas, que no modelo em sua forma completa são permeadas por características de outros transtornos da personalidade. No entanto, a dimensão Rigidez é composta quase exclusivamente por características do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo, com exceção as sentenças "expressa pouco senso de humor" e "orgulha-se em ser objetivo", típicas do transtorno da personalidade paranoide, segundo o modelo. Essas características também foram consideradas, por comporem uma dimensão em grande parte composta pelos atributos típicos do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo. No geral, as características consideradas por Clark (1990) dizem respeito a inflexibilidade quanto ao modo de realizar as tarefas, dificuldade de expressão das emoções, perfeccionismo e devoção ao trabalho, mesquinhez e dificuldade para tomada de decisão.

Na continuidade (etapa três) foram desenvolvidos itens com base nas características selecionadas dos modelos. A operacionalização dos construtos elencados deu-se a partir do consenso dos autores desta pesquisa quanto às sentenças dos construtos para avaliação de características relacionadas ao transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo, de modo que os itens desenvolvidos basearam-se nos 12 construtos detalhados nas tabelas 2 a 5. O número de itens desenvolvidos por construto, em um total de 164 itens, pode ser observado na Tabela 6, que também contempla informações da próxima etapa.

Na quarta etapa, foram selecionados os itens mais adequados dentre os 164 itens desenvolvidos, sendo que em um primeiro momento os pesquisadores selecionaram os itens de maneira independente. Assim, um total de 74 itens foi pré-selecionado e, na sequência, chegou-se a um consenso de um conjunto de 45 itens, como mostra a Tabela 6.

Observa-se que o número de itens desenvolvidos para cada um dos construtos se deu em função do montante de informação inicial obtida pelos pesquisadores acerca desses construtos. Por exemplo, para Perseverança foram utilizadas como base nove sentenças, já para Passivo-Agressivo, somente uma, sendo elaborados 32 itens para o primeiro e quatro itens para o último.

A Tabela 6 é composta por quatro colunas, a primeira referindo-se aos construtos nos quais os itens foram agrupados, a segunda indicando o número de itens desenvolvidos por construto, a terceira composta pelo número de itens inicialmente selecionados e a última com a composição final desses itens. Pode-se observar que o número final de itens selecionados variou entre 1 e 10, totalizando 45 itens. Na continuidade, na quinta etapa, foi verificada a representatividade dos 11 itens componentes da versão original da dimensão Conscienciosidade do IDCP em relação aos 45 itens selecionados. Para tanto, os 11 itens da versão original e os 45 novos itens foram agrupados de acordo com o conteúdo. Na Tabela 7 pode-se verificar o número de itens compondo os grupos criados.

Observa-se que foram criados nove grupos de itens, que abarcam itens originais e novos. Os agrupamentos foram estabelecidos de acordo com a literatura levantada inicialmente, sendo nomeados de: "Constrição emocional", acerca da dificuldade de expressar os sentimentos e uma tendência à racionalização; "Egocentrismo", referindo-se a necessidade de que as atividades sejam realizadas do seu modo; "Intelectualização", reunindo itens sobre uma tendência a compreender o mundo por meio do raciocínio mais do que pelas emoções e sentimentos; "Mesquinhez", agrupando itens relativos à inclinação a valorizar somente o que está atrelado a ganhos e a não dispender dinheiro com elementos considerados triviais; "Minuciosidade", referindo-se a propensão a ficar obcecado com determinados pensamentos e/ou atividades, com atividades laborais e higiene; "Perfeccionismo", acerca da necessidade de organização e ordem, planejamento e perfeição nas atividades realizadas; "Preocupação", agrupando itens sobre uma tendência a exibir preocupação generalizada; e "Rigidez", que refere-se a itens relacionados a tendência a ser rigoroso com os outros e consigo mesmo, necessitando de rotina e pontualidade.

E, por fim, finalizando a quinta etapa, os grupos original e novo de itens foram comparados quanto aos conteúdos específicos e verificou-se o quanto os itens antigos já estavam abarcando conteúdo dos itens novos. A comparação entre os itens originais da dimensão Conscienciosidade e os novos itens desenvolvidos neste estudo levou a exclusão de onze itens. Assim, na sexta etapa, considerando os procedimentos realizados na etapa anterior, a seleção final dos itens desenvolvidos ficou composta por 34 novos itens para a dimensão Conscienciosidade. Na Tabela 8 apresenta-se o número de itens selecionados de acordo com os agrupamentos e construtos, bem como exemplos de itens.

O número de itens por agrupamento variou entre 1 e 9, e um dos agrupamentos, Preocupação, não é representado por nenhum dos itens novos selecionados. Optou-se por manter essa ausência de itens novos já que os onze itens da versão original da dimensão Conscienciosidade já apresenta um item representando esse agrupamento. Pode-se observar que os construtos Perseverança, Perfeccionismo rígido e Obsessividade obtiveram maior número de itens, em função do montante de informação inicial obtida pelos pesquisadores acerca desses construtos, de modo que no início do desenvolvimento dos itens, por exemplo, foram criados 41 itens para o construto Obsessividade, chegando-se a 8 itens na seleção final, enquanto que o construto Rigidez (paranoide) de início tinha 4 itens e no final chegou-se a 2 itens. Além disso, pode-se verificar que para um dos construtos, Auto direção (self), não foi selecionado nenhum item para o conjunto final. Essa opção deu-se já que a descrição desse construto, qual seja, uma dificuldade para concluir tarefas e atingir objetivos relacionados com padrões rígidos altos e irracionais internalizados de comportamento (APA, 2013), envolve elementos já contidos nos outros construtos contemplados.

A partir da finalização da sexta etapa, obteve-se como produto final a nova dimensão Conscienciosidade para aplicação em pesquisa para o IDCP. Essa versão ficou composta por 45 itens, sendo 34 elaborados neste estudo e 11 provenientes da versão final apresentada por Carvalho (2011).

Considerações finais

Considerando o objetivo do estudo, revisar a dimensão Conscienciosidade do Inventário Dimensional Clínico da Personalidade, espera-se que a nova versão da dimensão apresente um índice de fidedignidade mais adequado do que a versão original da mesma, e tenha itens que mensurem níveis mais patológicos do construto latente (conscienciosidade). Em relação à fidedignidade, futuros estudos devem buscar as propriedades psicométricas da dimensão revisada, visando à verificação da consistência interna entre os itens, entre outros elementos. Sobre o nível de mensuração do conjunto de itens, buscou-se desenvolver itens mais patológicos do que os originalmente construídos, por exemplo, é possível observar que o conteúdo do item original "Sempre gosto de estar seguro de ter terminado meu trabalho antes de descansar", em relação ao item presentemente desenvolvido "Nenhum relacionamento é mais importante que meu trabalho", remete a aspectos mais saudáveis da personalidade, uma vez que se refere a foco nas obrigações - característica constantemente almejada na sociedade-. Já o segundo item apresentado tem atributos mais patológicos, uma vez que envolve questões de secundarização dos relacionamentos ao trabalho e produtividade, rigidez e obstinação que afetam negativamente o relacionamento interpessoal.

Entre as limitações deste estudo, ressalta-se que não foram considerados todos os modelos propostos na literatura, sendo os juízes do estudo os próprios pesquisadores. Para pesquisas futuras recomenda-se verificar se a nova dimensão é funcional, bem como evidencias de validade e fidedignidade. Sugere-se também que o mesmo estudo seja feito com as outras dimensões do IDCP. Apesar da incidência dos transtornos da personalidade na população geral, no Brasil são escassos instrumentos que se proponham a avaliar esses funcionamentos patológicos da personalidade, sendo assim, espera-se que esta pesquisa contribua com o campo de avaliação dos transtornos da personalidade no país.


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Recibido: Agosto 9-2013 Revisado: Junio 22-2014 Aceptado: Septiembre 24-2014